Se calhar vamos começar pelas apresentações não é? O meu nome é BH, tenho 25 anos acabadinhos de fazer risos, vivo na margem sul, na Cruz de Pau, fica no Seixal e neste momento… sou solteira, não é?!! risos E neste momento trabalho no programa Escolhas, que é uma organização governamental sedeada nos Anjos. Trabalho na área de intervenção social. E trabalho num bar à noite na margem sul. Ahhh, ora, eu nasci em França, sou filha de pais caboverdianos e vivo em Portugal desde sempre. A minha nacionalidade é caboverdiana mas, como eu costumo dizer, eu sou um bocadinho uma cidadã do mundo a nível identitário. Eu acho que consigo apanhar um bocadinho da Europa, um bocadinho das Áfricas, por isso acho que acabo por ser já um fruto do mundo no seu todo. Ahhh, pronto para me conheceres um bocadinho melhor, de interesses quero muito explorar, ahhh, a América latina gostava… a nível profissional gostava muito de explorar a América latina e as Áfricas, acho que tendo em conta a área social há muito trabalho a ser desenvolvido e poucos recursos humanos para o desenvolverem, ahhh, pelo menos qualificados.
Irmãos tens?
Tenho, tenho dois irmãos, a minha irmã concluiu 30 anos agora, dia 28 de Agosto, e neste momento está fora do país. É licenciada também, trabalhou cá durante 4 anos e em Janeiro de 2014 decidiu imigrar para o Reino Unido e lá está. E está a correr bem! E tenho um irmão mais novo que tem 19 anos, concluiu já o 12ºano e está um bocado perdido em relação ao que vai fazer daqui para a frente. Está numa fase de decisões, de tomar decisões, que é normal. Todos nós passamos por ela, uns mais rápido, outros menos, mas todos passamos por ela. É bom perguntares assim crias-me um fio condutor dentro do que queres que eu diga ou que precises que eu diga, precises saber.
Eu vou perguntando…
Portanto, interesses profissionais: viajar, ter experiências profissionais na área social fora, ahhh, fora da Europa, gosto de ler muito, gosto muito de ler, gosto de história, sou uma perdida por história mesmo, ahhh, adoro música, faço tudo com música, portanto, o meu percurso escolar foi-se todo…
Antes de começares com o teu percurso escolar, precisava saber dos teus pais, que escolaridade é que têm?
A minha mãe é… trabalha num restaurante, é cozinheira, tem 46 anos, os meus pais são divorciados, ela tem a 4ª classe, ela tentou mais tarde (e grávida do meu irmão mais novo) frequentar o ensino básico, sim quinto e sexto, mas não concluiu. Portanto, tem a 4ª classe. O meu pai, eu não quero enganar-vos, pronto! Eu não tenho uma relação muito próxima com o meu pai. Conheço-o e ele é uma pessoa relativamente… vai sendo muito presente ao longo destes meu 25 anos de vida, mas não é uma coisa regular nem certa. O meu pai, não quero induzir em erro, mas acho que ele fez o 9º ano. É um homem inteligente, eu acho-o um homem extremamente inteligente, apesar de todos os defeitos que tem é muito inteligente. A minha mãe já é aquela típica mulher caboverdiana que os pais imigraram para Portugal e ela já cresceu aqui, mas foi criada com o intuito de trabalhar. Pronto, tinha que ir trabalhar para ajudar os pais, portanto, ela nunca procurou desenvolver-se a nível académico nem nada do género. Procurou… eu acho que ela acabou por ir procurar essa concretização através dos filhos, portanto, ela criou-nos aos três sozinha e… tentou ali incutir-nos a necessidade e importância de estudarmos, tentarmos ser alguém, de procurarmos ser alguém no mundo que é tão difícil, blá blá… aqueles aconselhamentos que acho que pelo menos todos os pais deveriam dar aos filhos. E assim foi! Cresci com pais separados, a minha mãe a trabalhar para nos conseguir sustentar e dar-nos o apoio necessário para nós prosseguirmos os nossos estudos. Eu acho que acabei por ganhar aquele sentido de obrigatoriedade em concluir isto com sucesso. Era a forma que eu via as coisas, oh.. está… pronto, às que quiseres… dos três filhos eu fui a mais… que acabei por dar mais dores de cabeça a minha mãe por uma série de aspectos, mas no que tinha a ver com a escola e com os meus resultados escolares eu sentia uma obrigatoriedade em fazer as coisas sem criar qualquer tipo de problema. Eu recordo-me que a minha mãe deixou de ir às minhas reuniões escolares no 5º ano. Ela só até à 4ª classe é que nos acompanhou. A mim e foi igual para os meus irmãos, tanto para a minha irmã mais velha como para o meu irmão mais novo. Só até à 4ªclasse é que ela ia à escola e saber como é que as coisas estavam. A partir do 5ºano foi mesmo tida uma conversa formal em casa, do género “minha filha agora vais ganhar outra responsabilidade, vais para uma escola mais longe…”, aquela conversa natural que os pais dão aos filhos quando há a transição do 4º para o 5º do ensino primário para o básico e, e… pronto disse-me por razões profissionais, ela própria, por falta de tempo de não me poder acompanhar já nesta fase que eu teria de ganhar a responsabilidade de concluir aquilo de fazer aquilo ela costumava fazer a comparação “eu tenho todos os dias me levantar para trabalhar para vos pôr comida na mesa e vocês têm que todos os dias se levantar para ir para a escola e fazer as coisas como deve ser pensando que eu me estou a esforçar para vocês aí estarem” e pronto, foi isto! Fiz o 5º, fiz o 6º, fiz o 7º nessa altura vivia com a minha mãe, com a minha avó, com primos, com a minha irmã portanto eramos muitos em casa, ahhh, tanto tios como sobrinhos como a minha avó o meu avô, no 9º ano no meu 9º ano eu mudei de casa foi uma altura em que os meus pais reataram e nós fomos viver para Arrentela, ahhh, e mudei de escola e a coisa não correu muito bem…
E onde é que moravas antes disso?
Na quinta da Princesa. Mudei de escola, fui para Arrentela e fui para a José Afonso e não correu muito bem. No primeiro ano foi assim a revolta da adolescência, os namoradinhos e não sei quê. Tive um período em que tive algumas negativas. A primeira vez e única e última que tive negativas a minha mãe encostou-me contra a parede literalmente então pronto, ganhei juízo deixei-me de tretas e continuei como tinha que continuar. É importante também dizer porque acho que acaba por contribuir de alguma forma para o que tu estás… para o estudo que estás a fazer, eu durante a minha 1ª classe ao meu 5º ano não vivi com o meu pai nem com a minha mãe, eles estavam meio separados, meio juntos, porque o meu pai esteve preso durante esses 5 anos, o meu irmão nasceu uma semana depois, o meu pai foi preso e depois só o voltei a ver 5 anos depois, já eu estava a passar para o 5º ano. E daí depois nos termos mudado para Arrentela e eu ter… os meus pais se voltarem a juntar e eu ter prosseguido, no 10º, 11º e 12º sem sobressaltos. Tirando o episódio do início do 9º ano, o 10º ano também foi um ano… foi um ano muito interessante. Foi aquele período da escolha da área indicada para mim, coisa que eu não tive muita dificuldade porque sempre fui muito certa na escolha. Eu sabia o que é que eu gostava e sei aquilo que gosto. Comunicação! Gosto muito de comunicação e então, pronto! Fui logo! Fui para humanidades, conclui o 12º, aí levantou-se o grande problema: “ai o que é que eu vou fazer a seguir?…”, eu não sabia. Sabia que queria ir para a faculdade, não sabia o que é que queria tirar, não sabia. Estava muito indecisa entre comunicação, ahhh, jornalismo, sociologia e relações internacionais, ahhh, e tive entretanto um sobressalto que foi o facto de não ter de… não estar… não ter a minha situação a nível de documentação regularizada no país. Então, isto descobri com 18 anos. Eu não sabia! Porque até ao 12º ano sempre… nunca tive problemas para as matriculas da escola. Nada! A minha mãe é que costumava tratar disso. Até nunca tive problemas nenhuns quando acabei. Então, o 12º ano… comecei a ver faculdades e foi então que a minha mãe me explicou que eu até aos 18 anos estava coberta pela documentação dela, mas já não tendo 18 anos, aliás, já tinha 18 anos na altura ahhh, que essa lei já não valia e portanto eu basicamente estava em situação irregular no país. Eu frustrei!
Ou seja nem sequer tinhas documentos estrangeiros…
Não tinha nada! Não tinha absolutamente nada! Frustrei complemente, quer dizer, eu estava num impasse. Não podia trabalhar, não podia estudar… foi quando me surgiu a tal ideia, o tal projeto que eu estava a contar que vou fazer umas pesquisas. E foi onde eu percebi que não consegui perceber qual era a percentagem de estudantes, portanto, caboverdianos, Angolanos, Guineenses, etc. no ensino superior e não consegui encontrar essa diferença. Há alguns dados em relação aos estudantes africanos em Portugal no ensino superior, mas não há nada especifico por faculdade, por área geográfica… não há! E é uma coisa que me interessava para o que eu estava fazer, a desenvolver. Voltando outra vez ao impasse… portanto, fiquei um ano e meio numa guerra aberta com o CEF para me poder legalizar. Meti a minha mãe de lado, entre aspas, claro, decidi eu assumir a frente de combate e comecei então a tratar da minha legalização, da minha regularização, que acho que é uma palavra mais gira. E passado um ano e meio lá consegui. Aos 19 anos fiz a inscrição para a faculdade. Não entrei na primeira opção, entrei na segunda. Entrei em relações internacionais aqui em Lisboa, no ISCSP e conclui. Foram três anos de licenciatura maravilhosos. Foi brutal! Se eu pudesse (e eu costumo dizer isto às pessoas), se eu pudesse estudava a vida toda. Claro, obviamente em áreas que me interessam, mas se pudesse estudava a vida toda. Gosto mesmo do processo de aprendizagem. O que eu costumo dizer a pessoas que estão a acabar o secundário e têm dúvidas se vão para a faculdade ou não, que ah estou farta de estudar e não sei o quê… o ensino superior, acho que é a única fase da vida que realmente tem gosto de estudar o que está a estudar porque à partida estás a estudar para a área que te interessa trabalhar o resto da tua vida. Por isso as temáticas são de alguma forma interessantes pelo menos é a minha… foi a forma como encarei o ensino superior e foi o que continuei a sentir depois de abandonar. Portanto, terminada a licenciatura em 2012 estive durante 6 meses a fazer uns projetos com uma coisa muito informal, muito freelancing, muito à Ângela como eu costumo dizer… de vez em quando cai umas coisas do céu e estou um ou dois meses a desenvolver uma coisa qualquer e depois acabo… e foi simplesmente passageiro. Foi ali que o Centro de História e Relações Internacionais, que fica em Belém… estava um anúncio na net, eu mandei o currículo e o homem ficou um bocado encantado com o meu percurso profissional e escolar, porque eu comecei a trabalhar cedo no meio desta história toda. Eu fui trabalhando em vários sítios para me poder sustentar em nível mais pessoal, coisas que os pais não podem dar. Eu comecei a trabalhar sem contrato em limpezas e não sei o quê. Comecei a trabalhar com 15 anos. O meu primeiro contrato foi aos 19 foi quando… foi um bocadinho antes de entrar para a faculdade. Consegui a autorização de residência, ainda não era altura de aulas, fui trabalhar para a Sheen, para uma loja de roupa e entretanto depois fui para a faculdade, despedi-me, fui para a outra loja para conseguir conciliar horários… mas trabalhar mesmo (com ou sem contrato), comecei a trabalhar com 15 anos em Setúbal em casa de uma senhora a tomar conta dos dois filhos dela e depois fazia limpezas não sei aonde. Depois trabalhava aos fins de semana aqui na Rua do Ouro, na casa de um senhor. A minha mãe passou-se, porque ela não achava correto eu, uma miúda que na altura sei lá 16 ou 17 anos, trabalhar na casa de um homem na casa dos 40, solteiro, numas águas furtadas. Aqui… quer dizer, ela achava aquilo horrível! Eu saía de casa ao fim-de-semana, sábados e domingos, para vir trabalhar. Vinha passar a ferro, limpar e não sei quê, mas pronto! São experiências e eu acho que são essas experiências que nos constroem enquanto pessoa e não tenho dúvidas nenhumas disso. E a pessoa que sou hoje é pelo percurso que tive, as coisas boas, as coisas más, não há cá arrependimento. Há aprendizagem, ahhh…
E o trabalho com contrato foi na loja?
Foi, foi! O primeiro foi em loja. O primeiro, o segundo… trabalhei na Sheen, depois trabalhei na Parfois, depois trabalhei na Primark… trabalhei em montes de sítios. Ahhh, eu tenho um defeito de qualidade e a minha mãe já me diz isto desde que eu era pequena, porque eu acho que é um defeito que é feitio. Eu sou rezingona por natureza e quando eu digo que não sei se isto é defeito ou qualidade… e porque sou rezingona por ser. Eu se vejo se uma coisa não é correta, não é simplesmente: “não concordo com aquilo!” Eu não sou capaz de simplesmente virar as costas, eu falo. Eu digo “acho que isto não está certo! Acho que isto não é assim, não é assado!”, e isso acaba por me afetar muitas vezes profissionalmente. Não, por acaso não sei se tem… não sei se há relação ou não… por acaso nunca… nos trabalhamos mais sérios que tive… porque os trabalhos mais sérios que tive… quer dizer, estou a mentir! Sim, afecta-me profissionalmente! Ia agora mentir! Ahhh, todos os problemas… e por aí saltar muito durante a altura que estava na faculdade. Andei muito de lojas em lojas porque não nos davam condições absolutamente nenhumas. Recebíamos por frações e percentagens, por isso num mês recebia vinte por cento, depois trinta, depois quarenta… nunca sabia quanto ia receber. Achei que a situação era desumana, tendo em conta à forma como trabalhávamos. Moderei, fui para a Parfois. Na Parfois, trabalhei em várias lojas, umas gostei e o meu percurso naquela altura correu muito bem. Depois fui para o Colombo, tive algumas chatices com a gerência, que era uma jovem assim um bocado petulante, então acabei por acabar o contrato e pedi para me vir embora. Depois fui para a Primark, gostei muito, mas era trabalho de escravo e a meu ver era trabalho escravo e então, também me vim embora. E depois, entretanto, depois de sair da Primark, ahhh, depois de sair da Primark acabei em … janeiro, em dezembro de 2012 já tinha acabado a licenciatura, o meu… uma pessoa que coordenou um projeto na Arrentela onde eu morava tinha um projeto local, um projeto, pronto interventivo. Havia um grupo de pessoas que abriram um espaço onde a comunidade podia aceder para uma série de coisas e no meu bairro havia um coordenador desse projecto. Era o Pedro Calado, que atualmente é o alto comissário para as migrações e ele era super meu amigo quando eu era miúda. Ele acreditou imenso. Estava sempre a dizer-me tu és uma miúda genial, espero que consigas e não sei o quê, quero manter o contacto e blá blá… e dito e feito! Passado seis, sete, se não me engano seis anos (sou má em contas), ahhh, ele fala comigo no facebook e pergunta se eu já tinha acabado a licenciatura e não sei quê. Eu disse que já, mas que não estava a trabalhar na área e blá blá… foi quando ele me propôs ir para…. Pronto, ir a entrevista para integrar o programa central do programa Escolhas, que é a identidade que coordena a nível nacional os projetos iguais aos que eu frequentava quando era mais nova, quando era criança e adolescente. E pronto! Eu aceitei, claro. Fui à entrevista que era uma entrevista, dizendo a verdade, era certa. Eu não estava em fila de espera com mais ninguém. Eu fui… ele chamou-me, eu fui, falámos um bocado e eu fiquei automaticamente e é onde estou até agora a meio tempo. A questão é que não são as melhores condições. É um organismo do estado, a remuneração é má, mas é dentro de uma área que me interessa. É a área de sociologia. Nós coordenamos cento e dez projetos a nível nacional que trabalham com comunidades das mais variadas. Desde da cigana às imigrantes. Imigrantes… quando falamos de imigrantes é africanas, de leste, portanto, da América latina, nomeadamente os brasileiros, portanto, trabalhamos com tudo o que são imigrantes. Eu trabalho (como eu costumo dizer), estou sempre a dizer isto, eu trabalho no quarteirão mais multicultural do país e isso tem tudo a ver comigo. Eu gosto daquilo ali, gosto mesmo, gosto do que faço. É pena é ter as condições que tem, mas é um trabalho muito interessante e dignificante antes de mais. E depois, além desse trabalho, já fiz algumas outras coisas. Trabalhei… fiz um projeto durante nove meses no Chapitô (e foi aí onde conheci a N) chamado comunidades, que não conclui por incompatibilidades com a direção e outros, e outros… portanto, eu acompanhei o projeto foi a melhor experiência profissional da minha vida. Foi um trabalho de intervenção social com seniores. Eu nunca tinha experimentado e é diferente. É completamente diferente! O retorno é muito mais rápido e a gratidão, a própria gratidão diária com as pessoas que trabalhamos em relação ao que nós fazemos, com eles é muito maior do que quando trabalhamos com jovens ou com comunidades específicas. Com comunidades e jovens tens que partir alguma pedra normalmente e com os seniores é diferente. Eles precisam daquilo mesmo urgentemente. É tipo… é ontem, percebes e por isso foi a melhor experiência profissional que eu tive. Infelizmente foi no pior sitio de sempre para se trabalhar que é o Chapitô. Tenho muita pena, mas é a realidade. O Chapitô é uma instituição maravilhosa. É uma ideia brilhante, vinda de uma senhora brilhante, mas com alguns problemas. E por isso, eu acabei por ter uns problemas com um dos colegas de equipa. Eu era coordenadora de equipa, tinha um senhor de 60 anos que era irmão da diretora daquilo que não lidou bem com o facto de ter uma miúda de 24 anos (na altura) a coordenar o trabalho dele e portanto, acabou… acabámos de chocar literalmente e para evitar problemas maiores eu e outro colega que entretanto acompanhou a situação e deixou também de se identificar com o projecto… é um colega que se chama Fábio Gil, é ator de revista, é fadista, é compositor, portanto, é um senhor. Tem a minha idade, tem 25 anos mas, como eu costumo dizer, é um senhor. Abandonámos os dois o projeto a sete meses de concretização, portanto, nós acompanhamos o projeto durante sete meses faltava dois meses para terminar e nós entretanto saímos e entraram duas pessoas para nos substituir. Mas, independentemente de todos os contratempos que eu tive nesse projecto, foi a melhor experiência profissional até agora, sem dúvida nenhuma. Para além disso, como disse também, trabalho num bar à noite que é um bar dentro da minha área de residência. É um café bar, um café lounge, como se diz hoje em dia, ahhh, portanto, sinto-me em casa. É interessante, é muito bom para comunicar, portanto, estou ali a pôr em prática um bocadinho a minha boa vocação, a minha vocação para a comunicação…
E o que é que fazes no bar?
Lá? Tudo, servimos às mesas, fazemos atendimento balcão, copa é tudo! Somos uma equipa de sete pessoas, estamos ali tipo a trabalhar… aquilo é um conceito de uma mesa está a falar com outra e a outra mesa está a falar com outra. Conhecemo-nos absolutamente todos, portanto, é um espaço grande mas onde as pessoas que lá vão são regulares. Portanto, acaba por ser uma grande família. A princípio é um trabalho muito cansativo fisicamente, muito cansativo. Trabalho das oito e meia às duas e meia da manhã, costumo chegar a casa por volta das três, mas… passa! Eu não sinto o tempo passar e só sinto o cansaço quando paro realmente e percebo “uau, já trabalhei 6 horas ou 6 horas e meia nisto!”, para depois no dia a seguir acordar às onze ou ao meio-dia para vir para Lisboa, para vir para o Escolhas trabalhar das duas às seis, vir para casa, chegar às sete, ir às oito para o bar e sair à uma, duas da manhã. Esta é a minha rotina. Mais coisas que eu possa dizer que possam ajudar também, ahhh, eu acredito…
Trabalho associativo?
Na minha área é mais associativo. Frequentei durante um ano… era um ano e meio, mas eu não terminei. Eu começo a ficar um bocado assustada comigo, porque às vezes parece que eu ando a começar coisas e não acabá-las e isso é uma coisa com a qual eu não me identifico, mas pronto! Comecei há um ano e meio, sim já fez um ano e meio, um projecto. Não, integrei um projeto que se chama Academia Ubuntu ,que foi também uma experiência brutal, mas eu andava muita cansada. Estava no Escolhas e no Chapitô. Estava esgotada e não consegui acompanhar até ao fim. Acompanhei a companhia até à fase de projectos, depois abandonei a Academia Ubuntu. É como eu costumo dizer, é uma escola informal, é um ensino informal, é um ensino não formal que é o termo mais correto. Nós ali… as competências que tentávamos desenvolver foi as de liderança, de comunicação, de organização e de coordenação. Isto porque a segunda fase da academia… a academia foi dividida em duas fases, uma primeiro em… nós nos cingimos ao estudo e acompanhamento de lideres mundiais e dentro desses meetings que nós tínhamos, semanalmente ou quinzenalmente, vinha gente convidada de vários organismos públicos e privados, íamos a sítios, liamos, tínhamos muitas leituras, algumas leituras obrigatórias. Estudei Mandela, estudei Gandhi, estudei Luther King… Na segunda fase da academia, a ideia era que se formassem grupos e que cada grupo desenvolvesse um projecto. Portanto, houve uma fase de apresentação de projetos tipo mesmo concurso, tipo vais ao palco, tens o projecto, apresentas o projeto e tentas angariar. Tens que vender um peixe para angariar o máximo de, de, de… parceiros possíveis. Eu nessa fase saí, mas o meu projeto ficou e esse, o projeto que ficou e está agora a ser desenvolvido e da qual eu não faço parte infelizmente, foi o tal projeto que eu comecei a criar quando estava sem trabalhar e sem estudar porque não tinha o documento, exactamente. Que era, era a ideia, como eu costumo dizer, a politica do irmão mais velho. Acompanhamento da fase do 10º e 12º ano a jovens de descendência a… imigrante africana. Eu fui mazinha e tivemos discussão, tivemos muito essa discussão. Mas eu queria-me cingir só a comunidades africanas, ahhh, portanto, um acompanhamento contínuo em várias áreas… portanto, perfeito. Porque a literatura e não sei quê… agora explicar-te isto tudo não sei se te interessa mesmo saber… é uma coisa um bocadinho complexa. Ahhh, mas a ideia era basicamente esta e eu que chamei a isto a politica do irmão mais velho, porque foi o que a minha irmã mais velha representou para mim. Eu se no dia que fiz a inscrição para o ensino superior estava ao telefone com a minha irmã para ela me acompanhar que eu estava completamente perdida. Eu durante todo o meu percurso de faculdade e secundário 10º, 11º e 12º ano, aprender a fazer um ensaio, a primeira vez que fiz um currículo, aprender a fazer uma pesquisa na internet, aprender a construir um texto, não foi ensinado na escola e felizmente ou infelizmente também não me foi ensinado pela minha mãe, foi-me ensinado pela minha irmã. Ela foi assim aquela pessoa que não me deu peixe mas que me ensinou a pescar. E eu acho que é uma das grandes falhas das nossas comunidades. É a falta de alguém que ensine a pescar porque as mães, os pais normalmente são ausentes. As mães trabalham muito, os jovens têm que cuidar dos irmãos e depois qual é a parte que acaba por sofrer com as consequências?! É a escola! E por isso, pronto, o projeto era virado para o acompanhamento destes jovens que querem realmente seguir a escola, portanto, os estudos mas, de certa forma, têm ali alguns entraves e eram… iriamos nós tentar abrir caminhos, criar algum apoio a estes jovens. Propus esse projeto na academia, consegui angariar parceiros, começámos a desenvolver o projecto, só que depois para além do cansaço que eu já falei, começaram a querer alterar muitas coisas, a estrutura inicial do projeto e eu tinha de aceitar porque era um trabalho. Criou-se ali uma equipa de trabalho, apesar do projeto ter sido idealizado por mim, não poderia ser projectado à minha imagem… aos meus colegas… eles tinham de facto ter algum dedo na construção do projeto e a opinião deles tinha que contar e começou a perder completamente… deixei de me identificar porque eles queriam trabalhar com escolas, com juntas de freguesia e não se quê… com instituições e eu queria tirar as instituições formais do estado desse tipo de trabalho. Queria um trabalho mais direto com a comunidade. Nós jovens imigrantes ou descendentes de imigrantes com sucesso fazermos diretamente o acompanhamento. Representarmos os irmãos mais velhos destes miúdos, sem ter um professor no meio, sem ter o presidente da câmara ou whatever no meio. E comecei a deixar de identificar com tudo aquilo e acabei por simplesmente desistir. Deixei os colegas com o projecto, disse que se precisassem que recorressem à minha pesquisa e se pudesse ajudar que o faria sem problema nenhum, mas que já não me estava a identificar com aquilo e que já não fazia sentido. E conciliando o facto de já estar muito cansada por causa do trabalho, decidi abandonar a Academia. Custou-me imenso! Custou porque aquilo é uma experiência brutal! Eu acredito que daqui a uns anos a Academia vai deixar de ser educação não formal. Eu acho que aquilo… nenhum, nenhum de nós das… Já houve duas edições. Na primeira, eles conheceram um senhor chamado Desmond que foi o braço direito do Nelson Mandela na África do Sul, na altura da luta contra o apartheid. Tiveram na África do Sul. Nesta segunda edição, vão agora para a África do Sul. Eu não vou porque já não faz sentido, mas é um, um tipo de, epá… ensinam-nos coisas em que não nos ensinam em escola nenhuma e em lado… eu acho que com o passar do tempo, com o passar dos anos a Academia Ubuntu vai ganhar ali mais, qual é o adjetivo certo?!… peso! Por exemplo, no currículo eu já ponho… eu no currículo incluí a Academia Ubuntu, portanto, acho que a nível de aprendizagem, eu aprendi muita coisa sobre liderança na academia porque eu tenho um grande problema. Eu não sou autoritária, eu sou uma pessoa com… como é que eu hei-de explicar, tenho uma personalidade um bocado forte demais. Eu depois acabo… sou muito assertiva e às vezes confundem a assertividade e às vezes choca com a agressividade e eu estou aprender. Eu estou numa fase ainda que estou aprender a separar. Isso é legítimo, né?! Quer dizer, tenho 25 anos, estou a aprender e não sei quê… e a academia ajudou-me imenso nisso. O senhor Mandela era um cabeça, sim senhora! E pronto! Isso foi uma das minhas experiências, mais uma das minhas experiências, ahhh, que a nível pessoal contribuíram para a construção do meu eu, com eu costumo dizer. O que é que eu tenho mais para te contar?!
Voltando assim um bocadinho atrás, tu como estudante como é que te defines mais ou menos, por exemplo hábitos de estudo?
Eu trabalho excelentemente bem sobre pressão risos. Eu era daquelas… quando não era… quando era trabalhos de grupo, eu assumia uma postura mais séria e tendia depois a cair naquela tendência da liderança do… as coisas tinham que ser um bocadinho à minha maneira, não de uma forma negativa, mas eu morro de medo que as coisas corram mal. Eu odiava chegar ao dia de uma apresentação de um trabalho na faculdade e sentir que um dos meus colegas não estava preparado para fazer a apresentação. Porque mesmo que eu começasse a fazer a leitura para a apresentação dois ou três dias antes, eu ia garantir que ia fazer um bom trabalho, não só por mim mas também pelos meus colegas. Portanto, eu sou esse tipo. Eu não sou o tipo de estudante metódico, ahhh, com planos de estudo e não sei quê… não sou nada disso! Atenção, eu estudei em regime pós-laboral. Eu não estudei durante o dia, o que também fez muita diferença, muita diferença! Ahhh, mas pronto! Eu sou uma estudante… sou daquelas… fui um tipo de estudante que sobre pressão trabalhava excelentemente bem e mesmo a nível individual, ou em trabalhos de grupo, ou nas aulas, trabalho bem sobre pressão. Não era lá aquela pessoa que precisava de estudar mil e quinhentos anos antes, tenho… falava demais nas aulas. Sou daquelas pessoas que falava um bocadinho demais nas aulas, gosto de debater as coisas, ahhh…
Notas? Sempre boas?
Média. Eu acabei com uma média de 14, nunca fui brilhante. Tinha áreas que era brilhante e depois tinha áreas que era uma treta. Eu fui compensando uma coisa com a outra, eu lembro-me que as minhas opcionais todas na faculdade foram de sociologia. A melhor nota que eu tive na faculdade foi a uma cadeia opcional de um outro curso. Como é que era, qual era o nome?! Acho que era comunicação nas organizações ou qualquer coisa assim, que eu acabei a cadeira com um 18 ou o que foi, tipo genial. Foi como no secundário, a minha melhor nota foi tipo numa disciplina que não tem nada a ver com o que eu sou. Quer dizer, não tem nada a ver com o que me interessa, que é a psicologia. Sei lá, eu acho que a minha cena é mesmo pessoas. Lidar com pessoas, sociologia, psicologia, comunicação está tudo ali muito interligado de alguma forma. Eu acho que nunca daria para direito, para medicinas, para ciências… Ciências nunca na vida, eu matemática sou uma nódoa, físicas e químicas idem, idem… Pronto, não dava! A minha área são mesmo as ciências humanas. As minhas notas foram médias, sempre. Nunca me senti assim… nunca tive um 7 ou 8, raramente tive menos de 10. Na faculdade também não tinha. Mas, quer dizer, eu acho que veio desde muito nova com aquela ideia de “opá, ó BH é isto que tens de fazer, vê lá que é mesmo, sou para ti e para mais ninguém!” E então para mim aquela responsabilidade de pelo menos um dez.
Como é que era a relação com os professores?
Boa, boa, eu sempre fui muito comunicativa. Não era aquele tipo de alunas que ia a gabinetes e não sei quê. Fui uma vez porque tive uma nota numa frequência que achei que não fazia absolutamente sentido nenhum. Tinha estudado para morrer e tive uma nota muito baixa e então fui ao gabinete da professora e ela lá me explicou porque é que eu tinha tido a nota baixa. Acho que nessa frequência tive um 9 ou um 10. A cadeira era projecto europeu e eu gostava muito, como gostei de todas as cadeiras em relações internacionais. E eu fiquei muita lixada porque, pá, eu senti que fiz aquilo muita fácil, mas ela lá me mostrou os testes… outra frequência… e mostrou-me que eu não tinha feito aquilo que eu pensei que tinha feito e eu fui para casa e preparei-me para a frequência seguinte e tive um 16. Ahhh, mais coisas interessantes para te contar…
A relação com os colegas…
Ah, foi boa, foi boa! Fui, fui… deram o meu nomezinho, passei lá… como é que se chama aquela coisa?!... tipo delegada de turma, mas eu não aceitei. Recusei. Trabalhava também e não sei quê, e não tinha muita paciência. Ahhh, mas a relação dentro da minha turma era também um bocado especial entre todos. Não era só o facto de eu ser uma pessoa comunicativa que por isso dava-me bem com toda gente. O que eu costumo dizer é que estudar também em pós-laboral foi a melhor coisa que me aconteceu no ensino superior. Eu fui à faculdade uma vez de manhã porque me esqueci do telemóvel. Logo aí fiquei assustada com aquele contexto e eu não sei como é que as pessoas conseguem aprender naquele contexto. À noite é outra coisa! É dez mil vezes melhor. Eu e outra colega éramos as pessoas mais novas da turma. Logo aí, é uma vantagem porque estás aprender com professores e estás a aprender com colegas. Toda a gente ali ou noventa por cento das pessoas ali trabalhava, o que também é ótimo porque estamos no mesmo patamar, estás a perceber?! E depois havia um espírito brutal de entreajuda. Nós tínhamos uma pessoa, eu era a pessoa designada para datilografar matéria, eu sou muito rápida a escrever no computador. Depois tinha um colega que era o responsável sempre por organizar datas e etc., e depois tínhamos um colega responsável por diminuir aquilo por tamanho. E nós tínhamos tipo, com é que se chama na faculdade os…?! O que os professores escrevem que é para nós utilizarmos?! Sebentas! Porque nós tínhamos sebentas criadas por nós próprios, portanto a turma de RI pós-laboral 2009/2012 tem sebentas próprias que foram construídas pelos alunos. Claro que a informação vinha dos professores. Portanto, eu o primeiro ano de faculdade, eu só o fiz porque tinha uma turma brutal. Porque eu saía às sete do trabalho… as aulas começavam às seis e eu saía às sete do trabalho em Campo de Ourique. Até chegar à Ajuda já tinha perdido uma aula e meia, percebes?! E houve cadeiras que eu só as fiz pelas petas dos colegas e pela predisposição em ajudarem-me. Portanto, sempre houve o espirito de entreajuda. Nunca tive problemas e acho que a nível de relação com os colegas foi o melhor que se poderia ter. Nós fizemos… nós fazemos sempre jantares de turma (até hoje), em que todos os professores vão. Todos os professores vão aos nossos jantares de turma. É muito fixe por acaso! Juro! Eu costumo vender o peixe às pessoas: “vai para a faculdade, a faculdade é outro mundo, vais crescer, vais mudar, vais aprender muita coisa!”… mas eu acho que não é toda a gente que tem a sorte que eu tive. Eu fui sortuda, não tenho duvidas nenhumas que fui uma sortuda! Tive uma turma brutal! Nós começámos para aí uns 30 e acabámos 15 e éramos irmãos. Nós fazíamos tudo juntos, até as cábulas (isto não se diz), mas até as nossas cábulas… um… bastava um fazer a cábula, quem precisasse de uma cábula essa pessoa ia ser aquela pessoa “toma lá, vá, utiliza mas sê inteligente o suficiente para alterar as palavras senão vamos ser os dois apanhados!”, estás a perceber a ideia?! E a turma inteira a copiar da mesma cábula e nunca ninguém sofreu qualquer tipo de consequência, percebes?! Acho que toda a gente já cabulou na vida, ahhh, e mais…
Mas sempre foi assim desde da primária, a relação sempre foi boa com os colegas ou…
Não, ah sim eu sempre tive um problema. Eu, desde a primária, os meus recadinhos para casa e as observações na pauta… porque tinha a avaliação e depois vinha informações em baixo, e todas as professoras diziam “a BH é uma excelente aluna, mas fala demais!” Eu falo bué risos! Eu falo bué!! Eu não tenho problemas nenhuns em conversar. Eu se conheço aquela pessoa naquela hora, sinto que a pessoa de alguma forma está fechada em si mesma, eu arranjo uma forma de abrir aquilo, estás a perceber?! É feitio! Nem é… e sinceramente nem é uma coisa que me prejudica. Também sei me calar quando tenho que calar, não é?! Não sou nenhuma tagarela incontornável. Sei me calar! A questão é que acho que comunicar é importante em todos os aspetos da vida, não guardando as coisas para nós damos espaço às pessoas para se darem a conhecer, damo-nos a conhecer e pronto, aumenta-nos os anos de vida basicamente.
E o que é que achas das instituições por que passaste desde a primária?
De ensino? Ahhh… eu tenho uma opinião um bocado má das instituições de ensino em Portugal. Eu acho que os professores hoje em dia… não é os professores de hoje em dia, é os professores que temos tido até hoje… também acho que as mentalidades têm vindo a mudar e por isso as coisas vão mudar com tempo, não é?! Mas eu acho que principalmente as provas, tendo em conta a pessoa que eu sou, o meu contexto e etc…. eu acho que o ensino não está preparado! Não é para nos receber, isso é um termo… como é que eu hei-de explicar?!... o ensino, basicamente a estrutura de ensino, os… como é que…?!... desde os critérios que são aplicados para a avaliação à calendarização da matéria que é leccionada, as coisas são estáticas. Eu abro um livro de História, ahhh, do meu irmão, vá não tem de ser de alguém mais velho o livro do meu irmão de 12º ano, ou vejo um livro de História de 11º ano e há temas que ainda são abordados de uma forma muito desinteressante. Por exemplo, a colonização, a colonização e descolonização. Eu tive uma cadeira na faculdade que era a história da colonização e descolonização moderna e eu tive ali altas pegas com os professores, com a professora, neste caso, porque aquilo é uma visão doada e hoje em dia a globalização faz com que as pessoas tenham acesso a muita informação. Não nos venham atirar areia para os olhos, de histórias para o boi dormir, como dizem os brasileiros! Não pega! Vá, reformulem as coisas! Há uma coisa que Portugal tem falta que é de novos pensadores. Tu, se reparares, até uma dada altura tinhas pessoas que tinham ideias e que criavam ideias e que criavam ideologias e não sei quê. Hoje em dia só tens pessoas que estudam as ideologias que já foram criadas. E que tal começassem a fazer novos estudos e ver novas coisas para se dar novo conteúdo as estes jovens que estão a crescer. E aliás, diga-se de passagem, num contexto ou numa realidade completamente diferente do qual nós crescemos, das novas tecnologias, telemóvel, internet, televisão, redes sociais isso tudo são novos conteúdos que têm de ser acrescentados ao conteúdo programático do ensino desde o primário até ao ensino superior. E outra coisa, para mim… as… todas… no país deviam lecionar inglês desde da primeira classe. Inglês faz falta, faz imensa, imensa falta! Pronto, ahhh, basicamente eu acho que há muito trabalho a ser feito a nível do ensino em Portugal, principalmente quando se trata e quando se fala aqui de jovens imigrantes ou de jovens de comunidades. As pessoas têm logo um pré-conceito criado, a ideia do… depois, têm agora a porcaria que inventaram aquela história das turmas especiais, aquelas turmas que agarram nos miúdos que já chumbaram trezentas vezes e põem todos juntos que é uma solução genial. Não sei como é que não tinham pensado nisso antes?! Pelo amor de Deus! Isso é mesmo perpetuar a desgraça. É com tirar as pessoas de umas barraquinhas e pô-las todas em prédios, todas juntas. O que é que eles vão fazer?! Transportar as barraquinhas para os prédios! Não muda nada! Eu acho que estamos numa fase, e mais uma vez falo, na globalização as pessoas têm que misturar, um mix, a mistura é necessária. Aliás, quer queiramos, quer não, vai acontecer. Mais vale nós próprios impulsionarmos essa mistura do que ela acontecer num espaço de tempo muito maior de forma natural. Nós podemos impulsionar e a escola é um ótimo sitio. Quer dizer, os miúdos passam metade do dia deles, senão mais, na escola. É onde ganham as grandes primeiras aprendizagens, mais ou menos, em casa também. É onde ganham muito ali. É onde lhe é transmitido muito do que lhes vai construir a pessoa que são mais tarde, por isso acho que há muito trabalho por fazer. Eu gostava… se eu fosse uma pessoa bué rica, escrevia um livro sobre isto. Eu acho que a educação é tipo tudo! Por isso, ai também ter idealizado o projecto. Eu acho que a educação é tipo tudo. Só falta é darem a faca e o queijo ao pessoal, porque o pessoal só ter a faca e não ter o queijo ou só ter o queijo e não ter a faca não vai lá. É muito difícil! Mais?
E situações de racismo? Já viveste alguma? Em que período?
Já vivi! Directamente, sinceramente não. Eu também sou muito, sou muito, como eu costumo dizer, eu sou muito benevolente, mais ou menos. Por exemplo, há pessoas, jovens africanos, que ficam muito aborrecidos se forem tratados por pretos e eu, no meu caso, eu… por preta… e eu na faculdade a minha alcunha entre os meus colegas para fazer essa distinção, eu era a preta. Preta não sei o quê… sem aquele sentido de pejorativo e portanto, eu sei fazer essa leitura. Eu não me sinto ofendida de maneira nenhuma. Sou de facto uma mulher africana, negra, preta como me quiserem chamar. Não tenho problemas absolutamente nenhuns e tenho muito gosto obviamente e faço questão de o mostrar …
E eras a única?
Na turma por acaso não, havia outra, mas que não era, digamos, que era diferente. E a própria relação dela com a turma era diferente. Era uma pessoa mais ausente, mas desculpa lá eu ter que tirar o meu telefone, mas… [música] ahhh, sinceramente essa situação nunca senti, e tive muitas conversas com esses mesmos colegas a tentar explicar “vocês, atenção! Vocês dirigem-se a mim dessa determinada forma, eu abri-vos o espaço para isso e dei-vos a liberdade para isso, mas em grande maioria e maior parte dos casos, tenho que vos advertir! Quer dizer, é importante! Não é aceitável! É um termo que à partida é utilizado com grande sentido depreciativo e à partida as pessoas vão levar a mal de certeza! Portanto, mesmo tu”… eu a falar com eles… “tens que ver em que contexto vais utilizar esse termo”, mas sinceramente já ouvi coisas como “és uma preta diferente” e eu pergunto logo: “porque falo português como deve ser?! Mas uma coisa não tem nada haver com a outra, tem haver com a língua que eu estou foneticamente mais habituada a ouvir, não é por aí que vais definir ou deixar de definir!”,… mas assim comentários, directamente… eu directamente, sinceramente eu acho que nunca. Sim, já vivi mas fora, não sei se estás a especificar…
Não..
Em geral? Uma vez aqui, exatamente aqui, também já vivi coisas aqui… eu trabalhei com Amnistia Internacional, esqueci-me de te dizer, fiz trabalho de rua, direitos humanos, pronto! Também está ligado à minha área. Estava na faculdade nessa altura também e houve uma das vezes, estávamos… nós trabalhávamos com recrutamento de apoiantes à amnistia, trabalho de divulgação e não sei quê… era maravilhoso também. Tinha contacto com montes de gente diferente por dia, era aqui, normalmente era aqui na baixa… eu estava sentada ali ao pé da H e M, na rua, a ler um livro e já não me lembro qual era o livro, mas era um livro muito chato que eu lembro-me que estava ali, tanto que estava sentada no chão e não é o meu hobby e estava sentadinha no chão a fumar um cigarro e a ler o livro, passa um senhor na casas dos seus 50 e tal 60 e tal, engravatadinho, grisalho, alto, olha para mim e diz-me “vêem para aqui esses pretos fazer fumo…”, eu levantei-me, olhei para aquilo, ainda fiquei tipo… estás a ver?!... olhei para aquilo, olhei para uns alemães que estavam ao meu lado e disse: “Excuse me” e pedi para me guardarem a mala e fui atrás do senhor, pus-me ao lado dele e disse-lhe “olhe, é por essas e por outras…”, mas dei-lhe estás a ver aquele português limpo, limpo, limpo, tipo para ele perceber que nem toda a gente é ignorante como ele e eu disse-lhe “é por essas e por outras que pessoas como o senhor ficam sem dentes, porque você não sabe quem eu sou. É verdade, você não sabe quem eu sou, que tipo de pessoa sou eu e diz esse tipo de comentário. Poderia ser uma pessoa agressiva, ter-lhe-ia magoado com toda a certeza”, mas é verdade e ele olhou para mim, olha para mim tipo, olhou, olhou como quem diz “Poça, fiz merda!” e fez-me um aceno e baixou a cabeça e eu disse “a ignorância é um mal que vai acabar com este mundo!” e fui-me embora e agradeci aos alemães e pedi o meu livro de volta e sentei-me furiosa. Quer dizer, eu não admito que ninguém se dirija a mim dessa forma, eu pago impostos não sou mais nem menos que ninguém no planeta. Nem o senhor Obama, estás a perceber?! E acho que esse tipo de comentário é triste. O senhor também já tinha alguma idade, veio de um contexto que eu não sei qual é mas que provavelmente viveu a colonização e a descolonização e essas pessoas temos que ter em conta… não é desculpar, obviamente que não, mas sou eu a fazer uma análise da situação. Essas pessoas têm problemas, têm de facto alguns problemas em aceitar algumas determinadas coisas, estão na sua liberdade desde que não interfiram na minha liberdade de continuar a existir na minha paz, não é?! E pronto! Mais assim situações de racismo em concreto no geral na faculdade sinceramente nunca senti, no secundário não, porque estudei numa escola que tinha muitos africanos. Era uma zona de muitos africanos no… na primária, eu não estudei na escola do bairro. A minha mãe não me pôs na escola do bairro, ela pôs-me numa escola longe. Eu na minha turma era a única africana e na terceira classe entrou uma outra que veio de Cabo Verde na altura, que era a Elisabete. Não tínhamos africanas. Não havia africanos na escola. Só eu e mais meia dúzia, se tanto. E nunca… se calhar também é por isso que eu tenho esta forma de ver as coisas. Para já, eu sou uma defensora ferrenha da (???46:29) acho que, pá, somos todos seres humanos não me venham com história. Claro que não somos todos iguais! Eu não defendo essa ideia. Nós temos diferenças culturais, normalmente há muita coisa que se faz de forma diferente, percebes?! Culturalmente… mas somos todos seres humanos, corre-nos sangue nas veias, temos sentimentos, temos coração, temos um cérebro, neurónios portanto, a nossa constituição é a mesma. E eu sou um bocado apologista da tal história da globalização. Ainda nem eu nem ninguém sabe muito bem o que é, mas eu acho que de alguma forma contribuí para o crescimento. Pelo menos para o meu crescimento. Eu sinto-me extremamente feliz por ter amigos, amigos asiáticos, americanos, ter amigos alemães… portanto europeus, desde da Alemanha, holandeses, desde amigos da Guiné, do Senegal, de Portugal, de onde quer que seja. Quanto mais tiver amigos, melhor. Mais vou conhecer o mundo sem obrigatoriamente de ter que lá ir. Portanto, eu acho que o preconceito é uma coisa antiga, ridícula, sem pés nem cabeça. Acho que desde que nós respeitemos a liberdade, o espaço do outro, do próximo, somos livres de dizer ou fazer ou agir da forma que considerarmos melhor. Vá, que temos aqui o respeito pela ética, pela condição humana mas são questões que nem sequer se discutem e eu não menciono. Mas de forma geral, não faz sentido a ideia do preconceito. Quando eu digo preconceito, não me cinjo só à questão racial. Tudo! A homossexualidade, as preferências sexuais, etc.. Acho que as pessoas perdem demasiado tempo a ligar à vizinha do lado ser preta ou… amarela ou verde e há coisas muito mais interessantes para nos preocuparmos no mundo. Eu, sinceramente, tal como tu perguntaste já sofreste situações de racismo ou seja eu normalmente eu trato de esquecer esse tipo de coisas muito rapidamente porque são insignificantes. Esta da baixa não me esqueço porque eu fiquei realmente magoada. Não sei! Não estava a espera. Caiu-me mal. Se calhar estava num dia mais sensível e caiu-me mais mal porque sinceramente eu acredito que já me tenha acontecido mais coisas, mas eu não consigo assim recordar. E acredito que tenha acontecido porque o racismo é uma realidade acontece com muita frequência, diariamente, com muita gente. Também não nos vamos enganar que isso já não acontece porque acontece! E muito! A questão é que para mim isso é uma coisa tão ridícula que eu tenho mais que fazer. É pregar a ideia de “deixem-se lá de tretas, o mundo é tao grande! Deixem lá de tretas o mundo é tao grande, põem-se a perder tempo com essas parvoíces!” Acabo por perder anos de vida, saúde e paciência e beleza e tudo mais…
Então de certa forma não afetou o teu percurso ou não deixaste afetar?
Não deixei! Eu acho que nem pensar! Se tantas outras coisas mais sérias não afetaram o meu percurso, coisas mais pessoais, não é… não é poucas ou situações pontuais na minha vida em que pessoas, e como eu já disse antes, interferem que vão afetar o meu percurso. Aliás, alimentam, alimentam positivamente o meu percurso. “Ai é?! Então toma lá! Vamos para te mostrar se calhar que não somos todos ignorantes com tu!”
Mas em termos gerais dirias que Portugal é um pais ainda racista ou não?
É! Eu acho que é a ideia do…. Epá, é tão fácil perceber isso quando as pessoas chegam e dizem “ah eu não sou racista, a minha irmã é casada com um preto” ou “o meu melhor amigo na escola era preto”. Isso para mim é o esforço em se desculpar. Uma pessoa que não tem preconceito nem se esforça para se desculpar. À partida não aborda o tema, não aborda a questão e muito menos indo buscar termos de comparação. Eu tenho muitos amigos homossexuais e não sou preciso de “ah não sou preconceituosa até porque tenho não sei quantos amigos homossexuais” e não tem nada a ver com isso. Ahhh, parece que há a necessidade de essas pessoas mostrarem que não são porque pensam muito nisso e então têm que arranjar uma forma de tentar mostrar que não são. É sinal que estão a perder tempo a pensar nisso, portanto à partida há ali… ainda há, mesmo… e isto é assustador mas é real. E eu com o trabalho de (???50:47) tenho vindo a perceber isso. E mesmo nos mais jovens eu pensava que já essa classe dos 18, 19, 20 atual já não pensava nisto assim da mesma forma… ah e fruto dessa globalização… mas é mentira. Eles ainda fazem alguma diferença. Não é a mesma e a música ajuda muito à mistura, a dança… e são pontos que podem ser explorados para trabalhar nessa temática, mas ainda há! E ainda há aquele preconceito, há! E é um trabalho que está a ser ignorado. Sinceramente eu acho que não há nada que trabalhe essa questão a não ser a luta individual de cada um de nós, as… pessoalmente, eu, tu… provarmos que os negros também podem ir para o ensino superior, podem fazer o mestrado e o doutoramento. Para nos é obvio! Podem como qualquer outra pessoa, mas pronto! Pondo as coisas de forma objectiva, é isto! Sim, nós podemos fazer palestras. Sim, nós podemos ter bons cargos. Sim, nós podemos ser… ter mais do a quarta classe. E isso é um trabalho que está a ser feito e geralmente por cada um de nós quando poderia ser feito de uma maneira mais global. Como?! Ainda não parei para pensar nisso.
E em relação à cultura dos teus pais ?
Ah, identifico-me, completamente! Fui criada com isso também, não é?! E por isso é que eu acabo por me tornar uma cidadã do mundo, porque eu sou caboverdiana, eu tenho documentação caboverdiana e depois eu digo às pessoas que sou caboverdiana, mas nunca lá estive e nunca lá estive, mas eu sou caboverdiana. Para já, onde eu cresci, aquilo é uma mini reprodução de Cabo Verde em Portugal. É um bairro fechado, onde as pessoas estão de porta aberta, que vão para a rua pela amiga e não sei quê… pequenas coisas que se fazia lá. E porque depois cresci a ouvir o crioulo. Portanto, os meus pais falam crioulo, a minha avó fala crioulo, falo… não falo com a fluência que gostaria, porque é uma língua que eu não utilizo com regularidade. Falo com a minha avó, falo em casa com os meus pais, mas assim mais numa onda soft, não é assim nada que eu tenha que fazer nem que faça regularmente. O facto de ter crescido em França, nascido em França também contribuiu para isso. Na altura a minha mãe não quis que nós soubéssemos, portanto, a minha mãe ensonou-nos o francês e o português e recusou-se a ensinar-nos o crioulo. Ela disse que nos ia fazer confusão na cabeça. Ela e o meu pai, foi uma decisão dos dois. “É muita língua, vocês estão em França têm de falar o francês e obviamente que Portugal é um pais que vocês facilmente podem ir lá parar nem que seja só de férias, então têm de aprender o português, mas eu agora não vou estar aqui a enfiar-vos o crioulo cabeça a cima”. Erro, porque as crianças aprendem. Nós enquanto crianças poderíamos ter aprendido as três línguas sem problema nenhum. Mas, pronto! Eram outros tempos. Era aceitável. Depois acabei por desenvolver em casa da minha avó. Vim para Portugal com 4 anos, o francês entretanto já era, já pouco ou nada falo. E portanto, só me resta mesmo o português. Falo português aqui e falo o crioulo em casa. Falo o português em todo o lado e o crioulo mais em casa. Agora o meu funaná e as minhas festas na (53:51), as batoqueiras, amo cuscus, é uma maravilha, cachupa é brutal… quer dizer, eu sou caboverdiana! Eu tenho uma forma de educar caboverdiana, estás a perceber?! A minha forma de lidar com os miúdos, por exemplo… eu acho que a cultura caboverdiana têm uma grande, uma grande qualidade que é a forma como educam os jovens. Nós somos educados para lutar. Podem dizer o que quiserem. Eu não sei, não conheço bem a cultura angolana, a moçambicana ou guineense, mas eu defendo a minha cultura neste sentido. Nós somos educados para lutar. Eu não sei se tem a ver também com o facto das famílias caboverdianas serem famílias de emigrantes de quase todo o lado… tens mais caboverdianos em Portugal do que em Cabo Verde e não dá para pôr todos os caboverdianos do mundo em Cabo Verde. Nós somos um povo que se espalhou, que se mata a trabalhar e que de alguma forma é um povo denta e fomos criados assim. Nós somos frutos da colonização e fomos assim criados do nada e por isso acho que… a minha relação com a cultura caboverdiana podia ser melhor e só me falta uma coisa: ir lá! E já me disseram quando for “não vais crer voltar”, estás a perceber?! risos Epá, identifico-me completamente! Sou caboverdiana, sou! As pessoas perguntam-me e “sou, sim senhora!” e sou mais o que tu quiseres. Podes dizer que sou portuguesa, podes dizer que sou francesa (não sou obviamente)… eu não me sinto portuguesa, nem me sinto francesa. Eu sinto-me caboverdiana, o que é que hei-de fazer a isto?! Sou… vivo em Portugal e gosto da cultura portuguesa e em muitos aspetos também gosto de Portugal, né?! Tirando a parte económica disto tudo, gosto do país mas, epá, sinto-me caboverdiana.
E neste momento já tens a situação regularizada?
Sim já, já! Entretanto, eu para entrar para a faculdade tive que regularizar. Daí ter ficado um ano e meio sem estudar e sem trabalhar em nada como deve ser. Estava a tratar disso.
Então com que nacionalidade é que ficaste?
Caboverdiana, tenho a minha certidão de nascimento e tudo risos! Não me perguntes como é que eles arranjaram isso, mas foram eles que me arranjaram… a embaixada de Cabo Verde. E pronto!
E essa transmissão toda foi feita mais pela tua mãe ou …
Sim. E pela minha avó. As mulheres da minha vida: a minha avó, a minha mãe e a minha irmã são assim os pilares, os três pilares, sem duvida nenhuma. Eu fui criada numa família de mulheres. Eu sou caracteristicamente uma mulher independente. Sou aquela pintura da mulher, só me faltam os gatos risos…
E que pontos positivos e que pontos negativos é que atribuías à cultura caboverdiana, neste caso?
Negativos, vou começar pelos negativos. Ahh, acho que o perpetuar do, do, do desinteresse pela escola. Os pais caboverdianos têm o erro de os filhos chegam a uma determinada idade já não querem estudar então pronto, olha, tá a trabalhar. Logo! Logo! Não há aquele esforço em “estuda, não sei quê, tenta ser melhor de que eu, não sei quê!” Regra geral isso significa se queres parar de estudar, meu filho, estejas no 5º ano ou no 6º, ou no 7º ou no 10º, vais para a obra ou vais para a limpeza ou whatever. É logo, mas logo! Não há aquele incentivo ao estudo e isso tem de mudar. Eu pelo menos vou-me esforçar para que mude. Os meus filhos, se Deus quiser, hão de estudar. Ahhh, mais pontos negativos. Acho que é uma educação um bocado agressiva ainda, é muito baseada no choque, na pressão, física mesmo. O caboverdiano é tendencial… a mãe caboverdiana é aquela mulher que chega-te a roupa ao pêlo. Eu, a mim chegaram-me muitas vezes a roupa ao pêlo. Eu era terrível ainda por cima. Dois aspectos negativos, mais da cultura caboverdiana. Ahhh, e isto agora é mais uma mensagem quase que para o outro lado do oceano, neste caso as próprias ilhas. Eu acho que nós precisamos urgentemente de atrair mão-de-obra qualificada para o país. Cabo Verde é uma ilha que não tem nada, estás a perceber. Tem turismo, tem sal… não tem nada. Nós somos muito pobres e é muito difícil subsistirmos de forma independente. Nós não temos nada e acho que de alguma forma o cabo, os caboverdianos em Cabo Verde deveriam… quando eu digo isto são os caboverdianos da alta, não é?!, são os que mandam, não é?! Deveriam de alguma forma fazer, atrair os jovens como eu e muitos outros caboverdianos que cá estão a irem para o país, desenvolvê-lo das mais variadas formas. Porque não existe só, não é só a agricultura ou só… nós podemos ingressar por outras vias para tentar fazer alguma coisa pelo país e nós somos tantos no mundo inteiro, estás a perceber?!, que não dá, será que não dá para irmos fazer daquelas ilhas mais alguma coisa? A questão é que eles também não nos queriam… estão ali fechados numa cena que eu não consigo entender qual é e não criam nenhum tipo de política de atracção, nada de atractividade, nada. E obviamente que mesmo os caboverdianos que vêm de lá para cá para estudar, chegam cá e depois não querem voltar, estás a perceber?! Tem que mudar, as coisas têm que mudar por lá um bocado. Cabo Verde é uma cultura ainda… os caboverdianos, apesar de muito abertos e muito espalhados pelo mundo, somos muito, muito fechados e muito divididos. Porque depois os caboverdianos existe a divisão os caboverdianos de lá, os que estão fora, porque eles criam essa diferença. Há essa diferença! Mesmo na faculdade, a minha irmã viveu essa diferença. Eles diziam os caboverdianos que estudavam na mesma faculdade que a minha irmã, que era a mesma faculdade onde eu estudei, eles diziam que nós eramos os caboverdianos de cá e eles eram de lá, e a forma como… já a forma como nos comportamos é relativamente diferente, um bocado diferente, a educação também é diferente, mas depois há os sampajudos e os badios e depois não se dão e acho que tudo isto tem de mudar. A nossa cultura, tem que haver uma maior homogeneidade para podermos chegar a algum lado. Senão, é complicado! Aquilo é tão pequenino, estás a perceber?! E nós podemos representar. Nós podemos levar dinheiro a Cabo Verde sem sequer lá ir. Se as coisas fossem bem feitas nas comunidades caboverdianas espalhadas pelo mundo, nós podíamos contribuir financeiramente para o país sem sequer lá irmos. Só que não há ainda um espírito de equipa. Não há espírito de, de nação, de grupo, de povo. O caboverdiano é muito nacionalista, mas não é nada nacionalista. Como os caboverdianos nos Estados Unidos que já não se sentem caboverdianos, tens muitos caboverdianos em Portugal que já não se sentem caboverdianos. Tens caboverdianos, sei lá, em França que já não se sentem nada caboverdianos, estás a ver?! Basta tirarmos o pé, nem é preciso saltar uma geração, deixam de se sentir logo caboverdianos e isso é estranho porque eu nem sequer nunca lá estive e por acaso até me sinto caboverdiana. Não me identifico tanto com mais nenhuma cultura como me identifico com a caboverdiana. Também me identifico com a cultura portuguesa, já sou europeia, mas mais com a caboverdiana. 1.01.08 -
E pontos positivos?
Positivamente, somos alegres… não, estou a brincar. Somos, é como eu te disse há bocado, somos lutadores. O caboverdiano é um povo lutador, não vale a pena, acho que está no sangue mesmo. Ahh, e outra coisa positiva que vou pegar numa notícia que vi… os caboverdianos têm uma combinação genética única no mundo! Sério, é verdade, vi nas notícias! Nós, enquanto ser humano, temos uma combinação genética que mais nenhum ser humano tem. É engraçado porque somos fruto de uma misturada também desgraçada. Nós temos um bocado do mundo inteiro no corpo. Mais, positivo, ahhh… positivo, o caboverdiano é bué positivo, nós somos positivistas. Há sempre a crença de que as coisas vão melhorar, sempre. E eu gosto disso, fui criada assim. A minha mãe sempre me ensinou que temos que ver que as coisas vão melhorar. A minha avó sempre disse: “não te preocupes!”. Podíamos estar na merda, desculpa a expressão, mas ela havia de nos dizer: “As coisas vão melhorar!” E não é que acho que melhoram! As energias positivas contribuem de alguma forma, acho eu. Pronto.
E da cultura portuguesa, a mesma coisa.
Negativo e positivo? Negativo. Vou começar pelos negativos. O português é muito brando e cómodo. O português é comodista e isso é uma coisa que faz confusão, ahhh… muita confusão. O português… eles precisam de ser um bocadinho mais sinceros e eu generalizo… eu odeio que se generalize, não se deve, mas eu acho que há certas coisas que podem ser generalizadas se encontrarmos uma maioria. E eu nestas coisas que estou a abordar acho que é uma grande maioria. Ahhh, ahhh… como eu estava a dizer, eu acho que o português precisa perder o medo de si mesmo. Têm que ser mais sinceros com eles próprios, parece que estão sempre a enganar. Eu tenho uma… mas estou a falar a sério, não é uma brincadeira! Das várias pessoas com que eu já lidei nestes meus 25 anos de vida e o facto de já ter passado por muitos trabalhos em tão pouco tempo de vida, em muitas coisas diferentes, eu nunca saí do país, é incrível, eu entrei e não saí mais, mas eu sinto que conheço tanta gente, tanta gente, tanta gente… óbvio que não conheço de uma forma… conhecer realmente, mas já lidei com muuuuiiita gente e o que eu sinto no português, é que eles não são sinceros. Eles dizem muito que os brasileiros são falsos, os brasileiros são falsos na maldade, também de uma forma geral. As pessoas… não digo que são falsos, mas não são sinceros. É a tal história do chamam-te preta e a rir, mas estão… eles próprios estão confusos em relação ao termo. Então não utilizes! Se tu próprio não sabes porquê que os estás a utilizar e de que forma é que o estás a utilizar, não o utilizes. E é um bocado por aí. Não são sinceros com eles próprios e acabam por ser… não ser sinceros com os outros. Outro defeito, portanto, são cómodos, pouco sinceros, culturalmente são… fechados! Quando eu digo culturalmente fechados é… a música, não sai. Portugal tem boa música. Hoje em dia Portugal tem boa música. Eles não levam as coisas para fora, não sai. Ahhh, bons escritores, tem, brutais. Tem bons autores, tem, brutais. Bons actores, tem, brutais. Percebes?! E essas coisas não são trabalhadas, nem internamente, nem fora. Está tudo muito confuso. E vou-te dar um exemplo prático, assim muito rapidamente. Tu tens a jornalista que é a modelo, que é a que apresenta o programa X, que é a que entra na novela X, que é… tu em Portugal, uma pessoa na área artística ou cultural, vá, no sector na fracção mais visível, portanto, na mais pública, uma pessoa faz as mil coisas, quando tu tens montes de bons actores por aí em teatro clandestino, em teatro não público, quando tens montes de cantores excelentes a tocar em barezinhos estás a perceber?!, quando tens montes de escritores a escrever coisas e a guardar na gaveta… Estás a perceber?! Culturalmente não há uma procura… e eu acho que a cultura é a base, para além da educação, a par com a educação… eu ei de criar uma santíssima Trindade, já só falta o terceiro… a par da educação, a cultura é tudo para um país se projectar, percebes?! Tu vês os americanos… eu não sou, não sou defensora da cultura americana, nem sou grande apreciadora, eles são muito, é muito bling, bling, é muito brilho, muito somos perfeitos, somos os maiores, somos os melhores, só nos conhecemos a nós… não sou! Mas uma coisa é certa, eles culturalmente e a nível de, eles investem na educação, com as faculdades, o ensino nos Estados Unidos não tem nada a ver com o ensino aqui, ahhh, as escolas, desde as escolas aos professores, os métodos de ensino não têm nada a ver. E mesmo a música, o teatro, o cinema, não sei quê… nem preciso te dizer, eles sabem o que fazem! Sabem o que fazem porque esmiuçam, porque procuram, porque trabalham essas coisas para se projectar. Em Portugal não há isso. Nós estamos na Europa que é um, um território marcado pela cultura (Paris, Londres, Roma, Veneza), as cidades europeias são as cidades da cultura, nós somos mais antigos que os americanos, estás a perceber?! E nós cá… até Madrid, até Madrid que é aqui ao lado, a moda e não sei quê… não é, não são coisas que eu ligo, mas são coisas que no seu todo constroem o país. E culturalmente Portugal só… não está nada bem. Positivo: são afáveis! Digam o que quiserem, eles… e por isso é que a colonização deles foi feita como foi feita. Eles são tão parvos, tão povo, tão afáveis que não… não colonizaram no sentido de fazerem alguma coisa grandiosa e magnífica e que tivesse frutos para todo o sempre como fizeram por exemplo os espanhóis. As colónias espanholas são completamente diferentes das portuguesas. Ou os ingleses, as colónias inglesas são bons países hoje em dia. Os portugueses são aquele povo! Eles precisam ainda de ultrapassar aquela mentezinha do Zé povinho. Até há 50 anos atrás metade da população portuguesa era analfabeta, tás a perceber?! E 50 anos não é nada, estás a perceber?! Positivamente, vá eles são afáveis, não posso dizer o contrário. Ahhh, a cozinha portuguesa é muito boa, eles cozinham que se fartam. No norte então é maravilhoso! Isto, estás-me a perguntar culturalmente… ahhh, afáveis, boa comida… mais de positivo… opá, Portugal é um país cheio de história, Portugal é giro, eu acho. De norte a sul tu tens cada cantinho, cada… pá, é maravilhoso! Gosto! Acho que é um país bonito, culturalmente bonito, com uma história bonita, e acho que é um aspecto positivo. Acho que sim. Não sei se estou dentro do que querias ou procuravas, mas…
Se não morasses aqui, onde é que gostavas de morar?
País? Ahhh, pergunta difícil. Para mim é muito difícil porque eu gostava de morar em todo o sítio. É assim, eu adorava morar numa cabaninha com um alpendre, uma caminha de rede, virada para o mar, isso vale? Não. Portanto, é mesmo um sítio. Opá, sinceramente, sinceramente, não sei. Onde é que eu acho que me daria bem… ahhh, no Brasil, provavelmente, acho que me daria muito bem porque identifico-me. Para já é um país quente e eu gosto do calor, eu não sou uma pessoa do frio, nem do inverno, nem nada disso… ahhh, não sei, gosto! Acho que tenho aquela ideia do Brasil… não é aquela ideia paradisíaca do Brasil porque quando eu digo viver, quando me vejo a viver num sítio, tenho que pensar a nível social, profissional e tudo mais, por isso… pá, não sei. Sei lá. Não sei. É uma coisa que sinto, não consigo te dar aqui o porquê de achar que no Brasil me daria bem. Tenho muita curiosidade e é uma experiência que vou fazer com certeza, Cabo Verde, mesmo, estás a perceber?! Quero experimentar e vou experimentar. Não sei se me vejo, pelas razões negativas de que te falei há bocado, estás a perceber?! Cabo Verde é muito fechado, eles não estão à procura de… ou estão à procura da forma errada de crescer, portanto, não sei se me daria bem ali, não sei se o facto de ter a língua como tenho, não se não me iria prejudicar ali. Ahhh, o Brasil, em África talvez. Eu vou-te dar… posso dizer um país por continente? Acho que é mais justo. Não posso?
Claro.
Na Ásia era a Tailândia. Eu se vivesse na Tailândia era a pessoa mais feliz do mundo, a todos os níveis. Aquilo representa a pura calma, claro que não no geral, mas eu acho que eu vou morrer num sítio calmo, porque eu não sou uma pessoa calma por natureza. Eu tenho que encontrar o meu equilíbrio, não é?! Portanto, eu acho que a minha cidade de eleição ou o meu local de eleição tem de ser um sítio calmo. No Brasil seria a Baía. Eu se tivesse que viver no Brasil quereria viver na Baía. Em África em adoraria viver em São Tomé. Eu acho que São Tomé é lindo e precisa de tanta coisa, tanto trabalho. É um país muita lindo e que tem muitos recursos. Pode-se fazer muitas coisas ali e é lindo, é maravilhoso. Ahhh, na Europa… onde é que eu viveria na Europa? Na Europa eu viveria no Reino Unido, eu viveria em Londres. Vá, não é calmo, acho que é a única cidade que eu acho que eu viveria. A minha irmã… Eu nunca lá estive. Eu acho que não é preciso ir à China para saber o chinês, basicamente. Ainda não estive por lá, acredito que vou começar a viajar a partir de 2015, se tudo correr bem. A minha irmã está lá agora, foi duas ou três vezes em visita para sondar e está lá agora a viver e está sempre a dizer que é a minha cara. Ela diz que sai à rua e revê-me em montes de coisas, portanto, eu acredito em quem lá estive e que seria uma cidade em que eu gostaria de estar. Na Ásia, a Tailânda… acho que é só! Em África, talvez São Tomé, talvez não, mesmo São Tomé. Na América latina, o Brasil. Na América do norte, o Canadá ou o Alasca. Eu acho que… eu não gosto de frio, mas eu acho que vivia muita bem no Alasca. Gosto daquilo. Aquilo é giro. Aquilo é muita giro, é calmo, é paz. Já viste o que é acordares, abrires as janelas e veres serras de gelo, assim montes e montes de gelo, assim os… como é que se chama aquele puxinho do Pai Natal… as renas risos… é tudo o que eu preciso. Uma vida de paz e sossego e felicidade e um trabalhinho num projecto qualquer. Porque as pessoas às vezes pensam: “Ah, isto vais viver para o Alasca, vais viver do quê, do ar?” Não! Tu, uma pessoa a trabalhar na área social tens uma única vantagem (esta é a única, porque o dinheiro não é de certeza!)… é o facto de tu teres pessoas no mundo inteiro e em qualquer canto tu tens pessoas e a partir daí tu podes sempre desenvolver coisas das mais variadas formas. Ok, podes estar interessada em trabalhar em áreas específicas dentro da sociologia ou da área social e aí torna-se mais complicado, mas à partida, uma pessoa que se interesse em trabalhar com pessoas em sociologia ou na área da intervenção social, trabalhando com pessoas tu podes fazer mil e quinhentas coisas em qualquer parte do mundo e acho que é por isso que eu posso viver em qualquer parte do mundo. Se quiser ir para a Austrália, vou para a Austrália, faço um projecto com jovens na Austrália. E hoje em dia há imigrantes no mundo inteiro, tirando mais essa, não é?! Africanos no mundo inteiro. Tens africanos no mundo inteiro. E pronto, é isso.
E o que é que fazes nos teus tempos livres? Hobbies?
Hobbies… vejo filmes, gosto muito de cinema… (desculpa, tenho mesmo que responder porque eu tinha uma coisa combinada aí às oito e meia)… tempos livres, gosto de ler, como te disse. Leio muito, gosto muito de ler mesmo. Gosto de ver filmes, adoro passear, conhecer… eu por ter a autorização de residência, tenho alguma dificuldade em sair… não tenho dificuldade em sair do país, mas irrita-me a situação de ter que pedir vistos e não sei o quê, irrita-me! Então nem me dou ao trabalho. Então o que é que faço? Eu já percorri Portugal assim de uma forma bastante considerável. De norte a sul já vi muita coisa. Gosto de conhecer ruazinhas, mesmo aqui em Lisboa, assim coisas novas para conhecer, ruazinhas e não sei quê… gosto de ir a um barzinho, ouvir uma música (sou viciada em música), ouvir uma música, estar com amigos… ahhh, mais. Hobbies, assim, não é nada de especial. Ler, ver filmes, passear ao ar livre, não gosto de centros comerciais nem um bocadinho, nem um bocadinho. Não sei se é por já ter trabalhado também em muitos, mas não gosto. Acho que é um programa que não tem gracinha nenhuma. Ahhh, não me acrescenta nada. Pronto, é isso. Ler, ouvir música, filmes, muitos filmes, muitos, muitos, muitos, séries, passear, conhecer pessoas e barzinhos de música ao vivo e é assim. São os meus básicos.
E os teus amigos, de que origens são?
Angola, São Tomé, Cabo Verde e Portugal. Assim, mesmo. Tenho um grupo de amigas mais restrito. Somos um grupo de 7, cada uma com a sua vida, mas somos amigas há muitos anos e não sei quê e uma santomense com angolano, outra é angolana, eu sou caboverdiana, é mais uma caboverdiana que é badia e sampajuda ao mesmo tempo (portanto, o pai é uma coisa, a mãe é outra), tenho.. e uma é tuga. Uma delas é portuguesa. Pronto, é esta mistura. É Angola, Cabo Verde, São Tomé e Portugal.
E como é que as conheceste?
Oh! Como é que as conheci?! Pela zona onde cresci. Foi tudo ali no bairro. Basicamente, crescemos todas no mesmo sítio. Não somos todas da mesma faixa etária, que isso não foi na escola, foi o percurso. Ali durantes os últimos 12, 13 anos, ali mesmo na zona, no bairro.
E como é que defines o bairro? Ainda vives?
É uma comunidade… não, já não vivo. Ahhh, mas é uma comunidade. Tem os seus problemas como qualquer outra comunidade. Nós enquanto família, tu em casa discutes com a tua irmã ou com o teu pai ou com a tua mãe, de vez em quando tens problemas dentro da família. O bairro é uma comunidade, normalmente e é normal que as pessoas tenham problemas às vezes. Têm que ser geridos e por isso é que existem associações como as que eu cresci, para gerir esse tipo de conflito e acho que são indispensáveis nestes contextos. Mas eu acho que é um óptimo sítio para se crescer, sinceramente. Desdramatizando a ideia do bairro que todos nós sabemos qual é a ideia, não é?!, é um sítio óptimo para se crescer. Não há cá ilusões de “Ah!”, estamos a falar de… óbvio que há certos aspectos negativos no bairro, óbvio! Mas também há positivos e sinceramente os positivos sobrepõem-se aos negativos. Porque eu criei ali amizades e tenho pessoas ali com a qual posso contar como se fossem familiares. Por isso, mesmo pessoas fora… de amigas que são muito próximas, que são irmãs, não é?! Ahh, há pessoas dentro do bairro, da comunidade que eu posso confiar para certas e determinadas coisas e sei que posso recorrer a qualquer altura e portanto, acho que isso não se constrói sem… quando não se vive em comunidades como em bairros. É mais difícil como é óbvio.
E sonhos… ou antes disso, ahhh, planos para o futuro?
Quero sair de Portugal. Eu estou a falar a sério, eu estou mesmo a planear aí para… eu posso pedir a nacionalidade aí para março do ano que vem, vou logo pedir e assim que tiver a nacionalidade quero ir logo para o Reino Unido, aperfeiçoar, limar o meu inglês porque eu não uso muito o inglês apesar de ter estudado o inglês do 5º ano ao último de faculdade, e pronto, ser uma língua que eu gosto, com a qual me identifico, não está treinado. Preciso dele super fluente e vou para o Reino Unido, quero ir para ter mais ou menos um ano para ter uma experiência profissional. Gostava de experimentar a amnistia internacional lá, como já trabalhei na de cá, gostava de experimentar a de lá e depois queria muito ir à Ásia ver como é que são as coisas lá, mesmo a nível profissional. E quero ir a Cabo Verde também. Portanto, eu não estou com intenções de parar agora. Eu tenho assim na minha cabeça que para aí até aos 30, 30/31, vou explorar esta ideia de cidadã do mundo que eu tenho, para… até porque faz parte do processo de construção. Eu digo, costumo dizer aí da boca para fora: “Sou uma cidadã do mundo.” Mas é muito vago. Será que sou mesmo? Será que consigo chegar a uma cultura completamente diferente… que eu ainda não experienciei uma coisa destas… chegar a uma cultura completamente diferente da minha e integrar-me de alguma forma, então quero experimentar isto nos próximos tempos. Esse é o meu primeiro plano de futuro. O segundo é encontrar um esposo, ahhh…aquela ideia de… ahhh, como é que se diz?!... normal que toda a gente tem que é encontrar um esposo, viver um grande amor, ter uma ou duas crias e pronto, ter um trabalhinho… é assim, sinceramente é assim que eu quero acabar, mas antes eu quero ter a certeza que não deixei outras coisas por fazer, percebes?! E as viagens são uma dessas coisas. Eu preciso de conhecer o mundo. Primeiro porque estudei Relações Internacionais. Eu conheço o mundo politicamente e economicamente de uma forma que não o conheço socialmente, quando pelo contrário eu sou uma pessoa social, percebes? Portanto, há aqui qualquer coisa que não está a bater certo. Tenho que limar isto. Treinar. O meu plano mais breve é as viagens e a seguir encontrar um emprego, uma coisa, um projecto social que possa fazê-lo, possa prolongá-lo não digo para a vida porque é assim um termo, é assustador dizer para a vida, mas que possa fazê-lo com tempo, sem stress, a meu gosto e pronto, constituir família.
E pretendes continuar a estudar ou não?
Continuar a quê?
A estudar.
Quero fazer uma pós-graduação em desenvolvimento comunitário. É muita preciso, preciso mesmo. Só que para isso não posso estar em Portugal que aqui não dá. É impossível. Eu tenho dois trabalhos neste momento. Trabalho 10h por dia todos os dias, menos, agora desta semana, menos ao sábado. Desde esta semana, menos ao sábado e ao domingo. Até à semana passada só não trabalhava ao sábado. E não consigo ter a possibilidade… pronto, vivo sozinha, epá tenho contas para pagar e não sei quê, tenho que viver, não é?! Porque eu estou cá, existo e tenho que viver. Tenho 25 anos, portanto gosto de ir ao cinema, gosto de comer fora, gosto disto ou gosto daquilo, portanto acbo por não conseguir ter o dinheiro que me possibilitaria continuar a estudar como deve de ser cá. E então vou… o tempo que estiver no Reino Unido faço essa pós-graduação. Também não é uma coisa que leva muito tempo e pronto, sim. Não, muito sinceramente não estou a procura de mestrado nem doutoramento. Acho que neste momento ainda não preciso. Preciso de uma pós-graduação para me fazer o link entre as Relações Internacionais e a área social que é o desenvolvimento comunitário aquele que mais interessa, para ver se consigo aí um trabalho virado para as ONG’s porque é o que eu quero fazer, não tenho dúvidas nenhumas.
E olhando para trás, para o teu percurso, dirias mudarias alguma coisa ou não?
Nada. Juro-te. Nada, nada, nada. Desde… claro que há coisas que me influenciaram ou que tiveram um resultado, não é resultado, um reflexo negativo na minha vida, mas que ainda assim serviram sempre para alguma coisa. Eu ter nascido em França é uma…, como dizem os ingleses, it´s a pain in the ass, porque eu não sou portuguesa por causa dessa brincadeira. A minha mãe ter ido tentar, porque ela foi tentar a vida em França só que entretanto voltaram e foi quando o meu pai foi preso, não deu para irem de volta. Mas, pronto, foi mau ter nascido em França, foi mau o meu pai ter ido preso, mas eu aprendi coisas com isso. Pá, lamento ele errou, teve de ir, teve de ir. Ahh, foi mau ter perdido o meu avô, mas foi. Ele ter deixado de estar presente mudou muita coisa no meu contexto familiar e que também dessa forma acabou por contribuir positivamente para o que eu sou hoje. Portanto, eu acho que eu tento sempre retirar a parte (e isto não é mesmo fantasia, nem é ideológico nem nada, é um esforço diário que eu faço), tirar a parte boa das coisas. Isto de alguma forma há de contribuir positivamente para a minha, para o meu percurso neste mundo. E pronto, é isto! Acho que não mudaria nada.
E eu esqueci-me de perguntar, mas quem é que achas que influenciou mais o teu percurso?
A minha irmã, sem dúvida. Eu devia ter dito isso. Como eu costumo dizer ela é a minha role model , ela é tipo… eu sou apaixonada pela minha irmã mais velha. Estou a falar a sério e ela sabe disso. Nós passamos… ela foi, a primeira vez que… ahhh, não gosto nada de falar nela. É um tema muito delicado e é ridículo porque eu estive com a minha irmã 24 anos da minha vida, ela foi-se embora em janeiro de 2014, eu não estou com ela a 6 meses ou 7 ou… mas parece que já não estou a uma eternidade. Foi ela que me acompanhou, foi ela que me fez ver sem falar que estudar era a melhor opção, que há certas coisas que não se fazem, que há certas coisas que não se dizem. Ela é completamente o oposto de mim, ela é uma pessoa calma, metódica, é inteligentíssima, tás a perceber?! E eu não sou nada disso, eu sou mais… não estou a dizer que sou burra. A minha irmã era daquelas pessoas que não precisava… bastava ir às aulas e ouvir uma matéria e a coisa ficava. Eu sempre fui aquela jovem que tive que estudar, não precisava de marrar mas tinha que estudar. Ela faltava às aulas, a faculdade de manhã, ela houve ali muitas aulas que não compareceu mas depois bastava-lhe dar umas leituras nas coisas e ela é uma mulher inteligente por natureza. Sabe estar, sabe falar, pá, ela é um modelo para mim, completamente. A minha mãe, claro! A minha mãe a minha avó, a minha avó mas é outro tipo de modelo, percebes?! São pessoas de outra geração com outra forma de ver o mundo. Eu quando… tenho, tenho que dizer que é a minha irmã tendo em conta a minha realidade. Sou uma jovem de 25 anos no século XXI, com um percurso assim meio que conturbado e na realidade que temos hoje só a minha irmã poderia servir de modelo, porque de certo a minha mãe e a minha avó teriam tido um comportamento diferente se tivessem, com a personalidade delas, nascido ou vivido esta idade nesta altura. É outras formas de ver as coisas. A minha irmã é jovem, tem 30 anos, ahhh, é mais velha que eu mas ainda assim é jovem e é uma grande, é uma grande mulher, costumo dizer que ela é uma grande mulher. Não arrisca muito e… quer dizer, mais ou menos, é muito… ela devia ser um bocado mais doida, mas pronto, isto são outras… isto sou eu a tentar influenciá-la a ela, né?! Porque é mútuo. E eu às vezes puxava por ela nesse sentido: “arrisca um bocado!” Ela ter largado tudo aqui e ter ido para o Reino Unido para mim foi uma tal e completa surpresa, que ela é metódica e etc. mas nunca foi muito de arriscar. A minha irmã, a vida dela parece que foi desenhada, tipo escrito, estás a ver?! Nada aconteceu fora de ordem e eu não sou nada assim, é tudo ao contrário! risos Mas pronto, sim, ela é o meu modelo, completamente. Acho que lá no fundo eu gostava de ser como ela, mas não. Estou bem como sou, não tenho problemas de inferiorização nem nada disso. Mas sim, acho que se fosse como ela ainda me teria dado melhor, me iria dar melhor porque eu sou… é tipo ao contrário. A minha irmã conseguiu o que conseguiu porque teve alguma sorte na vida, como eu também tenho-me considerado uma pessoa com sorte. Teve alguma sorte na vida, mas teve ali que marrar muito, bater muito com a cabeça, para conseguir por exemplo um bom trabalho. Eu tive sempre sorte. Eu tive sempre sorte! Eu nunca estive mais do que 6 ou 7 meses desempregada, ahhh, sempre consegui resolver as minhas coisas… eu tenho sorte. Eu no meio de todos os problemas que a minha vida já en… que eu já enfrentei na vida, eu acho que sou uma pessoa com sorte porque as coisas bem ou mal vão aparecendo. Claro que tens que correr atrás sempre um bocado, mas acho que bem ou mal se abrires uma cortina a outra acaba por se abrir, entra luz por um lado acabas por iluminar a porta, a sala toda. Um bocado por aí.
E como é que te defines como pessoa?
Sou divertida, sou agressiva um bocado, sou teimosíssima quando acho que tenho razão e toda a gente diz “Ah, é claro que é quando achas que tens razão!”. Não, eu sou daquelas pessoas que eu estou-te a dizer que isto é verde, tu dizes que isto é vermelho, tu provas-me que isto é vermelho e eu dou-te razão. Ok, tens razão é vermelho! Não sou aquela pessoa que é teimosa cega. Sou muito teimosa, às vezes dá problemas, mas sou uma teimosa saudável. Teimosa, agressiva, bem dispostíssima, ahhh, alegre, é bem disposta, não é?!, sou assertiva, muito, do bom, do lado bom e do lado mau, sou assertiva das duas formas, às vezes bem e às vezes mal. Ahhh, quando é mal é quando já começa a bater na agressividade, é a tal história que eu estava a falar. Ahhh, sou amiga, sou muito amiga, não sei odiar, nunca odiei na minha vida, já tive muita gente a fazer-me algum mal a sério, mas ainda não consegui odiar. Eu acho que só vou conseguir odiar no dia que fizerem mal a alguém muito próximo a mim, mãe, avó, irmão ou irmã. Porque eu até hoje não consegui odiar, não sei odiar. Raiva não sinto. Sinto-me triste, desapontada, desiludida, uma moídazinha, mas normalmente deito tudo fora por isso é que não se cria aqui o sentimento de raiva. Não fico a roer as coisas, eu mando tudo cá para fora. Ahhh, sou lutadora, mas isso não tenho dúvidas nenhumas, pelo menos tento ser, né?! dentro do que é possível. Sou amorosa. Sou agressiva e amorosa. É engraçado, não é?! Se eu não me contiver… eu faço o exercício diário, eu tenho que todos os dias a trabalhar… eu sou ansiosa, eu sou muito ansiosa. E acho que isto não é de ser da idade, porque há pessoas que são ansiosas porque são jovens e são… eu sou mesmo ansiosa. Eu às vezes no trabalho tenho que estar a fazer o exercício de “A, estás a fazer isto, pára já de pensar no que vais fazer daqui a 20, 30 ou 40 minutos, concentra-te só nisto!” Eu estou aqui, estou com a cabeça ali, ali e ali. Faço mil e quinhentas coisas, meto-me em três mil e quinhentas coisas e depois não me consigo fazer, dividir em mil e quinhentas e depois óbvio que piora o meu estado de… eu sou muito nervosa, eu acho que vou ter problemas de coração como a minha mãe que eu sou igual a ela. Sou stressada, percebes?! Sou bué… toda esta energia, esta boa disposição e esta capacidade de comunicação traz também junto esta ansiedade, este… estás a perceber?! E são coisas que eu sabendo vou trabalhando. Acredito que quando for mais velha vou saber utilizar toda esta energia de forma mais inteligente. Pronto!
E achas que és uma pessoa que faz planos?
Faço, como toda gente.
O teu percurso foi consequência de planos ou…?
Algumas coisas sim, outras ocasionais. Há coisas que planeei. As mais importantes são planeadas. Se tu fazes… se continuas a estudar ou não, planeado. Se vais viver sozinha ou não, planeado. Vais comprar o carro ou não, planeado. São coisas, coisas mais importantes na vida, né?!, mais ou menos. Vais ter uma relação com aquela pessoa ou não… são tudo decisões que tu tomas depois de uma ponderação, não são coisas que caem do céu. Depois há coisas que são ocasionais. Profissionalmente tenho… a maior parte das coisas foi ocasional, nasceu a oportunidade… por isso é que eu te digo que tenho um bocado de sorte também. Há esforço, há um esforço! Porque tu ganhas a coisa com sorte, mas para a manteres tem de haver esforço e a nível profissional eu tive alguma sorte e depois conciliando com o esforço fui chegando a algum lugar… ahhh, mas sim, há coisas que são planeadas, há coisas que são ocasionais. Eu quero sair do país, é planeado, percebes?! Quando eu for, é já com uma ideia de para onde vou, com que objectivo, quanto tempo, percebes?! E vou e nesse sítio como quero pular para outro, lá vou fazer a pós-graduação e vou planear, agora quero ir para aqui, tenho que conseguir isto, quais são as melhores opções ali, blá, blá, blá, blá, blá, blá, blá, blá. Vou! Há coisas têm que ser planeadas, não podem ser ocasionais. A não ser que me apareça um shake árabe cheio de dinheiro a dizer toma dez milhões e faz a tua vida. Pronto, aí era tudo muito ocasional risos. Mas não.
e quais foram os momentos mais marcantes da tua vida?
Da minha vida? Estou a escolher, tenho vários.
Podes dizer todos.
Vou fazer do mais cedo para o mais… do mais recente para o mais antigo. O último momento mais marcante da minha vida foi a despedida da minha irmã no aeroporto. Foi horrível! Foi tão mau. Eu vou dizer bons e maus porque há coisas más que também te marcam, não é?! Pronto, a despedida da minha irmã foi a mais recente mais marcante. Ahhh, outra que me marcou muito foi na Academia, um seminário residencial que nós tivemos, em que fizemos um… nós tínhamos, normalmente tínhamos encontros no auditório e depois iam lá convidados e não sei o quê. Foram dois professores ali da universidade Católica e até não sou religiosa… ahhh, ali da universidade Católica que andavam a dar umas formações sobre desenvolvimento pessoal e comunicacional, uma coisa assim e tivemos ali uma hora e meia numa conversa sobre nós próprios e a nossa capacidade de nos conhecermos e de nos revermos nos outros, uma conversa extremamente filosófica, mas que psicologicamente tem um efeito muito interessante e que teve em mim (e até hoje lembro-me)… ahhh, pá, eles de alguma forma não contribuíram para absolutamente nada em concreto, mas estás a ver aqueles dias em que tu chegas a casa, encostas a cabeça na almofada e pensas: “Eu tenho mesmo que fazer aquilo!” ou opá “Eu tenho a certeza que sou capaz de chegar ali!”, eles tiveram essa, essa, esse efeito. Deu.. estás a ver quando tu ouves alguém a falar e os teus olhos estão a brilhar tipo “Epá, é mesmo isto que eu precisava ouvir!”, pronto, isso foi um momento marcante. A noite em que o Mandela morreu, foi outro. Doeu-me tanto como quando o meu avô faleceu. Ya, foi… eu sou admiradora eterna do senhor, li mais de 20 livros do homem, escritos por ele, mesmo escritos por ele, sinto que ele me ensinou muita coisa e custou-me bué. Por acaso nem eu estava à espera. Estava com duas amigas, duas dessas amigas desse grupo de 7, estávamos deitadas as três na minha cama e eu estou a passar, a fazer zapping e vejo que o Nelson Mandela tinha falecido. Doeu-me bué. Foi… não consegui conter, tipo saíram-me as lágrimas. Não… enfim. Outro momento que me marcou muito foi o nascimento do meu irmão mais novo, foi a minha desgraça risos. Fiquei tão aborrecida, pá! Perdi o pódio, fiquei deveras chateada. Perdi o pódio. Foi outro momento marcante. Aí quando… o primeiro dia de aulas na faculdade, brutal. Foi buéda lindo! Claro que meti logo conversa com trezentas mil pessoas, fiquei logo a conhecer a turma toda, foi muito fixe. Gostei bué. Estou a dizer aulas, aulas mesmo, porque eu não participei das praxes. Fui só um dia e tive ali uma brincadeirazinha com um veterano numa dança do Michael Jackson, mas não participei da forma intensa que se vê hoje em dia. Nada, nada, nada. Não me fizeram nada, não fui com roupa de… estava normal! Por isso, pronto! Primeiro dia de aulas, foi sentar e dizer “AG, começa aqui uma nova fase!”, porque começa. O dia que o meu avô morreu, né?! Obviamente. E acho que assim, marcante, marcante, marcante, não tenho assim mais nenhum. Que me tenha… que me lembre. Se não me lembro assim de repente é porque não foi assim tão marcante.
E um sonho que tenhas mesmo que realizar? Daqueles quase de criança…
Sou uma sonhadora, bolas! Tu não podes perguntar uma coisa dessas a uma sonhadora. Vou-te contar! Eu gostava muito, muito… não tenho esse sonho desde criança, mas já tenho há alguns anos, há alguns bons anos, desde adolescente pelo menos… gostava muito de conseguir adoptar uma criança. Eu quero ter um filho e adoptar outro. Não quero ter dois filhos, acho que não sobrevivo a dois partos risos. Por isso… eu sou avessa à dor. Toda a gente é, mas eu particularmente. Ahhh, acho que não sobrevivo, não sobrevivo a dois partos, por isso…. Não é por isso, é porque se eu quero ter dois filhos, quero obviamente ter um biológico, toda a gente ou toda a gente que quer ter filhos, quer ter pelo menos um biológico. Há muitas crianças aí que não têm um pai e uma mãe. Posso ter um biológico e um adoptado. E porque não, estás a perceber?! E então, sei lá, é uma coisa que gostava muito de poder concretizar. Mas é complicado! É muita complicado adoptar uma criança. Tens que… desde teres que ter um companheiro ou uma companheira, não é?! No meu caso seria um companheiro… tens que ter companheiro, tens que ter determinada condição financeira, estatuto, blá, blá, blá… uma série de coisas. É muita difícil adoptar uma criança, principalmente neste país. Ahhh, não sei se adoptaria branca, preta, chinesa… não sei. É aquela sensação de chegar a um sítio, olhar para as crianças que lá estarem e procurar a que eu diga “este é meu filho ou minha filha!”. Não tenho aqui um critério. Vai um bocado de encontro à minha velha ideia do, pá, somos todos seres humanos, vou educa-lo como fui educada e pronto, não me interessa a cor das crianças. Pronto, acho que esse é o meu grande sonho e aquele que me parece que está mais, é mais difícil de alcançar, mas que sim é um grande sonho. Gostava mesmo. Depois era as viagens e não sei quê, mas isso é concretizável, completamente. Não é nada que eu ponha naquele suspiro, percebes?! O meu maior sonho de todos os tempos era conhecer o Mandela. O senhor tratou de falecer, pronto, teve de ser substituído. Adoptar uma criança.
Ok. Terminámos!
Terminámos a entrevista?! Eu estava a gostar tanto de conversar…