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Entrevista_de_ND

Jovens adultos descendentes de imigrantes africanos em (dis)posições de destaque: um estudo sobre percursos de mobilidade ascendente entre as minorias

SubtítuloEntrevista com ND
Data2017
Sexomasculino
Idade: 30
Nível de formação: 12º ano
Ocupação: professor de capoeira, músico e animador sócio-cultural

Ora bem. Idade?

30.

Nacionalidade?

Portuguesa.

Não tens dupla?

Não, mas prontos, porque sou negro ?

Zona de Residência?

Hum, Lisboa.

Escolaridade?

12º.

Profissão?

Animador Sociocultural.

Número de irmãos?

Hum, quatro.

Idade?

As idades? Deixa-me ver se eu consigo, hum, 36, 34 e 31.

Falta um.

E a mais nova tem 21. 21, é isso mesmo.

Estado Civil?

Solteiro.

Número de filhos?

Zero.

Nacionalidade do pai?

Caboverdiano.

Escolaridade?

Do pai? , era a Classe.

Profissão?

O meu pai era Pedreiro.

Nacionalidade da mãe?

Caboverdiana também.

Escolaridade?

Hum, a minha mãe não estudou. Não estudou.

Profissão da mãe?

Empregada Doméstica.

Porque é que os teus pais vieram para Portugal?

Como toda a gente, em busca de algo melhor não?

Pronto, enquadramento feito, agora queria que me começasses a contar um bocadinho como é que foi a tua escola primária, o ciclo preparatório.

E a escola primária, vamos voltar atrás então ? Então, como é que foi a escola primária, hum, lembro-me perfeitamente, do inicio, não no ano, lembro de no, no ano ir para a escola sozinho, frio nas orelhas risos, mas prontos, hum, depois na altura, hum, não era assim, digamos que, eu sempre fui assim um miúdo assim, que conseguia assim seguir bem em qualquer meio não? Desde miúdo que nunca tive problemas com os colegas, tive alguns mas prontos isso é, é outros assuntos ? Mas prontos é, não, não foi difícil, como toda a gente as vezes pensa por, tipo, eu vivi num bairro ? Bairro Santa Filomena e prontos, toda a gente pensava que, ou normalmente a ideia que as pessoas têm é que por se viver num bairro, muitas dificuldades em, em se inserir e essas coisas todas. Eu não fui, não fui um miúdo desses, que tem essa dificuldade de, de tar num meio de outras pessoas sempre tive o à vontade de tar seja com quem for, então não, para mim não foi difícil, foi fácil, era um miúdo que em relação ás notas e essas coisas, sempre fui super atinadinho, tirando depois mais tarde, , quando cheguei ao ano, é que foi um bocado assim mais atribulado, hum, conheci outros ambientes , conheci outros colegas, a mudança, quando, quando tu tens até à classe ? Um certo tipo de, de colegas, tu tás habituado à rotina e então é, é tudo mais fácil, de repente muda tudo. No ano, começa a conhecer outras pessoas doutras escolas, doutros bairros, confesso que eu descarrilei um bocado, principalmente nas notas, mas é eu tentava andar mais ou menos sempre dentro do, do eixo, mesmo porque os meus pais eram assim pais rígidos, hum, com bastante regras também não é? Hum, então eu não podia tar assim muito além da linha , mas pronto, depois ano, chegando ao ano comecei a trabalhar nas férias, hum e prontos, comecei a ganhar o meu dinheiro e prontos, tornou-se assim um bocado mais fácil essa situação de , de não depender dos pais ? Eu juntava o meu dinheiro e, e prontos dava assim para o ano todo. Chegando ao ano, hum, não terminei logo o ano, hum, fui até meio, depois as dificuldades em casa aumentaram, porque o meu pai ficou desempregado e a minha mãe também, então eu tive que optar por trabalhar e foi e terminei a escola para dois, três anos atrás, terminei o 12º à noite, tava a trabalhar e o meu percurso foi, foi basicamente este. Não, não foi assim nada de foi onde eu aprendi a viver como é óbvio , mas não, não teve assim, muita turbulência como eu costumo dizer.

Então não tiveste recordações, tiveste foi uma paragem certo?

Tive uma paragem, uma longa paragem e depois tive que voltar mais tarde , para terminar.

E como é que eram os teus hábitos de estudo? Eras estudioso, estudavas com frequência, ou…

É assim, eu não precisava de estudar muito para ser sincero, não precisava de estudar muito, até porque durante as aulas eu tava sempre com atenção e fazia vários apontamentos, era a minha forma de estudar, eu acho que o estudar é relativo, cada um tem a sua forma, a minha forma era enquanto a professora falava ou tava a ditar alguma coisa eu fazia os pequenos apontamentos que depois iam dar para, para conseguir boas notas…nos testes e nas fichas de avaliação que tínhamos na altura.

E… quais eram as tuas áreas preferidas?

Hum, durante muito tempo foi ciências, Ciências da Natureza, depois comecei no ano o Tecnológico e essas coisas, mas pronto História também era algo que eu, que eu tinha muito jeito, Português, mas o que eu gostava mesmo era de Ciências; Ciências, Físico-química, era assim o que eu gostava mais.

E o que é que gostavas menos?

Menos? Matemática risos. Ah não, Educação Física também era excelente Penso eu, é um, isso , normalmente quase todos os alunos gostam de Educação Física, hoje em dia é que não Hoje em dia não, mas prontos.

Alguma vez tiveste explicações, apoio escolar?

Não, nunca tive explicações, ia era muitas vezes estudar para a casa dos colegas, mas prontos era mais no sentido de, vamos, tamos a brincar era mais nesse sentido, não era nada eu lembro uma vez que, que, acho que foi no , no ano, hum, um dos professores, que era o professor que fazia, ele era nosso professor de, hum, de Geografia e E era nosso professor de desporto também, ele tinha uma equipa, tinha as equipas escolares, nessa altura ele pediu que, que nós tivéssemos a nota máxima na, nas aulas , ou na disciplina, sim. Eu lembro-me de nós, eu e um colega meu, hum, tavamos sempre juntos e tavamos sempre ali a estudar, não, temos que surpreender o professor e não sei quê e foi a única altura que eu acho que assim que nós trabalhamos, não foi nenhuma explicação, mas prontos, foi a altura em que nós nos empenhamos mais e e foi assim.

Esse professor influenciou um bocado a tua, o teu percurso ou não?

É assim, eu, eu, eu costumo dizer que eu sou privilegiado, porque não esse professor como a minha directora de turma na altura, a Lia, a Lia Graça, que até hoje a gente tem um contacto não é? Eoi, foi das pessoas assim que, que me deram aquele apoio, deram-me sempre aquela visão assim diferente e poder seguir uma linha certa. Então acho que toda a gente que passou na minha vida naquela altura serviu para de influências boas…principalmente os professores, quando sabiam que eu podia descarrilar davam-me aquele, aquele sinal. Eu tinha por hábito, na altura fazia Capoeira também, tinha por hábito estar com os meus professores todos e e ia fazer compras com eles, não sei, se calhar a minha maneira de ser também atraía isso…sempre, sempre fui um miúdo assim tranquilo, então eles levavam-me para passear, levavam-me para fazer compras, para casa deles, então acho que isso tudo foi bom para mim, então eu tenho que ter em consideração essas pessoas.

O que é que te fez voltar a estudar depois da paragem?

É assim, eu achei que, que pelo menos o 12º eu tinha que fazer, tipo, ir Faculdade e essas coisas, eu tava numa altura muito avançada, eu não pensava tanto nisso, mas o 12º era uma obrigação. Prometi à minha mãe também, que eu ia fazer isso, porque na altura ela, eu lembro-me bem, ela ficou triste porque, porque era algo que ela não queria que acontecesse, eu deixar de estudar, nem eu nem os meus irmãos. Os meus irmãos, todos deixaram a escola bem mais cedo. Interrupção Hum, então os meus irmãos todos, deixaram a escola cedo, tirando a minha irmã mais velha, ela foi a que aguentou-se mais, , , ela aguentou-se bem mais, se bem que de resto, todos deixaram a escola cedo. A minha irmã mais nova foi para França para estudar, meteu-se com um rapaz, acabou por engravidar. Eu lembro-me que na altura fiquei, fiquei assim, não sei se fiquei triste, se fiquei chateado, , por nós, íamos apoiar ela nisso e de repente acontece completamente o inverso não é? Mas pronto

Quem é que estudou mais, na tua família?

Quem é que estudou mais na minha casa, foi a minha irmã mais velha, ela fez Faculdade, não chegou mais longe, porque depois também, a vida não permitiu, teve filho e essas coisas todas, tornou-se mais complicado mas ela foi a que estudou mais.

E família alargada, mais alguém se licenciou?

Não, Não, é assim, família, eu sei que eu tenho mas costumo dizer que a família é, é aquela que mais próxima, é os meus irmãos alguns tios, não, não é assim nada por além.

E disseste-me que começaste a trabalhar no 7º ano, o que é que fazias?

Era servente, trabalhava com o pai de um colega meu, ele era, na altura ele era, chamavam pato bravo

Pato Bravo?

Pato bravo risos

Porquê?

Não sei, era o nome que davam a empreiteiros assim que não, prontos, ele não estudou para ser empreiteiro, ele chegou a Portugal na altura e prontos, com o conhecimento daqui e conhecimento dali, ele chegou a isso e ele tinha muitos trabalhadores por conta dele e prontos, foi uma oportunidade que eu encontrei, fácil de me inserir no mercado de trabalho e prontos, aproveitei.

Estiveste lá até quando?

Tive durante enquanto estudei até ao , enquanto estudei até ao fazia sempre as férias, férias da Páscoa, férias do Carnaval e fins-de-semana também, havia muitos fins-de-semana que eu fazia, mas depois, quando deixei a escola fui para , comecei a trabalhar a tempo inteiro, fins-de-semana também. Depois, mais à frente, tive . Quando foi assim certo, devo ter estado quatro, cinco anos, não sei precisar agora, mas foi mais ou menos isso. Depois prontos, comecei a trabalhar noutros sítios, como na Câmara Municipal da Amadora, como carregador depois tive nos Açores através da Capoeira, tive seis meses nos Açores o contrato nos Açores foi para fazer show de Capoeira, mas depois acabei por trabalhar num restaurante e e prontos e foi assim as minhas aventuras. vivi em Espanha também, Marbelha. Em Espanha também trabalhei nas obras na altura estavam a fazer um, um zoo e eu trabalhei no zoo, nas obras.

Como é que surgiu isso?

É assim, eu nunca fui assim nunca fui de ficar parado, então houve um dia que eu tava a chegar a casa, eu passava sempre, no bairro onde eu vivia tinha um largo, eu passava e então em conversa com um amigo, tu não sabes se alguém precisa de algum empregado ou qualquer coisa assim? Ele disse, olha, para a semana vão uns quantos para Espanha, trabalhar e não sei quê. Eu disse: vão para Espanha trabalhar e o dinheiro que vão ganhar é fixe? É, é fixe e eu disse: olha sei, vou falar com a minha mãe, se ela aceitar, eu vou para e foi assim não foi assim nada planeado, surgiu, aproveitei.

Estiveste lá quanto tampo?

Quase um ano, quase um ano.

E como é que foi a adaptação?

É assim, é fácil porque na altura eu era praticamente criança não é? Então a adaptação à língua foi fácil e as pessoas eram supersimpáticas, também no sítio onde eu estava aquilo era tipo uma vila, o sítio onde eu ficava. O zoo ficava mesmo na cidade. Então foi fácil, tinha muitos miúdos da minha idade. Fins-de-semana íamos jogar à bola, íamos para a discoteca e essas coisas todas, então foi fácil. Depois na altura fazia Capoeira também, então quando eu aproveitava assim um tempinho para ir treinar, as pessoas diziam ah afinal fazes isso e não sei quê então foi fácil também, juntar assim um grupo de amigos treinar com eles e não sei quê. Eu ensinava aquilo que sabia e foi assim.

Como é que a Capoeira entra na tua vida?

A Capoeira entra na minha vida na escola, no ano. Foi no primeiro ano. A Capoeira também serviu um bocado para me distrair assim dos estudos, no início, no início, que depois eu percebi que se eu continuasse a utilizar a Capoeira para esquecer os estudos, eu ia ficar sem a Capoeira e aquilo foi tipo, amor à primeira vista. A primeira vez que eu vi ainda fiquei isso não é muito fixe Porque a minha irmã me falava, a minha irmã tinha um colega e esse colega acabou por ser o meu professor e ela me falava muito tempo. Ah, tenho uns colegas que fazem Capoeira e eu, não sabia o que é que era, então não falava muito sobre. Quando eu fui para a escola é que eu percebi o que é que era a capoeira. E surgiu como? Comecei por assistir às aulas e quem é o meu professor hoje, que é o professor Sapo, houve um dia, não sei, ele apareceu de repente, passou por trás, agarrou-me nos braços e disse anda, hoje vais treinar e eu, vou treinar porquê? Porque tu estás sempre e eu olhei para ti muitas vezes aqui a assistir. Eu disse então olha, vamos é , não sei se foi sorte ou azar, nesse dia, nós sem exagero, fizemos mais de trezentas flexões, assim e eu tou a falar por alto, porque houve alguém que chateou o mestre ou a namorada do mestre apareceu e deram tipo, sabes, aqueles bitaites tipo mas o mestre também puxou por isso , o mestre disse ah, é pessoal, está quase na minha hora de ir, em casa a minha mulher é que veste a calça. Então outro, que é gozão disse logo…ah, então o mestre veste saia. Então aquilo foi foi encher até não mais, lembro-me perfeitamente, normalmente a aula terminava às sete, nós ficamos até oito e meia na boa ali e foi assim. Normalmente quando levas uma tareia assim, logo na primeira aula, no dia a seguir não apareces e eu apareci, gostei e tudo o que eu queria era mais, não, eu quero mais, mais físico, não sei quê sempre fui assim de aceitar desafios então foi assim que surgiu. Depois, passado um bocado, o mestre disse é , para continuares tens que pagar e eu disse. Eu, pagar agora difícil mas depois, a minha directora de turma foi falar com tinha falado com o professor na altura e sem eu saber de nada, sem eu saber de nada de repente quando eu dou por mim, ela tinha o meu equipamento completo comprado e assegurado as mensalidades e eu então mas a stora nem sabe se eu vou continuar, se não, isso está bem no inicio, não, não, eu sei que tu vais continuar e prontos, continuei até hoje.

Que papel é que a Capoeira tem na tua vida agora?

Para começar, é com a Capoeira que eu me sustento, isso é algo importante, é fazer o que eu gosto e fazer juntar o útil ao agradável. Eu inicialmente pensava. Eu não, não pensava a Capoeira é algo que me faz distrair, é algo mais, então se eu tivesse que procurar vários meios, ou seja, tipo, se eu tivesse que fazer como se fosse uma empresa, para mim ia ser complicado, eu sei que é complicado, primeiro porque eu ia-me sentir pressionado no sentido de ter que ganhar dinheiro para pagar as minhas contas. Então mais uma vez digo que eu sou privilegiado, o professor, que é o meu professor hoje disse, convidou-me para trabalhar com ele nos centros educativos ou no Chapitô nesse caso e prontos, a adaptação foi logo, enquadrei-me facilmente no contexto e tou . Eu sou dos mais novos e tou sete anos, se não estou em erro. sete anos, então tudo isso acaba por acontecer assim de forma natural sinceramente sem ter que fazer muito muito esforço. O único esforço que fiz até hoje na Capoeira é, é continuar .

Quando é que começaste a trabalhar com a Capoeira profissionalmente?

Foi quando fui para os Açores, foi quando fui para os açores, em 2004 2004, 2005, se não estou em erro, foi para .

Nessa altura ainda não tinhas voltado a estudar, certo?

Não, ainda não. Eu voltei a estudar, eu acabei o 12º três anos atrás, três anos.

Mudando um bocadinho de assunto. Hobbies?

Hobbies?

O que é que fazes nos tempos livres?

Gosto de cinema gosto de estar com os amigos, em casa sempre sair à noite nunca foi nada assim que me chamasse a atenção. Se for para dançar e para tar com os amigos, gosto, se não, se for sair por sair, prefiro tar em casa com os amigos, na palhaçada e essas coisas todas e prontos, até algum tempo a música foi um hobbie para mim, hoje não é.

Como assim? Cantas?

Sim, tenho uma banda e tou , tou a trabalhar a minha carreira a solo também.

Em que género?

Diz?

Em que género?

A solo, Reggae e Dance e na Banda fazemos um pouco de tudo, fazemos kizomba, fazemos Afro podemos fazer Raggae também, depende, é conforme. Não temos assim um ponto ou um género musical que a gente possa dizer que é isso que a gente faz.

E mais?

E prontos, depois é a minha vida, gira, sempre em torno disso mesmo, Capoeira, Música, estar com os alunos, é basicamente isso.

E viagens?

Viajo muito com a Capoeira, com a Capoeira

Por onde é que já andaste?

Tanto sítio

Mais na Europa?

Mais na Europa, mais na Europa. Fui uma vez ao Brasil, fui uma vez ao Brasil mas fui, fui de férias e procurar, como sei tipo, de onde a Capoeira desenvolve-se, mas fiquei desiludido

Porquê?

Porque, porque tinha uma fama enorme de chegar e poder encontrar Capoeira por todo o lado e foi precisamente o contrário. É, é o contrário do que as pessoas pensam. Chegas Capoeira por todo o lado e não, não foi isso que aconteceu.

Eu não tinha essa ideia também.

Diz?

Eu não tinha essa ideia.

Eu também não, tanto que eu não quero ir ao Brasil mais não, não para fazer Capoeira, porque para ir ao Brasil para fazer Capoeira tem que se conhecer as pessoas certas não sei, talvez eu não tenha ido com as pessoas certas na altura. mas pronto. Depois Alemanha, Suécia, Espanha, França, Itália uma vez mas depois é quase sempre os mesmos países, a não ser que a gente conheça tipo outras pessoas, é mais ou menos isso é, esses países que eu disse, não foge muito, mas quero conhecer, quero ir a Cabo Verde também.

Ainda não foste?

Ainda não fui.

Não conheces Cabo Verde?

Não conheço Cabo Verde, mas quero conhecer também, porque me falaram bem da Capoeira dizem que tem muito boa Capoeira, então quero aproveitar para conhecer também.

E o que é que achas que essas viagens te trouxeram? A nível pessoal.

Para mim? As viagens é como eu costumo dizer, é como se fosse a limpeza da alma. Eu vou para um sítio que não conheço, onde ninguém me conhece e eu sou super bem recebido por quem não me conhece, talvez por causa da Capoeira, mas prontos, depois fica sempre aquela, aquela amizade mesmo. Nós ficamos com a possibilidade de ir novamente e sem se preocupar com o sítio onde ficar, sem se preocupar se vais ter ou não dinheiro para comer, tas completamente à vontade, é isso, de positivo é isso que eu tiro e pronto, principalmente as amizades que ficam mesmo, que ficam.

E em relação a Cabo Verde, uma vez que não conheces. Tens curiosidade por ser o país dos teus pais, as tuas origens? Ou achas que não faz muita diferença?

Sinceramente para mim não faz muita diferença. Quero conhecer. O que me liga mesmo a Cabo Verde não é o facto de os meus pais serem de , é mais a nível cultural, quero tar dentro, quero conhecer, quero perceber como é que funciona a música também é mais nesse sentido, porque, até porque fazia muito mais sentido ser por causa dos meus pais, se eu tivesse alguém a quem visitar e não tenho isso. Se eu tivesse isso, essa seria uma das razões a ir, por exemplo conhecer um avô, isso seria logo, era, era uma obrigação, mas visto que não eu tenho ninguém, passa pela cultura, é isso que eu quero.

E qual é a tua ideia do povo caboverdiano enquanto comunidade?

Uma ideia como assim?

Características?

É assim, para começar do que eu vivi, da minha vivência, é um povo alegre é um povo muito batalhador, mas, mas quando eu falo assim, atenção, não quero que me interpretem mal porque eu tenho noção que, que principalmente os filhos de caboverdianos aqui na Europa ou na América deixam muito a desejar é verdade. Eu fico triste, as vezes, em abordar esse assunto mas a realidade é que, acho que eles desvalorizam muito o que é o ser caboverdiano, entram por caminhos que o caboverdiano não quem diz caboverdiano diz o povo africano normalmente não é, mas prontos, isso é como tudo, é, é outras vivências, é outras culturas, é misturam-se com com tudo o que é diferente, pelo menos, os meus pais não me ensinaram isso. Então tirando essa parte, eu acho que o povo caboverdiano é um povo que se insere bem em qualquer, em qualquer situação também. Para além de batalhador, é um povo que é resistente, luta contra todas as adversidades, para tar inserida, é capaz de se submeter a coisas que se calhar outros povos não, não eram capazes. Eu vejo isso pelos meus pais, mas quem quem diz os meus pais diz os pais dos outros também. muita história que os meus pais falavam na altura e eu, e eu sou a prova disso, que, por exemplo a minha casa no bairro, lembro perfeitamente que foi, depois de estar construída como deve ser, foi construída à volta de uma casa de madeira e o meu pai construiu a casa sozinho e por isso, é e prontos, no bairro, também outras pessoas fizeram isso que o meu pai fez, as coisas começaram a, a fluir melhor quando eles se conheceram e realmente disseram , para a gente fazer algo juntos foi quando o bairro cresceu, em que todas as pessoas viviam bem se houvesse um a trabalhar em casa, todos iam ajudar e não, não pensavam. Por exemplo, hoje em dia uma pessoa vai trabalhar na casa doutra, mesmo sendo amigo, tu tens que ter o financeiro, ? Depende, depende, não no meu, no meu meio de amigos mas vejo muito isso. Mas antigamente não. Antes era o pessoal que se organizava todo para trabalhar e a única coisa que tinha que ter era comida e se houvesse comida a gente trabalhava com alegria, então por isso eu acho que. é é um povo bom. Gostava de conhecer mesmo Cabo Verde para perceber melhor ainda como é que funciona, mas através dos meus pais, eu tiro assim as minhas elações em relação ao povo de também.

O que é que os teus pais te transmitiram em termos de cultura caboverdiana?

Em termos de?

Cultura caboverdiana…tradições…

Ih, fogo

O que é que se mantém?

Não, não muito, não muito. Como eu costumo dizer, principalmente em relação à música, em relação à música, os meus pais praticamente ouviam a música portuguesa e eu ficava tipo, mas calma, vocês são caboverdianos porque é que ficam a. Eles ouviam praticamente fado e assim tipo aquelas, aquelas bandas que surgiam tipo, Xutos, os meus pais ouviam mais isso a minha mãe é que de vez em quando se saía com, com algo assim mais africano, mas nunca foi assim tão ligado a Cabo Verde, algumas coisas, tubarões por exemplo, assim, não me lembro assim muito de de ouvir música africana em casa. Depois passado, mais à frente, quando a gente começou a crescer e começou a ter acesso à internet ou a ter acesso aos CD`s, é que começou a surgir mais música africana mas foi por nossa causa, como da parte da minha irmã, como da minha parte e a nível de cultura, não, não, não se mostrou muito, aqui, mas isto foi no bairro. As coisas que a gente fazia tipo, na rua, que era por exemplo íamos buscar a cana do açúcar, nós tínhamos horta, íamos buscar cana do açúcar e fazíamos o mel ali, toda a gente, a pisar a cana, a fazer o mel faziam a cachupa, tipo, em relação as comidas, isso é sempre Mas prontos, é basicamente isso, era tipo pisar o milho, essas coisas assim agora se eu te disser que conheço a cultura a fundo, estou-te a mentir

E valores? Que valores é que os teus pais te transmitiram? Que achas que vais perpetuar.

O respeito pelo próximo nunca desistir daquilo que eu quero ser responsável é uma das cenas que também que o meu pai era bastante, trabalhador, tanto ele como a minha mãe e acho que conseguiram passar isso para a família toda e eu acho que é basicamente isso eu acho que é, é a base, essa base para mim é fundamental.

E já nasceste em Portugal, certo?

nasci em Portugal.

Como é que te vês em termos de nacionalidade?

Sendo sincero? Eu te digo em relação à nacionalidade, muito sinceramente é um papel, para mim, ajuda-me em alguns aspectos, antes diziam ah, para viajar mas para viajar, não posso viajar se eu tiver o documento caboverdiano também, então não vejo assim nada de mais em relação à nacionalidade O que é que eu posso dizer, antes muito pelo contrário, se eu tivesse na altura os papéis todos certos, nascendo e tendo o direito de ser Português, hoje em dia se calhar não, não fazia Capoeira e se calhar jogava Futebol, por exemplo porque também joguei Futebol durante muito tempo, que acabei por desistir porque eles tinham leis que, que não permitiam jogar dois estrangeiros no mesmo clube ou estar ao mesmo tempo em campo e eu passei praticamente a minha vida toda tipo a tentar não é Quando, quando havia oportunidade de jogar, eu mostrava que realmente tinha valor e quando não houvesse oportunidade? Tás a entender? é que era mais complicado, mas prontos percebi cedo também, cedo ou tarde se calhar, não sei, que porque eu também fiquei muito tempo a fazer Futebol e fazia Capoeira e percebi que o que eu queria mesmo para mim era a Capoeira, independentemente de os miúdos na altura pensarem ah mas o Futebol é mais à frente, vai-lhe dar dinheiro mas não era isso que, que eu pretendia, pretendia algo que me deixasse feliz e a Capoeira até hoje consegue-me deixar feliz, entende?

Mas espera lá, não percebi a história do Futebol. Tu não tinhas nacionalidade portuguesa, era isso?

Não tinha nacionalidade portuguesa até aos 19, 20, não tinha e pronto, porque havia aquelas leis não é? Que diziam que, depois de oitenta e três se não tou em erro

Oitenta e um.

Oitenta e um. aos 18 é que tinhas direito à nacionalidade ou de escolher dupla nacionalidade ou não e eu fui um desse casos.

Conta lá como é que foi esse processo.

É assim, para mim não foi chato, não foi chato no sentido de não era eu que tinha que tratar de tudo, mas para a minha mãe foi muito chato, porque ela ficou anos a fio, anos a fio a tentar com que nós fossemos portugueses e nunca conseguiu.

E os teus pais têm nacionalidade portuguesa, ou não?

Não. Isso é outro, é outro senão, porque também nunca tiveram direito O meu pai ainda conseguiu ter nacionalidade, mas a minha mãe por exemplo, não tem nacionalidade.

E deram alguma explicação para isso ou não?

É assim, ultimamente cerca de dois anos a minha mãe tentou, a minha mãe estava a estudar também, ela veio aprender a assinar e a fazer o nome dela, cinco anos atrás, se não estou em erro ou mais, mas ela é que decidiu, ninguém falou, ela é que decidiu, pegou nela e vou para a escola, vou aprender a escrever e essas coisas todas e realmente aprendeu. Então, ela tentou fazer, diziam que se tinha que fazer um exame, um teste, para poder ser atribuída a nacionalidade e ela disse não, se for para fazer isso eu não quero, com os anos todos que eu descontei, com o tempo todo que eu tou aqui, darem a nacionalidade era o mínimo que podiam fazer e eu concordo com ela, e para ela é indiferente ter ou não ter.

Mas eles são obrigados a dar após cinco anos de permanência, deve ter havido aí qualquer coisa…

Tem, tem, é porque quando tu vais , cada um explica as coisas da sua forma. Como eu costumo dizer, não muita coerência nisso, mas prontos, ela, ela viveu pior com isso, pode viajar é isso que interessa.

Mas tu vês-te como português ou como caboverdiano?

Eu vejo-me como cidadão do mundo. Se eu tiver que estar aqui tou aqui, se eu tiver que tar na Alemanha, África, onde eu tiver vou procurar é estar bem isso, não, não me sinto até porque eu tenho uma teoria. Aqui dizem que eu não sou daqui tu és daqui, com essa cor? ... Não é que eu ligue a isso e muito sinceramente isso não é conversa para mim, mas se eu for a Cabo-verde, por exemplo, vão-me dizer que eu não sou de também. Então eu sou de onde? É a única pergunta que eu faço. Eu sou do Mundo. Eu acabei por, por gravar essa resposta para mim e fico bem

E já agora, quais são as características dos portugueses?

Quais são?

Por exemplo, amigos. Assim num modo geral.

Uma pergunta difícil viu?

Já te fiz a mesma para os caboverdianos e conseguiste responder perfeitamente.

uma coisa que é assim vindo assim de uma forma exterior e sem pensar que eu tenho amigos, portugueses, quando eu digo portugueses, mesmo portugueses nós eu, eu vou explicar doutra forma, vou começar a explicar assim eu tenho os meus amigos e todos os meus amigos portugueses pensam da mesma forma, ou seja, pensam da mesma forma do que eu, se estamos juntos estamos juntos, se precisas de ajuda eu tou para te ajudar, não importa a hora, tu ligas, eu vou atender o telefone porque tu precisas de ajuda. Eu, não sei, no meu meio de amigos tem isso, mas tudo o que eu vejo fora não é isso, muita individualidade eu, eu vou o que eu vejo é, as pessoas não querem saber das outras, por exemplo, eu tou na minha casa e tu tas na tua casa, confusão na tua casa, eu não sou capaz de ir bater à porta e perguntar se precisas de ajuda, por exemplo, é algo que nunca, nunca presenciei no meu bairro por exemplo. Se acontecesse alguma coisa no bairro, a vizinha do lado estava e os portugueses não fazem isso. Não sei se na Alemanha presenciei na Suécia também, algo assim parecido. Na Suécia por exemplo, se tu não tens o número da pessoa, tu não vais à casa da pessoa, porquê, porque tu não sabes o código da entrada do prédio, entendes. E prontos, eu vejo que Portugal a caminhar para isso, mais tarde ou mais cedo é isso que vai acontecer, que até o teu pai para ir à tua casa, tem que ter que te ligar, então isso para mim não é nada é, é das coisas assim que eu tenho a apontar, assim aos portugueses, de resto, não tenho assim razão de queixa.

E em que aspectos é que te identificas com os portugueses?

Fogo. Em que aspecto é que eu essa pergunta é que é difícil em que aspecto é que eu me identifico com os portugueses

Tendo em conta que viveste cá toda a vida, praticamente, há-de haver alguma…

Não sei eu sou, como eu costumo dizer, eu sou uma pessoa bué fácil a sério, bué, lido bem com, é assim, tem algo que eu se não for com a cara de uma pessoa, logo à primeira vez, eu costumo acertar sempre, é porque essa pessoa não é de bem raramente falho. Mas se eu gostar da pessoa e sentir empatia com a pessoa e não sei quê, isso para mim, não sei, então sinceramente não vejo assim nada que me ligue ou que me afaste de, de ter assim características de português ou não sei, eu acho que, mais do que isso tudo, é ser humano não é? Eu acho que é, é algo mais próximo que eu tenho de ser português, porque eu vivi o tempo todo, alguma coisa devo ter de português, agora identificar, para mim é difícil sinceramente.

Estilo de vida?

Os portugueses gostam bué de Centros Comerciais, eu não gosto. risos É verdade, eu não gosto, eu entro num centro comercial, canso-me facilmente. Eu posso ficar seis horas na praia, a fazer Capoeira directo, estar tranquilo, mas não consigo ficar uma hora no centro comercial.

Os portugueses também gostam de praia.

Mas é diferente, está, mas eu, eu prefiro este tempo por exemplo, eu posso tar na praia, tranquilamente, tas a ver?

Isso é mais de desportista do que propriamente de… não é?

Também pode ter sido, também pode ser isso.

A maior parte das pessoas, com frio não sai à rua.

Eu saio sempre à rua. Impossível para mim ficar em casa mesmo que esteja a nevar.

Bem. Vamos mudar um bocadinho de assunto. E racismo? Discriminação de algum tipo, alguma vez sentiste?

Se eu senti? senti, senti mas é assim, as pessoas que eu eu notava nas pessoas quando isso acontecia, que estavam mesmo a sentir as palavras . Aquilo que diziam era forte, mas eu desvalorizo isso, desvalorizo porque, eu acho que as pessoas, tipo tu, meteres tipo a pessoa numa, nessa situação é porque tu se calhar não passaste por nada, não sabes o que é viver. Para estares tipo a a chamar preto ou essas coisas todas com, com essa como se fosses mesmo inferior a essa pessoa ou superior nesse caso eu acho qua a pessoa não viveu, a pessoa não, não está aberta a para perceber o que é realmente a vida. Então, tudo o que aconteceu comigo, olha, foi, aconteceu, desvalorizei facilmente. Se fiquei chateado algumas vezes? Fiquei chateado, principalmente nos Açores, porquê? Porque, eu fui, estava a trabalhar na esplanada, tipo, nós tínhamos o restaurante e eu tava na esplanada e eu servi eu contei essa história tantas vezes mas prontos, é mais uma, então o que é que acontece eu estava a trabalhar, entrava as onze da manhã, que eu chegava sempre mais cedo para lavar a esplanada e essas coisas todas. Interrupção Eu entrava às onze, mas entrava sempre mais cedo, para preparar a esplanada e essas coisas, que a esplanada abria ao meio dia, que é quando o pessoal vai para almoçar e essas coisas. pessoal que preferia almoçar em cima, então prontos, tudo bem, eu faço sempre o meu papel, simpatia , ser prestativo. Chegou um senhor ao meio dia em ponto, sentou-se e ele não foi para almoçar, ele estava com ela fisgada, beber, beber, beber, mas prontos, tudo bem, está no seu direito. Então, do meio-dia até as cinco e, eu saia as cinco e meia, eu, sempre simpático com ele, prestativo, tudo o que ele pediu tava , se não houvesse não é? Então, mesmo no final, tipo, o que é que acontece? Quando bateu as cinco e meia, cinco e quarenta, seis e ele continuava a fazer pedidos e eu disse é é assim, gostava muito de continuar a atendê-lo mas a minha hora terminou meia hora atrás, vou ter mesmo que sair, se não se importa trago-lhe a conta. Foi mesmo assim, se não se importa trago-lhe a conta e prontos, se você quiser continuar, você fala com um colega meu que vai entrar agora e continua a fazer, mas eu tenho que deixar a conta fechada. Ele disse ah não, não tem problema prontos, tudo bem, nisso aparece um amigo dele não sei qual era o nome, mas foi qualquer coisa como ou Jorge, uma cena assim então Jorge o que é que queres beber? E ele, ah uma cerveja e não sei quê olhou para mim antes de trazeres a conta trás uma cerveja e eu tranquilo, levei a cerveja, levei a cerveja e depois ele disse: eh , esqueci-me de te pedir, trás uma água e depois trás a conta e eu fui, trouxe a água e trouxe a conta, depois entreguei-lhe a conta, ele para pagar a conta, ali a enrolar tás a ver? Mas ali um bom tempo, a olhar para mim, fazia assim e olhava para mim não te enganaste? Eu não, até porque não sou eu que faço, eu , clico aqui nós temos um, como é que se chama aquilo? Nos restaurantes, é um PDA? Se não tou em erro, um PDA e tudo o que apontas está ali. Olhe, você fazia o pedido e eu clicava, nem sou eu que faço as contas, aquilo vai logo para a máquina não, isso está errado oh, eu disse-lhe a ele olhe, está aqui as horas todas, ta aqui tudo. Você esteve aqui desde o meio-dia não, não acredito, isso está mal contado e não sei quê. Eu disse: não, não mal contado é isso mesmo, depois eu disse, mas pronto se quiser eu posso, se você acha que eu enganei-me na conta, vou novamente, volto a imprimir e trago fui, imprimi e trouxe. Depois ele olhou: se calhar tens razão, mas passa-se alguma coisa? Não, não se passa nada, está tudo bem, depois ele disse-me: então porque é que estás com essa cara de sabes? Bem, naqueles dois segundos, passou-me tanta coisa pela cabeça, depois eu pensei eu tinha visto o meu a descer e a subir na cabeça dele tás a ver? E depois, eh , tipo, nesse pensamento eu virei as costas, fui até ao balcão, falei com o meu, meu gerente na altura e disse….Hugo, faz-me um favor, vai , recebe o dinheiro daquele senhor se faz favor, porque se eu voltar ali, não vai acontecer algo de bom. , o gerente era, era um gajo novo também, na altura foi logo eh você não pode tratar mal os empregados e não sei quê, o rapaz até foi super atencioso o dia todo consigo e não sei quê mas prontos, aquilo passou logo e pensei man, foi mais um dia man, foi mais um dia, mas esse senhor vai perceber que agiu mal comigo quando um dia lhe tratarem mal também, tás a ver e vai ser um empregado a lhe tratar mal, claro. Mas prontos, foi a única situação assim mais alarmante que eu tive. E tive uma situação na escola, foi bem no segundo ou na classe se não estou em erro, mas isso foi algo de criança, hoje em dia eu vejo que foi algo de criança, não foi nada assim porque e depois, verdade seja dita, na altura, os pretos não estavam na moda. risos Os pretos na altura não estavam na moda e então isso passou.

Mas achas que não interferiu em nada no teu percurso?

Não, não, até porque eu sei, eu sempre soube aquilo que eu quero, eu sei o caminho que eu devo seguir, sei o que é que é o certo, sei o que é que é errado, os meus pais trataram bem disso, logo de início, tás a ver?

E agora fala-me um bocadinho do ambiente da tua área de residência.

O ambiente. É assim, eu mudei-me agora, não, não tenho assim muitos, assim algo com que eu possa dizer bom é, é calmo não conheço os vizinhos O que é que eu posso dizer, posso dizer que eu estou sempre à vontade, tem sitio para estacionar à vontade, tem supermercado e essas coisas. Tem, tem tudo ali ao . As poucas pessoas com quem vou cruzando, são simpáticas também, não tenho assim muito por onde pegar

E o sítio onde cresceste?

O sítio onde eu cresci foi maravilhoso, foi é, não nada como a infância e quando é boa tem pessoas que hoje não estão, não estão entre nós, que marcam para sempre a minha vida. As minhas vizinhas, que eram, uma delas era a mãe do bairro por exemplo, nós dizíamos isso. Ela tratava de toda a gente do bairro, a pessoa tava doente ela é como nas tribos, ela fazia mesmo lembrar tipo tipo Eu comecei a perceber isso mais tarde tipo, em relação as tribos, em África, os Sobas e essas coisas todas ela era mesmo aquela mãe africana, ela cuidava, ela era mãe e cuidava das mães todas, então isso é algo, que quem viveu ali, se esquecer, está-se a esquecer de si próprio tás a ver. Tudo, tudo, era desde, as festas por exemplo, tu organizavas uma festa, querias baptizar o teu filho, ela organizava tudo. Não precisavas de te preocupar com nada porque ela ia tomar conta de tudo, desde a comida, desde a roupa se fosse o caso, ela estava sempre. O meu pai quando queria me bater, ela estava a bater à porta não, não faças isso ao teu filho. Por exemplo, e não era a mim, era no bairro todo ou naquela rua. Nós o bairro é enorme mas a minha rua era a rua D, então aquilo era, eu tinha uma entrada na parte de trás mas tinha a entrada principal tipo, nós tínhamos um, como se fosse uma entrada, não tinha porta, mas entrava e depois aquilo fazia um largo de casas, fazia um largo de casa, depois fazia um corredor que era para a minha casa. Então ali na rua toda a gente se conhecia, as portas ficavam abertas, eu precisava de alguma coisa, não eu mas os meus pais. Mandavam-me olha vai buscar sal na casa de a fulana não mas eu chego, pego, depois é dizer olha, fui e peguei então não, não sei se, se alguém tivesse oportunidade de viver isso ou de eu passar essa vivência, eu ia passar para os meus filhos, para as minhas sobrinhas, isso era algo que eu ia fazer. Eu falo isso muitas vezes com o meu irmão e ele diz ah Neno desculpa, toda a gente me chama Neno Neno, tu tas a brincar, estás a pensar como os cotas. Não estou a pensar como os cotas, aquilo é que era mágico Mano, tu é que não tas a ver, nós saíamos todos pequenos, com o prato na mão, os ovos numa tigela para fazer gemada, ali e essas coisas todas. Isso não , não dinheiro que pague isso, tás a ver. E então eu acho que isso fez de mim também ser o que eu sou hoje, tudo isso conta, tás a ver…e era uma das coisas que eu gostaria de passar para aminha sobrinha por exemplo, mas hoje em dia respeito não concordo de todo que a criança tem que ter tudo o que quer, principalmente a nível de bens materiais, mas prontos olha, é outros tempos, tenho que respeitar e tenho que saber lidar com isso. (01h00m50s)

Um bocadinho atrás outra vez, ao tempo da escola… quais eram as condições da escola por onde passaste?

As condições É , as escolas por onde eu passei foram sempre escolas simples, não tinha assim as condições as mesas as salas para eram frias na altura, lembro-me perfeitamente, o aquecimento, tinha mas era como se não tivesse mas a diferença para o que eu vejo hoje, os professores eram muito mais preocupados com os alunos, isso é, é algo que também não se consegue voltar atrás. Não sei o que é que se passou mas eu vejo pelos professores, tipo, do, dos meus sobrinhos por exemplo, que é , se o aluno não quer fazer eles não insistem e antes eu se não fizesse, o meu pai sabia logo em primeira mão, entendes? Então isso perdeu-se também, então era uma das qualidades da escola, na altura era. Podíamos não ter tanto conforto, a nível de estrutura e não sei quê, mas os professores preocupavam-se realmente com a tua aprendizagem. Hoje em dia não sei o que é que se passou, não sei se estão a julgar mal ou o que é, é qualquer coisa assim do género, mas não estão, não estão a dar de si aos alunos, até porque o professor também começa a aprender mais quando começa a lidar melhor com os alunos não sei até que ponto ou onde vamos chegar, mas é o que eu vejo. trabalhei em escolas dois anos dois anos iniciei um projecto com, com o Sandro, em que o projecto era Capoeira para todos e o nosso principal objectivo era fazer o quê? Ligação, Capoeira, pais, escola, ou seja unir todos em busca de uma melhor educação dos alunos, tas a ver? Então o que é que acontece? Os pais colaboravam, a Capoeira colabora e a escola zero, tas a ver? Nós procuramos todos os meios, nós temos um amigo que é jogador de futebol, que mal falamos desse projecto, ele foi dos primeiros, ele disse eu não preciso de saber de nada, o que vocês fizerem está ok, eu injecto o dinheiro tas a entender? E justamente o que não podia falhar, falhou, foi a escola. Como é que eu tenho os pais a colaborarem, como é que eu tenho nós a fazer o nosso papel e justamente a escola vai falhar, entendes? Depois nós chegamos a uma conclusão, que a escola estava a pensar no financeiro, receber dinheiro e eu pergunto, como é que uma escola que tem o apoio da Câmara, necessita desse pouco dinheiro que era para os alunos, para a gente fazer o quê? Saídas, para a gente comprar material se eles precisassem, escolar nós canalizávamos o dinheiro e geríamos de forma a. Por exemplo, nesta altura do Natal, ter cabazes para eles, tas a ver? E como é que a escola mete os seus interesses primeiro, metem os interesses à frente da educação dos alunos? , acabamos por desistir, não do projecto mas desistimos da escola. Fomos para outras escolas, mais uma vez este ano nós fizemos um, fizemos um plano diferente. Não quisemos assim meter a escola tão dentro, opção nossa, para ver se eles vinham ter connosco e mais uma vez, foi igual, a escola, zero. Nós conseguimos verbas, nós, nós. Foi surgindo também, automaticamente, mas nós concorremos a um projecto que não era nosso, nós caímos de pára-quedas, porque a nossa ideia era uma e, e prontos, a miúda que estava a coordenar na altura o projecto todo, ela disse. Ah vocês têm jeito para isso, podiam concorrer e nós concorremos e ganhámos. O projecto era qual? Era requalificar uma zona ali na, no Pendão, que é um campo e tens um descampado. O que é que acontece? Nós temos tantos grupos de música, tantos grupos de dança, teatro e essas coisas todas, que têm grupo mas não têm onde apresentar. Então a nossa ideia era, requalificar o espaço e fazer, e criar um espaço próprio para isso. Tens o teu grupo, trazes o teu grupo para apresentar, fazemos uma festa com um tema assim bacano e não sei quê e tudo isso foi por água abaixo, porque as pessoas ficaram com o dinheiro mais uma vez, tas a ver? E eu penso, a culpa é de quem? Depois dizem que as pessoas não querem fazer nada, então, em relação a isso eu acho que a escola foi muito melhor do que hoje e sinceramente eu preferia não ter condições a nível estruturais, de conforto e essas coisas mas os professores faziam alguma coisa.

Mais humano... E consideras-te uma pessoa que faz planos?

Não não a única coisa que que eu…não é fazer é dar continuidade aquilo que eu começo eu quero levar adiante, e eu quando entro em alguma coisa, eu entro de corpo e alma, caso contrário fico de fora. Se eu sinto que não vou ser capaz de seguir eu prefiro ficar fora mas não sou de fazer planos, não sou de, de dizer ah porque daqui a um tempo não faço, estruturo algumas situações e pelo meio até pode haver algumas mudanças, que eu sinto a necessidade de fazer essas mudanças, mas nada, nada planeado. É como a Capoeira, não planeei, a música não planeei, comecei, continuei até hoje, ? mas não sou, não, não sou de fazer planos, nem com pessoas, nem comigo próprio, eu deixo ir andando e vou controlando melhor assim a situação.

E metas para o futuro?

uma meta assim, bem, bem próxima é assim para nunca pensei poder fazer algo a solo na música, até porque eu não sou assim uma pessoa de não acreditar muito em mim, mas a música, eu tenho a noção que a música é assim algo delicado, tás a ver, e principalmente o estilo que eu estou a fazer Reggae, eu não tenho origens do Reggae, eu não, não conheço o Reggae, posso ir estudar, mas nada como ter a essência. As pessoas podiam dizer, podem ou vão dizer de certeza, tive entrevistas que as pessoas, mas tu tens a possibilidade de ir ter a possibilidade até tenho, mas eu vou , durante quanto tempo, eu vou perder tudo o que eu tenho, não é fácil. Então tudo o que eu tenho feito no Reggae, primeiro eu procuro não ouvir Reggae, oiço tudo o que é música menos Reggae, até porque eu, eu tenho uma cena que é, eu digo Reggae que é para as pessoas não ficarem ah mas e prontos tu não sabes o que é que cantas não sei quê. Eu tenho que ter um género, ? É mais perto do Reggae, mas envolve hipop, envolve Jazz, envolve , e se for preciso vou buscar coisas de Cabo Verde, coisas à capoeira, coisas a tudo o que eu sinto e faço assim uma mistura. Depois a cantar é que me podem atribuir mais ao Reggae ou qualquer coisa assim, mas prontos assim de futuro, uma meta que eu tenho, está tudo marcado, a meta está traçada, agora vai ter repercussão depois de tar , ? Eu vou fazer a abertura de um artista africano que é C4Pedro, na Suíça, se fosse aqui em Portugal, confesso que eu iria estar mais tranquilo. É fora do meu país é um sítio que eu não conheço, é um povo que eu não conheço também, se bem que tem muitos emigrantes, tive a pesquisar, tem, mas prontos, é inédito eu não sei como é que eles vivem , então eu cair de pára-quedas, entre aspas, assim para um concerto grande, deixa-me assim um bocado, mas prontos eu sou assim de encarar mesmo a cena e depois disso logo se . Prontos, estou a preparar o meu álbum, é a minha meta para este ano. Em relação à capoeira, dar continuidade ao trabalho que nós temos feito e a música a minha meta é, não sei ainda datas, prontos, antes do verão lançar o meu álbum.

Tens sonhos que ainda não tenhas realizado?

Assim, sonhos que eu não tenha realizado, os sonhos tão a vir assim naturalmente, eu sempre sonhei com isso da música, sempre sonhei com isso da Em relação à capoeira, houve um tempo que eu tive perdido, tive perdido no sentido não sabia o que é que eu queria da capoeira e hoje percebo o que é que eu quero da capoeira. Eu quero poder passar tudo o que eu vivi, passou, a tua carga de experiências, quero que as pessoas sintam que a capoeira pode ser algo bom na vida deles e principalmente o ambiente, o ambiente tem que ser saudável, eu dou tudo de mim, para que isso aconteça, eu tou no Chapitô, tou nos centros, tou numa escola aqui em Campo Pequeno também. Então quando eu tou na capoeira o próprio lugar, mesmo quando chego a casa de rastos isso é outro assunto, eu é que tenho que resolver depois, tenho que fazer com que as pessoas sintam foi bom, se eu conseguir fazer isso, meta alcançada, tas a ver? Mas nem sempre é fácil como é óbvio, mas prontos é isso, esse é um dos sonhos, é poder entreter ou poder mostrar o caminho certo através da capoeira. Por exemplo, em relação à música é poder ouvir a minha música quando as pessoas passam no carro, é sinal que eu estou a fazer alguma coisa, é sinal que as pessoas sentem aquilo que eu transmito também tas a ver? Ontem enviaram-me um vídeo por exemplo, da praça do comércio, uma música minha que eu lancei. Eu lancei um EP dois meses se não estou em erro, dois meses e não tinha assim noção que a música ia andar e ontem mandaram-me um vídeo Olha Neno, aquela música que lançaste no outro dia porque eu meti no youtube pouco tempo, olha tava a tocar e mostraram-me o vídeo e inicialmente eu não estava a perceber, de repente comecei a ouvir ei é a minha música, bué fixe e aquilo, sabes tipo, quando tu ouves algo que fizeste ou escreveste, ás vezes por seres tu, por estares tão dentro, mas aquele vídeo fez-me pensar a dar certo, a dar certo, tás a ver? Então isso é os sonhos a virem se tornar realidade. Passei bué tempo no quarto a fazer música no quarto, em que fazia música para eu ouvir, em que a minha mãe dizia sempre tu também fazes sempre essas músicas não sei quê, tas a entender? É que até hoje tipo, as minhas irmãs dizem tu, tu és mesmo artista mesmo sabendo que vou actuar em vários sítios perguntam, mas prontos. Outro dos meus sonhos é aprender a tocar guitarra, porque para a minha mãe se eu não souber tocar guitarra eu não sou artista, então esse é também um dos objectivos também, quem sabe se torna realidade, não é fácil.

Sempre sonhaste, os teus sonhos sempre foram relacionados com desporto, música?

Sempre, sempre, tipo perguntam-me porquê música, faz sentido porque as crianças automaticamente e perguntam porquê música? Música surgiu na minha vida assim através de um vizinho, um vizinho meu tinha uma máquina que era isto, mais ou menos assim, aquilo era uma máquina cheia de botões e eu via ele, fogo, eu vou ter que aprender isso, eu disse a ele olha explica-me a base da máquina não sei quê, ele explicou-me e não sei quê e eu a olhar, aquilo parecia chinês. Depois um dia eu perguntei-lhe, olha será que podes emprestar isso um dia, ele é bem mais velho do que eu, na altura tinha 30, eu tinha 15, 16 para , ele tinha 30 então a distância era enorme e ele confiar em mim era quase impensável. Então olhou para mim como quem diz tu miúdo, tas maluco ou quê? Depois eu disse: não, empresta-me amanhã vou te mostrar uma cena fixe, não sei quê, com o que ele mostrou, fogo, levei aquilo para casa, meti os phones, comecei a mexer, comecei a mexer, olha fiquei a noite toda, a noite toda, cheguei assim noutro dia. Assim que acordei eram tipo nove da manhã fui-lhe bater à porta tou, tou Helder e não sei quê, e ele, ei bué cedo e não sei quê, não, não, vou-te mostrar uma cena. Mostrei-lhe a música, ele olhou não, não foste tu que fizeste. Não, fui eu que fiz! Queres que faça outra agora aqui para tu veres? e ele disse ta bom, calma , deixa tomar um banho não sei quê, vamos fazer. Ele ligou novamente aquilo e eu fiz outra coisa, tás a ver aquilo que eu senti, e ele disse fogo, como é que tu num dia tu consegues, e eu disse não foi num dia, fiquei a noite toda mesmo, tás a ver? E ele disse, olha sabes o que é que podias fazer? Podias começar a escrever também, não sei quê, e foi tudo assim. Claro, inicialmente eu não tinha assim ideias, aonde é que eu ia buscar ideias, comprava uma pastilha, uma pastilha tinha aquelas, aquelas da gorila, tinha tipo, tiravas a cena e tinhas outro pacote e ali tinha umas dicas tas a ver? que dava, tipo agora não sei precisar, por exemplo isto aqui, tinhas isto ? A música está alta, estás torta por exemplo, eu pegava isso e com isso fazia uma rima tas a ver? Pegava e juntava mais umas cenas e não sei quê, foi assim, eu comecei a fazer assim, que ele depois viu Então Neno tu tás a utilizar a dica das pastilhas então mas calma mas então onde é que eu vou buscar inspiração? Do que é que eu posso falar? Não, podes falar do teu dia-a-dia, do que fazes com os teus pais, podes falar não sei quê, eu disse ah é, posso falar? Então olha, vou começar a escrever, e pronto de repente começou a sair assim, para altura tava bom ? Claro que depois vai-se exigindo mais, e pronto, foi assim que a música surgiu na minha vida, não foi nada planeado, foi desde .

Quando é começou a evoluir?

Quando é que começou a evoluir? Talvez dois anos depois. Fiz a minha primeira apresentação numa escola em Rio de Mouro, na altura tinha assim grupos, fui com o meu grupo em que era eu, o meu irmão; ah claro, quando eu comecei, depois incentivei o meu irmão e mais dois amigos, a agente constituir um grupo, na altura nós éramos uns radical G. Nós escrevíamos e o Hélder, o Hélder tipo, dava-nos algumas dicas, ele era tipo nosso mentor, tas a ver? Então eu era bom a fazer as produções, mas não era tão bom a escrever como os outros e o que é que eu fazia muitas vezes? não, agora vamos improvisar, e foi assim que eu comecei a aprender mais em relação à escrita, e a primeira apresentação surge neste mesmo. Nós fizemos uma música e eu dizia ah, essa música está boa e não sei quê, então vocês vão apresentar, tão preparados? Claro que tamos preparados e não sei quê, e fomos para a escola. Ei nesse dia, éramos miúdos, mas o pessoal todo mais velho, cantava bué da tempo e não sei quê, e nós fomos tipo a sensação da festa, ei não, esses miúdos dão-lhe bué e não sei quê e foi a primeira apresentação. Depois dali foi surgindo, mais uma aqui outra ali, escolas e não sei quê e prontos, não quer dizer com isso que a gente ficou cega, foi tipo incentivo, foi um incentivo , pra gente continuar. Depois passado um tempo, passados uns tempos, não sei quê, o meu irmão acabou por desistir, o outro foi ficando pelo caminho e o outro pelo caminho também ficou, então tipo eu fui ficando, fui ficando com altos e baixos até que consegui fazer o quê? Quando comecei a trabalhar comecei a comprar pequenas peças que eu podia ter em casa, uma das peças foi uma máquina igual à dele, e comecei a perceber melhor música, comecei a estudar e não sei quê, mais tarde, depois com a internet, com essas coisas todas é que eu comecei a estudar mais, tipo, o que era a música e começa a ficar mais sério. Quando nós, quando eu acabo por constituir uma banda, que era os Insense, foi porque fizemos uma música que de repente toda a escola tinha, e da escola passou para outras escolas e foi rodando assim e começámos a apresentar nas escolas e de repente távamos a apresentar em bares e essas coisas todas e vimos eh , calma , nós temos que fazer mais músicas, temos que fazer mais músicas. Olha, não sei o que é que me deu, fiz uma cabine de estúdio dentro de casa e não sei quê, eu e o meu irmão, o meu irmão percebia de trabalhar assim bem e não sei quê, fizemos uma cabine, depois nessa cabine foi tipo onde surgiu essas músicas todas, para apresentar aqui, no Porto, pelo país todo. sim, acho que começou a ficar mais sério, que ao ficar mais sério traz outras coisas, traz outras coisas, tipo, os egos começam a surgir tas a ver, se nós não soubermos lidar com isso. Foi o caso, um dos elementos da banda não sabia lidar com isso, porquê? Porque ele era tipo o principal digamos assim, nunca tive problemas em ser aberto, a ser tipo segundo ou terceiro tas a ver? mas prontos, pelo caminho tu vais percebendo pessoas que têm necessidade disso. Eu não tenho essa necessidade, de ser o primeiro ou o segundo, eu acho que cada um de nós tem o seu espaço, ele decidiu, esse rapaz decidiu seguir a cena dele a solo, foi quando, por um lado foi mau, porque nós perdemos o ritmo que a banda tinha, mas por outro lado foi bom, eu comecei-me a descobrir também, comecei a descobrir que tinha jeito para fazer outras coisas. Até ali era rap e a partir dali comecei a ver não, eu tenho capacidade para fazer outras coisas, tas ver, e prontos, olha, foi daí pra frente. Muito mais à frente nós a, eu tava a fazer as minhas coisa de reggae, mas sempre em casa também, nada de sair pra fora, nada de mostrar tipo às pessoas; mostrei tipo a um amigo meu que era do Algarve, ele disse oh Neno, porque é que tens isso em casa? Tens de sair e não sei quê. Eu até lançar o meu EP, eu não sabia me preparar, não me sentia confiante para fazer isto, então fui deixando, fui deixando, depois surgiu a oportunidade de a gente criar uma outra banda, da outra banda fiquei eu e mais outro elemento e adicionámos mais um que é o Nuno, ? Hoje em dia temos os Afroboboys , e as coisas estão a correr às mil maravilhas, é pessoal dedicado, é pessoal humilde, não tem tipo a necessidade, pelo menos até agora, a necessidade de ser eu ou ser ele, não, tamos todos no mesmo barco, remar no mesmo sentido. Tivemos a trabalhar com uma editora, editora não, uma produtora que é forbabeats, as coisas não correram muito bem; agora tivemos outra proposta e agora parece que se encaixou tudo, tás a ver. Temos tudo para trabalhar a toda a hora, temos distribuidora da música, temos manager, temos tudo o que precisamos para avançar, então é excelente, surgiu tudo ao mesmo tempo, tás a ver. Surgiu a produtora, surgiu o manager e começam a aparecer os shows todos é tudo o que a gente quer, então eu acho que estamos em boas mãos, tas a ver, e prontos é dar continuidade ao trabalho.

Se tivesses que te descrever como pessoa.

Se tivesse que me descrever como pessoa, ei essa é difícil, tu falares de ti, mas eu acho que algo assim que eu tenho assim muito bom, é ser amigo do meu amigo, simpático, sou uma pessoa fácil como eu disse bocado, de lidar. As pessoas, pelo menos eu sinto, como nós costumamos dizer hoje em dia, as pessoas dão-me love, tas a ver, por ser eu, tipo eu não procuro meter máscaras ou ser quem não sou, não, eu sou assim, ponto, se eu tiver que gozar vou gozar, se eu tiver que rir vou rir, entendes? Se eu tiver que chorar, também com alguma contenção claro ? Ainda não me sinto, me senti menos, mas prontos, hoje em dia se tiver que chorar e se tiver de dizer à pessoa amo-te ou se tiver, olha gosto de ti, isso é algo que não me afecta, me afectou antes. Mas prontos, aprendi bastante a viver e então isso é algo que, é, é deixar andar. Acho que é as coisas boas que eu tenho, fácil, lido com toda a gente, mas também se eu não gostar como eu disse bocado, é melhor ficares na distância tas a ver? Não sou de fazer fretes, não sou de dizer tá-se bem quando tá-se mal, então é nesse sentido, eu acho que é os pontos fortes que eu tenho.

E defeitos?

Teimoso, bué teimoso, às vezes eu não quero, principalmente quando tou com pessoal da banda. Eu tenho, mas a teimosia passa pela simplicidade. Quando eles querem complicar muito e eu vejo bom, estás a complicar demais, tas a complicar, não podes complicar, a música é simples man, a simplicidade acaba por vencer tas a ver? É mais nesse aspecto. Agora se eu sei que não tenho razão em alguma coisa, sou o primeiro a dizer que não tenho razão e prontos. Outro defeito, algo que eu não consigo mesmo, eu tento, ainda hoje passei a manhã toda a arrumar o meu quarto mas eu sei que amanhã ta desarrumado novamente tás a ver? , isso é algo mesmo, não sei, é de mim, não consigo tas a ver, gerir, eu tento, eu faço as cenas, não sou tipo, eu tenho amigos tipo, isto ta aqui, não, não, isto não pode tar aqui, tem que estar aqui, tás a ver. Eu não sou assim, sou mais descontraído nesse aspecto, eu acho que esse é dos meus maiores defeitos, ser um bocado desleixado na arrumação, tenho organização no trabalho, tenho organização, sei me organizar para cumprir com os calendários e essas coisas todas, mas quando se trata da arrumação, esquece, se o meu caderno estiver aqui, tá-se bem, bom mano, não mexe, até porque se alguém for mexer, tipo é uma desarrumação que para mim é arrumado tás a entender? Eu acho que para as outras pessoas, para mim é o maior defeito que eu tenho, é. Mas de resto não vejo assim nada que eu possa apontar assim como defeito.

Ok. Terminámos.

Terminámos?

This is the first translated utterance of the interviewer.

This is the first translated utterance of the interviewee.


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