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Entrevista_de_OB

Jovens adultos descendentes de imigrantes africanos em (dis)posições de destaque: um estudo sobre percursos de mobilidade ascendente entre as minorias

SubtítuloEntrevista com OB
Data2017
Sexomasculino
Idade: 39
Nível de formação: licenciatura
Ocupação: professor de educação física

No que eu puder responder, não é?!

Vamos fazer só o enquadramento… Tens que me dizer a tua idade…

39.

Nacionalidade?

Portuguesa.

Não tens dupla?

Tenho.

Dupla? De onde?

Ah portuguesa e caboverdiana.

Zona de residência… Fogueteiro?

Quinta do Conde.

Ok. pausa Escolaridade?

Licenciado.

Área?

Educação Física.

Que giro. Ah… Profissão?

Professor. Professor a meio termo

Número de irmãos?

Dois.

Idades?

Quarenta e três e quarenta e sete.

Mais velhos. Estado civil?

Solteiro.

Número de filhos?

Um.

Nacionalidade do teu pai?

Nacionalidade do meu pai?! O meu pai tem nacionalidade portuguesa.

Mas é de origem…

Mas é de origem caboverdiana.

Ou seja, nasceu em Portugal? Cá? O teu pai?

Não ah eles nacionalidade, neste momento ele tem nacionalidade portuguesa, mas ele é natural de Cabo Verde. E neste momento, passaporte, ele tem passaporte português risos.

Humhum.. ok. Escolaridade do teu pai?

classe.

Profissão?

Ah o meu pai neste momento é reformado!

Tenho que saber do quê…

Do quê?! Embar…Embarcadiço! Ele trabalhava nos barcos.

Mãe? Nacionalidade?

Então é nacionalidade portuguesa

Mas também é caboverdiana…

Sim.

Escolaridade?

Também é classe.

Humhum. Profissão?

Doméstica. Doméstica reformada.

E porque é que os teus pais vieram para Portugal?

À procura de melhores condições de vida

É normal.

Como a maior parte

Vamos começar então a entrevista? Que ainda não era…

Oh! Opá! Então, eu a pensar que íamos a meio risos! Força!

Quero que me fales um bocadinho do teu percurso escolar, a começar pela primária, que escolas é que frequentaste, condições das escolas, o ambiente… [mensagem sobre a chegada de comboio].

Ah É assim! Eu nasci no Barreiro, tive fiz a e a classe no barreiro, mas pronto, como tinha algumas estava com algumas dificuldades depois foi na altura que houve a transição que eu mudei de zona. Passei do Barreiro para a Quinta do Conde. E pronto! Na altura, ahhh, o professor o meu professor da altura, ahhh, falou com a minha mãe e disse que se calhar era aconselhável eu ficar retido. Ou seja, deveria repetir novamente o segundo ano. E, pronto, foi e tendo em conta que ia mudar de escola, ia mudar de zona, ia mudar de professor Ele disse, se ficasse com ele, ahhh, até poderia me passar porque pronto como tinha o acompanhamento, ahhh e pronto, ele como me conhecia sabia aquilo sabia o que eu sabia e o que não sabia, e sabia como é que poderia, ahhh, no ano a seguir trabalhar comigo. Como eu ia para outra escola com uma nova professora, ele achou que era aconselhável, ahhh, voltar a repetir o ano. Depois foi isso que aconteceu! Depois mudei de escola. Fui para Quinta do Conde. Depois fiz o a a e a classe e depois mudei para a escola secundária secundária não, que naquela altura não havia escola secundária a escola preparatória da Quinta do Conde, onde fiz o fiz o , fiz o , e . Entre o e o , ahhh, reprovei mais uma vez acho que foi no . No ano voltei a reprovar, ahhh a questão aquela idade cada criança tem a sua o seu desenvolvimento de maturidade diferente. Uns têm a maturidade mais acelerada, outros um bocadinho mais lenta. Digamos que a minha era um bocadinho mais lenta. Ia para a escola mais para a brincadeira. Jogar à bola, etc Estudar não era muito comigo e E pronto! Reprovei no para o ano. Depois fiz o , o , o . Depois como a minha ideia sempre foi ligada ao desporto e ligada à educação física, ahhh, tinha decidido, tinha em mente, tinha decidido que queria seguir a àrea de desporto logo nessa altura havia no ano, havia escolas onde havia onde podias escolher a tua área. Área de vocação. E vim aqui para a Amora onde havia área de desporto. E no ano, vim aqui para a área de para a área de desporto. Ahhh Secundária da Amora. O que é que aconteceu? Era uma escola complicada fica ali à volta de alguns bairros Quinta da Princesa Não sei se conheces? 06: 13 -

Não…

Nunca ouviste falar Mas pronto! São bairros assim meio meio complicados. A escola em si era um pouco um pouco complicada, com alguns alunos problemáticos. E tive a infelicidade de calhar era o que diziam na altura fui para o ano para uma área para a área de desporto diziam que era a pior turma da escola. Havia tudo o que.... Tudo o que havia de pior naquela escola meteram todos ali juntos. Pronto, e eu e mais uns quantos caímos ali de paraquedas. Ouve, o que é que aconteceu?! Ahhh se sabe que à partida quando turmas problemáticas, mesmo os que não mesmo os que não fazem nada, ahhh, às vezes não não consegues acompanhar. A nível de matéria, se a matéria não é dada em condições e se tens alguma dificuldade, pronto, não não consegues apanhar. E acabou o que aconteceu é que volto a reprovar nesse ano! O ano! Fiz o . Reprovei no . Depois voltei a fazer o a repetir o . Depois fiz o 10º entretanto, os anos foram passando e passei para o 11º, mas entretanto não eu apanhei na altura que o serviço militar era obrigatório. Tive que na altura fui fazer a inspecção, e tal, e não sei quê e depois fiquei à espera dos resultados. Logo fui à inspecção, depois fiquei à espera dos resultados e o resultado saiu e fui ahhh, fui enquadrado no para cumprir o serviço militar obrigatório. E o que é que aconteceu?! Isso tive o isso iria-me atrapalhar os estudos. Ainda tentei pedir adiamento e pronto consegui fazer com que terminasse o não! Consegui com que terminasse o ano, não! Consegui, ahhh, terminar o neste caso terminei o 10º, iniciei o 11º e depois, ahhh ainda fiz o primeiro período do 11º, depois não! passou tanto tempo que eu nem me lembro! Não! Terminei, terminei o terminei o 10º Não! Eu pedi adiamento que era para terminar o 10º ano. Exactamente, foi isso! Terminei pedi adiamento para terminar o 10º, ahhh, que inscrevi-me na mesma no 11º, fui cumprir o serviço militar, acabei o serviço militar voltei para a escola novamente, entrei no segundo período, e e pronto! E mesmo assim ainda consegui terminar o 11º, depois de Fiz o 11º, fiz o 12º o 12º deixei alguma deixei uma disciplina, acho que foi matemática. Ahh, depois entretanto deixei matemática depois no ano a seguir estive a trabalhar e fiz e fiz essa disciplina e depois entrei para a universidade.

Isso quer dizer que os teus irmãos/irmãs mais velhos são meninas?

São?

São meninas?

Não, é um menino é um rapaz e uma rapariga.

Então porque é que não tiveste dispensa do serviço militar? O teu irmão não tinha feito?

O meu irmão? Não, o meu irmão cumpriu!

Huuummm! Estranho! Normalmente quando o irmão mais velho cumpre, o outro…

Não! Não!

… pode ser dispensado.

Não! Não! Ahhhh Sim, sim. Também ouvi ouvi algo do género, mas na altura não foi! Não! Foi até a minha ainda hoje em dia, ahhh está sempre a falar nisso. Porque o meu pai trabalhou fora e quando as coisas não estão bem aqui, começa aquela conversa: Ah! Este país não nos deu nada! O teu pai trabalhou fora, ainda eu é que tive filhos que tiveram a contribuir para o país, o teu irmão foi os meus filhos estiveram a cumprir o serviço militar e não sei quê, e não sei quê, e não sei que mais. E pronto! Por isso, foi e o meu irmão foi pior! Que o meu irmão esteve quase dois anos, porque na altura ele é mais velho ele apanhou quase ele esteve quase dois anos a cumprir serviço militar. Eu, tive a sorte de apanhar quatro meses. Na altura daí permitir sair e voltar para a escola. Ahhh e pronto, olha depois fui tirar o meu curso e e pronto! Não Tirei o curso aqui no Piaget. O curso de professor o curso de de e ciclo, ensino básico variante educação física e terminei o meu curso.

E no curso não tiveste nenhuma reprovação?

Não! Nessa altura estava com juízo.

risos Pelo que eu entendi bem, foram quantas? Duas ou três?

Quê? Reprovações? Foram três! Salvo erro, foram três.

Ok. Ahhh, já percebi que foi um bocadinho cabeça no ar, não é? risos

Sim, no princípio. Foi no princípio! Tanto é que, eu mesmo depois que saí da tropa, apanhando o ano no meio quer queira, quer não, ahhh o 11º implica algumas dificuldades, não é?! E pronto! Ainda consegui fazer! Tive explicações pelo meio que era para poder acompanhar, tendo em conta a matéria que eu perdi, ahhh, mas é ! Pronto! Depois apanhei o comboio e consegui.

Quais eram os calcanhares de Aquiles?

Quê? A nível de disciplinas?

Sim!

Inglês. Eu a nível de línguas nunca fui nunca fui muito dado a línguas! em casa é ao contrário ahhh, os meus irmãos eles são ao contrário. São mais dados para línguas, a nível e.. a nível de números, ahhh, pronto! não têm muita aptidão para . Apesar de eu apesar de eu ter reprovado um ano ahhh, ter, reprovado um ano, no 12º, a matemática, sempre tive um pouco mais de jeito para ahhh, para os números do que propriamente para as línguas. En.: E ia mesmo perguntar quais eram as disciplinas em que te davas melhor, mas pelos vistos educação física, matemática

Ahhh Sim, mais a a parte mais científica. Matemáticas depois às vezes nem é questão tanto de de ter vocação ou não. Às vezes é questão de gostares ou não. Também depende muito por . Por exemplo, eu também gostava muito de biologia, também está muito ligado à minha área, ahhh e a partir do momento quando gostas, torna as coisas tornam-se mais fáceis. Não quer dizer que eu não goste das línguas, porque por acaso, epá, é um dos meus ahhh, como é que ei de dizer ahhh, ahhh, ahhh, das minhas desilusões, o facto de não dominar, principalmente principalmente a língua inglesa, porque acho que a língua inglesa é universal. Ahhh, se dominares o inglês, epá, estás à vontade em qualquer lado. E se ainda estou aqui uma das razões que risos quer queira, quer não, se ainda estou aqui em Portugal, é o facto de ir para um país onde não domino a língua. Por exemplo, tenho os meus irmãos não estão . Tenho a minha irmã na Holanda e o meu irmão está na Inglaterra. O meu irmão está Várias vezes me disse que Epá, anda para aqui! Vamos aqui tens outras condições e etc. , etc.. Mas são duas coisas: é a língua e o clima! Que por acaso não me seduz muito. E e pronto! Estou por ainda, mas mas estive fora! Estive uns anos estive alguns anos fora.

Ok. Já vou aí a essa parte, mas antes… hábitos de estudo, como é que eram?

Hábitos de estudo?

Hummhumm! Costumavas estudar acompanhado, sozinho, em casa, nas bibliotecas, como é que fazias?

Não! Por norma era sempre sozinho. Nunca fui de muito estudar acompanhado. Tipo: Ah, vou chamar um colega para vir estudar comigo! ou ir estudar na casa de um colega. Por acaso foi sempre sozinho. Nem muito de ir a a bibliotecas. Quer dizer, digamos que na primeira fase não havia muito estudo. Era aquele estudo quase obrigado, ?! Ahhh, porque pronto, a cabecinha não queria estava mais a pensar na brincadeira. Mas na segunda fase, onde pronto, ahhh, estava a levar as coisas mais a sério, digamos que o estudo sempre foi, ahhh, basicamente foi sozinho. Tirando a parte da dos trabalhos. trabalhos de grupo e etc., , ahhh tinha que me deslocar para casa do colega ou o colega vinha ter comigo para para realizar os trabalhos. Mas, de resto, basicamente era isso.

E com que frequência, mais ou menos? Estudavas antes dos testes, com muita regularidade…?

Inicialmente, naquela primeira fase, era antes dos testes. Uma horinha antes dos testes, Na segunda fase, ahhh, estudava com mais regularidade, tentava (entre aspas) manter sempre a matéria em dia e e pronto! Na última semana antes do teste começava a estudar um pouco, um pouco mais.

Quando é que começaste a pensar que querias ir para a universidade?

Quer dizer pensar, pensar desde muito cedo! Ahhhh, a partir do momento que eu eu dizia eu tinha, eu tinha ahhh, entre aspas, eu tinha dois sonhos a nível profissional, que eu gostava de ser. Gostava de ser professor de educação física e gostava de ser Dj.

risos

Era a minha pancada de puto, pronto, era essa! Ahhh, e pronto! Um realizou-se! Ahhh, que hoje sou sou, entre aspas sou professor de educação física não sei se posso considerar que sou, mas pronto. Não no activo, mas digamos que está está no papel. risos A outra pronto, a outra passou ao lado. risos Ahhh e pronto!

Quem é que te influenciou mais… ahhhh… a prosseguir nos estudos, a seguir com a carreira académica?

Ahhh a minha mãe! A minha mãe e os meus irmãos. O meu pai não tanto porque, pronto, o meu pai como trabalhava fora, ahhh, digamos que era um pouco ausente. Por isso não havia muito aquela não tínhamos muito aquela ligação de ele estar sempre a falar: Olha, tens que ir tirar o curso etc., mas pode-se dizer mais a minha mãe.

E como é que é a tua relação com os teus irmãos nesse sentido?

É assim em todos os aspectos! Em todos os aspectos, eu tenho uma excelente relação com os meus irmãos. E pronto! E posso confessar que, pronto, quer dizer a relação que eu tenho com eles é a mesma que eles têm comigo e entre os três. E uma das desilusões que nós temos neste momento é facto de estarmos afastados uns dos outros. Estar um aqui, outro ali e outro noutra ponta. Por isso seja a nível a nível de profissional, seja a nível de estudos, seja a nível pessoal, ahhh, nós temos uma excelente relação.

Mas de que forma é que eles te influenciaram nos estudos? Foi como exemplo, ou incentivavam, ajudavam…?

Ahhh Não! É assim, ajudavam naquilo que podiam ahhh

O facto de serem mais velhos influenciou?

Mais naquela altura mas na altura na primeira fase, quando não queria muito saber da escola. eles davam-me conselhos. Diziam que eu tinha que estudar, etc. A partir do momento que, pronto, tomei o meu rumo e comecei a levar as coisas mais a sério, ahhh, pronto, não até não falávamos muito nisso. Perguntavam se, se como é que corriam as coisas, se estavam a correr bem, se não estavam, mas e pronto, os dois por acaso eu acabei de tirar um curso, acabei por tirar um curso que os dois gostavam de tirar e não tiraram devido à questão que havia naquela altura, que era ia-se tirar o curso mas tinha-se que fugir aquela disciplina porque senão vai ser um Deus nos acuda. Ou seja, eles devido à Matemática fugiram um pouco àquilo que queriam tirar e e pronto! Posso dizer que acabei por tirar o curso que que que eles gostavam. 20:20 agora o que é que os teus irmãos tiraram?

Ahhh, é assim, a minha irmã tirou gestão gestão hoteleira. Ahhh, mas pronto! Nunca exerceu e depois foi para a Holanda e está a trabalhar numa área completamente diferente do que da sua área de formação. O meu irmão não se formou aqui, o meu irmão formou-se em Ingalterra. Ele aqui teminou o terminou o 12º. Depois foi para Inglaterra e depois, quer queira, quer não, tal como ele me tinha dito, Inglaterra dá-te outras facilidades, outras possibilidades que Portugal nem de perto, nem de longe, oferece. Ahhh, eles ofereceram-lhe essas possibilidades e ele aproveitou. Ele tirou o curso de, de, de línguas. Ele tinha o português, ?! Depois aperfeiçoou depois especializou-se no inglês, espanhol e italiano. Esteve a trabalhar uns tempos como tradutor porque muitos estrangeiros, portugueses, brasileiros, angolanos que não conseguem que não dominam a língua e que fez alguns trabalhos nesse sentido. Depois, ahhh, decidiu tirar a vertente pedagógica pois se calhar também para dar aulas. Começou a tirar e que depois o ensino é complicado os miúdos são terríveis. Eles têm muito poder! Eles têm o poder que aqui não se tem e e na maior parte dos sítios acho que não têm. Eles podem fazer praticamente tudo. E os professores dentro da escola têm são muito limitados. Mas depois que não chegou não chegou a terminar o curso porque as coisas não correram bem. que pronto, eles dão tanta facilidade que pronto, não terminas um, deixas esse e vais tirar o outro. Ele neste momento está a tirar fisioterapia. Está no último ano, ahhh, mas pronto! Esteve sempre a trabalhar. Foi estudando e trabalhando sempre ao mesmo tempo. Basicamente é isso!

Como é que foi a tua transição entre secundário e curso? Sentiste diferenças? Adaptaste-te bem?

Sim, sim, sim. Senti alguma diferença mas adaptei-me bem. Adaptei-me bem até porque o primeiro e o segundo ano até estava admirado comigo mesmo. Posso dizer que eu era dos melhores alunos da turma. Um dos melhores, pelo menos a nível de notas. No terceiro e quarto ano as coisas não foram assim. Mas o primeiro e o segundo ano, por acaso, ahhh, as coisas correram bem. E por isso a adaptação até foi boa. Ahhh, tens mais autonomia. aquela questão de, pronto, estares dentro de uma sala de aula onde os professores praticamente não é como no secundário que dão-te a papinha feita: Ah! E escreve agora vocês têm que escrever isto! Ali, logo no primeiro dias dão-te umas quantas bibliografias que tu tens que te orientar e a partir daí tu é que tens que fazer o trabalho. logo no princípio foi um bocadinho esse choque, mas depois fomos fui-me adaptando e as coisas até correram relativamente bem. Os últimos anos não não tão bem como no princípio, mas

Tiveste algum dos professores que te tivesse marcado durante o percurso escolar? Pela positiva ou pela negativa?

Huuumm, mas.. ahhh ao longo de todo o percurso?

Sim.

Sim, tive, tive tive. sempre Todos nós temos! Ou pela positiva u pela negativa, ou por isto ou por aquilo, temos sempre um ou outro professor que nos marca.

E em que sentido? Desenvolve um bocadinho mais… risos

Ah! Em que sentido?! Ahhh, epá, são tantos! Cada um no seu alguns pequenos aspectos que às vezes podem acontecer durante o ano que te marcam. Deixa ver! Por exemplo, ahhh desde o professor pronto, quer queira, quer não, os que os que marcaram mais são os que estão directamente ligados à minha área, que é a área de educação física, basicamente. Os professores de educação física, ahhh, ahhh, marcaram. Uns devido mesmo ao próprio relacionamento que acabas por ter com esses professores, ahhh, levam-te a levam-te a marcar, ?! Mas às vezes não, às vezes nada assim de concreto. Simplesmente às vezes a própria relação. Negativas?! Negativas, uma professora que, pronto uma que me marcou, uma professora de matemática, que foi na transição do 10º do 11º, quando eu saí da tropa e voltei para escola que, pronto, concretamente, cheguei , disse olhe, expliquei-lhe! Ela sabia da minha situação, e pronto, simplesmente ela disse que tu vais ficar aqui, mas tu não vais conseguir passar! Não sei, acho que não vale a pena!, tanto é que no segundo período tive nota para ter 10, ela não me deu 10, deu-me 9. Ahhh, e pronto! No terceiro período teve que me passar. Pronto, também não foi da minha parte, porque eu estava a ter explicações por fora. Porque eu sei perfeitamente que se fosse , ahhh, se fosse eu não conseguia. Tanto e, porque tinha a matéria atrasada que tinha que apanhar. E ela depois disse ah, mas eu não posso fazer nada!. Ela chegou a dizer viesses mais cedo! ou alguma coisa assim do género. Devias ter vindo mais cedo!, pronto, marca ?! Muito positivamente, ?! risos Ahhh um professor de História! Mas esse marcou muita gente! aqueles que professores que marcam uma escola. Porque hoje em dia eu falo do professor Paredes, que é o professor de História e toda a gente o conhece. Porque é daqueles professores que não dava matéria. Chegava dentro da sala e que bebia um copinho ou outro e não dava matéria, e que depois dava as notas por sei ! Se estava bem disposto dava-te 10, dava-te 15, 16. Se estava mal disposto dava 10. Negativas acho que não dava muitas, mas pronto. Ahhh, era sempre positiva, mas consoante a sua disposição era mais alta ou menos baixa. Ahhh epá, são tantos! Desde uma professora de filosofia que não era muito boazinha da cabeça, que fumava dentro da sala, ela dizia epá, desculpem mas eu tenho que fumar! E, epá, por a fora

E falaste-me em explicações. Porque é que tiveste explicações. Como é que surgiu a ideia de teres explicações? Como é que gerias isso?

Não, a explicação surgiu, tendo em conta quando eu saí da tropa e depois perdi o primeiro período, depois fui para a escola, para recuperar a matéria tendo em conta que pronto, matemática, quer queira quer não é uma daquelas disciplinas um pouco mais complicadas ahhh, decidi quer dizer, decidimos decidi juntamente com os meus pais que era aconselhável ter umas explicações, e e pronto! Depois, fui, fui, fui ter explicações no que era na altura era uma simples garagem a mulherzinha dava aulas dava explicações numa garagem e neste momento tem um ATL de todo equipado. É considerado dos melhores ATL’s dali da Quinta do Conde e pronto! E por acaso consegui manter uma boa relação com eles. E basicamente foi por causa disso que surgiu a hipótese de ir pa de ir ter explicações.

E chegaste a ter apoio escolar em alguma fase?

Na escola?! Dentro da escola, não. Foi sempre fora.

Ok. E quando é que começaste a trabalhar? Tiveste algum período em que estudasses e trabalhasses?

Ahhh Tive Quando é que foi? Na altura Na altura que estava a fazer na altura que estava a fazer disciplinas, tive eh, tive a fazer uns trabalhos era pronto! Tive a fazer uns trabalhos na Quinta do Conde, dentro da área da construção civil. Tinha uns amigos que trabalhavam nessa área e depois, ahhh sempre que surgia essa possibilidade, ahhh, ia. E depois quando no primeiro ano do curso, tentei conciliar. Tentei conciliar o curso com com com o trabalho, mas não foi possível. Ainda comecei, comecei, trabalhei durante um mês, ahhh, no hipermercado de de venda a grosso, ali na (posso falar a marca? Posso falar a marca? Posso?) sim, porque acho que havia um para aquela zona, não é?! Não é? Se não

Acho que não…

Mas pronto, ahhh, tive a trabalhar nesse Hiper, mas foi durante pouco tempo. Não estava a conseguir conciliar. Depois estive durante o tempo que estive na universidade, estive na universidade. Estive na universidade, não. Minto! Depois comecei a trabalhar surgiu a hipótese de ir trabalhar para também era part-time, era casual no estádio da luz como stuart.

Como?

Stuart. Assistente no recinte desportivo. Aqueles que andam com aquele colete florescente a dar apoio e etc. às pessoas. Foi mais ou menos o que consegui isso, pronto, consegui conciliar porque não era sempre. Era ao fim-de-semana, de vez em quando durante a semana, mas pronto isso era possível conciliar.

E tinhas bolsa?

Não, não. A única bolsa que tive foi a bolsa dos meus pais. risos

E depois que acabaste o curso o que é que fizeste?

Depois que acabei o curso, ainda no ano, ainda não tinha terminado o curso, uma tia minha veio de Cabo Verde (é professora ) ela chegou e disse-me: sabes N, em (que ela dava aulas numa escola) em Cabo Verde, na minha escola, falta de professores de Educação Física! Ahhh, e pronto, ! Eu sempre fiquei com isso na cabeça! E a saber que a situação aqui estava complicada na área de ensino ahhh, mesmo estávamos a tirar o curso e todos os dias estávamos a ouvir a mesma coisa: Ah, isto do ensino está complicado, está complicado, está complicado, está cada vez pior! E pronto, eu meti isso na cabeça pronto, meti na cabeça, e digo: pronto, sei! Vou tirar o curso e sei que não vou arranjar trabalho! Epá, e fiquei com essa ideia na cabeça de porque não fazer uma experiência?! Epá, o tempo foi passando, eu um dia decidi ligar à minha tia: Como é tia? Como é que está a situação ? Ela disse: Está! Ainda existem vagas, se quiseres é terminas o curso, envias-me os documentos que a escola trata do resto da burocracia, depois é para começar a dar aulas . Então pronto, olha, decidi e disse liguei-lhes e disse: Pronto, vou aceitar a oferta e vou fazer uma experiência. Acho que ela falou directamente com os directores da escola e eles prontificaram-se logo disseram logo: Olha, então diz para ele vir rápido porque estamos mesmo a precisar! Ainda nem tinha terminado o curso. Ainda faltava-me (esta parte que eu adoro risos) ahhh, que ainda nem tinha terminado o curso. Ela ligou-me e disse: Olha, N, tens que então se te despachas que, pronto, que eles estão a contar contigo para o próximo ano lectivo, ahhh, por isso se terminas rapidamente o curso que é para poderes vir! Eu disse: Ah! Ok, falta-me fazer a monografia, terminar, quer dizer (no caso), que na altura estava tudo previsto que era para eu entregar em Dezembro, que entregar em Dezembro que as aulas, o ano lectivo devia iniciar em Setembro. O que que aconteceu? Foi um ainda hoje acho que arrependo-me ah, quer dizer se arrependo? Não sei. Quer dizer, hoje em dia nem sei nem posso dizer se me arrependo, se, se, se me arrependia ou não. Foi que eu falei com a minha orientadora na altura, falei com ela e expliquei-lhe a situação, disse-lhe: Olha, expliquei-lhe a situação, surgiu esta possibilidade de ir trabalhar para fora que ainda não terminei a monografia, está previsto entregar em Dezembro falei com ela para saber o que é que era possível fazer! Tens todos aqueles tens todos aqueles objectivos que tens que atingir ao longo do trabalho ahhh, pronto, falei com ela e ela disse-me: N, olha o que nós podemos fazer é fazermos o trabalho assim desta forma, certo?!, mas sabes que em determinados itens não podes ser avaliado! Mas pronto, se eu quise isso agora tinha que saber se eu ia de acordo ou não. Que pronto, digamos, isso foi mesmo com o conhecimento da direcção porque, pronto, eles souberam neste caso, a orientadora falou com os elementos da direcção, expuseram a situação, etc. e pronto, eles aceitaram, ?! que neste caso fui penalizado porque, pronto, o trabalho não consegui ter, ahhh, digamos, uma nota considerável, ?! O que fez com que a minha média descesse. E pronto! Quer queira, quer não, hoje em dia posso dizer que arrependo-me porque, pronto, quer queira quer não, o que que conta é a nota final de curso, ?! Se vais te candidatar em qualquer lado o que eles vão ver no meu caso principalmente, quando a nível de concurso vais concorrer, tens uma plataforma com que concorrer, ahhh, um dos sítios principais que eles vão avaliar é a nota! Aquilo , nem entrevistas nem nada! Tens aquele concorres, tens o é os anos de serviço, é a nota de final de curso, é a idade, etc., depois consoante o cada um tem uma percentagem, depois consoante isso és colocado numa posição! Ahhh, logo porque ali às vezes uma diferença de 1 valor aquilo faz epá! Faz muita diferença! Devem-te passar para uns 2 ou 3 mil à frente. para dar-te aqui um exemplo. Nesse aspecto posso dizer que arrependi-me um pouco. Mas, pronto, olha, fiz as coisas dessa forma, terminei e enviei alguns enviei a documentação necessária e depois fui! A minha tia tratou do resto e depois cheguei , supostamente que era para começar a dar aulas logo no início e também as coisas não correram bem. sabes, estamos a falar de um país subdesenvolvido onde as coisas é tudo mais lento, ?! sempre aquela ahhh, tenho que enviar a minha documentação e depois tive que pedir equivalência, ?! Tinham que dar equivalência ao curso e isso levou enquanto não me dessem equivalência não podia começar a trabalhar. Isso levou algum tempo. Ou seja, comecei a trabalhar em Janeiro. Fui em Outubro e comecei em Janeiro! E pronto, foi assim.

Chegas lá, ficas um tempo à espera em casa de familiares, certo?

Sim! Em casa da minha tia.

Hummhumm. Depois começas a trabalhar…

Comecei em Janeiro. Nesse período foi complicado, até pensei em voltar porque logo à primeira é assim, nunca tinha ido para tinha ido para Cabo Verde tinha 6 anos não conhecia praticamente. Tinha ido para outra ilha. Quer queira, quer não, aquilo foi um choque porque é uma realidade completamente diferente e e custou-me um pouco a adaptar. Eu dizia antes eu dizia: Ahh, eu sou caboverdiano! Eu estou aqui mas eu sou caboverdiano e não sei quê Apesar de ter nascido aqui eu sou caboverdiano, tenho cultura caboverdiana, etc. e não sei quê, não sei que mais. Eu cheguei e fiquei assim: Epá, afinal as coisas não são bem assim! Ou seja, estava-me a sentir um pouco desenquadrado. Eu via o comportamento das pessoas e eu não me enquadrava muito com certos comportamentos. Afinal andava para aqui a abrir de boca cheia que era isto e aquilo e afinal a coisa não é bem assim. Ahhh, e pronto! A princípio foi custou um bocadinho. A partir do momento que comecei a trabalhar, pronto! Comecei a conhecer mais pessoas, colegas e etc. e pronto! Consegui comecei a socializar um bocadinho mais e pronto! A adaptação tornou-se mais fácil!

Estiveste lá quanto tempo?

Oito anos e qualquer coisa. risos Foi uma experiência de longa duração.

E durante esse tempo chegaste a morar em casa própria? Como é que fizeste? Continuaste em casa dos teus familiares?

Ahhh, estive na casa de familiares e depois os meus pais arranjaram casa. Eles arranjaram-me uma casa em São Vicente. Foi para a ilha que eu fui. Depois saí da casa de dos familiares, fui morar para a casa que os meus pais arranjaram e pronto, fiquei .

E durante esse tempo estiveste sempre a trabalhar como professor?

Sim! Sim.

Conta u bocadinho a experiência…

Como professor?! Por incrível que pareça posso dizer que foram oito anos posso dizer que o ano que eu gostei mais de dar aulas foi o primeiro.

E porquê?

Não sei porquê! Ah! Não sei porquê?! Sei! Porque quer queira quer não é aquela coisa Estás a tirar o curso e tens aquela motivação toda, ?! Sangue na guelra e não sei quê, muita adrenalina, pensas fazer isto e aquilo e aqueloutro e pronto! E e pronto! Foi posso dizer que o primeiro ano foi o que me marcou mais. Mas foi foi um bocadinho complicado! Foi um bocadinho complicado porque quando cheguei tinha horário tinha o meu horário feito. Ia ficar com as turmas do 10º ano. Ahhh, que, pronto, tive que esperar até (como tinha dito), até janeiro para começar a dar aulas. E pronto, me tinham alertado para algumas situações que ia ficar com turmas do 10º ano, são turmas complicadas, ahhh, onde apanham uma faixa etária complicada que era havia miúdos que apanhei pessoal do 10º ano que havia miúdos com 18, 19, 20 anos. Que era autênticos que eram uns homenzinhos e umas mulherzinhas!

E tu na altura estavas com…?

Eu na altura estava com 27 Estava com 27 aninhos, que tinha a carinha se calhar não tinha cara de 27. Tinha cara de menos. Ahhh, e eles avisaram: Olha, tu vais ter que ter cuidado porque senão tanto com eles como com elas, vais ter podes ter alguns problemas. Pronto, epá! Eu fiquei a partir do momento primeiro dia de apresentação primeira semana de apresentação com a maior parte das turmas, eu pensei: Uff, pois! Isto Vai ser complicado! Tanto é, para veres, o primeiro dia de aulas isto foi fora, eu passei por eles, entrei ahhh, entrei dentro da sala e pronto, eu sou professor de educação física, mas a primeira aula é a aula de apresentação, fazemos nem todos, mas pronto! Eu quis fazer dentro da sala. Mas pronto, sabia mais ou menos como é que as coisas ahhh, como é que as coisas seriam, por isso ahhh, para veres, no primeiro dia, passei por eles, entrei dentro da sala e eles não Não! Mas vou te explicar o simples porquê! Porque eles não sabiam que eu era o professor. Eles pensavam que eu era um aluno. Eu sabia mais ou menos que seria assim. Pronto, entrei, fiquei à espera, passado um bocadinho houve um ou outro houve um que apareceu na porta e viu-me e foi chamar os outros: Ah! O senhor é professor?! O professor entrou! Conforme eles estão a entrar eu estou a ouvir comentários: Ah! Isto é que é o professor? Eu a pensar que era aluno Pronto! Ahhh, eu sabia como é que teria como é que tinha que funcionar com eles no princípio. No princípio foi tolerância zero. Posso dizer que eles viram os meus eles viram os meus dentes para um mês e tal depois porque senão esquece! Se eu mostrasse os dentes antes, não tinha mão. não fazia nada durante o ano. Epá, e surpreendeu-me! Turmas excelentes! Os rapazes, havia gajos que eu pensei que ia ter problemas com eles e por acaso não. Dei-me lindamente! As miúdas ahhh, posso dizer que tive mais problemas foi com as raparigas, porque naquela idade ah, professor novo e não sei quê e não sei que mais, pronto! Tive que manter aquela duas ou três barreiras para elas não poderem risos ultrapassar. Ahhh, que custou levou, levou, levou algum tempo. Mas, epá gostei! Gostei, gostei da experiência. Depois nos próximos anos foi o acumular de experiência. O segundo ano foi diferente do primeiro. O terceiro foi diferente do segundo. Depois apanhei outras faixas etárias. Depois comecei a trabalhar com miúdos do , , . Trabalhei com miúdos.. depois também com o 12º. Ahhh, assim de uma forma experiências sempre diferentes.

Hummhumm. E o que é que te fez voltar?

O que é que me fez voltar?! O que me fez voltar foi várias questões. A nível pessoal as coisas não estavam a correr bem, ahhh, e a nível profissional também não dava. Tipo, quando sentes que não estás a quer dizer, eu nunca evolui. Quer dizer, ganhei alguma experiência, ahhh, a trabalhar naqueles a trabalhar naquele ambiente e a trabalhar com aquelas condições. Isso quer queira quer não isso quer queira quer não, isso dá-te alguma experiência, alguma bagagem porque pronto, às vezes tens que te adaptar a algumas situações, mas senti que não estava a evoluir, que estava a regredir. Epá, metade das coisas que eu aprendi no curso não consegui pôr em prática, até hoje não consegui pôr em prática porque não havia condições para tal. E aqui também neste momento não me permite. E juntando as duas partes, a parte profissional e a parte pessoal, que não estavam a correr muito bem. Ahhh, pensei, olha, digamos que acho que estava na altura de não digo, pôr um ponto final, mas fazer um pequeno intervalo. E depois logo se ! Tanto é que eu vim que eu fazia parte dos quadros, estive tanto é que eu vim, mas não vim vim de licença. Pedi licença sem vencimento para para voltar para Portugal. E pronto! E neste momento, ainda estou de licença. Foram dois anos de licença e prolonguei por mais um. Até decidir ao certo o que é que eu vou fazer ou não. Quer dizer, sei! Não tenho ideias de voltar, mas pronto! De qualquer das formas não me quero desvincular, assim, radicalmente, ahhh, com o Ministério de porque, pronto, nunca se sabe [perdão], nunca se sabe o dia de amanhã, por isso vou aguardando. 48:26 E tinhas ido a Cabo Verde com seis anos, chegas depois grandinho, o que é que achaste? Qual era o imaginário que tinhas de Cabo Verde e o que é que achaste que era diferente?

Ahhh não, era mais ou menos aquilo que eu estava à espera porque, pronto, apesar de não ter ido, tenho pessoas que familiares e amigos que costumam ir de férias e me tinham explicado mais ou menos como é que as coisas eram ! Mas atenção: explicaram-me as coisas como pessoas que vão de férias, não como pessoas que vão para viver. O primeiro período que eu estive ok, isto é engraçado para passar férias! - , mas quando passou aquele período e me adaptei, e posso dizer que fiquei mesmo inserido dentro da realidade do país, ahhh, pronto! Digamos que as coisas tornam-se um pouco diferentes, principalmente porque é um meio pequenino. Um meio pequenino, toda a gente conhece toda a gente, ahhh, não podes fazer nada, se fizeres qualquer coisa aqui, na ponta da ilha passado meia hora sabem mas não quer dizer que estive a fazer alguma coisa de mal, mas pronto! risos Mas toda a é um exemplo que eu te estou a dar, ahhh e depois entras ali numa rotina, estás dia após dia a fazer sempre as mesmas coisas, as mesmas coisas, e aquilo quer queira quer não mexe, mexe e tens ali um impacto. E é assim, eu os primeiros anos chegava às férias tinha que vir a Portugal porque senão não dava. Senti mais quando não, não foi tive uns anos que não foi possível vir, a coisa foi ainda mais complicada. Custou, custou, custou, custou um pouco mais. Ahhh, mas pronto! Hoje em dia digo: é um país excelente para passar férias, mas para viver Depois outra questão, que é a questão financeira. Porque a nível de a nível de salários é baixíssimo e o nível de vida é caríssimo. O nível de vida não é o mesmo nível de vida que tens aqui. Tanto é porque os produtos que eles têm é tudo é de fora! Ou vem daqui, de Portugal ou é do Brasil, basicamente. Sabes que tu não vai comprar o mesmo produto aqui não vais comprar o produto pelo mesmo preço! Se tens as taxas e não sei quê, a deslocação, fica tudo mais caro! E quando ganhas menos epá, eu sinceramente eu digo-te: não sei como é que pessoas que vivem . A sério! pessoas que vivem o dia-a-dia. Sabes que muito aquele, como é que eu hei de dizer aquelas lojinhas a retalho. E o que as pessoas vão comprar é a retalho, ?! Um bocadinho disto, um bocadinho daquilo às vezes vão comprar as coisas que é para fazer aquela refeição. Levam as garrafinhas, um bocadinho de óleo, um quarto disto, um quarto daquilo e cem gramas disto e não sei quê, que é para fazer aquela duas, três batatas que é para fazer aquela refeição. Muita gente vive assim! Epá e aquilo fazia-me confusão!

Mas diz-me uma coisa… por acaso não tenho muita noção… ahhh, lá… se tu vivesses lá com um salário de Portugal, vivias bem?

Não! Com o salário de Portugal, como assim?

Um salário normal, acima dos 500 euros mas não acima dos 1000. Entre os 500 e os 1000 vivias lá bem?

Normal?

Sim.

Não vivias normal, vivias limitado. Eu digo-te que é assim eu licenciado. Um professor ganha quinhentos e trinta e tal euros. A minha sorte era que eu não pagava casa! Eu tendo que pagar o aluguer de uma casa, luz, água e a minha manutenção ! Mas trabalhas que é para sobreviver, digamos assim

Nesse sentido não é muito diferente de Portugal… aqui com 530 euros também não vives se não tiveres margem de manobra!

Não! Mas, mas aqui tens um bocadinho mais. A nível de os bens essenciais, epá, consegues. Consegues obter um bocadinho mais barato. A vida é mais cara. Não, mas , ! Atenção também 530 euros aqui também não é nada, sim. Aqui aquela questão porque a vantagem que a única vantagem que é que quer queira quer não as casas são mais baratas. Uma casa é mais barata do que aqui. É a única coisa, porque de resto é tudo mais caro.

E davas as aulas em crioulo ou em português?

Português. A língua oficial é é é o português! Apesar que essa era outra das batalhas, mas pronto! Foi uma estratégia que eu adoptei por forma de manter aquela barreira, que era falar sempre português. Ás vezes os miúdos, os meus alunos, chateavam-me muio Ah, não sei quê o professor fala, (eu era conhecido pelo professor que fala português), Ah! O professor fala português, fala português, fala português , fala português Mesmo fora da escola, encontrava-os Ah! Não sei quê, eles falavam comigo crioulo e eu falava português. Então professor, fale crioulo e não sei quê e não sei que mais tanto é ahhh, depois chegou uma altura eu mesmo que quisesse falar crioulo não conseguia. Soava-me estranho! E pronto! Porque às vezes conhecia tive alunos que pronto, tive alunos que depois saíram da escola, supostamente pronto, saíram da escola, podemos ter uma relação dita normal, sem manter aquelas barreiras eu queria falar crioulo com eles, não conseguia. Aquilo, pronto, aquilo ficou interiorizado

Mas sabes falar?

Falo! Falo! Digamos que, ahhh, aprendi mais tarde. em casa fui não, houve alturas que eu era gozado por aquele que não sabia falar ou falava mal. Depois digamos, mesmo quando cheguei , ainda misturava um bocadinho português/crioulo. Depois fui depois foi ao contrário. Tanto tempo passei tanto tempo, depois quer queira quer não começaste a falar muito crioulo, muito crioulo e falava mais crioulo do que português. Quer queira quer não, às vezes quando ia falar português, mesmo a falar português não saía não saía igual. Ahhh, mas pronto! É normal!

Ahhhh… deixa-me cá ver! Hobbies?

Hobbies?

Hobbies? O que é que fazes nos tempos livres?

Agora? Aqui?

Ahhh, no geral…

No geral?! Sim. Ahhh, sendo da área, ?!, gosto muito de praticar desporto. Futebol! pratiquei futebol, era federado, neste momento não não! Porque a idade também não me permite. Ahhh, as lesões também não. E agora, de vez em quando, uma vez ou outra, pela desportiva ahhh, mais! Passear! Gosto de passear. Ahhh, cinema, se possível. Gosto do meu tempinho em casa. Sou viciado em televisão, apesar que fui um bocadinho mais. Agora menos ahhh, estar com os amigos. Beber um copinho de vez em quando. Ahhh, basicamente é isso. Estar com a família basicamente é isso.

E amigos? Como é que é o teu grupo de amigos? Ou grupos? De nacionalidade variada? Identificas-te mais com algum tipo específico?

Dentro do meu grupo de amigos, a maior parte são todos como eu. Ahhh, descendentes de caboverdianos mas nascidos . É pessoal que nós criámos juntos desde pequeninos pronto! uns que depois sempre diferenças. uns que nós damo-nos mais do que outros, mas temos pronto, tenho uma relação com todos. Somos assim um grupo até por acaso tenho um grupo nós temos um grupo, aqueles grupos fechados do chat do Messenger e não sei quê eu por acaso não sou muito de estar a falar por , mas tenho um grupo que está constantemente... está sempre a falar. Falam de tudo e mais alguma coisa. Tipo às vezes o pessoal nem o pessoal encontra-se, ?! Mas mesmo que o pessoal não se encontrar tens ali aquele meio que o pessoal vai ahhh, vai metendo as coisas em dia. Sim!

E até que ponto é que achas que o teu grupo de amigos influenciou o teu percurso?

Não! Não! Nesse aspecto não. Porque cada um tem o seu tem a sua tem o seu percurso bem distinto e que pronto, não está muito ligado ao meu, a nível profissional.

Ok. E em termos de estudos também não? Não sentiste que algum deles tivesse…

Não! Não! Não!... Não, por acaso, não. A nível de estudos posso dizer que digamos não tenha assim nenhum tipo de ligação com o meu grupo de amigos.

E a tua escolha pelo desporto também não foi influenciada por ninguém? Sempre foi uma coisa que cresceu contigo?

Não, foi, foi minha! Foi minha! Sempre foi minha. Desde pequeno , e pronto foi minha e eu tinha o que também o que me facilitou é que eu também tinha algum tinha algum jeito. Tinha jeito e desde pequeno os meus professores diziam que eu tinha jeito para a área do desporto. E pronto, tendo jeito e gostando, pronto, era meio caminho andado. Sim, a nível do meu grupo de amigos temos uma ligação dentro da no que diz respeito à minha área, que é basicamente é o futebol. Nós jogamos à bola tenho alguns que é jogávamos e ainda hoje na brincadeira reunimo-nos que é para fazer fazer uns jogos assim por por diversão. Mas nesse sentido. De resto, não.

E tinhas-me falado em identidade, no facto de achares que eras caboverdiano antes e depois de estares lá sentires um bocado a estranheza de não te identificares assim tanto com o modo de estar das pessoas… ahhh, agora como é que te identificas… em termos de nacionalidade?

Não, na mesma.

Sentes-te caboverdiano?

Não. Sinto-me na mesma como antes. Antes de ir para antes de ir para cabo-Verde.

Então identificas-te como caboverdiano, certo?

Ah, não! Desculpa! Esquece! Não, não, identifico-me como ahhh, é assim, não posso neste momento não posso dizer que me identifico como como português mais como português, porque quer queira quer não estive quase oito anos.. quase nove anos. Quer queira quer não mesmo houve algumas coisas a nível de comportamento também que mudei. Por isso, quer queira quer não neste momento posso dizer que aqui um misto das duas, ?! Portanto posso dizer que é mais um misto das duas, porque é assim, tu a partir do momento que estás oito anos dentro de um país acaba por ficar qualquer coisa, ?! Ainda mais tendo raízes. Por isso, posso dizer que está ali um misto. Apesar de, conforme os anos vão passando, aqui vai diminuindo a parte que eu adquiri .

E como é que vês as características do povo caboverdiano? O que é que achas que se destaca mais?

Positivamente? Ou negativamente?

As duas.

É assim o povo caboverdiano Atenção! O povo caboverdiano que nós temos é distinto! Porque varia de ilha para ilha. Cada ilha tem um tem as pessoas têm uma determinada personalidade. Por isso, posso falar um pouco da minha posso falar daquilo que eu tenho mais conhecimento, que é da ilha de São Vicente. Falando de uma forma geral, pronto, se calhar não te posso adiantar assim muito mais. De uma forma é assim: de uma forma geral o povo o caboverdiano de São Vicente (de uma forma geral, não quer dizer que são todos) apesar que aqui também muito é muito assim, é pessoal muito que olha muito para o muito, muito para o umbigo. Ahhh, não aquela camaradagem. O pessoal não é assim tão unido, por exemplo, como noutras ilhas. É são um bocadinho assim como é que eu hei de dizer?! Posso dizer que um bocadinho arrogantes. pessoal que é estou a falar de uma forma geral, é óbvio que dentro de de muitas pessoas, varia, ?! muitas pessoas que não são todas assim! Ahhh, pessoal ali que é é, como se costuma dizer, ahhh o pessoal ali normalmente tem mais olhos do que barriga. Aquilo é um pessoal muito de viver o dia-a-dia, . Hoje , amanhã se não houver, olha! Paciência! Arranja-se! O pessoal vive é um pessoal muito festivo! Nem sei, de uma forma muito geral, acho que o caboverdiano em si, ahhh, mesmo nas dificuldades é um pessoal alegre! É alegre! Isso notas, por exemplo, tens o centro falo tens o pessoal que vive no centro, o pessoal que tem mais condições, ?! Depois o pessoal que vive nos arredores que é pessoal que tem menos condições, ahh, e que passam algumas dificuldades mas notas que as pessoas esse pessoal está sempre contente! É alegria o dia inteiro! Festas é assim: é um país que não dinheiro, mas para a festa aparece sempre! risos Não sei porquê?! Ahhh, e pronto, é um pouco é um pouco assim.

E em termos de cultura? O que é que achaste?

Culturalmente é São Vicente é das melhores ilhas. É conhecida pela culturalmente é considerada das melhores ilhas. A nível musical, porque muitos artistas de renome até a nível mundial, ouviste falar na Cesária Évora. Cesária Évora é de São Vicente. A nível de arte, também é muito forte. Até mesmo a nível de teatro, eles têm bastante. Eles são e mesmo eles criam muitas actividades nesse sentido. Chamam diversos grupos que é para ir à ilha para fazerem actuações. Eles são muito dinâmicos, nesse sentido.

E com que é que te identificaste mais? Do modo de estar dos caboverdianos? Isto por oposição ao que tinhas dito anteriormente… que te sentias um bocadinho desenquadrado…

No que é que eu me posso, ahh, identificar neste momento É assim: eu quando digo enquadrar acho que até nem…se calhar se calhar nem nada de, de nada em concreto. Ás vezes é pelo facto de, ahhh, de lidares com eles, ?! Ahhh, pronto! Se calhar, huuummm és capaz começas a tentar percebê-los um bocadinho melhor. Acho que é mais nesse sentido. Não tanto de identificar com eles, mas mais uam questão de, de entendê-los um bocadinho melhor anível de alguns comportamentos que eles possam ter. Não que me identifique. Porque sinceramente, ahhh, algo que eu me identifique neste momento com o pessoal de Cabo Verde, não sinceramente ! Não estou a dizer que não haja. Mas neste momento não me vou não me salta assim nada à vista. 1:08:10 E agora mudando de país com os portugueses? Com o que é que te identificas mais com o modo de estar português?

Ahhh, com os portugueses vamos voltar à velha questão que, pronto, nem toda a gente é igual, ?! Ahhh

Ou melhor! Sim, vamos começar pelas características… o que é tu achas que são características dos portugueses?

Características, ahhh, dos portugueses. O povo o povo português acho que é o povo que acho que quando precisam mesmo eles unem-se. Acho que é um povo mais aparentemente é mais solidário do que parece. Sinceramente. E quando e quando precisam, ahhh, eles unem-se que é para para tentar fazer qualquer coisa. Acho que alturas houve uma pequena alteração a nível de mentalidade. Acho que o povo português de agora não é igual à mentalidade que eles tinham uns anos atrás. Acho agora um povo mais aberto. Acho que uns anos atrás era um povo, era um bocadinho um bocado um bocadinho fechados, ?! Um povo mais um bocadinho egocêntricos, muito para dentro e agora acho que, pronto, quer queira quer não, acho que derivado também desta multiculturalidade que agora, ?! Quer queira, quer não eles não têm por onde fugir. Se se viram para um lado dão com alguém de outra nacionalidade, viram-se para o outro e acabam por risos por ter que se adaptar. E às vezes eu próprio digo que eles têm que se adaptar a uma nova realidade. Tanto é que hoje em dia vê-se a nível cultural, a nível da música que eu fiquei admirado quando cheguei , como eu fui antes de ir para Cabo Verde ias para as discotecas normalmente, ia para as discotecas era pessoal africano. Quem ouvia música era pessoal africano e neste ponto, quando chego aqui, o pessoal africano não houve música africana. É óbvio que eu estou a exagerar, como é óbvio! Quer dizer, que isto hoje em dia parece que mais portugueses estão a ouvir música africana do que propriamente os africanos. Ahhh, epá! E isso tudo leva a que uma maior mistura, ?! Neste momento encontras casais de nacionalidades diferentes, coisa que uns anos se calhar não se via. Logo nota-se que, pronto, qualquer coisa mudou, ?! Quer queira, quer não, acho que neste momento o português está com a mente mais, mais aberta. E nesse sentido, estou-me a identificar um pouco, ahhh, com eles, ?! Ahhh, acho que é um povo trabalhador. É óbvio, vamos falar de uma forma geral, muita gente que de certeza que não está para muito virado, mas de uma forma geral acho que acho que sim. Ahhh, humildes q.b., da mesma forma, estamos a falar de uma forma geral, porque é óbvio que muita gente arrogante e por a fora, mas pronto, acho que estes aspectos que eu estou a dizer são alguns aspectos com que eu me identifico.

Ok. E culturalmente o que é que os teus pais te passaram de Cabo Verde? Ahhh, o que é que em casa dos teus pais se mantém da tradição de Cabo Verde?

Em casa fala-se crioulo, fala-se crioulo. Ahhh, eu fui o último a começar a falar crioulo

Porque…

Pela simples razão que é assim: eu morava no Barreiro no Barreiro, ahhh eu nasci no Barreiro. Morávamos num prédio, ?! Cidade, mais movimento, ali era casa-escola, escola-casa. Os meus irmãos mão saiam e eu ainda era novo também, é óbvio que não saía. E como eles não saiam muito, basicamente iam à escola e falavam português na escola, criaram aquele hábito de falar o crioulo em casa. Criaram esse hábito e começaram a falar. O que aconteceu foi que comigo não aconteceu porque mudámos para a Quinta do Conde e a Quinta do Conde é um espaço mais aberto. Não é cidade, não é?! Onde podemos circular mais à vontade, as crianças podem sair na rua, ahhh, e foi o que aconteceu. Eu saia muito na rua, para além de ir para a escola, vinha para casa, saía muito na rua, ficava ali à frente a brincar com os com os meus amigos ali da que eram portugueses, ?! Ou portugueses ou também como eu, mas também falavam português e apanhei aquele hábito de falar português. Não criei o hábito de falar crioulo. Logo, mesmo em casa eles falavam crioulo, eles falavam crioulo comigo e eu falava respondia em português. Por isso, foi ahhh, não apanhei logo a língua. Ahhh, vim apanhar mais tarde. Vim apanhar mais tarde quando, ahhh olha quando fui para o fui para a Holanda. A primeira vez que fui para a Holanda os caboverdianos falam crioulo e até não percebem muito português . Que remédio, tive que começar a arranhar no risos tive que começar a arranhar no crioulo. Ahhh, e depois daí comecei a falar um bocadinho, mas sempre muito pouco. E pronto! E era sempre gozado pelos meus irmãos. Ahhh, risos mas comecei a falar mais foi mesmo quando quando fui para Cabo Verde. Comida, culturalmente também a comida ainda hoje está presente na mesa. Catchupa e por a fora. Música também! Mas a música a música foi mais nós! Nós é que nem foi propriamente os meus pais que nos incutiram Ah, ouvir isto, aquilo. Não! Foi mais nosso. Nós fomos buscar de nós próprios.

E que valores é que achas que os teus pais te transmitiram que queres transmitir ao teu filho/filha?

Epá, acho que os melhores valores que podemos ter. Desde ser humilde, sinceros, ahhh, ajudar o próximo, que nós em casa nós na nossa casa sempre fomos, ahhh a nossa casa é a casa da família. Toda a gente que vinha de fora, toda a gente ia para . Ainda hoje é assim. Pessoal que vem de fora não sei porquê. outros outros, porque nós temos outros familiares por exemplo, em relação à minha irmã à minha irmã à minha mãe, ahhh, a minha mãe tem tem outros irmãos a viver aqui, outros irmãos que vivem fora mas, pronto, eles quando vêem para , vêem para casa. Porque pronto têm aquele hábito, ahhh, desde desde muitos anos, ?! Logo desde é o hábito de sempre quem vem de fora vai para casa. Por isso, as pessoas se sentem mais à vontade ali do que propriamente, ahhh, nas outras. Pronto, são são basicamente são esses os alguns dos valores que os meus pais, ahhh, nos transmitiram. Fazer sempre o bem. Sempre nos indicaram o que é que era o certo e o que é que era o errado. Nós nunca por exemplo, nós nunca.. nunca nos faltou nunca nos faltou nada. Nunca nos faltou nada, mas também nós nunca fomos de nunca fomos de esbanjar, nem, nem, nem de estar a dizer Ah, nós queremos isto ou aquilo, ou. Foi sempre numa base de muita, muita muita humildade. Sim, basicamente é isso.

E a educação? Farias igual?

Sim, sim. Sem dúvida! Ahhh, sem dúvida! Não, não, não vou não vou negar isso. Tanto é que eu tanto eu como os meus irmãos, ahhh, devemos muito a eles os dois. Tanto ao meu pai como à minha mãe.

Falaste-me de viagens… da Holanda… em que época é que foi, em que circunstâncias e por que países é que já andaste?

Ahhh, basicamente as viagens que eu fiz foi sempre numa de visitar família! O caboverdiano é um povo que tem família em todo o lado. E os países onde eu estive basicamente nunca foi naquela de intuito de ir Ah, vamos viajar que é para ir conhecer O objectivo principal é ir ter com a família, é ir ver a família e depois depois junta-se o útil ao agradável. Se estiveres em algum país onde haja alguma coisa para ver, muito bem. Nesse sentido estive na Holanda várias vezes. A última vez que estive na Holanda foi dez anos atrás. Foi quando o meu sobrinho nasceu, o mais velho. Ahhh, entre Luxemburgo, França, Bélgica, Espanha sempre no mesmo sentido de como temos família, !

E achas que essas viagens de alguma forma te transformaram? Te trouxeram alguma coisa de novo ou nem por isso?

Ahhh, não! Nem por isso, porque a maior parte delas ainda era muito pequeno ainda era novo. Posso dizer que a última que eu fiz, que fui visitar a na altura que fui conhecer o meu sobrinho, é que poderia, é que poderia ter marcado de alguma forma diferente ahhh, mas não, não, não. Porque acho que quando é assim: quando tu não vais para umas férias numa de mesmo numa de viagem, lazer que é para ir visitar, acho que a coisa torna-se praticamente como estar a sair daqui para ir visitar o teu familiar ali a Lisboa. risos É um pouco isso. É completamente diferente se sais com alguém, se tens alguém e vocês dois juntos decidem vamos fazer uma viagem para tal sítio, sítios diferentes, ?!... ahhh, onde te possa marcar mais, ?! Agora, pronto, foi numa fase numa idade até onde eu encarava aquilo olha, vou visitar família, pronto, não é aqui em Portugal, é noutro país!. Por isso não deu para para tirar mais do que

Ok. Agora fala-me um bocadinho do sítio onde cresceste. Como é que era o ambiente, os vizinhos… Qual é a tua memória da tua infância nesse sentido?

O sítio onde cresci. Posso dizer é assim: no Barreiro não tenho muito para contar porque ainda era muito novo. Depois mudei para a Quinta do Conde, nós morávamos numa rua onde éramos, ahhh era engraçado, por acaso, eramos um grupo de deixa ver 2, 4, 6, 8, 10 à volta de 12 rapazes e uma rapariga que era a única e era a minha irmã. Ahhh, nós criámos uma convivência muito forte ali. Posso dizer que nós estávamos sempre, praticamente todos os dias, ahhh, juntos. Principalmente ao fim-de-semana. E posso dizer que tive uma infância, uma infância feliz, aquela infância do antigamente, de brincar na rua, não havia essas histórias que agora playstations e não sei que mais. Era brincar na rua com aqueles brinquedos que existiam antigamente, ahhh, jogar muito à bola, ahhh, entrar no quintal para roubar fruta, ahh, do vizinho, ahhh, esse tipo de coisas risos. Mas foi, foi, foi foi uma posso considerar que foi uma foi uma boa infância, uma infância feliz.

E em termos de vigilância parental, ahhh, os vizinhos ajudavam? Davam um olhinho pelos miúdos ou era uma coisa mais…

Nós todos do grupo! Sim, posso dizer que quando não era um, era outro. Quando não eram os pais de um, eram os pais do outro. Às vezes tal como, pronto, aquelas casas onde nós íamos mais, mas ahhh, ahhh…mas basicamente nós recebíamos uma orientação basicamente ali de, de, de da vizinha toda. Tanto é que era uma rua tão unida, ahhh, e que o pessoal dava-se tão bem, que pessoal que doutras ruas que vinham para ali porque gostavam daquela rua. Sentiam-se bem ali.Havia muita gente, ahhh, que saía de outras ruas e iam brincar para ali. Porque ali, pronto, arranjava-se sempre qualquer coisa para fazer.

E qual é a composição da zona em termos de nacionalidades? Maioritariamente portugueses?

Eram portugueses e eram posso dizer metade eram portugueses, ?! E metade eram como eu. Posso dizer assim

Huummhummm. Ok. E voltando um bocadinho à escola, queria que me dissesses como é que era o ambiente… disseste-me que tinhas ficado numa turma problemática…

Isso no ano, sim.

No 9º ano… e qual era o ambiente da escola por onde passaste, em termos de composição também?

Desculpa?

Em termos de composição… se tinha muitos alunos de origem africana ou não?

Sim! Ahhh, a escola onde eu estive aqui na amora, muito era uma escola problemática que tinha ahhhh, como eu disse tinha ali a Quinta da Princesa, tinha a Arrentela, tinha arredores havia ali muitos miúdos de, de principalmente de origem caboverdiana e problemáticos. Tanto é ahhh, eu posso te contar isto

Podes contar tudo… risos

Aconteceu! Eu fiquei admirado! Um belo dia epá, havia pessoal que era mesmo compli epá, eram complicados. Tu notavas mesmo que, epá, o futuro este não vai ter assim um futuro, ahhh, muito risonho. Havia um que era mesmo olhávamos para o perfil dele, olhávamos para a cara epá, este aqui não engana ninguém! Mas, pronto! Às vezes eu era daqueles por ser apesar de não ser dali, mas por ser de origem caboverdiana tinha sorte. Para os outros, para as outras pessoas eu era um deles, ?!, e e para eles eu passava por ser um deles porque, pronto, era era apesar de não ter o mesmo comportamento do que eles, eles, ahhh, pronto! Achavam que eu enquadrava-me. Ou pelo menos, achavam que este aqui, deixa-o estar! risos. Tanto é que houve um dia, ahh, na Quinta do Conde, fui a um sítio uma casa de frangos, fui comprar, fui comprar frango, estava um jornal, o Correio da Manhã, e que engraçado, havia uma página que tinha o título os dez mais procurados de Portugal. E pronto, eu com curiosidade comecei a ver as fotografias dos putos, não é que eu encontrei um que eu, Oh, pronto, olha!. Quer dizer, não fiquei muito admirado porque sabia que o futuro do rapaz era mais ou menos aquele, mas pronto, era barra como se costuma dizer, era barra pesada, era, sim. Tinha uns miúdos complicados.

Passaste por alguma situação ou soubeste de alguma situação que te tenha chocado?

Chocado?

Ou marcado de alguma forma?

Oh, ahhh aquelas coisas reco Não, naquela altura ainda não acontecia assim nada de grave, era aquelas coisas recorrentes de era de pessoal juntar e tirar as coisas aos outros , , !!! Dá-me isto e dá-me aquilo e pronto, basicamente é isso. Houve um torneio de futebol qualquer que por acaso convidaram-me que era para jogar na equipa deles, ahhh o torneio de futebol tinha o arbitro, o arbitro também era um.. era um dos alunos, um aluno, ?!, pronto, não sei houve um lance qualquer que o pessoal não gostou e epá, desataram aos pontapés ao coitado do miúdo. [som exclamativo], eu fui tentei epá, não! parar mas esquece isso E e pronto, mas é esse tipo de situação. Não mais situações com maior gravidade. Se calhar aconteceram depois na escola eles respeitavam um pouco a escola. Mesmo que fizessem alguma coisa, eles faziam mesmo era, era, era fora. Não sei, eu sabia que eles faziam havia pessoal que fazia fora faziam coisas piores. Assaltavam! Faziam mesmo assaltos a sério. Mas dentro da escola, não, não. E depois, pronto! Depois estamos a falar de a falar de miúdos de menores de idade. Pessoal com 16, 17 anos, ainda nem eram maiores de idade.

E preconceito em relação ao sítio onde moravas, em relação à escola, sei lá… ou à tua cor da pele… alguma vez sentiste alguma coisa em relação a ti ou a alguém que conhecesses?

Ah! Nesse aspecto, aconteceu! Pelo facto de andar naquela escola e por causa de ter este tom de pele [bate com o mão no braço], ahhh mas eu era do bem, ?! Mas eu podia chegou a acontecer comigo, eramos dois, por acaso tinha outro colega meu que é de origem caboverdiana, mas também super pacífico como eu éramos capazes de estar a andar estar a sair estar a andar no passeio e epá, uns miúdos a ir para a escola, viam-nos a vir e eram capazes de passar para o outro lado do passeio porque pensavam que olha, vêm estes dois aqui, vêm nos roubar!, porque se calhar era o que acontecia. A situação normal eram outros, mas pronto! Ahhh, aconteceu houve uma vez , ali ali não, aqui na Quinta do Conde sempre aconteceu uma vez ou outra Ah, não sei quê! de chamar nomes, chamar preto e não sei quê. Mas, ahhh, mas foi, foi aconteceram-me poucas, poucas vezes. E por acaso uma dessas risos, engraçado, uma dessas vezes tomei passei-me dos carretos, saltei para cima do gajo, comecei comecei ali a dar-lhe uns sei , nem me lembro se era socos, se era pontapés e não sei quê, depois tiveram que me agarrar e depois ele começou a chorar, pediu-me desculpa e pronto, olha, e ficou-se por ali. Foi enquanto era puto, ?! Devia ter os 13, 14. São coisas que eu me recordo.

Se calhar vamos fazer aqui uma pequena pausa…

Ainda falta muito? Pausa motivada pelo fecho do bar/ mudança para bancos da estação

Faz-te confusão agarrar um bocadinho só para estar mais perto [em relação ao gravador]?

Ah! Ok!

risos

Mas faz

Faz?

Mas faz. Mas deixa, !

Consideras o povo português um povo racista?

foi mais, mas ainda é! Digamos, ahhh, eles como é que eu hei de dizer, eles huumm

[tira o gravador] …para não te distraíres…

Ah! Não não sei, ahhh, disfarçam um bocadinho, mas ainda são. Alguns pequenos pormenores que ainda temos que lidar, alguns pequenos comentários.

E achas que de alguma forma, em alguma situação isso influenciou o teu percurso?

Não! Não.

Oportuidades?

Não. Não. Creio que era capaz acho que isso é capaz de acontecer mais com as pessoas que vêm de fora. Com as pessoas que vêm de fora acredito que sim, mas se nasceste , quer queira quer não, tu nasces nasces habituado a uma determinada realidade e a conviver com eles daquela forma, por isso acho que isto não não vai influenciar muito a tua maneira de a tua maneira de ser.

E como é que te vês? Se tivesses que te descrever como é que te descrevias? Como pessoa…

Como pessoa? Sou pessoa. Sou uma péssima pessoa risos. Não, agora a sério! Sou ui, isso agora! Sou por norma, tento por norma, tento sempre fazer as coisas da minha forma. Tento sempre ajudar quem me pede ajuda da forma que posso. Sou uma pessoa humilde, pelo menos considero-me uma pessoa humilde. Por vezes sou sensível, apesar que às vezes as pessoas dizem que sou um bocadinho frio sou mais de por norma sou mais de ouvir do que falar, ahhh, não sou muito extrovertido, ahhh mais?!

Defeitos? risos NA.: Defeitos? Não tenho defeitos! risos Ahhh, defeitos… sou… não era, mas às vezes por vezes sou um pouco confuso…

Em que sentido?

Em que sentido? De uma forma geral! Ás vezes às vezes acho que as coisas estão bem de uma forma, às vezes acho que não, estão bem de outra forma, ahhh, isso levaa-me às vezes a não leva-me às vezes a não a não tomar a decisão certa. Sou sabes que isto é passar da hora às vezes quando toca directamente a falar o às vezes é mais complicado! risos Sou, sou, sou Pareço calmo, mas às vezes não às vezes não sou. Stresso-me às vezes, mas é mais um stress interior, ?! Ahhh, às vezes fico com os nervos à flor da pele, mas que em vez de mandar as coisas para fora, fico com as coisas para dentro e isso às vezes é do pior que . pausa Sou teimoso em algumas coisas

Isso é um defeito para ti?

Teimosia?! Às vezes é às vezes é considerado, é considerado um defeito. Porquê? Tu és teimosa e achas que é uma virtude risos

Dependendo da situação pode não ser… NA.: Pois! Exacto! Ahhh… mais?! Não me recordo assim mais logo à vista…

Ok. Planos para o futuro?

Planos para o futuro?! Planos para o futuro Planos para o futuro é arranjar um emprego estável. Neste momento é o principal, para poder estabilizar, para poder entre aspas, organizar a minha vida.

Ahhh… Sonhos não realizados? E que ainda queiras realizar…

Sonhos não realizados?! Se calhar fazer algumas viagens, por exemplo, que que ainda não tive a possibilidade de fazer, a não ser por visitar família risos. Digamos que não tenho assim muitos, ahhh, não tenho assim muitos sonhos.

risos Consideras-te uma pessoa que faz planos ou não? NA.: Se faço planos?! Não.

Então o teu percurso foi todo circunstancial, ou seja, as coisas vão acontecendo?

Sim, tirando a parte tirando a parte de ahhh, a parte académica, o resto foi.

Ok. Acho que acabámos!

Está?!

This is the first translated utterance of the interviewer.

This is the first translated utterance of the interviewee.


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