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[Título principal]: edição digital

Fernando Pessoa
Não sem lei, mas segundo leis diversas

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Não sem lei, mas segundo leis diversas Entre os homens reparte o fado e os deuses Sem justiça ou injustiça Prazeres, dores, gozos e perigos.

Bem ou mal, não terás o que mereces. Querem os deuses a isto obrigar Porque o Fado não tem Leis nossas com que reja a sua lei.

Quem é rei hoje, amanhã escravo cruza Com o escravo de ontem que é depois rei. Sem razão um caiu, Sem causa nele o outro ascenderá.

Não em nós, mas dos deuses no capricho E nas sombras pra além do seu domínio Está o que somos, e temos, A vida e a morte do que somos nós.

Se te apraz mereceres, que te apraza Por mereceres, não porque te o Fado o prémio ou a paga De com constância haveres merecido.

Dúbia é a vida, inconstante o que a governa. O que esperamos nem sempre acontece Nem nos falece sempre, Nem com que a alma uma ou outra cousa espere.

Torna teu coração digno dos deuses E deixa a vida incerta ser quem seja. O que te acontecer Aceita. Os deuses nunca se rebelam.

Nas mãos inevitáveis do destino A roda rápida soterra hoje Quem ontem viu o céu Do transitório auge do seu giro.

17-11-1918

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