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1692. Carta de Francisco Gomes Sardinha, vigário, para um membro da Inquisição de Lisboa.

SummaryO autor escreve mais uma vez à Inquisição de Lisboa para que os inquisidores o ajudem. Queixa-se de não ser ouvido e acusa o Bispo que o mandou prender.
Author(s) Francisco Gomes Sardinha
Addressee(s) Anónimo111            
From América, Brasil, Rio de Janeiro
To Portugal, Lisboa
Context

O réu deste processo é o vigário Francisco Gomes Sardinha, preso por solicitação. Era vigário na igreja de São Salvador, bispado do Rio de Janeiro, e foi acusado de solicitar várias mulheres para atos "torpes" e "desonestos" aquando da confissão sacramental. As mulheres abordadas por este padre tinham sido: Inês, escrava do Curral de Nossa Senhora da Ajuda, Isabel de Barcelos, solteira e filha de António Soares da Costa, Catarina Soares, mulher de Mateus de Medeiros, e Luísa, escrava de Catarina e Mateus. Segundo a acusação, o réu oferecia dinheiro e prometia muito mais às ditas mulheres para estarem com ele. A defesa do réu negou todas as acusações, alegando que o padre era um homem de bem, de boas famílias, e que sempre tinha cumprido o seu dever como religioso; estaria a ser vítima de uma perseguição, uma vez que na sua freguesia costumava descompor quem não ia à missa. Muitas das famílias da freguesia ter-lhe-iam tal ódio que até tinham deitado fogo à sua casa, e 25 pessoas tinham mesmo sido apuradas como culpadas. Francisco Gomes Sardinha veio a falecer no dia 6 de setembro de 1695, em Lisboa, nos cárceres do Santo Ofício. Segundo os inquisidores, o réu morreu de causas naturais.

Support meia folha de papel não dobrada escrita em ambas as faces.
Archival Institution Arquivo Nacional da Torre do Tombo
Repository Tribunal do Santo Ofício
Collection Inquisição de Lisboa
Archival Reference Processo 12242
Folios 68r-v
Transcription Ana Rita Guilherme
Main Revision Mariana Gomes
Contextualization Ana Rita Guilherme
Standardization Sandra Antunes
POS annotation Clara Pinto, Catarina Carvalheiro
Transcription date2008

Text: -


[1]
Illmos Senhores
[2]
Com o divido respeito, dou parte a vas Illmas q em sinco de mayo se avistou commigo nesta emxovia o rdo commissario Fr Christovo da Madre de Deus Lus da parte de vas Illmas a saber de mim se os cazos, de q fis avizo pertencião ao sto officio,
[3]
respondi q sim, e por serem agravantes, e capitais não depunha perante elle q são rezervados denunciarse pesso-almte a vas Illmas pa darem o remedio, e não por elle pelos inconvenientes, q se seguem.
[4]
Não são menos os cazos q haver sojeito q se atrevese ao sanctissimo sacramto e em desprezo do Divino respeito haverem outros, em outro cazo q se conjurarão em acto publico, todos estes de nação conhecidos, q seus projinitores pagarão pa a finta.
[5]
Eu sou mortal, e algumas testas q sabem disto, ja são mortas e qto mais breve vossas Illmas mandarem me buscar seguro debayxo de prizão darei conta de tudo, q isso me não livra de ser restituido outra ves a ella,
[6]
e qdo nam, se algum dia me der Deus liberdade, e vida farei o q devo á fiel christam, q não he materia pa me descuydar;
[7]
e pa que não paressa, q o fasso a respeito de me remir da violencia, q padesso; tal atrevimto não cometo eu, e merecia ser aosperamte castigado, se tal intentasse,
[8]
e mto grande Ignorancia minha qdo sei q todos os q maliçiozamte se recorrem ao sto officio se restituem a seu juizo, inda em materias mto justas.
[9]
Nenhuma outra Couza me move ir dar conta de mim mais q so o fervor, e zello, q tenho do serviço de Deus, o que ja fazia no anno de 89 qdo me prendeu o B D Juzeph de barros de Alarcão, odiozamte, por desconfianças q teve de mim, e não por culpas, q tenha cometido, salvo elle mas formou,
[10]
segundo os efeitos, q delle vi, e colhi contra o direito da justissa
[11]
Deus lhe dara o pago,
[12]
e cazo negado, q as cometese, q direito acha, ou lei Divina, e humana segue, pa q me tenha em descurço de quatro annos prezo sem ser ouvido,
[13]
e terme com anos, q sou prezo do sto officio tam oprimido, avexado em ferros, tronco e reteudo sem remeterme, ou deferirme a li-vramto sendo hum Princepe, ecleziastico, de cuja in-justissa, e porfiada tirania se não serve Deus,
[14]
nem vas Illmas tal permitem, q com o poder do sto officio moleste aos fieis como tem ouzado com mto empenhato
[15]
E me quer acabar a vida na prizão como tem morto alguns, pois me deixou neste aperto sem antes, q fose remeterme, ou levarme consigo ao tribunal q tocassem essas culpas; q ora dis, q sou prezo de El Rei e outras vezes do sto officio,
[16]
desta sorte, me tem morteficado.
[17]
Vas Illmas sam christianissimos, e mto pius, q guovernão esse tam sto e soberano tribunal, recto, e de tanta justissa pa administrarem o q for mais conveniente ao serviço de Deus, e conservação de seus fieis como costumão.
[18]
gde Deus as pessoas de vas Illmas por felices annos
[19]
emxovia rio de janeiro 17 de junho de 1692 annos.
[20]
Prostrado aos pes de vas Illmas O Pe vo Franco guomes Sardinha etc

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