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Maarten Janssen, 2014-

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1576. Cópia de carta de Manuel Leitão, ex-guarda do Santo Ofício, para Álvaro Mendes.

ResumoO autor congratula-se, a partir do cárcere, com uma carta que lhe chegou do destinatário; comenta depois factos que conhece sobre algumas pessoas amigas.
Autor(es) Manuel Leitão
Destinatário(s) Álvaro Mendes            
De Portugal, Lisboa
Para S.l.
Contexto

Este é o segundo processo de Manuel Leitão, preso no cárcere do Santo Ofício de Lisboa em fevereiro de 1574 e transferido para a guarda da Inquisição de Évora em maio de 1577. Antes de ser preso, Manuel Leitão era guarda do Santo Ofício de Coimbra, onde, em conjunto com o notário Baltasar Fernandes e a troco de compensações, auxiliava os reclusos, transportando-lhes mensagens e dando informações sobre os seus processos. Por este facto, foi-lhe movido o seu primeiro processo, pelo qual foi preso. No presente caso, ocorrido dois anos mais tarde, Manuel Leitão mantinha correspondência com um antigo companheiro de cárcere, Álvaro Mendes, entretanto libertado. O intermediário era agora Domingos Rodrigues, guarda do colégio da doutrina da fé em Lisboa, que foi denunciar as cartas à mesa do Santo Ofício. Aí, o seu texto ia sendo copiado e concertado “verbo ad verbum” pelos notários apostólicos João Campelo e António Pires. Tornavam depois a fechar as cartas, que seguiam pela mão de Domingos Rodrigues até ao destinatário, mantendo-se ativa a linha de comunicação, sem os correspondentes suspeitarem da vigilância de que eram alvo. O diálogo assim registado durou de agosto a outubro de 1576.

Num interrogatório feito a Manuel Leitão em dezembro de 1576, este negou ter contactos com o exterior, mas, confrontado com originais escritos por si e com as cópias mencionadas, começou por confessar que o fazia para obter ajuda de Álvaro Mendes e de pessoas suas amigas, por estar em grande necessidade no cárcere. Mas acabou por escrever uma extensa confissão, ratificada em 1578, onde comprometia um vasto conjunto de pessoas.

Um apontamento processual relativo a esta carta diz o seguinte (transcrição modernizada): 8v; “Aos quatro dias do mês de setembro de mil quinhentos e setenta e seis […] Domingos Rodrigues, guarda do Colégio da Doutrina, apresentou o escrito cujo traslado vai adiante o qual dera Manuel Leitão para o dar a Álvaro Mendes o qual vinha cerrado e eles senhores Inquisidores o leram e mandaram que se trasladasse o qual trasladei […] João Campelo.”

Suporte duas folhas de papel escritas em todas as faces.
Arquivo Arquivo Nacional da Torre do Tombo
Repository Tribunal do Santo Ofício
Fundo Inquisição de Évora
Cota arquivística Processo 9469
Fólios 9r-10r
Socio-Historical Keywords Tiago Machado de Castro
Transcrição Tiago Machado de Castro
Revisão principal Rita Marquilhas
Modernização Fernanda Pratas
Data da transcrição2013

Texto: -


[1]
Sor tanto folgei v esta sua como v a vm em pa e a todos nossos amigos e a minha mai q não tenho outrem
[2]
nosso sor me chege a tempo q pague tantas merces e lembranca como de min tem porq eu não tenho q lho page senão com a vida q tenho offerecida por elle e por todos meus amigos se for ncessario
[3]
como se vera por obra vm crea q estes dias estou mto triste o embaraco da letra e por nam ver reposta do dro q mandei he dei por isso desgosto ao portador
[4]
tambem emComendo a v m q tenha mta cautella porq com poucas palavras sendo conhecidas entenderei o q for ncesso
[5]
quãto da sinal dos pelhos não me podera mãdar outro mais incerto porq o meirinho torto de Coimbra foi por esse caminho tirando ora culpas de min he todos esses signais foi dar na mesa por que eu fui perguntado po isso
[6]
mas pareceme q nam lhe souberan dizer quem heram os mesmos poq a min nam me nomearam ningem
[7]
mandame mais signais outros pa acabar de ser certo he descansar e tambem porq a sua letra nam a conhecia
[8]
quãto ao martinho não sabia nada de min porq sempre me gardei disso
[9]
eu o farei a saber logo a dous dedos
[10]
a elle lhe veo oje aqui hum recado de sua casa pello alcaide dezendo que hera aqui hum moco ha d ir a mesa pera ver se o querem deixar fallar com elle
[11]
saiba la quem he la q vem
[12]
o sinal q lhe mando he q quãdo me mandou chamar a sera me vieram esperar elle he o amiguo antes de cheguar a ponte ja noite e ceamos en casa do sirgeiro todos tres carne de porco assada q eu mãdei por pa e ao outro dia nos partimos de madrugada e fomos dormir onde estavam as palhas e ao outro dia antes q me apartase me fez escrever hũa carta pa o brandão q Ds livre que falava no mullato he lhe emcomẽdei dese vinte cruzados ao homen
[13]
e mãdeme dizer se sabe disso algũa cousa
[14]
haqui dentro vai hũa carta q ja tinha feita das cousas q sam pasadas
[15]
veja se he ncessario sobre isso fazer algũa cousa he de tudo me mande
[16]
e mamdeme dizer se ha ja inqor em Coimbra he notairo he quem são do coadros
[17]
me avise como aqui for
[18]
e mãdeme dizer se despois de minha prissão faleceo algũa pa amigua das nossas conhecidas e se os lhes tiraram e a todas la cada hũa dellas em particular
[19]
mande minhas emcomẽdas porq sei q folgarão com isso e principalmte a lianor de beca filha do baeca porq lhe devo mto
[20]
he a todos e ao sarnoso de jorge dias
[21]
e como esta he aseite q a olanda furtou a sua mai pa me dar q la lhe ficou na cevadeira com hũa camissa q ma mande pa fazer hũs pannos pa a cabeca q são mal desposto della
[22]
e a snora sua mai q lhe bejo as mãs
[23]
he a elle ao sor manuel luis me facam dar minhas emcomendas
[24]
e ao sor miguel luis q lhe mãde novas de min porq hora sei q folgara com ellas
[25]
he q quãdo nosso sor levou a sua bem avẽturada q eu estava la e q me pesou quãto nosso sor sabe
[26]
nosso snor q foi servido levalla sua onra o sera de lhe dar a gloria de seu tio graviell
[27]
folgaria saber como passou porq o nam pude saber
[28]
noso sõr dee a vm e aos seus irmãos aquillo q pa min quiria he a todas. e mos leixe v fora desta prissão
[29]
ao sõr companheiro beije as mãos por min e lhe dee os agradecimtos das merces q me fez
[30]
e se ha aimda algum peixe puta q parta comiguo porq bem o achei menos he a sua conversacão e bona e amizade.
[31]
beijo as mãos a vossas merces seu Reitor

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