Esta carta faz parte do processo do padre Diogo Mendes, acusado de solicitação. Ao que parece, um Esténio António Gonçalves Botelho, contador dos contos das sereníssimas casas de Bragança e do Infantado, de setenta anos de idade, e sua mulher, dona Luzia Maria de Almeida Juitlim, moradores por cima da Igreja dos Anjos, fizeram queixa de que havia quatro anos que tinham em sua casa uma mulher de nome Mariana da Silva, do lugar da Ota e nele casada com José Marques surrador, a qual, depois de lhe fazer a criação de um filho, os persuadiu a deixarem-na ficar em casa a título de criada alegando que não estaria bem com o seu marido. Depois disso, a dita ama Mariana da Silva tomou-se de amores por um padre novo de nome Diogo Mendes, capelão de João da Silva, governador, e só com ele se queria confessar, levantando assim a suspeita de algum envolvimento entre ambos. A autora da carta, Joana da Trindade, veio a saber de todo o acontecido porque os delatantes deram alforria à escrava Josefa Maria, e esta, nos primeiros tempos de liberdade, foi viver para o convento do Salvador. Nesse convento encontravam-se as duas sobrinhas dos delatantes, a autora da carta e a sua irmã Margarida, ambas freiras. A escrava que acompanhava sempre a dita Mariana da Silva acabou por confessar tudo o que presenciou quando ia com ela à Igreja. Sobre o frasco (vidro) de água que alegadamente a acusada levou para oferecer ao padre, disse que apenas o teria oferecido no ato da confissão. Do processo não consta nenhuma sentença.
Dentro do fundo do Tribunal do Santo Ofício existem as coleções de Cadernos do Promotor das inquisições de Lisboa, Évora e Coimbra. O seu âmbito é principalmente o da recolha de acusações de heresia. A partir de tais acusações, o promotor do Santo Ofício decidia proceder ou não a mais diligências, no sentido de mover processos a alguns dos acusados. Denúncias, confissões, cartas de comissários e familiares e instrução de processos são algumas das tipologias documentais que se podem encontrar nestes Cadernos. Quanto ao crime nefando e à solicitação, são culpas que não estão normalmente referidas nestes livros.