Teotónio de Freitas, familiar de um elemento do Santo Ofício, pediu uma audiência ao Inquisidor João Alves Soares para dizer que recebeu uma carta de Argel remetida por José Alves Pereira, que ali se encontrava cativo. Ofereceu ao Tribunal a referida carta (CARDS2052), acompanhada de uma outra, em árabe (CARDS4050), de um "mouro" para o seu irmão, cativo dos portugueses e a servir nas galés. Como Teotónio de Freitas não conseguiu ler o sobrescrito da carta, e não sabia, assim, a quem a devia entregar, socorreu-se de uma Antónia Teresa, solteira, filha de Felícia Nogueira e de André Fernandes, fragateiro, cunhada de José Rebelo, cativo resgatado em troca de um turco de Argel, o qual morava às portas da Ribeira. À mulher, pediu-lhe o Inquisidor que "bem e fielmente interpretasse [a] carta escrita em letra mourisca". Mas perguntou-lhe também por que razão a sabia ler, o que deu lugar ao seguinte testemunho (transcrição modernizada): "E Logo sendo perguntada se sabia ela ler, e entender bem a letra da dita carta, e quem lha ensinara, disse que por ocasião de ter em esta cidade [de Lisboa] amizade particular com uma genovesa chamada Marcelina, já defunta, que sabia a língua turquesca, da qual lhe deu algum ensino, e depois de a mesma falecer, ter ela intérprete um escravo turco chamado Heli Mamette, e se querer aperfeiçoar na língua dos mesmos, com o dito seu escravo acabou de aprender, e juntamente a ler, a língua turquesca" (fls. 354r-354v).
Tratando-se de papéis guardados num Caderno do Promotor, e não num processo inquisitorial, a documentação do caso ficou, como se esperaria, incompleta.
Dentro do fundo do Tribunal do Santo Ofício existem as coleções de Cadernos do Promotor das inquisições de Lisboa, Évora e Coimbra. O seu âmbito é principalmente o da recolha de acusações de heresia. A partir de tais acusações, o promotor do Santo Ofício decidia proceder ou não a mais diligências, no sentido de mover processos a alguns dos acusados. Denúncias, confissões, cartas de comissários e familiares e instrução de processos são algumas das tipologias documentais que se podem encontrar nestes Cadernos. Quanto ao crime nefando e à solicitação, são culpas que não estão normalmente referidas nestes livros.