Visualização das frases 1612. Carta de Bárbara Pimentel de Leão para Fernão Rodrigues, cura de Santa Justa. Autor(es)
Bárbara Pimentel de Leão
Destinatário(s)
Fernão Rodrigues
Resumo
A autora relata um conjunto de notícias relativas à comunidade portuguesa de Ruão. Entre elas, refere os seus problemas pessoais com alguns elementos dessa comunidade, a questão de o seu irmão aparentemente se ter convertido ao judaísmo e outros factos ligados aos seus negócios.
Texto: Transcrição Edição Variante Modernização - Cores
[1]
Jhus em Ruão 12 de dezro 1612 Snor Fernão roiz
[2]
em 9 deste resebi huã de vm de 10 do pasado e com a igualdade
com que
estimei saber novas da saude de vm
[3]
simto o estado
que
vm me aviza de minhas couzas o que atrebuo a minha
pouqua vemtura porque inda que os tempos se levantarão
comtra mĩ estava
eu serta que temdo a vm
pa me fazer ms
nada me podia fazer dano e mal
[4]
me pareseo que com a car-
ta que escrevi a
vm em 16 de setembro de que agora tive re-
posta fizese vm tam pouquo como foi não me tirar os titolos he
mais
papeis da mão de diogo
roiz pois
vm sabe mto bem que as
cazas
não estão empenhadas nem lhe devo nada e que qual
quer procurasão inda que tivera mtas duvidas bastava
pa isto
[5]
mas por mi se pode dizer que auzemte
não tem amigo
[6]
pois a
firmo a vm que meresia eu ter mtos
[7]
mas seja ds louvado com
tudo que me pos nestas partes tamto comtra minha
vontade
[8]
mas
comfio nele que me a de tornar a por nesa terra mais sedo do
que
emagina nhũa pesoa que esteja nela que se eu
não sou a por
tadora desta he por estar ja camsada de caminhar por
terra e
ser isto inverno
[9]
mas espero em ds que tamto que vier março
se eu tiver vida ate emtam que eu me embarque logo
[10]
o
que
poso fazer mto comfiada porque ei de levar
mto boas justifica
sois da
cristamdade com que sempre porsedi e esta não a de ser
de purtuguezes pois eles
o não são
[11]
a diogo
roiz escrevo a que
com esta sera aberta que vm me fara m fechar e
darlha
[12]
e sem
do servido tirar os papeis de sua mão e fazer me as
ms que lhe tenho
avizado em
mtas o pode fazer
[14]
farei
de
comta que não tenho nada de meu
[15]
e como tenho a
ds espero
nele me a de acodir em tudo
[16]
e peso
mto a vm que ou fazendo
a escretura com diogo
roiz ou
tirandolhe os papeis da mão e ven
dendo as cazas a outrem me fara
m sendo posivel mandarme o
dro logo
pa pagar o que qua devo a framsezes que me emprestarão
sobre pesas minhas
pa me sostemtar que a isto me chegou em terra alhea o
que diogo roiz
uzou
comigo e ate não dar esta satisfasão não me poso ir
[17]
e sentirei
mto ser cauza
e não me vir este
dro de estar por qua mais tempo do que eu
quizera pois
este que estou he mais por forsa que por vontade .
[18]
Vejo as novas que vm me da de luis vas ser chegado a esa terra
[19]
e disme
vm lhe da credito a que ele não tomou os panos porque lhe
jurou que não
fizera tal
[20]
he vm
mto fasel de crer sertas pesoas
[21]
mas como
vm o não conhese mais que de dous dias e tem bom
peito pareselhe que todos o tem asim
[22]
e eu como o conheso de mais
tempo e sei
os males que fes a minha mai e os que me tem feito a mi de
que vm he testemunha
de algũs doulhe o credito que merese
[23]
e mto
galamte he dizer ele a vm que o pora com os guardas que forão
com ele
[24]
folgara de saber se os guardas se abrirão o caixão que
hia leado e fichado com
duas chaves ou se virão se vinham nele
panos ou palha
[25]
e de simco caixois que
vierão em hum navio
em nhũ asertarão logo
[26]
os
fransezes logo de bolir senão naquele
[27]
mas he tal como huas galhetas e saleiro
de prata que me furtou
das pesas que mandava
[28]
e tambem o botou ao mestre do
navio .
[29]
mas vm o conhesera e emtendera que so a mi se me pode
dar
credito
[30]
e porque a vm lhe não paresa que eu como molher a
paixonada de perdas falo e tudo são palavras ainda que nas
pasadas avizei a
vm que de rosto a rosto deria a vm
mtas
couzas que não queria por em carta o credito
que vm da a luis
vas me obriga a mandar
a que com esta vai a qual he de hum
moso que quando meu irmão e filho de meu
pai e de minha
mai se chamava joão pimentel
[31]
e
pa que vm saiba a estoria
toda lha quero contar .
[32]
tamto
que cheguei a esta terra dahi a des
ou doze dias mandou antonio
mendes a ese fidalgo que ca esta a
minha caza e que levase dela a
lianor e joão que não hera bem
estarem em minha
companhia pois eu hera catoliqua
[33]
a
lianor deixou em sua casa pa o servir e a
luis mandou que
levase joão caminho de
olanda ao qual deixase feito o que esta
e se fose
ele pa esa terra a busquarlhe ese
dro que dis ser seu .
[34]
em
hum dia deste
mes de setembro pasado veio a esta caza andre
mendes e me trouxe
esta carta dizendo que lha mandara em
hum maso seu fernão d alves melo que esta em
olanda onde
esta joão e que hera de meu
irmão
[35]
diante do dito andre mendes
abri a carta e afirmo a vm que quando vi o sinal dela ele e eu
ficamos
mudos porque numqua nos pareseo que ese fidalgo
que la esta se não comtemtase
de ser o que he
[36]
e mostrou nestas
partes ser senão que ainda emganase hum rapas
e o tirase
de minha caza pa o deixar feito o que
esta e tivese tam pouqua
vergonha
que se fose a esa terra
[37]
e na carta
que fernão d alves melo
escreveo a
andre mendes em companhia desta lhe dezia que ja
joão tinha conhesimto do
snor como os que estão naquela
terra
e que ja se chamava jacobo israel pimentel
[38]
e que
luis hera
o mesmo mas que não mudara nome porque hia a
lxa
arecadar dro mas que em vindo uzaria do nome como os
mais
[39]
a esta carta respondeo andre mendes como quem he e de ma
neira que o melo não folgaria ver a reposta .
[40]
fis mtas deligensias com andre mendes
pa que me dese a carta
do melo
pa a mandar a vm com esta mas como estes homẽs
dependem de
negosio e tem corespondensia em todas as partes
não pude acabar com ele a ma dar
[41]
antes apertou mto comigo
rompese esta de
joão e a não mandase a vm a quem peso
me fasa
m que tamto que a vir queira ir a caza do
ldo
sabastião
mendes e a ele e a minha tia lha mostrar e lhe ler este capitolo
pa que saibão o em que se tornarão os filhos de meu
pai criados
em tamta cristandade e vejão a obra que fes ese fidalgo
que
tem em sua caza
[42]
porque o rapas hera moso e como
tal não emtendeo mais que o que
lhe diserão seu irmão
e cunhado ser bom .
[43]
sobre esta carta fis eu o que
devia
e respondi a joão lembrandolhe a cristandade com que
meu pai e mai nos doutrinou a todos e que inda estava em
tempo arependendose de se salvar
[44]
que olhase o que devia
a ds que o criara .
[46]
afirmo a vm
que saber este suseso me custou samgraremme
sete vezes
seja ds louvado
[47]
que dos filhos de meu
pai e mai que so eu sou
e serei ate morte a que lhe onrarei seus osos em ser
cris
tam como eles sempre forão
[48]
tem me tirado o juizo ver
que teve ese fidalgo tam pouqua vergonha
[49]
que fazendo o
que fes e uzãdo por
estas partes o que uzou se for a esa terra queira
noso
snor por sua devina
mezericordia
[50]
que desa doemsa
de que vm se doeo tamto o aja levado
pa si pa não
ser
mais dezomra dos osos de seus pais e como qua deixava
estas boas obras
feitas e a suas irmãs e irmão tais como ele
[51]
por
iso dise a vm que eu não tinha nada nas dividas que la estão
paresendolhe que eu como catoliqua fico fora de ter parte nas
dividas .
[52]
não sei que procurasão geral e verdadeira pode
levar pois nela deve
de ir asinado joão pimentel chamandose
onde esta como vm vera pela carta pois eu que sou a prinsipal
e titora não vou asinada nela
[53]
e iso peso a vm veja porque
mto faselmente fara o meu sinal falso como ja fes em
hũa
carta que mandou em meu nome e com hũa letra de cambio
a seu tio
manoel vas a frandes
[54]
e dito seu tio ma
mandou a mĩ
pa que me precatase a qual não mando tambem a vm
com esta porque me emporta tela em meu poder
pa sempre
poder mostrar quem ele he
[55]
e por
ela derão nesta terra tamto
credito que pelo furto dos meus panos me pasarão mandado
pa o prender
[56]
e ele andou bem em se ir a esa terra e
não vir
qua
[57]
vm me fasa m fazer
todas as deligensias posives por
que ele não arecade hum vintem ate
eu estar satisfeita do
que se me deve e da tersa que he minha como se vera pelo
testamto de minha mai que ds tem
[58]
em tudo fasa vm como
lhe mereso que tudo saberei servir que lhe
afirmo lhe mereso
me fasa mtas ms .
[59]
despois de minha tia e seu marido virem esta carta de joão que
mando a vm me a vm de fazer m
emcomtrarse com gra
viel ribeiro e mostrarlha porque a
ele e a eitor mendes a
vizo que vm a mando a qual vm me fara m não
lar
guar de sua mão
[60]
e despois de fazer com ele as
deligensias
que lhe peso ma guarde mto bem
guardada pa quamdo eu em
bora for ma dar porque
me emporta mto a minha onra
e fazenda tela em meu
poder
[61]
e se não fora ao snor fernão
roiz ao qual tenho na
comta que me merese d outra nhũa
pesoa do mundo a
fiara
[62]
e atemte vm não a veja luis
porque he tam
desavergonhado que da mão de vm a
tomara e a fara em pedasos
[63]
e a ele lhe pergunte vm sem
lha mostrar onde deixou seu irmão e como
se chama a
gora
[64]
e no que ele diser a vm sobre isto emtendera as
verdades que fala e emtam lhe diga vm de palavra tudo
o que vai na carta e
a limgoa que deixou aprendendo
a seu irmão
[65]
pareseme daqui a marco mto tempo q
tomara fora oje pa me tirar desta
babilonia emfernal
pois de mais de trimta
purtuguezas que ha nesta terra
sou eu so cristam
[66]
não digo isto por me abonar que em
o ser faso o que devo e a obrigasão que tenho senão que
porque sou
esta tenho tamtos enemigos
[67]
e vm como
cristão tem obrigasão de me favoreser e
olhar por minhas
cousas como suas .
[68]
a minha tia britis vas me fara vm m
dizerlhe não escrevo porque lhe
tenho escrito tres e de
nhũa tive reposta meresendoa eu pois dos filhos de
seu
irmão so eu sou catoliqua e mostro ser sua filha .
[69]
de
lianor estou bem vimgada de se ir de minha caza
por mandado de
seu irmão pois cada dia me manda
aqui mtos
recados com mtas lagrimas que a queira ter
comigo que não pode sofrer a vida da caza onde esta
o que não farei numqua porque ja
oje não são meus
irmãos e de todos espero em ds
ter vimgamsa .
[70]
de todas as que mando a vm me fiqua a copia e simto
n a quamdo vem as de vm não me respomder a tudo
o que nelas digo
[71]
e
deve de porseder de vm aver por mal em
pregada a ora que gasta em me
escrever não lhe meresendo
eu ser asim
[72]
pelo que peso a vm me fasa m quando
me es
crever por a minha carta a par de si porque se asim fora
não
escrevera vm a andre mendes que as demandas
avião
mister rios de dro e que pelo não aver não corrião temdo
eu dito em mtas a vm que a neculão pimto lhe dão o
terso
de tudo o que arecadar e que ele se obrigou a fazer todos os
gastos
a sua custa
[73]
e pa iso pedia vm me fizese m ver
a
escretura que fizemos
[74]
parese que quando isto asim estava
comsertado que
não se lhe avia de dar terso e mais dro .
[75]
mas como digo le vm as minhas depresa e pasalhe o
que digo nelas pois me não fala nos alementos sobre que
lhe escrevi e nesta esperava reposta .
[76]
q
quamto a graviel ribeiro sem embargo de tudo o que vm o em
posebelita eu sei o seu
custume e se vm me fizer m como
lhe peso em todas e saberei servir de o apertar eu fico a vm
que tire sumo
[77]
e fasame vm
m pelo papel que la tem dos tres
mil cruzados fazer hum embargo em sua mão porque a
semtemsa que ha comtra ele esta tirada
em nome de luis vas
e he tal que por dous vinteis que lhe de lhe
dara a quitasão
de tudo como ja fes nesa terra a outras semtemsas que se
tirarão
em seu nome e prinsipalmte em hũa comtra
o fiziquo joão
nunes de que hera escrivão luis gomes de
bairos
[78]
que ele
o pode dizer a vm que quem perdeo a ds
e a fe tudo isto
e mais fara .
[79]
a dito graviel ribeiro escreveo e bem
sei que quando
vm lhe mostrar a carta de joão que lhe
a de negar ter carta
minha por duas ocaziois a
pra porque lha não manda por
via de vm senão botada no correo
[80]
e a outra porque me des
emfado no que lhe escrevo levar me a noso
snor nesa terra
como
espero
[81]
e ele me pagara se antes diso vm me não fizer
m
[82]
inda vm não achou nesta que eu lhe meresia mandar me
hũa
sertidão da divida do milão seja embora dar grasas a
ds com tudo
[83]
e com esta carta que mando a vm
pa diogo
roiz me fasa vm m não pasar como pasou ate gora se
não tirarlhe
os papeis da mão
[84]
que se ele dis que eu lhos em
treguei por esta carta que he da
minha letra e sinal lhe digo
os de a vm porque lhos não dei
pa ser snor das minhas
cazas e não mas
pagar a hum ano .
[85]
a izabel jorge me fasa
m dar mtos
recados meus e que lhe não
mando nada porque alem de não aver navio estou
em
tamta nesesidade que nem pa me sostemtar tenho
qua
[86]
mas se vm vemder as cazas me fara
m darlhe em sua
mão propia tres cruzados
pa ajuda de hum manto
[87]
e não
lhe mando
mais porque os que herão meus irmãos que
ja oje não são me não deixarão ate me
roubarem quamto
tinha de meu .
[88]
posto que asima digo que a carta de
diogo roiz a feche vm digo lha de
vm aberta pa que ele
saiba
[89]
ve vm o que digo nela e lembro
a vm me fasa m arecadar
o aluguer das cazas deste natal
porque ja que a escretura não esta feita nem
eu resebi dro o aluguer
he meu e como
tal me fasa vm
m de o arecadar .
[90]
ainda esta vai por via de
cristovão peres o que fis por me temer
de luis ir
o correo e as tomar
[91]
despois que tiver recado de
vm como as ira busquar ao coreo as mandárei
[92]
e
dos portes se não emfade vm porque quando as venda das
minhas cazas não
aja efeito proverei logo o dro
pa eles ou
o pagarei tamto que embora for que emtendo me fara vm
m fiar de mĩ e não servindo de outro
[93]
noso snor guarde
a vm como pode e eu dezejo .
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