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Maarten Janssen, 2014-

Sentence view

[1690-1699]. Carta de Catarina Escolástica de Almeida de Amaral para o primo, [Manuel Viegas Lobo].

SummaryA autora deseja que o primo resolva a situação em que se encontra e diz-lhe que gostaria muito de o ver. Também lhe pede que não a esqueça, já que ela tem duas filhas para criar. Embora a carta contenha no sobrescrito o nome Manuel Gomes, depreende-se pelo conteúdo que é para Manuel Viegas Lobo, seu primo e réu do processo
Author(s) Catarina Escolástica de Almeida de Amaral
Addressee(s) [Manuel Viegas Lobo]            
From S.l.
To S.l.
Context

Trata-se de um extenso processo de bigamia, movido a Manuel Viegas Lobo, natural de Abiul (concelho de Pombal), filho de Sebastião de Magalhães e de Maria de Almeida de Amaral. Segundo a Inquisição, o réu teria levado, durante anos, uma vida de relações promíscuas, com episódios de sodomia e crime. No decorrer do processo, é utilizada frequentemente a expressão "outros crimes" para referir ilegalidades não explicitadas que o réu teria cometido e que o levaram frequentemente à prisão. Tinha sido da prisão de Montemor-o-Velho, por exemplo, que o réu se casara por procuração com Mariana de Sousa Vasconcelos, forçado por ameaças da parte da família da mulher que teria "desencaminhado". Foi um casamento "sem ânimo", já que quereria ter casado com Maria do Amaral de Melo, mas ela morrera. O casamento com Mariana de Sousa Vasconcelos não chegou a ser consumado: os esposos nunca viveram juntos porque ele estava preso, e da prisão seguiu para o degredo em São Tomé, como castigo pelos "outros crimes". A sentença de degredo foi dada em 1695 e implicava que nunca mais voltasse ao reino, sob pena de condenação à morte. Mas em São Tomé, sob o nome de Manuel Magalhães Lobo, o réu casou de novo, desta vez com Ana Correia de Carvalho, filha de Jerónimo Correia de Carvalho e de Violante de Alva, viúva de "três ou quatro maridos" e que tinha fama de rica e abastada. Para a realização do matrimónio, Manuel Viegas Lobo teve de fazer uma fiança a banhos. Decidiu então retornar ao reino para obter a anulação do primeiro casamento. Testemunhou que julgava poder fazê-lo, uma vez que o casamento nunca fora consumado e que a procuração que passara na prisão para se casar com Mariana de Sousa Vasconcelos fora feita pela sua própria mão, não sendo válida por estar preso na altura. Justificou tal convicção porque não era a primeira vez que isso acontecia: numa outra ocasião, em que igualmente se encontrava preso, fizera uma procuração por mão própria para se casar com Maria do Amaral de Melo (a mulher com quem realmente queria casar) e a procuração fora considerada inválida por ele estar preso. Chegou a Portugal dois anos depois da sentença de degredo para São Tomé, em 1697, altura em que soube ter mais uma ordem de prisão em seu nome. Alegou tal razão para não se ter dirigido logo ao Tribunal do Santo Ofício. Em vez disso, mandou citar Mariana de Sousa Vasconcelos para anularem o matrimónio, mas foi de novo preso e condenado ao degredo, agora para Angola, por cinco anos.

Do processo consta um elenco de filhos ilegítimos do réu. Tinha, por exemplo, uma filha "de uma moça cujo nome não [sabia]" e que foi criada de sua casa. A filha com esta criada chamava-se Sebastiana e na altura do processo tinha 17 anos, sendo natural de Abiul e aí moradora. Teve outro filho de uma outra mulher, Maria de Amaral. Esse filho chamava-se Francisco de Almeida, de 14 anos, e era também natural de Abiul e aí residente. Com Maria Gomes teve uma filha, Mariana, que já havia morrido, e Joana, que tinha agora 7 ou 8 anos. Com Antónia da Silva, moradora no Vale, termo de Pombal, teve um filho, Nicolau, que também já falecera.

As cartas aqui transcritas são na sua maioria de familiares do réu. O processo contém documentação interessante, como por exemplo uma fatura de despesas com escravos.

Support meia folha de papel não dobrada escrita no rosto
Archival Institution Arquivo Nacional da Torre do Tombo
Repository Tribunal do Santo Ofício
Collection Inquisição de Coimbra
Archival Reference Processo 6928
Folios [25r]
Transcription Ana Guilherme
Main Revision Rita Marquilhas
Standardization Catarina Carvalheiro
POS annotation Clara Pinto, Catarina Carvalheiro
Transcription date2009

Text: -


[1]
Sor primo
[2]
não tenho faltado em todas as ocasiois de precurar notisias de vm por asim mo pedirem as rezois de tão grande parentesço e ver diante dos olhos aquele belo retrato do meu fransisquo
[3]
ainda crese em mim maior o dezejo de a vm ver com descansos pa tanbem o ver emparado
[4]
trate vm do seu negosio e neste cartorio de Mel gomes tem vm boa defensa em q esa sra cofesa
[5]
ese matrimonio era nulo e ele esta corasão grande pa a vm lhe mostrar os papeis
[6]
noso sor lhe de a vm mtos alivios q tanto os dezejo como se forão pa mim propria
[7]
eu meu sor tenho ja nesta vida tanbem pasado mtos trabalhos mas tendome com coanto peso não desbarate vm todos os seus brinquos e pesas q tras
[8]
lenbrese desta parenta pobre q tenho duas raparigas q nas orellhas se podem trazer
[9]
estimara eu mto o ver a vm antes q se fora mas não quero q Vm ponha a sua vida em perigos
[10]
a ma gomes me de Vm mtos recados
[11]
deos gde a Vm como dezejo
[12]
oje nove de fevereiro prima e cativa Escolastiqa d almda d amaral
[13]
e coando vm queira ver os papeis pode mandarme avizo coando ha de vir q eu mandarei mel gomes em busça de vm a santo Anto e seguramente pode vir q ele he bom homem não ha de fazer pesa a Vm as oras q Vm mandar dizer

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