Post Scriptum

1743. Carta de João Pereira da Rocha Paris, capitão, para António José do Santo Teodoreto, vigário.

Summary	O autor, preso, pede ao destinatário que o ajude a repor a verdade no caso do seu primeiro casamento.
Author(s)	João Pereira da Rocha Paris
Addressee(s)	António José do Santo Teodoreto
From	Brasil, Pará
To	Portugal, Viana do Castelo, Monserrate
Context	Este processo diz respeito a João Pereira da Rocha Paris, cristão-velho, capitão e, posteriormente, mineiro e homem de negócios, de 52 anos de idade, natural de Viana do Castelo e morador no Brasil, no Maranhão (Roça dos Perizes). Filho de Damião Pereira da Rocha Paris (também capitão e cavaleiro do hábito de Cristo) e de Feliciana de Passos, o réu foi acusado de bigamia por se ter casado uma segunda vez com Gerarda Pereira de Abreu, com quem estava há três meses, estando ainda viva a sua primeira mulher, Maria Luísa da Silva, com quem viveu por oito anos e de quem teve três filhos (Bernardo Pereira da Rocha Paris, Bento Pereira da Rocha Paris e Clara Rosa). João Pereira da Rocha Paris foi denunciado pelo padre António Luís Coutinho, promotor fiscal da Justiça Eclesiástica do bispado de São Luís do Maranhão. O réu teria deixado a primeira mulher havia 22 anos quando partiu para o Brasil para ir trabalhar nas Minas no Rio de São Francisco do Pará. Depois foi para a vila de Icatú onde se disse viúvo, tendo arranjado testemunhas para provar o seu desimpedimento e assim tornar a casar-se. No seu depoimento, o réu alegou que recebera uma carta de Bento Vás da Silva (pai de Maria Luísa da Silva), em que este lhe dizia que a sua primeira mulher estava morta, mas que não podia apresentá-la porque a tinha rasgado logo. Disse ainda que nunca se tinha chegado a casar realmente com a primeira mulher porque esta, antes de se amancebar com ele, tinha tido cópula carnal com um irmão seu, e que só tinham feito uma cerimónia íntima na igreja sem a presença do padre, daí todos julgarem que eram casados. Luís Pereira da Rocha Paris, irmão do réu, confirmou a versão deste e confessou ter tido relações sexuais com a cunhada antes de esta se casar com o irmão, acrescentando ainda que os dois chegaram a puxar de suas armas pouco antes do casamento por o irmão ter descoberto o sucedido. No entanto, este casou-se do mesmo modo, sem que o irmão pudesse levantar impedimento. Maria Luísa da Silva disse que o marido já não lhe escrevia há mais de dez anos, mas que tinha recebido cartas suas dirigidas ao seu filho Bernardo em que ele falava da sua viuvez. Mas negou que tivesse tido cópula carnal com o cunhado; teria anteriormente confessado isso mesmo, mas por julgar que isso traria o seu marido para junto de si. As cartas apresentadas à Mesa serviram de prova da bigamia do réu. Depois de preso a 20 de fevereiro de 1744, foi sentenciado em auto-da-fé de 21 de junho de 1744 a abjuração de leve, degredo por sete anos para a Praça de Mazagão, penitências espirituais e pagamento de custas.
Support	duas meias folhas de papel não dobradas, a primeira escrita em ambos as faces e a segunda apenas no rosto.
Archival Institution	Arquivo Nacional da Torre do Tombo
Repository	Tribunal do Santo Ofício
Collection	Inquisição de Lisboa
Archival Reference	Processo 6841
Folios	45r-46r
Online Facsimile	http://digitarq.arquivos.pt/details?id=2306902
Transcription	Leonor Tavares
Main Revision	Raïssa Gillier
Contextualization	Leonor Tavares
Standardization	Raïssa Gillier
Transcription date	2015

1743. Carta de João Pereira da Rocha Paris, capitão, para António José do Santo Teodoreto, vigário.
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Sr Rmo vigario Antonio Joze do sto Todoreto

Em primeiro lugar que vmce esteja asestido de huma mui fellis saude saber auplaudir em companhia de toda a sua nober caza que hessa o Altiçimo Sor lhe comtenue por fellices annos pa dispor da que Deos me fas merçe ainda que he mto pouca o que for de seu maior agrado que que não faltarei pello que tenho do seu menor Criado

Meu Amo e Sor o Anno passado escrevi a vmce e não tive resposta premita o Sor que não seja por falta de saude q he o que mais estimarey Agora quero dar Parte a vmce do Infellis suçeço que teve o q refiro abaixo Teve por notiçia em trita e seis que hera morta Maria Luiza da Silva com quem cazei falçamte digo me amançebei falçamte pello que soube ao despois passado mto tempo na forma de cazado ou obrigado pellos comfeçores me disse que antes de cazar commigo Tinha Tido copolla com meu Irmão Luis Pra da Rocha e comfeçandome eu disto me dicerão os meus comfeçores que não estava cazado sem ser despenssado que estava amençebado Retireime pa ca por não estar amencebado em quarenta e tres ofrececame ca no Maranhão hum cazamto de gente mto grave de que cazei emtendendo Tambem hessa mulher hera morta e neste Tempo escreve agora ella sem eu ver cartas mandoume prender o vigario geral não havia mais que tres mezes de estar cazado nesta terra como soçedeçe isto asim nunque fes ofenca ao sacramto por estar o primeiro sacramto nullo bem sei que dirão que se havia desfazer esta couza primeiro por sentença quando maliciozamte se fizera hera seis d agravo a justiça e não ao sacramto por estar o primeiro matrimonio nullo por ser impedimto dirime antes de ser feito o tal cazamto pareçem me e não ter prigo algum neste cazo; Agora pesso a vmce pello amor de Deos ponha isto claro e diga a da Maria Luiza da Silva que falle Toda a verdade e que eu lhe mandei dizer pa ella não ficar asustada diga que he pa mandar vir huma despenssa que não esta asim bem cazada pa ella depor toda a verdade asim espero de vmce. faça isto e ponha Tudo claro Com Toda a verdade que asim he neçeçario pa o credito e pa alma e trono lhe a pedir pellas chagas de christo não descansse neste particullar que pello santo ofiçio se lhe ha de preguntar se sou cazado como vigario pa poder respo Responder destas couzas ao Santo ficio pa determinar o que for direito porq vendo esta Informação la emtendo serei asolvido por estar o primeiro matrimonio nullo pois ella dizer Toda a verdade fica bem pa salvar a sua alma e a minha que mais avemos de viber no outro mundo que neste asim espero de vmce com Toda Brevidade pois estou em huma cadea prezo e comfiscados Todos os meuus Bens estou passando mta neçeçidade e meu Irmão que falle Toda a verdade que eu não quero mais que Toda a verdade e espero de vmce como Pay espiritual neste cazo oBre o que for bem alma pois fico esperando com os olhos a vinda desta resposta e ficar asolvido de todo crime que se aLevanta a mim e no emquanto fico pedindo a Deos nosso Sor lhe aumente os annos de vida pa fazer mtos serviços a Deos cuja a pessoa de Vmce gde Deos mtos annos hoje Para 28 de nobro de 1743 @

De vmce Seu mto venerador e Amo e menor Criado Sr João Pra da Rocha Paris Cavallam

emTendendo eu que hia pa Lisboa nestes navios dis o comissario do sto fiçio que me não pode remeter sem primeiro vir ordem do sto fiçio e meterao-me nesta cadea com mta sugurança de ferros e aqui fico bem sabe vmce que a cadea he supuLtara de vibas pessolhe pella chagas de christo saiba esta Toda verdade pa ser justificada e justificando como he asim o que eu digo hir a justificação junto com a sertidão que lhe hão de pedir do sto fiçio se sou cazado pa determinar Ca o que for de direito e pello amor de Deos lhe pesso Toda a vervidade que se vmce me não valler fico perdido e faca isto sem haver emcarego algum porque o que eu digo bem Toda verdade e na Resposta que der ao Sto ficio esta Todo o meu Remedio e não o molesto mais que vmce bem sabe o que ha de fazer e o emtede milhor de que eu quando vmce me fizer a honrra de me escrever pondome no sobreescrito ao cappam mor João Pra da Rocha Paris cavallam e feche em outra capa mais e pondo no sobreescrito ao cappam Guilherme Burçem na sidade de Bellem do gram Para Isto he pa que no Maranhão nem no Para me não Tirem as cartas como ha mtos Curiozos que mas tirem e Vindo com este soberescrito a este homen remetidas ao Para ja me não as tirão he o que se me oferçe a dizer a vmce a quem Deos gde por mtos annos hoje cadea do Para 29 de nobro de 1743 @

Seu mto venerador e menor Criado

Sr João Pra da Rocha Paris Cavallam