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Maarten Janssen, 2014-

PSCR9376

1603. Cópia de carta de Isabel Mendes para João Nunes Baião, seu filho.

ResumoA autora conta pormenorizadamente ao destinatário, seu filho, todos os esforços que tem feito para o contactar com notícias e para lhe enviar encomendas. Narra também como tem tentado que o soltem.
Autor(es) Isabel Mendes
Destinatário(s) João Nunes Baião            
De Índia, Goa
Para Índia, Goa
Contexto

Algumas das cartas trocadas entre Isabel Mendes e o seu filho João Nunes Baião, quando este se encontrava preso em Goa (o que acontecia desde 3 de março de 1600), foram apreendidas pelos inquisidores e incluídas no segundo processo de Isabel Mendes, presa a 5 de abril de 1603. A cópia do processo, acompanhada do traslado das cartas, foi enviada pela Inquisição de Goa para a de Lisboa. Nela, encontram-se trinta cartas: cinco da autoria de Isabel Mendes e vinte e cinco da autoria de João Nunes Baião, escritas entre 1602 e os primeiros dias de abril de 1603. Duas destas cartas, "um papelzinho embrulhado noutro com uma linha por cima", com a letra de João Nunes Baião, foram entregues aos inquisidores no dia 4 de abril de 1603, por Simoa, uma escrava do alcaide Brás Martins, que as tinha consigo para as entregar a Isabel Mendes. Uma terceira carta, da autoria de Isabel Mendes, foi entregue aos inquisidores por um escravo do mesmo alcaide (PSCR9376). As restantes foram entregues por Leonor Costa e encontravam-se num saquinho que Isabel Mendes deixara propositadamente em cima da cama no momento em que foi presa, tendo pedido a Leonor Costa que as queimasse.

Algumas cartas tinham sido escritas em cifra ‒ é o caso da carta PSCR9380; no entanto, na cópia do processo enviado para a Inquisição de Lisboa, a carta foi trasladada e descodificada. Sobre as cartas cifradas, Isabel Mendes confessou que pedira ajuda ao seu neto António de Vilalobos para escrever as que enviou ao filho e para lhe ler aquelas que recebeu do mesmo. Inicialmente, mãe e filho trocaram correspondência por intermédio de uma cozinheira da prisão, a qual entregava também a João Nunes Baião alimentos e outros bens que a mãe lhe enviava. A partir de certa altura, a cozinheira teve medo de continuar a servir de intermediária e Isabel Mendes socorreu-se de um António, um escravo («bicho») do alcaide Brás Martins. No entanto, António não entregou muitas das cartas: rasgou algumas delas, ficou com alguns bens que Isabel Mendes lhe confiou para dar a João Nunes Baião, e, sem sucesso, tentou enganar Isabel Mendes com uma carta falsa, supostamente da autoria do filho, a pedir dinheiro. Depois deste episódio, António nunca mais se prontificou a entregar cartas. Isabel Mendes socorreu-se, então, de Simoa, uma escrava do alcaide Brás Martins, a qual passava as cartas a um Francisco, escravo do alcaide Brás Martins, que lavava os bacios dos presos, para as entregar a João Nunes Baião, de quem também trazia correio.

A comunicação entre Isabel Mendes e o seu filho foi descoberta a 4 de abril de 1603 pelo alcaide Brás Martins. Nesse dia, Francisco, um escravo de Isabel Mendes, apareceu à porta da prisão a abanar-se com uma folha de figueira ‒ o sinal combinado com Francisco, o escravo que lavava os bacios ‒ e entregou um bolo embrulhado num lenço e uns mogorins para dar ao preso. Do balcão da sua janela, o alcaide testemunhou o encontro entre os dois escravos e mandou deter o escravo de Isabel Mendes, obrigando-o a confessar. Isabel Mendes foi presa no dia seguinte.

Arquivo Arquivo Nacional da Torre do Tombo
Repository Tribunal do Santo Ofício
Fundo Inquisição de Lisboa
Cota arquivística Processo 12792-1
Fólios 1r-3r
Online Facsimile http://digitarq.arquivos.pt/viewer?id=2312999
Transcrição Teresa Rebelo da Silva
Revisão principal Catarina Carvalheiro
Contextualização Teresa Rebelo da Silva
Modernização Catarina Carvalheiro
Data da transcrição2015

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Benção de Ds, e a minha vos cubra, e vos dei aquillo q lhe eu pesso todas as horas quartafra a derradeira oitava de sancta paschoa Vindo eu de fora muito canssada de hũa Romaria Longe entrando polla porta de vossa Irmãa me derão hum esCrito vosso com o qual fiquei tão consollada q não me fartava de dar graças a Deos. tudo attribui a vir eu de Caza da Virgem Nossa snora q ella me quis dar dar aquella consoLação e assi tambem nos dara o mais; pollo vosso soube não vos darem o saco com o Livro e hum Lançol q hia dentro, e assi tambem algũ douce, e do qual me não mais q do Lo perq era muito bom e levei tanto trabalho em o buscar dentro nũa pasta delle hia hum esCrito falsso q me trouxe esse perrinho, em q me pedia oito pardaos dizendo q vos os mandaveis pedir, mais nẽ a letra, nẽ as palavras são vossas, per iso lhos não dei E disselhe com quem lhe dera aquelle esCrito, ou enganara contenteio foi daqui mto contente do dia do ecce homo estando eu em são paullo deste dous esCritos a franco, hum grande outro pequeno, em q pedias o Livro, E assim vos veja eu diante dos meus olhos como lhe dei de ma vonta-de, mas per vos consollar arisquara mto mais h e per outra parte me tambem me pareçeo q não cobiçasse hum Livro perq não tinha outro, nẽ perca, mas sempre tive algũa desconfiança delle perq não queria vir aqui, per mais Rogos, per mais mimos, e per mais q lhe enchia as mãos não avia Remedio pa vir aqui; mandastes me q lhe desse hum xe da vossa parte assim o fiz fugio aqui o tive dous dias mil mintiras dizendo q fogira com medo q teve se o lhe achara hum esCrito vosso, não me faltou mais q beijalo no Cuu per onde ia não qm confiar per amor de Ds, e per amor de mỹ q não vos agasteis, nẽ vos desconsoLeis q bastão vossos Trabalhos q Lo não faltão e tudo o mais como tivermos Caminho seguro eu vos prometo de vos não faltar em couza nenhũa perq entendei q não tenho outra consoLação, tres anos, e mes fez ontem que forão tres de abril, não tenho mor ConsoLação q esCrevervos, e ver sinal vosso pode ser que nesta preta aja mais verdade, eu a contentei mandei a chamar perq a conhecem Breatis e a fra eu lhe dei hum esCrito da minha Letra q foi appressadamente per estar a preta esperando ate q eu acabasse; tambem vos mandei per ella hũa pera dambre q seria de Meia onssa, pouco mais, ou menos enfiado nũa fita enCarnada roguei lhe mto q vos Levasse Levasse hũa pouca de Conserva, disseme q não podia ser perq buscão as moças quando vem de fora, e lhe apalpão o collo, e que aquelle esCrito metteo ella na barriga, se pode ser per outra via eu estou prestes, e sempre se me danao a conserva no aLmario per esperar quem na leve, he os meus peccados não me querem dar esses gostos agora vede vos se temos outro Caminho milhor onde possa passar o mais. quanto os Livros que dizeis ate agora ninguem me falou nelles somentes o fo de Roque d ares me pedio hum Lo seu q qua estava, o qual estava ja comido de bicho, e dei lho per Conselho do padre fernão gomes agora pede o zopete, e diz q tambem vollo emprestou, eu não no tenho qua, o padre quando se quis Ir pera Ormuz me deu tambem algũs Livros vossos. esCrevesme q vos dei Lça pa me esCreverdes certas couzas esCrevei tudo o que quizerdes, e desabafai vosso coracão comigo, pois assim he Rezão, e tudo o q eu puder nessa parte farei de mto boa vontade. A chiqua, e sua mãy, e toda a caza estão de saude; a Velha falecida perdooulhe nosso sor, Isabel miz esteve aqui dia de são Lazaro, e ate agora não veo seu marido ella me disse q Miguel Similagas, e o seu Irmão mais pequeno se meterão frades de são frco De portugual tive este Anno duas do pe Cartas Curtas, se puder mandarvos hũa dellas faloei, outra Carta nenhũa vi della pa vos, tambem vos mandei as mechas e isqua pollo mesmo quão não lhe dei quando Levou o fuzil, mais da outra vez q veo as Levou q erão trinta mechas que ainda me ficarão algũas q vos possa mandar se tiver per quem. A mãi d angella athe agora está aqui comigo a filha. Jugou lhe o marido quanto tinha ate a deixar nũa Vendeo as cazas per seisçentos pardaos dizendo que se queria Livrar com aquelle dro, e não se livrou perq tudo nigou, e agora embarcou d armada deixou a molher en Caza de seu Irmão. tinha mto bons aparelhos pa se livrar se quizera se quizera, perq o vizorrei he Cunhado dũa sua Irmã q está em portuguaL molher de Martim afonço, mais todos estão aborre-çidos delle per sua travessura, e velhaquarias. Antoninho veo d armada duas vezes se embarcou, e de ambas deu mto ruim conta de ssy perq vai mto bem negoçeado, e vestido q nos despimos pa elle, entra polla porta nu nẽ sapato no pee, nem chapeo, camiza do corpo em pedaços, elle diz q não joga não podemos detreminar com elle, alembresse Ds delle q Ja homẽ e quasi q lhem vem a barba esteve aqui tres, ou quatro dias comigo não se queria ir pa o pai de Vergonha emquanto aqui esteve lhe fiz esCrever dous esCritos de letra virada vos mandou elle he este q vai com este o que vos elle mandou foi na perdição dos outros, a dama bem sei q está alli recolhida, mais não per esCrito vosso, nẽ meu q se achasse, Ja vos esCrevi isto outra vez a snora falou comigo E me disse q se achara hum Livro dentro no aRos, e q lhe perguntou q Lo era aquelle, e ella disse q eu lho dera pa vollo mandar. tambem me disse q ninguem sabia disso senão ella mais per outras mtas emburulhadas q ella tem feito com quantos aly estavão, e per isso está aly metida a snora d antão pa qua não me quer tomar nada, nẽ consente couza minha a sua porta perq mto medroza de perder o seu cargo, esta festa mandei Vizitar per hũa moça de vossa Irmã, e de longe lhe disserão q não entrasse, veja nos Ds q delle nos ha de vir todos os bens, não me pedia ate agora couza nenhũa pa vos, dizeis q aveis mister CaLçõis, e camiza, e Lenços, fronhas, não sei per q via possa Ir isto, Rogai ao velho q per elle o pode fazer muito bem franco conheçido per isso não ouzo amandallo, bem sabeis q não tenho outrem, nem nessas couzas não se pode confear tanto como vos dizeis, nẽ podemos abril la bouca; eu falei ao pe frei simão q foi custodio em são frco sobre os vossos negoçios disseme q não falasse nada perq elle em pessoa fora falar sobre aquella Aquella molher do Bispo de Malaca q lhe responderão que se espantavão mto de sua paternidade falar nisso, ora vede vos agora como falarei; contudo eu falarei o pe frei Jeronimo e o que me Responder eu vos falarei esCreveisme q comeis brados, e abobara mais não me dizeis q estais doente per amor de Ds vos pesso se me quereis dar vida, q me esCrevais tudo larguo tãbẽ desejo de vos mandar papeL e sempre estou com coração arebentando nũa lide per não vos poder prover somente, que do mais confio na Mya de Ds que aveis de sair mto bem e todos dizem q isto q he penitençia, eu vos esCrevi sempre Largo, e perq não posso sou ja mto canssada Ds vos tem de sua conta


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