Visualização das frases 1820. Carta de Bernardo de Sá Nogueira, futuro Marquês de Sá da Bandeira, para o Coronel Bernardo Correia de Castro e Sepúlveda, membro da Junta Provisional do Governo Supremo do Reino. Autor(es)
Bernardo de Sá Nogueira
Destinatário(s)
Bernardo Correia de Castro e Sepúlveda
Resumo
O autor acusa o destinatário e a Junta a que pertence de terem ordenado a sua prisão, na sequência da Martinhada, por razões opostas ao espírito do liberalismo.
Texto: Transcrição Edição Modernização - Cores
[2]
Tenho a honra de me dirigir a V
Exa como sendo aquelle que
aos officiaes de
policia que me conduzirão a esta prizão intimou
a ordem da parte do Governo
para eu ser prezo nesta noite .
[3]
Estou persuadido que deu causa á minha prisão a
carta que no dia
4 do corrente derigi ao Governo , em
q com o respeito devido á digni
dade
q occupão os seus membros , e no estilo que
compette a hum
homem livre , expuz o meu modo de pensar sobre os
acontecimen
tos relativos ao dia 11 de novembro , e qual tinha sido a minha
conducta .
[4]
Desde o dia 14 de setembro me julgo homem livre e estou na
firme
resolução de sêllo sempre ,
de não ser contado n'hum rebanho
de Portuguezes escravos :
[5]
como homem livre
derigi ao Governo a mi
nha exposição , cujas bazes erão factos que o
mesmo Governo no dia
11 sancionára com o seu juramento .
[6]
Nunca póde ser crime
fazer-se
huma tal exposição , pois que não ha hum só Governo liberal em
que
aos cidadãos se prohiba manifestar as suas ideas tanto ao poder
legislativo
como ao executivo .
[7]
Se eu na minha carta tivesse censurado a conducta do
Exercito
no dia 11 , se eu com razaoens tão fortes como as expendidas nella
tivesse provado ( o q era impossivel ) ,
q o Exercito tinha commettido hum
crime ;
decerto não seria castigado , mas , talvez antes , elogiado ;
[8]
mas
sou castigado por ter ditto
q o Exercito fez o seu dever ,
[9]
e como
eu
penso assim não há prisoens , não ha desterros
q me obriguem a
des
dizer-me .
[10]
Sou castigado do mesmo modo que nos paizes os mais
despoticos se castigão os homens pelas suas opinioens , e isto no tempo
em que
tanto se falla em liberdade em constituição .
[11]
De sorte que
quando pensâmos
marchar a ser hum Povo livre nos achamos obri
gados a não fallar , e
até se pretende que sejâmos
estupidamente
da opinião do Governo ! ! !
[12]
A revolução
q
V
Exa e o coronel Cabreira
principiarão , nada ate
agora tem produzido em favor dos Portuguezes .
[13]
Todo o
trabalho
de V
Exas se limita ate hoje á mudança de certos
homens dos
lugares q occupavão .
[14]
Nenhuma liberdade
há neste Reino , nem
a pode haver emquanto a imprensa fôr escrava .
[15]
Ha hum
prin
cipio reconhecido em Inglaterra e em
todos os mais paizes livres :
[16]
q pode ser culpavel o escreverem mal das particularidades , mas
que as acçoens
do Governo devem soffrer hum exame publi
co , e
q se faz hum serviço á sociedade publicando
cada
hum as suas opinioens :
[17]
este principio esta bem desconhecido em
Portugal actualmente ;
[18]
attação os escritores impunemente os
par
ticulares , q
pr conseguinte tem mto
menos segurança q no Governo
passado , e nada he
permittido dizer das acçoens do Governo ;
[19]
a
ssim se prova o que digo ,
[20]
por ter manifestado a minha opinião ,
não só
sou prezo mas desterrado .
[21]
Emquanto a este acto
q o Governo exerce em mim decidirá a
opi
nião publica
[22]
quando se imprimir a carta que forma o meu corpo
de
delicto , ella decidirá se eu sou criminoso em apresentar a
jus
tificação da conducta do Exercito e da minha a hum Governo que
se diz
liberal , ou se este Governo obra despoticamente e por poder
absoluto
mandando sem formalidades e como por surpreza prender
hum cidadão , mandando-o
desterrado sem se lhe comonicar
a causa da sua prizão , e exercendo todos estes
actos mesmo pelos
na vespera , e no dia em que este
cidadão havia de escrever o maior
dos seus direitos , aquelle de concurrer as
eleicçoens dos Re
presentantes da Nação .
[23]
Concluo lembrando a
V
Exa que a minha conducta he filha
dos meus
principios que estão intimamente ligados á mi
nha existencia ,
[24]
e que
conseguintemente a minha conducta
futura nunca puderá ser contraria á passada e
á pre
sente .
[25]
O bem de todos os Portuguezes , ou do maior numero he
o meu unico alvo .
[27]
Cadea do Castello de S Jorge de Lisboa
10 de Dezembro
de 1820 á huma hora da noite .
[28]
Illmo e
Exmo
Sr
Bernardo Correa de Castro e Sepulveda
[29]
Bernardo de Sá Nogueira
Capm do 4o de
cava
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