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Maarten Janssen, 2014-

PS1030

1760. Carta de José Gonçalves Marques para Miguel Rodrigues Colaço.

SummaryO autor mostra-se claramente desavindo com o seu destinatário e refuta uma série de acusações de que foi alvo. Demonstra ainda o seu bom serviço para com o dono daquela embarcação.
Author(s) José Gonçalves Marques
Addressee(s) Miguel Rodrigues Colaço            
From S.l.
To
Context

António José Brandão era, além de negociante na praça de Pernambuco, capitão-mor desta capitania, procurador da Câmara do Recife e proprietário da galera Senhor Bom Jesus dos Navegantes e São João Nepomuceno. Aspirando a acionista da Companhia Geral de Pernambuco e Paraíba, reclamou em juízo, por via de um libelo por perdas e danos, a fim de que Miguel Rodrigues Colaço restituísse a quantia de que lhe era devedor. Conforme alegou, os factos reportavam-se a 1759, altura em que mandara a sua galera, capitaneada por José Gonçalves Marques, na frota que partira do porto de Pernambuco rumo a Lisboa, dali seguindo para Angola, tornando ou para o Rio de Janeiro ou para Pernambuco, conforme o sucesso das transações.

Miguel Rodrigues Colaço tinha sido procurador de António José Brandão, o qual solicitara os seus serviços para conseguir fazer aquela viagem, além de ter colocado a galera sob a sua proteção. Com efeito, Miguel Rodrigues Colaço dava-lhe conta das diversas diligências que tocavam à carregação e circulação de mercadorias através do trânsito marítimo, chegando a tecer conselhos sobre o modo de proceder, atendendo à conjuntura de navegação (como sejam a concorrência direta de outras embarcações, não sendo vantajoso investir na ida da corveta para Angola quando houvesse notícia de muitas estarem nas mesmas circunstâncias). A sua intervenção era também muito relevante na intermediação com a Junta da Companhia Geral de Pernambuco e Paraíba. Contudo, este conselheiro e procurador viria a obrar de forma contrária ao ajustado, agindo à luz dos interesses pessoais e ignorando as ordens que recebera: vendeu a galera carregada, com claro prejuízo do seu dono, o qual perdia assim todo o investimento nos fretes que transportava, destinados a serem vendidos em Angola. Usurpou ainda a carga que o mesmo António José Brandão encaminhara numa corveta para Angola, ao cuidado do capitão José Gonçalves Marques, assim como dois escravos que haviam seguido na embarcação anterior.

Graças a essa venda particularmente dolosa, Miguel Rodrigues Colaço arrecadou o valor necessário para começar o seu próprio negócio, adquirindo uma embarcação mais pequena para seguir na mesma rota, a fim de também ele comerciar em Angola, agora na qualidade de proprietário. Além das desavenças que o opunham ao capitão da galera, torna-se evidente que as suas ações não se resumiam a uma mera vingança. A conivência do piloto João Gonçalves Ribeiro e a reunião de todas aquelas circunstâncias acabaram por conceder a oportunidade para a concretização das suas aspirações.

Quanto a provas documentais, consta um registo autógrafo do réu, Miguel Rodrigues Colaço, datado de junho de 1759 a abril de 1760, composto em estilo epistolar e com um discurso mais formal. Ali dava conta do seu procedimento, das carregações feitas e do conhecimento que tinha face a outras embarcações. Este documento foi entregue pelo autor do libelo na qualidade de prova incriminatória, demonstrando como Miguel Rodrigues Colaço agira contrariamente às ordens emanadas por António José Brandão.

A presente carta surge associada à denúncia feita por José Gonçalves Marques, capitão da galera Bom Jesus dos Navegantes e São João Nepomuceno, relativamente ao mau proceder de Miguel Rodrigues Colaço, por cujos enredos chegou mesmo a ser preso. Ademais, contestou a postura do piloto, João Gonçalves Ribeiro, a quem apelidou de "mexeriqueiro", além de ter pretendido acusá-lo de ter embriagado o contramestre para conseguir fazer uma avultada carregação, destinada a Angola. Na verdade, tudo fizera parte da estratégia de Miguel Rodrigues Colaço em assumir o total controlo sobre a embarcação, tendo efectivamente conseguido colocar o piloto - pessoa da sua confiança - no lugar daquele capitão. É de salientar ainda a presença de um outro anexo: precisamente o livro de carga da referida galera, com descrição detalhada dos bens carregados e respectivos valores, bem como a identificação dos particulares que as remetiam e as marcas usadas. Estes documentos terão sido apensos ao processo pelo autor do litígio.

Support uma folha de papel de carta escrita em ambas as faces
Archival Institution Arquivo Nacional da Torre do Tombo
Repository Conservatória da Companhia Geral de Pernambuco e Paraíba
Collection Feitos Findos
Archival Reference mç. 6, n.º 1, cx. 8
Folios 121r-v, 123v
Socio-Historical Keywords Maria Teresa Oliveira
Transcription Ana Leitão
Main Revision Fernanda Pratas
Contextualization Ana Leitão
Standardization Fernanda Pratas
Transcription date2016

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Snr Miguel Roiz colaço

Receby o Escripto de vmce e veyo o que me dis sobre a minha hida a Bordo que vmce tanto emcrepa sem motivo pois o hir a bordo Camaradas levando o Jantar não foy asim de como vmce diz embebedar o contra me no q emtendo o sentido pensa vmce mto mal ao mesmo tempo que tambem sey discorre vmce como qm me não conheçe e se lhe ajunta a persuadirlhe de algumas rezois que lhe sugire esse mizero e motivador de dezordens a que vmce devia não dar ouvidos nem credito pre nem o contrame bebado nem a isso costumado e eu ainda que em lxa tenha pouco conhecimto em Permco me conhecem todos e o c Anto Jozé Brandaõ qdo me emcarregou do Navio naõ foy pr peditorios mas sim pr conhecimto proprio de meu proçedimto e naquella ocaziaõ naõ se media a faza pa que o contrame me houvesse de favoreçer e nem elle o que a mede e taõ lizo obro que tal naõ pensey cuydasse vmce prqto em materia de verdadro o sou tanto como aquelles que o prozumem ser e o naõ serey na sua openião; pello que lhe dis esse mexeriqueyro que pr semelhante fraze naõ pertendo caber com pessoa algua e isto tanto asim que sendo esta a pra ves que a esta cide venho e elle a mais de 20 as hey de achar pella ma pte mais abono de comedido do que elle de verdadro e os homens de bem naõ daõ ouvidos a semelhantes pois protegendo-os dão motivo a qe cada hum aJuize o que lhe pareçer e todos falem o q quizerem porem a vmce digo que eu procuro o adiantamto e conveniençias do Navio emqto surto e quietaçaõ pa a viagem e naõ dezordens nella que ao que vmce emcaminha querendo seja esse o soto Pillotto e conçiderando vmce bem neste particular vera o benefiçio que fas ao Navio e a qm vay dentro nelle pois vendo eu que vmce devia naõ se meter com pessoa alguma dos da obrigaçaõ do mesmo Navio pr me tocar a mim essas nomiaçoïz me sugeyto a pagar a soldada pello naõ ver diante dos olhos que vmce ao prinçipio lhe naõ disse ouvindo os seus mexericos que com aqe da obrigam se não metia que se asim o fizesse nada disto havia de haver mas como vmce asim o quis e quer tenha o trabalho de comtinuar com a prudençia que me dis teve a 4 do preze més comigo e adevirto a vmce que nada emcaminho pa maõ fim rezão pr que naõ temo se me deyte nada em rosto pois louvores a Ds naõ cuydo em mãchar o meu credito e ainda mayormte nas couzas de ma obrigam No que respta a faza que levo com camaradas e a ma de pte e me pareçe repeti a vmce o aJuste que fis com o C Anto Joze Brandaõ que não Tendo obrigam de lhe dar a vmce pte delle tanto me sugeytey a sua vontade que lho Expressey e agora de novo o repito pa que vmce o publique que a mim nenhũ projuizo me cauza; Que em Angolla naõ levaria pa ma caza faz algua de ma conta mais de conto de rs q o q lhe disse trazia de ma conta mas que se a carregam fosse mayor naõ a levaria pa ma caza e que emtressado poderia eu ser com qm quizesse prqto o C Anto Joze Brandaõ sabia q Felix Jozé da Costa era meu camarada e mal do Navio se a nossa carregam naõ fora prqto meu camarada tudo carrega e vay com o Numero de cento e tantos fora a ma de pte que vou em vinte e com isto que se tem adiantado o Navio e vmce thé o preze tem mandado catorze fardos e esse perturbador da quietaçaõ outros tantos e como vmce me dis deza todo o adiantamto e utilidade do Navio e o carregar eu como o tenho feyto naõ procurar meyos de tirar a comveniençia que o Navio pode alcançar como vmce me dis mas antes pa qm o emtende procurar comveniençia pa o Navio No que respta ao meu aJuste nesta forma de Permco pa Lxa cem mil rs e acabada e de Lxa a Angolla e de ao Ro ou Permco duzentos e sincoenta mil rs acabada e naõ podendo eu hir de Angolla pr ter a incombençia de despoziçaõ da Carregam me ter capm a ma satisfaçaõ pr conta de seu dono e se ouver passagros aJustallos e o gasto pr conta do Navio e do que derem tirar a despeza que fizerem e o que ficar repartir emtre mim e o dono e suponho que isto mesmo desse a vmce qdo me falou o CMor de Moxima o coal tendo esta faculdade naõ o ajustey sem benaplaçito de vmce q suponho se lembra lhe disse isto mesmo e que vmce me disse o aJustasse pa mim que pa o Navio naõ queria nada asim o fis e qdo vmce se der por arependido e o queyra pa o Navio Estou prompto pa devertindo que o Navio o ha de sustentar pa se fazer a repartiçaõ na forma do meu aJuste e se vmce acazo Estava Esquecido de todo o meu ajuste agora ficara lembrado que asim lho comoniquey e emthé agora naõ tenho procurado projuizo pa o Navio mas sim comveniençia e no que respta a faza que vmce dis mandará por prompta pa eu arumar donde quizer emganasse pois vmce tem tomado isso a sua conta e basta que ma mande arumar em pte que em Benga a deyte em terra pois tem seu dono como mandey dizer a vmce a cuja pessoa gde lhe ms as caza 7 de Janro de 1760 as

De a vmce Mto seu venor Jozé Glz Marquez


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