Visualização das frases
1576. Cópia de carta de Manuel Leitão, ex-guarda do Santo Ofício, para Álvaro Mendes.
Autor(es)
Manuel Leitão
Destinatário(s)
Álvaro Mendes
Resumo
O autor descreve ao destinatário diversos factos do tempo que tem passado na prisão e das circunstâncias que o levaram para lá.
Texto: -
[1]
treslado da carta q mandava
Manuel Leitam
pa se dar ha
Alvaro mendez da quall faz
mencão no escripto asima
[2]
Sor
Nam ponha duvida nesta letra
porq a
outra fazia cõ carvam e cõ hum
pao.
[3]
hagora quero dar cõta a
vm do
q pasei despois
q
são preso da
ql prissão Ds perdoe
a quem foi
causa della
[4]
porq se me não fizeram ir
pa
galiza he mais pa tal parte
numqua heu
fora preso nẽ se fizera tanto dano
[5]
porq eu
estava offerecido
pa ir pa toda
pte
q me mã
darem
[6]
mas ja
q he feito ds o
remidie.
[7]
logo
como fui na prissão me poseram na mais ma casa
q avia e dahi a poucos dias veo este paneleiro
hũa noite ter comiguo
[8]
e bateo a porta e me
disse
q lhe pesava de minha prissão he visee
se
quiria eu q fizesse algũa cousa por amor
de min
mostrando q cõ toda vontade o faria
e com isto se
foi,
[9]
dahi a outros dias tornou a ter
comiguo cõ as mesmas palavras
[10]
então lhe pedi
desimuladamte
q vise se podia saber algũa
cousa de meu negocio
e q dous dedos hera
mto
meu amiguo e que pola ventura lhe diria
algũa cousa
[11]
e dali a dias tornou cõ mta alegria
a
pedirme alvisaras q dous dedos lhe per
guntara por
min e elle lhe repondera q
eu estava mal e lhe
dissera que lhe pedia
se sabia de meu nego se mo
quizera mãdar
dizer
[12]
e q elle lhe dissera
q me dissese
q
me não agastase q
não hera mais q o q
eu sabia e q portanto nã seria nada
[13]
e com
isto
fiquei algum tanto consolado he lhe
dei hum pouco de
dro
q me mandaram
no esprito os amiguos por meu filho
e da
fa
[14]
a outros dias me troxe hum escripto
do mesmo
dous dedos en q me dizera que ja
o villa e
simão sabiam de minha prissão
e estavam avissados de nã fallar
nada
[15]
este mesmo me dise o que lhes levara a cada
hum seu
escripto
[16]
e despois diso me troxe
outro recado do villa em
q me mandava
preguntar como me prenderam
e que lhe
mandase novas de sua casa e fos e sua
fa
se estava en casa
[17]
he se estava en
casa
se en casa de sua tia
[18]
he o conego villella se
vinha
cuidado de suas cousas.
[19]
he o jenro do
baeca se hera morto se vivo e
q estava
mto
areceoso delle elle sua filha
[20]
e se ouvira
dizer
de seu irmão de bragua como estava
he
guiomar dias sua cunhada e fas e
fo
[21]
e
eu lhe mandei dizer tudo o
q passava e como
o irmão do frade
bernardino fora comigo
a galliza e
passaramos por bragua e q
hum filho de seu irmão viera ter comigo
a pousada e me dissera
q seu pai estava ẽ
cama das pernas
[22]
assi
q lhe mandei dizer
tudo
miudamte he disto achei qua na boca
de
manuel de coadros algũas cousas quando me
fez as
derradras perguntas e em hũs Artigos
cõ
q me vieram de novo despois
q estes
qua
são presos pello q me parece
q este velhaco
disse disto algũas cousas
[23]
porq este alcaide
me disse
q afora as vezes
q fora a mesa he
estava la muito espaco
escrevera cimquo
folhas de papel e q fizera mui
larga cõfissão.
[24]
he despois disto por outra vez me disse
este paneleiro
q viera ahi hum seu filho
o qual lhe
mandara hum escripto de letra
mto boma q perecia de
forma
[25]
e lhe mã
dava quinze cruzados em ouro e q
elle
tambem de dentro lhe mandara outro
[26]
he por tudo isto fui ca
perguntado.
[27]
e pasado isto
assi estava hũa giomar
miz de
sea numa
casa em cima de min e sentio me
embaixo
e perguntou a este quem heu hera
[28]
e elle lho
disse e ella mandoume
dizer por elle que lhe
pesava de minha prissão e que lhe mã
dase por elle
hum sinall
[29]
e eu lhe mãdey
dizer q me fizera hum
lenco e por elle
me mandou hum pouco
laran
jada e me mãdou perguntar se dera heu
hum recado a sua mai
q tambem estava
presa
[30]
e ei medo
q tambem fallase
nisto
[31]
e despois disto me
veo dizer q elle
tinha muita amizade cõ hũas tres molheres
q estavam todas juntas e lhe dissera
q
eu hera presso as quais heram a britis
mdez
q me mandou dizer e hũa issabel
frco de linhares
he outra molher de sea
[32]
e q
me mandavão perguntar se sabia
de seus negos
q lho mandasse dizer e
eu lhe disse
q nam sabia nada
[33]
e então
me pedio
q o mandasse perguntar a dous dedos
q me daria tinta e papel
porq estava em
mta obriguação a estas molheres
[34]
he eu
o fiz o
qual me mãdou por elle hum
escripto em q me
mandava dizer q ellas
nam fallaram em min e
acerqua dellas
não me respondeo nada
[35]
he elle coãdo
isto veo disseme
q lho avia de perguntar
de palavra
[36]
he
despois me disse q elle lho
dissera e
q ja o ellas sabiam e eu não
tive numqua
outra cousa com esta bria
tiz mendez nem com as outras
q me
lembre.
[37]
e tinha
mtas deferencas com
esta briatis
mendez sobre alguodam q
q lhe eu nam queria comprar nem
dar a
cõta da recão como provarei por as pas
q ja mandei dizer a vm.
[38]
he pasadas
estas
cousas e outras q agora me não
lembram quãdo veo
pello santiago este
que pasou fez dous annos me mãodou dizer
dous dedos e por hum escripto q como
estavam
esperando por manuel de
coadros e por simão de sa
pra
pa fazerem
o auto e me avisava do
q eu avia de fazer
[39]
e como chegaram fui
chamado pante
elles ambos na casa das perguntas e
me
fizeram mtas amoestacoes e esconjuracoes
da
parte de nosso sor
q descobriuse a
vdade
do que sabia
porq restauraria muitas
perdas
q tinha dadas a ell Rei he dano ao
sto
offo o q averiam comigo
mta
mia e
me despachariam loguo
[40]
e neste
tempo
estava o Cardeal em alcobaca e adoe
ceo e foi chamado o coadros he
ficou simão
de saa.
[41]
he neste tempo estava hum luter
castelhano com o villa oo coal pedio mesa
he foi dizer
q este levava os escriptos ao
villa e
cochichava com elle secretamte
e que lhe quirião
mal he houtras cousas
[42]
e com isto o botaram fora e antes
q ho
botasem fora me foi dar conta de
tudo isto
de que fiquei mto desconsolado e me disse
q dous dedos lhe dissera
q o villa estava
despachado a sua vontade e
dei com isso
mtas gracas a nosso sor
cõ tam boa nova.
[43]
e daqui por diante me comecaram a fazer
audiencias e
vieram com libello cõtra
min pellas cullpas daquelle quão de
linhares e dei minha defessa
[44]
e ao
tempo de dar
as contraditas tinhame mãdado
dizer hum jorge mendez de
trancoso por
esta mao q
nomease por testa e a fernão
dous
dedos e outros
[45]
he quando foi a mesa
a nomeallos deixei fernão dous
dedos por
deRadeiro
[46]
e coando fui a nomear disseme
simão de saa
q testemunho daria por
min quem heu fizera livrar
he por
na Rua q não no quiria aceitar nem
ao
jorge mendez mas q me Requeria
da parte de jhu xpo e do santo offo
q
assi delle como das mais assi de dentro
como de fora com quem eu tinha in
teligencias as discubrise e falase
vdade
pa se fazer en tudo conprimẽto de
justa
porq tinha dado de perda a el Rei
mais de cem mil
cruzados he pa
que se tornasse a restaurar a casa
q
a tinha lancada a perder e tudo isto
passa
perante dous dedos.
[47]
he estando o feito
em termos
q me parecia q
estava pa
se dar sẽtenca me disse o alcaide
frco
dias
q era ja vindo simão de sa pera
qua.
[48]
e dahi a hũs dias mandarãme
chamar a mesa e fizeramme outras
preguntas
acerqua de hũa brisal gomez
de trancoso e
de hũa soares dahi mesmo
dizendo q
tambem as favorecera he lhes
trazia recados
[49]
e dahi a outros dias me
mandaram pera qua
[50]
e quãto a fonseca
como foi no carcer dahi a
pouco tempo
veo este velhaco dizerme que lhe dissera
q eu estava asi preso e que elle conhe
cia hum
almocreve seu inteado q
tratava em
lousa e que seus filhos lhe
mandavam algũas cousas
por elle e
que ho fazia por amor della o q podia e
q dous dedos tambem lho emcomẽdava
[51]
he eu lhe
disse que fazia bem que
hera molher onrada e que seria bem
paguo e
q eu tambem fizera o que
pudera por amor
della
[52]
e que lhe disse
que eu fora a trancoso ho sam
bartholo
meu pasado e que vira seus filhos e
estivera em sua casa
q estavão de sa
ude
[53]
e tambem por isto
apertão comigo
q este parece o confessou quãto ao
brandão
[54]
pouco tempo antes q ho
fazer
fora este mão me disse que fazia
por amor
della de sua mai digo o q po
dia e
q dous dedos lha ẽcomendava
mto
e que lhe dera hũa carta e
outros
recados pa ella
[55]
eu lhe disse que
fizesse
tudo o q pudesse
q senão arepender
disso
porq eu o mesmo fazia e que lhe dese
minhas ẽcomendas
[56]
e por tudo isto qua fui per
guntado.
[57]
he como aqui cheguei onde
agora
esta loguo veo o coadros e me fez duas
audias
dizendome
q de Lta graos
q merecesse de
penna nam avera cinquo e senão
q
doutra maneira seria digno de
mto castigo
[58]
e neste tempo foi o cardeal
pa
evra e elle
foi com elle e não tornou senão este
sam
joam pasado fez hum anno
[59]
e veo aqui
seu escrivão he me disse
q quisese
confessar a
vdade de minhas cullpas por
porq estava ja sabida
[60]
he
q não negaria
eu
q por hum official de casa me
mandar outro
official mtos escriptos e re
quados he a presos do carcer e
que
pois isto estava tam sabido
[61]
e eu
o não queria confessar
q no cabo to
maria a
q achase e com isto se foi.
[62]
e dahi a obra
dois dias soube como
heram cheguados estes aqui ambos
presos de que fiquei acerqua doudo com
paixão
[63]
e soube logo como este
velhaco
fora loguo a mesa he acabara de
fazer a comfissão
q fizera em
coimbra
[64]
e como acabou fomos chamados dous
dedos e
eu a reveses e loguo vieram
com libello contra nos digo contra elle
e
Artigos de nova rezam contra min
nomeandome mtas
cousas destas q aqui
diguo e dizendo
q eu hera mto mao
xpão he sintia mal da fee he me
mostrava
mto sospeito nella e emcobri
mtas
pas erradas nella he sendo tão ma
nifestas e q disenbrisse assi as
pas
q
foram presas como as de fora que
mandavão
recados e senão q fosse
castiguado cõ graves
pennas de drto he
com todo rigor
da justa
[65]
e estando assi em
estes termos este
agosto passado fez hum
ano foran se pa
evra e nan se falou
mais
the o presente
[66]
e dispois disto
me disse aqui hum padre preso
q
foi companheiro deste mao omẽ
que
alem de dizer de min muitas cousas
cullpara
mtas
pas
[67]
e que lhe parecerão
q seriam presas mais de 20
[68]
e
preguntando lhe o
padre pelo causo lhe
disse q despois
q ho botaram fora
do
offo se confessara a hum a hum frade
ho
qual ho não quisera absolver sẽ
primeiro ir cõfessar aquellas cousas
a
mesa e q não ouvesse medo que por
isso aprendese
porq o mesmo frade hiria
com elle a mesa
e faria com q o nam
prendesẽ e entam que elle
fora a mesa
e confessara algũas cousas e q
mãdarão
loguo qua estas cullpas e de qua fora
mandado
q viessem presos elle he dous de
dos e qua
cõfessara o mais e queira Ds
não disesse.
[70]
agora
vossa merce veja isto e mandeme
dizer
o que lhe parece he vejam la o q he
cumpre porq de min não tem mais
q o
q tiveram the o presente e dous dedos
assi o ha
de fazer e bem me podem
queimar e fazer o q
quiseren
e nosso sor livre a todos por quẽ he
dos
filhos da fonseca me pesa mto
como de
tudo o mais nosso sor lhes livre de
tudo
me mande reposta e por amor de nosso sor
q nam se enfade de minhas
emportunacois he petitorios e se
ouver algũa cousa
disso q ficou onde
o amiguo sabe
q não se dee nada a
esse diabo dessa molher
porq ella lhe
ficam mais de cem cruzados
em dro afora
pecas douro he de prata que avia
tirãdo
duas tacas q ficaram cõ o mesmo fato
he
com que bem se podera governar he
tudo mall empreguado
porq eu mãdei
dizer por meu filho
q nam lhe desem
nada senão algũ movell e
se outra
cousa fizeram agravarãome muito e
não pella perda inda
q não tenho nada
de meu senão por ser tão
mal empregado
e em quem tam mal o tem se isto comigo
e
porq estou nuu folgaria me fizesse
vir o
vestido que ficou s hũa roupeta e
hũas
calcas e hum gibão de ciron e quatro
ou cinquo varas de
frisa que ficaram pa
fazer hũa roupeta
pa este inverno e
panno de huso
pa hum gibão q
ho não
tenho he q
pa
q se daqui algũa ora
sair tenha com
q me cubra e
vosa merce o
mande por em sua casa ou onde lhe
parecer he
vosa merce não gaste
nada do seu
comiguo porq não me esta nessa
divida
e eu a
vosa merce eu tanta
q não pode mais ser
a qual nosso
sor lhe pagara por mim
nem me mande mais
nada do seu os
seis tostois q me mandou não os
ouvera
de tomar senam pera os dar a este por
tador ho fez
pa
q fora de
milhrmte
o que for
ncessario porq eu antes
quero passar
trabalho que quarcer de
ver recado de
vosa merce
[71]
ao
sor
fernão dous dedos
he a eitor filho e a todos na casa
me
fara merce mandar minhas encomẽ
das
[72]
he lhe faca hũa piticão e
a todos os
sres amiguos porq este
anno he pa fazer
caridade he mais as
pas
q aqui estão
q não se mantem doutra cousa
[73]
beijo
as mãos a
vosa merce
Edit as list • Representação em texto • Wordcloud • Representação em facsímile • Manuscript line view • Pageflow view