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Maarten Janssen, 2014-

CARDS7034

1821. Carta não autógrafa de Luís do Rego Barreto, Governador de Pernambuco, para Inácio da Costa Quintela, Ministro do Reino.

SummaryDepoimento do Governador de Pernambuco sobre a tentativa de assassinato de que foi vítima.
Author(s) Luís do Rego Barreto
Addressee(s) Inácio da Costa Quintela            
From Brasil, Pernambuco, Recife
To Portgal, Lisboa
Context

Este processo é sobre o atentado por parte dos liberais contra o Governador da Província de Pernambuco, Luís do Rego Barreto. Após esse acontecimento, vários presos foram levados para Lisboa e condenados por ajuntamentos sediciosos e premeditação de assassinatos. As cartas aqui transcritas, duas delas do próprio governador, dão a conhecer a situação conturbada de Pernambuco em 1821.

Do processo (fls. 11r-12v) consta também um pasquim oposicionista que circulava em Pernambuco e que tinha o seguinte texto (transcrição paleográfica): «Baiannos: o actual Governador desta Provincia não hé húmano hé um Monstro de iniquidades, que sem consideração a o Rei, nem a Patria tem devorado com os seos indignos consocios os povos, que governa. Elles tem experimentado todos os insultos, que se podem considerar; adultérios de predaçoens, mortandades, e roubos são os relevantes caracteres de gloria que o assignalão. E como há quem se atreva comparallo á Marco Aurélio, e a Tito? Lezongeiro, vil, infame, víbora, e raça de víbora sagrada, que sacerdotte não hés, o seo Heroe hé hum assela fero denominado flagelo de Deos. O Sacrilego abandóno do Templo dos Jezuitas dos Jezuitas hé huma sobeja prova, senão houvessem outras, desta verdade. A guerra do Bonito, a deploravel mortandade de mil inocentes que alí expirarão a ferro, e fogo, opprimidas familias exbulhadas de posse inveterada das suas propriedades: Soares Mete cabeça, Madureira, Belarmino, Patrone, Merme, e outros perpetradores de horrendos crimes contra Deos, contra o Rei, contra a Patria, contra a Relegião, são poderozas testemunhas, são execrandos notórios factos, que o qualificão de tirano. Todavia, Baiannos, os honrados leaes Pernambucanos antes querem acabar a vida que instalarem espontaneamente o Governo Provizional, que Portugal instalara, e vós a imitação delle. Seja, ou não divina a Constituição que as Naçoens eluminadas adoptão, que Portugal inculca, e vós confirmaes, os experimentados, Portuguezes a considerão como hum caudalozo rio de malles que depois de engrossar alagam submergindo toda a face da terra, os Soberanos, os Reis, e mesmo permitasse-me essa expressão a Santa Religião dos Nossos Pais. Socegai Pernambucanos, se Luiz do Rego Barretto vos oprime cedo acabará sua do dominação e despotismo. O braço direito, e esquerdo da Impia estatua já se quebrarão, sua esquentada cabeça já não governa, e as bazes sobre que ella discança pouco a pouco se estão deslocando. Lá, João, Cacemiro, e Soares já não influem, Patrone está rendido de huma verilha resta o sanhudo devulento Merme, que cedo acabará a vida, por ser inimigo jurado de Deos. Socegai Pernambucanos que não melhorareis de sorte, nem de fortuna com o estabelecimento da inculcada regeneradora Constituição, que as maiores auctoridades desta capital por satisfazerem seos fins sinistros a maneira de cegos vos conduzirão, sem concelho, nem deliberação a pedir a El Rei Nosso Senhor no infausto dia trez do corrente Março. Socegai Pernambucános, a sombra das sabias leis de Sua Magestade. Elle acaba de soltar generozamente vossos Pais, filhos, Irmãos, Parentes, Compatreotas, e amigos das horridas masmorras, e prezoens em que jazião, perdoando-lhes outros semelhantes crimes cometidos outra hora sem sem o involucro da constituição. Suplicai humildemente a Deos que torne tenebrozo como a nocte escura o aziago dia dois de Abril que se segue. Oh dor!.. N'esse tremendo dia vereis constetuidos mosntruozos Governadores sem morál, nem relegião, enemigos do Rei, e da Patrea, enfames Mações vindos do inferno, subverdores da boa ordem civil, poletica e relegioza. Praza a Deos, que a verdade seja ouvida!...Baiannos, vos não tendes honra, nem estimação...

Recife vinte e seis de Março de mil octocentose vinte e hum»

Support duas folhas de papel dobradas, escritas nas seis primeiras faces.
Archival Institution Arquivo Nacional da Torre do Tombo
Repository Casa da Suplicação
Collection Feitos Findos, Processos-Crime
Archival Reference Letra F, Maço 65, Número 1, Caixa 130, Caderno 1
Folios 4r-6v
Socio-Historical Keywords Rita Marquilhas
Transcription Ana Rita Guilherme
Main Revision Rita Marquilhas
Contextualization Ana Rita Guilherme
Standardization Rita Marquilhas
Transcription date2007

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Illmo e Exmo Senhor

Tenho a honra de enviar a V Exa para que tenha a bondade de a fazer prezente a S Mage a relação incluza de presos que por occasião do soccesso da noite de 21 do passado, sou obrigado a remetter para essa Corte á disposição de sua Magestade.

Dos documentos que a acompanhão os meus primeiros officios dirigidos pelo Paquete, e dos que acompanhão ás 2as Vias dos mesmos, que agora tenho a honra de remetter a S Mage e ao congresso das Cortes Nacionais, bem claro se mostra, que estas prisões posto que arbitrarias, forão indispensaveis; e felismente evitarão huma cedição furiosa que esteve a ponto de rebentar a noticia do assassinio perpetrado contra mim. O mesmo Ouvidor da Comarca julgou indispensavel esta medida, como do officio que me dirigio no dia 22 e que por copia tãobem remetti, consta. O Ministro, e os Chefes dos Corpos armados, que bem virão qual era o espirito que principiava a desenvolver-se pedirão até a remossão destes indivíduos sem processo, nem devassa, pelas razões que alegão e que me parecerão convenientes. Sobretudo outra razão muito mais poderoza tive que foi evitar que os Corpos armados se arranjassem a hũa sublevação com o pretexto de vingar-me. As primeiras ordens que dei quando me vi mortalmente firido forão que se não vingasse a minha morte, e que se sustentasse a paz na Povoação: bem custarão ellas a exe a executar-se; porem felismente os soldados se contiverão graças a disciplina em que se achão. Temi logo o que sei que sempre soccede: as melhores Tropas do mundo em se insubordinando meia hora, não se podem mais conter, e precizo ou dissolvellas logo, ou mudalas de lugar, ou po-las entre outras mais numerozas e bem regidas. Estamos cercados de traidores e assassinos, era a vos que se ouvia nos Quarteis. Os negociantes, o povo Europeo e muitos homens do paiz, que amão a tranquillidade publica, dizião o mesmo, e apontarão como inimigos da Ordem todos os indivíduos que vierão soltos da Bahia: dizia-se claramente que tinhão elles, e seus soccios concertado o plano de darme a morte; e que a esta se segueria a dos Europeos aqui estabelecidos; apparecião cartas, que estas vozes confirmarão, e eu me vi obrigado a consentir na prizão dos indivíduos constantes da incluza relação, e em mais alguns Millitares, que apezar da opinião contraria, destinei para a Guarnição da Ilha de Fernando de Noronha.

Como levo referido era a opinião publica a que condennava estes homens: elles se havião feito espectaveis por seus clamores, e ainda mais pela aversão que mostrarão aos Europeos aqui estabelecidos, em razão da devassa de 1817. Depois que os prezos da Bahia chegarão, esta aversão subio de ponto: muitos dos julgados testemunhas da Alçada forão insultados em publico, ameaçados; e os dias em lugar de se esfriarem com o tempo, tomarão cada dia maior Corpo.

Eu julguei do meu dever conter os dous partidos nos seus limites: tratei como devia os prezos, más dezaprovei a conducta de muitos. Estes, e os seus adherentes na verdade opinavão por a minha expulsão daqui, clamavão que o meu governo era dispotico, e que se percizava de hũa Junta: quando eu offereci mudar o dito Governo ninguem assentio a mudança, e todos os homens estabelecidos ,Negociantes, Camera, Deputados da Provincia, Ministros e Militares, assentarão que o novo Governo era requerido a fim de se poderem contentar as vinganças do partido dos independentes, e accarretar ao paiz novas desventuras. Eis aqui á razão por que os individuos da Relação incluza erão summamente mal vistos; e tanto que pertendendo eu por motivos de compaixão poupar a alguns o incommodo de hiren a Lisboa com condição de sahirem daqui, não o pude conseguir as Tropas principiarão a amotinar-se, o povo julgou-se rendido, e não tive remedio senão anunciar que o voato era falço por não ter o desgosto de ceder.

Igual commução se principiou no dia 9 por eu mandar inspeccionar alguns prezos, que se dezião doentes mas que a commissão achou em estado de puderem fazer viagem.

Se se exceptuarem os individuos comprehendidos na devassa a que se procedeo e de que mando certidão, e que se acharão complices em projectarem o meu assassinio, todos os outros forão prezos por se haverem mostrado fautores de opiniões subversivas, e contrarias ao que, se julgou conducente para a manutenção da Ordem na Provincia.

Eu não duvido que muitos delles inocentes estejão, mas foi forzoso ceder pelos motivos ponderados. O certo contudo que todos e ainda alguns mais hão sido diversas vezes accusados de turbulentos, e promotores de cidicções; o certo que o terrivel fora, e mata marinheiro (nome com que desprezivelmente aqui se designão os Europeos) e que ressoou funestamente em 1817, foi agora repetido; e que o Governo de Junta Provizoria aclamada pelos amantes da novidade pareçe ser dezejado para a exclusão dos que não forem filhos do paiz.

Como quer que seja eu offereci este governo attendendo as circunstancias geraes do Brazil, e me foi regeitado attendendo-se as circunstancias locaes, que disse alguãs vezes serem extraordinarias; porque os habitantes da Provincia se dividem em accusadores, e accusados. Nada pois direi de cada hum dos individuos em particular: a aggressão foi directamente feita a minha pessôa: ve-se ao menos que a opinião da população não me era contraria, e isto creio que de toda a evidencia; esta aggressão não custou sangue como se poderia bem esperar; tendo eu as Tropas declaradas altamente por mim, como tãobem he claro custa a remossão de alguns individuos, indespensaveis para que o resto fique sucegado; e esta mesma remossão dezejada mais pela opinião publica do que por mim.

Que esses individuos que vão se tem feito nimiamente odiozos inegavel; que se declararão Chefes de Clube, e cabeças de motim, ou seus soccios tãobem certo: do mais pessoalmente nada contra elles tenho, e digo em geral que conveniente que taes homens, em tempo de mudanças, e novas medidas, não tenhão influencia alguã; porque perturbadores, e tuburlentos por caracter necessariamente serão damnozos emquanto o sistema não tomar a dezejada polidez; e estabelidade.

Eis aqui o quanto se me offerece dizer a V Exa acressentando que tenho em vista tomar alguãs medidas para considerar quanto for possivel, os partidos, e sostentar a páz athe a chegada de ordens, que espero sobre a forma do governo que se deva adoptar nestas Provincias, aonde me dão que receiar as differentes castas, e cores, e esta emmensa multidão de gente barbara, perversa, e que mal obdece a força comtudo não me pertence ir adiantar reflexões sobre estas materias, que não são da minha competencia.

Deos guarde a V Exa ms as Recife de Per-nambuco em 11 de Agosto de 1821.

Ilmo Exmo Senhor Ignacio da Costa Quintella. Luiz do Rego Barretto

Legenda:

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