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Maarten Janssen, 2014-

CARDS2164

1776. Carta de Joaquim de Foios para José Anastácio da Cunha, matemático e poeta.

Autor(es)

Joaquim de Foios      

Destinatario(s)

José Anastácio da Cunha                        

Resumen

Frei Joaquim de Foios elogia a obra do destinatário. A Inquisição resumiu assim o conteúdo do documento: "Carta de Joaquim de Foyos datada em Lisboa a 17 de julho de 1772 em que lhe reprehende de traduzir a oração universal de Pope que contem cousas que não cabem no homem cristão esta faz algua carga ao R[éu]".
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Sr Jozè Anastasio da Cunha.

Não lhe sei encarecer, o qto, muito tempo, desejava boas noti-cias suas. O Tenente João Baptista, em que VM tem grande admirador, e hum amigo, que conhece e sabe avali-ar o seu merecimo foi quem me deu noticias individuaes; e isto mto por acaso, porque eu não tinha conhecimo algum do tal João Bapta mas vindo aqui à livraria desta casa, me fallou na sua Arithmetica Universal, e me repetio alguns versos, dos que VM tinha feito. de-pois me trouxe a Arithmetica e os versos, os quaes a-ctualme parão na ma mão. Qto a confissão, que VM faz dos seus erros, creyo que he em pte necessaria, e em parte não. E primeirame pelo que toca aos versos, prescindindo da materia, não são in-dignos de apparecer, porque em todos elles são os pensa-mtos verdadeiros, e muito frequenteme nobres e poeti-cos; assim a huns sustenta os a verdade, a outros levan-ta os a novidade, a belleza, e ainda a sublimide. A Ode sobre a Empresa da Academia de Valencia he hum Dithyrambo, de que gostei muito. Os Heroicos, que tem por epigraphe Veritati sacrum contem muita coiza boa e verdadeirame poetica. Porem a materia de quasi todos os outros versos não sei eu, nem saberá ninguem desculpar corrompe e perde não o Christão, mas ate o homem. Sim estão de coizas deste genero cheyas as obras dos poetas, mas a ninguem salvão os peccados dos outros. A oração universal de Pope contem coizas, que nem cabem no homem Christão. Vejo que VM ha de dizer, que brincava, como poeta; porem qdo tornar a trazer a memoria aquelles bons principios, que VM algum dia teve, e pelos quaes escrupulizava ate de abraçar aquelle genero de vida, que não de si máo, mas estava sogeito a alguns perigos de consciencia; qdo digo eu, tornar a fazer re-flexão sobre tão bons principios, conhecerá com o claro enten-dimo que tem, que fez mal. Porem basta disto, e perdoe toda a molestia, que lhe tenha cauzado. Da sua Arithmetica não sou eu, nem posso ser juiz competente. Eu não aprendi de Geometria mais que aquella, que julguei preciza para me dar a clareza o entendimo, segurança no raciocionio, e methodo. De calculo toquei tanto, qto era necessa-rio pa esta mesma Geometria. Assim não passei mto da Algebra e da Geometria Elementar. Donde pode estar certo, que aquillo, que vou a dizer, não de homem, que enten-da a materia, mas de quem deseja satisfazer de algum modo ao que me pede na sua carta. Isto supposto, digo, que a sua obra he de hum Homem, que tem feito progressos grandes no calculo; e suppostos ogs poucos subsidios, que em Portugal pa o adiantamo das sciencias Mathema-ticas, cuido, que disse pouco em dizer grandes. Dois livros Livros que eu vi mostrão, que a obra toda conterá mtas verdades e muitos conhecimos que atè agora estavão ocultos a todos os nossos Naturaes, e que entre nós se vay chegando aonde mto tempo chegarão as outras naçoens da Europa. Do calculo costumava eu dizer, que era semente, que ou não nacia absolutame ou ao menos não pegava bem, nem se lograva no nosso terreno; mas com os conhecimos a que VM tem chegado, e creyo, que à sua imitação chegarão outros, mudarei de linguaguem. Este o juizo, que faço da sua obra qto ao seu merecimo absoluto, e a sciencia, que mostra em seu autor: não o faço tão favoravel pelo merecimo que diz respeito aos leitores, e a instrução, que nella podem ter principalme os principiantes, para quem ella se quer inculcar; porque a acho summame conciza, e por conse-quencia quasi no mesmo gráo difficultosa. Em dois li-vros pequenos chega VM as Equaçoens do quarto gráo, começando dos primeiros elementos: ha obras extensas, como a Arithmetica dos Geometras de Deidier, que sego ma lembrança, não passão das Equaçoens do 3o Huma obra elementar he necessario que se detenha em cada huma huma das coizas, e que deduzindo humas das outras não com rigor de demonstração, senão tambem com clareza e evidencia. o que se não pode fazer em marcha mto rapida. Sei que Descartes censurando o de fazer conciza a sua Geometria respondeo, que não tinha empenho de compor obras grandes nem que as suas fossem intendidas de idiotas; porem aquelle Filosofo era hum espirito de invenção raro, e escrevia não para expor o que se sabia das sciencias, mas para descubrir o que se ignorava ainda nellas. Este juizo, que eu tinha feito da sua Arithm e communicado ao Tene João Bapta vi que era o mesmo, que depois formou hum tal P. Monteiro, que aqui , e de cuja Mathematica ouço dizer bem. eu não o conheço. Estimarei que nestes novos estu-dos da Universide o empreguem a VM porque me persua-do, que ha de ficar o publico bem servido, e a VM tiramno da vida mais miseravel, que eu considero, que he a de soldado. João Baptista fazlhe neste ponto todos os bons offos de grande amigo. Tinha mto mais que dizer, mas for-çoso acabar, se fizer primeiro huma advertencia, que nacerá de escrupulo, e não seria necessaria, e he, que a verdade dos pensamos de que fallo acima, he a verdade precizame practica. Ds gde a VM ms as

Lisboa 17 de Julho de 1776 De VM Criado, amo e apaixonado Joaqm de Foyos

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