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Maarten Janssen, 2014-

Visualização das frases

[1788-1790]. Carta de Nicolau de Santo Agostinho, padre, para Ana Vitória.

ResumoO autor escreve a Ana Vitória pedindo desculpas pela demora, justificando esta com os atrasos do correio por causa das condições meteorológicas e com o seu serviço de padre, que lhe deixava pouco tempo para a escrita.
Autor(es) Nicolau de Santo Agostinho
Destinatário(s) Ana Vitória            
De Portugal, Faro
Para Portugal, Setúbal
Contexto

O mestre frei Nicolau de Santo Agostinho foi acusado pela Inquisição de Lisboa por ter solicitado a Ana Vitória, a destinatária das suas 13 cartas. Neste processo, diz-se que o padre juntou por várias vezes a sua cara à de Ana Vitória e que também lhe apertara a mão (fl. 2r). Como estas ações eram feitas no confessionário, e como assim se comungava sem ter efetuado a confissão, chegariam estas para formar delito. A denúncia formal de Ana Vitória surge no fólio 3r e contém o seguinte (edição e pontuação normalizadas, abreviaturas expandidas): "Para satisfazer a Lei da Santa Inquisição denuncio o Padre Manuel Francisco Nicolau de Santo Agostinho Provincial de São Francisco, o qual no confessionário por vezes uniu a sua cara com a minha de propósito e me apertou a mão, mas não passou a mais. Eu, Ana Vitória, filha de António Pinto, marítimo, e vivo com meu pai em Setúbal, na freguesia de Nossa Senhora da Anunciada. 27 de junho de 1789...". Apesar de ser acusado naquele testemunho de Ana Vitória, nos interrogatórios (fl. 8r e seguintes) a religiosa afirma não desconfiar de segundas intenções nas sessões de confissão. Afirma também que o padre sempre se havia comportado respeitosa e honestamente, mesmo tendo estado a sós com ela diversas vezes. Comprova essa conduta, até porque no domínio privado da correspondência o padre demonstra ter para com ela um bom comportamento. Ana Vitória disse ter feito o documento por sentir que devia certificar-se de que aquela ação de juntar a cara não era ilícita (fl. 8v), depois de ter comentado este facto com outro frei e este lhe ter dito que deveria denunciar, mas que ele próprio não tinha má opinião das ações do frei Nicolau. Várias testemunhas no bairro do Troino, onde morava a solicitada, foram inquiridas e todas atestaram a boa-fé e conduta de Ana Vitória, pelo que a Inquisição acreditou na palavra da mesma. Cinco testemunhas ligadas à Ordem de São Francisco foram também inquiridas e todas elas atestam a boa-fé e conduta do mestre frei Nicolau de Santo Agostinho, alegando que apenas os religiosos mais dignos conseguiriam o cargo de vigário confessor das freiras do Convento de Jesus em Setúbal (fl. 45r). Segundo os dados de catalogação deste processo por parte dos serviços do Arquivo Nacional da Torre do Tombo, o documento está incompleto.

Suporte meia folha de papel não dobrada escrita no rosto.
Arquivo Arquivo Nacional da Torre do Tombo
Repository Tribunal do Santo Ofício
Fundo Inquisição de Lisboa
Cota arquivística Processo 2817
Fólios 23r
Online Facsimile http://digitarq.arquivos.pt/details?id=2302748
Transcrição Mariana Gomes
Contextualização Mariana Gomes
Modernização Catarina Carvalheiro
Anotação POS Clara Pinto, Catarina Carvalheiro
Data da transcrição2014

Texto: -


[1]
J M J,
[2]
Minha filha em Jezu Christo
[3]
este Sr te assista sempre com a sua divina graça e te mto do seu amor; pa q fortalecida com este possas levar os trabalhos, q elle mesmo te permita.
[4]
Sinto q por meu Respeito tenhas tido tanta mortificação, e afli-ção;
[5]
porem entendo q ja estarás aliviada do cuido q te oprimia; porq ha quinze dias q te escrevi, e ja hades estar entregue da carta, e descansada.
[6]
A grande demora dos Correios, os tempos de chuva, q não permitem, q elles cheguem a tempo de se poder escrever, ao ter mtas vezes, q fazer na minha obrigação he a Cauza destas demoras.
[7]
Na tua me dizes q tem havido embrulhadas a respto de mim,
[8]
eu não sei de couza alguma, nem de tal te-nho noticia; porq ainda q a Religioza, q eu dirigia me deixou, e tomou outro, da minha parte não houve nada, nem sei q haja couza de turbação, se me não querem dizer.
[9]
Tãobem hum Donato q se confessava Comigo me deixou, e o Capellão Fr Jozé he q con-tinua a escreverme, o qual tãobem me consta q tem estado com cuido em mim por- falta de noticias minhas;
[10]
porem tãobem ja ha de estar descansado; porq por elle he q eu te escrevi, e te escrevo tãobem esta; porq esse he firme, e não se ha de mudar com tanta facilide
[11]
Eu graças a ds estou bom, e tenho passado bem nesta terra,
[12]
e as Religiozas estão mto satisfeitas, e contentes comigo,
[13]
e ja tenho seis a minha conta, e com esperanças de mais.
[14]
A dezoito do mez passado houve huma entrada, e ámanhã Vespera de São Jozé ha outra, e estão mais tres pa entrar, com q não falta q fazer, e em q me ocupar, mas o q trabalho he qdo morrem.
[15]
Dezejo q vás continuando as Confissoens, e Comunhoens ainda q com morti-ficação, e trabalho, mas tudo he precizo pa agradar a N Sr e alcançar o Ceo.
[16]
Não te descuides da sta Oração; pois esta he a q fortaleza a Alma pa os trabalhos, e pa vencer as tentaçoens.
[17]
Conserva sempre no Coração hum ardente dezejo de agradar em tudo a Ds e de lhe fazer em tudo a vonte
[18]
e confia mto neste sr e ama-o bem deveras, e com todo o Coração, com toda a alma, e com todas as tuas forças, q ainda q são poucas, o mesmo amor tas aumentará.
[19]
Sofre Com paciencia tudo o q se te offerecer de mortificação, e conformate em tudo com a divina vonte
[20]
Reziste com valentia a todas as tentaçoens, e prosegue com valor no serviço de Ds a qm peço me encomendes,
[21]
e o mesmo te gde como mto e mto dezejo.
[22]
Faro dezassete de Março.
[23]
Fr Nicoláo.
[24]
Recomendame a Quiteria.

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