Illustrissimos, e
Reverendissimos Senhores
As minhas Lagrimas, que de Sangue Choro, são a Cauza de segunda
vêz por aos pês de
Vossas Illustrissimas â mimha queixa, e aflicão, que me assiste; não
por me Considerar
ha témpo de hum anno prezo sem culpa (que esta
serve de alivio â pena) mas sô de me ver desfavorecido,
e desemparado
e não ter, que gastar, em hũa prizão tão dilatada; onde estou morrendo de
fome e
padeçendo infinitas miserias, e necessidades sem hum Princepe e Pastor
da Santa Madre
Igreja; se doér da sua Consçiençia, nem haver Charidade e
Commiseração de hũa sua
pobre ovelha de seu Rebanho, que tanto Cústô a
JESUS' christo: antes do grande odio, que
metem, em me Reter em hũa
prizão, pareçe dezejar tragarme, sem haver outro motivo, mais que o
que ja
a Vossas Illustrissimas Com as mesmas Lagrimas, Representey;
expondome este Prin
cepe â Cénsura de delinquente com notaveis dimminuicôes no meu
credito, fama,
e honra; sendo tudo gravissimos Cazos de Restituição, de que
este Princepe, fâz pouca Conta,
dandome occasião â perderme, e desesperar
em ver me não defere, e em ver me não quer dar audiençia â
minha
justica, e quererme imputar hum caso, que sabe muito bem, estou nelle
innocente, Como tambem testemunha toda esta terra; e he querer
incobrir Com a minha pobre capa
os delitos de hum frade filho de hum
seu criado, que andava amancebado Com duas
Irmâns suas: e por saber
que eu tenho em meu poder desta verdade; a clareza,
me não quiz nunca
admmittir a Livramento: Razão por que aggravey
para a Coroa de Sua Magestade
do Acordâo incluso, virão
Vossas Illustrissimas no Conhecimento da sem Razão
Com
que padeço innoçente: não obstante, para fazer o cazó feo, dizer o
vigario geral, que eu tinha Cúlpas de Rapto
stupro, e incesto; o que tudo he falço e
supposto: Como hey de mostrar mais claro que a
lux do mesmo sol: pois o
mesmo Prelado lhe deu Licença, e as mandou por hum Primo para Lisboa, e
lhe
deo todo o dinheiro para os gastos, e o mais necessario, sendo tudo nomes de
fevereiro
do anno passado: E eu estava nesta terra e sô no mes de Mayo, que
fui
para essa Unidade; e me despedi do seu
servico, por me não deixar ir formar,
Logo me teve odio, e Raiva, que em hum Princepe
Catholico se tem muito
estranhado nesta
terra: Como tambem injustamente de me privar do
exerçiçio e esmola da minha missa por eu seguir este caminho do
aggro para
conseguir a minha Liberdade:
que tenho Captiva; dipois de ter feito Com
a paçiençia actos
meritorios no dicurso de hum anno de prizâo: que he
bastante teyma ou Omnipotençia
de hum Princepe da Igreja nossa may, que
he pia: Inda no caso,
que Como grande e mizeravel pecador, que sou;
Commettesse, não sô
esses crimes affectados, e suppostos: mas ainda outros mayores!
Mas he digno de se notar
que sabendo o Senhor Prelado evidentemente, a
minha innocençia, e
toda a mera verdade; não desista da sua teyma, e paixão, para dar
a entender,
que obrou bem em me mandar prender; o que todos conhecem o contrario.
Dou a Vossas Illustrissimas; esta Conta; não para me justificar:
porque me confesso, por
indigno Mynistro de JESUS christo: mas sim sô para mayor
clareza da
verdade; que a Vossas Illustrissimas Representey: E como este Prelado estâ duro, e não quiz obedeçer
a
primeira Carta Rogatória; estou esperando segunda, para se dar Conta a El Rey, e se
tomar
neste negocio assento; a quem em mão propria se hão de entregar os
melhores
documentos, manifestaivos de todas estas tractadas, e de toda a pura verdade
Como
bem de me mandar prender de poder, e da parte
do mesmo Rey enganadamente; pellos
Criados do Conde de Santiago, Com desprezo
do habito Saçerdotal.
A vista do que, Como me acho pobre e sem a esmola da minha
missa unico
Remedio da minha vida, e alma; não tendo outro; senão Recorrer â Caridade
de
Vossas Illustrissimas para que me favoreção; pois me vejo
tam dezemparado, que tenho vendido ate
os proprios Livros, e factos, e hey
de vender a camisa para aclarar a minha verdade
porque
sou hum clerigo honrado, e de vergonha; que nunca imaginey, chegasse a
semelhante estado: e assim se me não fizerem justiça,
estou em termos de dezesperar, e
matarme
por minhas proprias mãos; porque me he melhor morrer mil vezes, do que
viver
sem honra; e se Deos me não dezempárara com a sua graça e seus
não sey que fezerã; mas hey de ter
paciençia emquanto elle for servido, e hey de fazer
da
necessidade virtude, sem ser descredito da
minha pessoa pedir publicamente porque
o mesmo Senhor nos insinou
isto mesmo: A elle pedirey Continuamente pella vida
e saude de Vossas Illustrissimas; e augmento, e conservação de tão pio, tam Recto, e tão Santo
Tribunal
da nossa santa fe Catholica; e que
guarde por infinitos seculos. Aljube de
Braga
25 de Julho de 1722
Aos pês de Vossas Illustrissimas, e Reverdissimas
Humilde subdito, e mais
obediente Servo
Thome da Motta Barretto