PSCR0047 1576. Carta de Julião da Costa, oficial da Coroa, para Maria de Almada, sua mulher.
Resumo O autor mostra-se confiante quanto à entrada da filha no mosteiro de Chelas. Além disso, dá notícias da sua estada na Índia e faz recomendações à destinatária, sua mulher.
Autor(es)
Julião da Costa
Destinatário(s)
Maria de Almada
De
Índia, Cochim
Para
Portugal, Lisboa
Contexto Trata-se do processo de admissão no Mosteiro de Chelas de Francisca da Costa, posteriormente chamada de Francisca de Cristo. Deste processo, constam duas cartas do pai, Julião da Costa, oficial da coroa no Estado da Índia. Nelas, o autor dá as suas recomendações sobre a entrada da filha no mosteiro, além de outras notícias. A pedido do juiz do cível, ambas as cartas de Julião da Costa foram autenticadas por testemunhas.
Suporte
quatro folhas de papel escritas em ambas as faces.
Arquivo
Arquivo Nacional da Torre do Tombo
Repository
Mosteiro de Chelas
Cota arquivística
Maço 78, Documento 1541
Fólios
[17]r-[20]v
Socio-Historical Keywords
Tiago Machado de Castro
Transcrição
Tiago Machado de Castro
Revisão principal
Catarina Carvalheiro
Modernização
Catarina Carvalheiro
Anotação POS
Clara Pinto, Catarina Carvalheiro
Data da transcrição 2013
Opções de representação
Texto : Transcrição Edição Variante Modernização - Mostrar : Cores Formatação <pb> <lb> Imagens - Etiquetas : Classe de palavra POS detalhado Lemma Notas linguísticas
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Aa Snrã ma d allmada en lixa mi
nha senho rã – d arsea en casa
do sõr bispo don mell d allma
da ou ao sõr ãto soares escri
vão da caza da India a porta
crus
1a va
de Jullião da costa
Snra
por via da Ilha da madra e do brazill lhe escrevi o q fizera por mill viaz
se por tãotas me fora posivell e o q agora mais sinto e não no
poder fazer senão de ano en anno Ate q noso sor me tire
deste cativeiro – ben creio snra q estareis esperãodo novas
de minha viajen e saude as qs são fazerme noso sor nella
mtas ms e darnos mto viajen e con saude de todos sen nos
morer pa nenhũa e viemos A goa en sinqo mezes e mo primro
q todas as naos / ainda q não tomamos mosaĩbique mas não
nos foi nesesario porq nos não falltou nada por aver senpre
mta agoa pa os pobres e a mĩ sobejou mta e galinhas e mtas
couzas mais e conpartir con mtos q tinhão nesesidade ho q foi
cauza de noso sor mo acresintar e serto asin paresia –
fallar en minhas saudades quero escuzar pois e serto q cada hũ
de nos por sy pode jullgar ho q o outro podia sentir e se
tãoto A de custar apartarse A allma da carne como a mĩ
custou ese apartamto des aqui e con mta rezão comesso a sẽtir
e chorar esa teribill ora q lhe pormeto q en tall estremo
me pos minha vinda q de todo estive detriminado A não
vir a esta terra e deixar fazda e tudo o mais q della
pertendia por sra não deixar a vos mas teve tãota forssa
a nesesidade pa comigo q me fez negar amor e vontade não
q en mĩ se pdese nenhũa destas couzas q digo mas
por
q vivemos de manra neste mũdo q pa nelle viver e ne
sesario deixar ho omẽ liberdade e võtade propia e entregarse
no q elle pede e Requere e porq isto não va mais por diãte
e não mate a anbos escuzo de dizer couzas en q me deleitava
porq ho tenho por milhor remedio q dizello pois por ora se
não escuza viver apartado de vossa conpanhia de mĩ tão
dezejada de mto pouqa idade A q furtuna me foi me foi
senpre tão contraira q me não nada do q tãoto dezeJava
q ben lhe poso chamar nada pois q eses pouqos diaz q tive con
vosqo forão senpre tão inquietos e sen repouzo –
lenbrame q deixei A meus fos A qn mto queria cujas lenbransas
me dão tãoto sentimto q ho não posso dizer mas coando chego sra
as vossas – acabo e não vivo mais porq estas são as q de tudo
me tirão os sentidos ho ser e a vida e nesta pena viverei en
coãoto viver vos não vir – mãodayme sra mtas novas de vosa
saude e pa pois dellas vivo e de meu fo luis d allmada
e se vay Ja ao estudo q na escolla ja não fallo – e asin
as peso particullarmte de minha fa qn mais trago no sentido
e mais trabalho me da porq he molher e algũ tãoto de
sua condisão della quero as novas mto meudamte q depois das
vosas – so nellas espero descansar se de meu gosto forẽ coãoto
A ma preta ellas mas
mãodara de sy q idade ten pa isso
mas todavia as quero e dezejo posto q nos não conhessamos
ella e eu –
quero deixar lenbransas q matão e não sven por ora de mais
e vir a outras en qn espero restaurar parte de meus des
gostos e saudades – A ql he pidirvos sra q conformemos a ãbos
nesta minha võtade pois o fezistes senpre no mais o q vos
sra pesso por saber q tivestes senpre A mesma võtade –
q e daremos A nossa fa A parte de ma manella a quẽ
xpo dise q escolhera A milhor parte en deixar tudo po tornar
a elle e q se ds foi svido de trazer ese dinhro da mina
q a metaĩs freira pois isto e o sto e bon e ahi pode ganhar
o paraizo q se ben lhe queremos isto e o q lhe devemos de dezejar
pois e isto e o q agora mais dezejo pa refugio de meus des
gostos ho q con ella gastardes quero q va A minha cõta e
escrevemo sra porq logo vos mãodarei outro tãoto pa cõ
prardes en fazda e pa iso o buscarei e me enpenharei e le
varei mto gosto en o fazer – porq sendo isto como digo me
poderme ey ir pa ese ne reino como acabar o meu cargo de
ormũz e d outra manra sera nesesario andar qua mtos anos
pa poder partir con minha fa como e rezão ho q não podera
ser senão A custa do q digo e con a vida senpre mui
arisquada – pesovos sra q ponhais diante A vos e a vosa fa
os trabalhos en q tendes e os q pasastes depois depois q con
vosqo cazey e q iso e o mais baste pa vos mover ao q digo
põde de tras saudades e auzensia de vosa fa q não saira
da terra nen Ira sobre o mar / e a mĩ sera iso parte de
de me levar ds mto sedo a ese reino q pois sra sofreis – a
minha auzensia e por tãotos anos con a vida tão
arisquada por amor de vos – justo he q sofraes A de vosa fa –
tendo A tão perto e con a vida tão segura – fiqo mui con
fiado q na reposta destas me escrevera q são ja meus deze
jos conpridos e fiqa minha fa no mostro q sobre estas espe
rãsas vou ja vivendo e descansando e o digo a meus amigos
todos q tenho hũa fa freira / ao snor bpo pode pidir de
minha parte toda A ajuda e favor pa isto e pa o mais
q tall amor e võtade me mostrou senpre q creio delle
q q en tudo o q se oferesser me fara mtas ms coanto mais
en couza tão justa e de sviso de ds e o mesmo fara don Jo
A quen pode acupar en tudo –
Eu sra conprey qa hũs moinhos por sinqoenta mill rs q rẽden
sesenta alqueires de trigo e não sei coantas galinhas e
pagão de foro quinze alqueires como como vera plas
escreturas q mãodo por tres vias – os qs conprei A hũ
paullo cabrall cunhado de po frz tronqro do arsebpo pa quẽ
vão cartas con estas minhas e nesesario q antes q lhe
mãoden as cartas mãodeis chamar po frz mell frz e lhe
digaes q Roge A po frz q aja esta venda por boa e lhe
dares A cartas q vão pa elle e pa po frz e pidirão A po
frz os titulos e escreturas dos moinhos – e asĩ e nesesario
saber quen he o senhorio dos moinhos pa q lhe rogen pa
algũa pa q os não queira plo presso – diz este mãosebo
q ho molro e obrigado A trazer este trigo A lixa e
q ao mesmo molro arendou os moinhos po este preso po
nove anos con hũa tera q ten os moinhos po ẽtão a conprei
con tudo o mais q ptencer aos moinhos – os qs nove anos
diz q se acabão Agora se lhe la pareser ben darlho plo
presso fasao ho q tudo sera p conselho do lesensiado
fernão duarte – outro irmão deste paulo cabrall e
cunhado de po frz anda qa e ten hũas teras de pão
en punos as qs me quer vender saibão de po frz o q
renden e o q vallen pa lhas conprar –
pesovos sra q não aja couza q fos fasa ver nen ouvir novas de
pesoas aqui con tãota rezão o deveis Asi de fazer e não bastẽ
pa iso apostolos nen outras pas pa acabarẽ convosqo couza
q en tãoto sentirey valha eu e a rezão nisto con ella
mais q todos nen baste poren ha nesesidades pa lhes valer
p sỹ nen p outrẽ llenbrelhe q não quis eu nũqa valer
ao prezo sendo minha may prezẽte q me a mỹ mto magoava
ãtes tinha gosto de lhes ver trabalhos e nessesidas eu
dando q iso q iso seria parte se enmendar e chegar pa
ds e deixar o diabo
Eu sra não entro no meu cargo de ormũz senão daqui a tres A dous
anos porq ho q serve não entrou qoando coando ouvera
por hũ enbarasso q teve – do q fiquei tall q endey pder
o sizo mas espero en ds q ho ey de svir e me A de fazer
mtas ms pello q lhe vos sra mereses e eu vos pormeto
q q tãoto q ho acabar me va logo pa vos asin ds me
sallve porq este e a minha võtade e dezejo e nisto
podeis viver sigura e confiada –
lenbrarvos sra q A nĩguen custa mais ho dinhro q A mĩ tenho
por escuzado porq o sabeis pello q pasães q ben basta ser elle
parte de vos deixar nesa terra soo – q me custou como q se
me arãocara a allma do corpo e pa tãoto tenpo pa como
digo me custar mais mais q A todos ainda q deixen mo
lher e fos porq pa o sentir tenho eu mais rezões q todos
do q vos sra soẽs boa testemunha isto digo somte pa
qte que se alguen vos pidir o voso lhe ponhaes o q digo diante
e a vos pa ho não dardes – e coanto ao q for nesesario
pa vosa pa e caza lhe peso e rogo por vida minha q ho
gaste mto largamte q eu pa iso quero o dinhro e não pa
outra couza e fazendo o asĩ averei q folgaes de fazer
sra o q vos pesso q espero en ds q me A de dar vida e q vos
não A de falltar por iso en nenhũa couza re
seberei mor gosto q en saber q levais mto vida e q não
tomais nenhũ trabalho nẽ desgosto q ho sentirei mto q pa
resse rezão q bastẽ os trabalhos passados q ben entendo
q so sra vos podereis con elles – e pois isto Asĩ he não fasais
ho contrairo do q vos peso se quereis q viva con algũ gosto
e seja isto de manra q me escreva este ano q ven q fiqa
mto gorda e ben desposta porq eu o mesmo fiqo ds seja
louvado e a sra dona ma peso q vos queira mexiriqar comigo
se fareis o contrairo e mo escreva mto meudamte q espero
en ds que vos A de dar senpre o nesesario por isso não deixeis sra de
gastar ho nesesario pa o q se faltar dro venda as pesas q eu
levarei outras milhores se vender esas
mãode chamar fernão lopez e pgũtelle ho q p vall hũa pesa de
chamalote con agoas e coanto covados A de ter e o q
vall cada covado porq en ormũz A mtas q dizen me q
ten valia en lixa folgaria de ho saber pa mãodar algũas
e se valerẽ mãodallas ey todos os anos e não se esque
sa de me responder A isto –
Coando me escrever digão os sobreescritos q se darão en
goa A dio carvalho notaro do vizorey ou a mell nunez A
sãta luzia ou A dio froes A nosa sra da lũz e q se
as naos tomarẽ cochin as den A migell de ganboa
ou A mell callasa –
A sra ca cara minha comadre beijo mil vezes as mãos
e q me encomende ao sor en suas orasões q lhe encomendo
seu afilhado – no caixão vai hũa pesa de touquinha
pa veo re vormelha q me encomendou e q dizeilhe
q não ven agora as outras maiores q forão a vir mas
q se esa basta pa o veo da freira q he mto fina e boa
custou hũ cruzado la vos avinde con ella –
A ma d allmada q seu marido po caldra hia na nao q se
pdeu o ano pasado e q levava corẽta mill cruzados isto
serto – e agora veio da perdisão porq se sallvou toda
a Jente e en hũa nao q fizerão pequena na ilha
onde se pderão en q se sallvarão e algũa fazda
dizen q con ho q lhe fiqava na India coando se
en
barqou e con a pedraria e allmiquer e anbre q
sallvou ten ainda perto de vinte mill cruzados
e q não sey coando se ira –
quero hũa carta sua de mtas folhas de papell en q mto lar
gamte me de cõta de si e sua vida e o q A mister A
inda q o eu saiba e quen na vizita – e mãodaime
sra pidir tudo o en q tiverdes gosto porq en vollo
mãodar sera ho meu e não ajais sra medo de pidir
A quen tomastes por penhor ho prinsipall q nelle
avia –
lenbrame q hũa vẽz me encomendastes q me goardase das frutas da
tera porq erão perjudisiaes e q me goardase de as comer no que
serto sra asertastes – q taes são elas q fazen ben de mall A
quen as come e mais A mĩ q venho custumado as boas desa tera
q e o q me faz ter mor avorisimto a estas de qa e por tãoben sra
cunprir o q me mãodaes tenho detriminado e asi A de ser de as
não comer e nisto estou mui seguro e o mesmo podeis sra estar
vede sra mtas vezes As minhas lenbransas e fazei tudo ho
q nella pesso e não aserte de fiqar algũa couza de ver
por falta de a ler e asĩ me escreva se arecadou
todo ho dro q se me devia e se vendeo a roupa e por
coanto –
coanto A Jorge da Costa mãodolhe q en tudo lhe obedesa
e q se venha pa qa asin o aconselhes de coanto este
ver en lixa pouze con minha tia ou con algũ amigo
q não seja de caza do jeronimo pra ou onde quizer ho
mesmo follgaria q fizesen os maĩs ospedes porq são
contrairo de gritos e desenquietasões e por asin ser cus
tume a quen não ten seu marido en caza como sabe
o mesmo voso irmão ãto fragozo e asin o uzão en caza
de vco lourenso e mais porq hos ospedes são de condisões
q fallão senpre e fazen couzas q eu não fallo nen
fasso ho q e perjudisiall asin pa a vizinhansa
como pa quen ten hũa fa molher A ql não
e rezão q ousa mtas couzas q se fallão q dizen eles q não
e nada e do mais folgaria q ouvese mta conformidade
e amizade
A sra vosa tia beijai por mĩ mtas vezes as mãos q seu fo luis
d allmada anda mto ben desposto mas não ten dinhro
q foi Agora daquy ãtes q eu viese pa malaqa con
fazda de hũ omẽ q he cazado con hũa prima de sua
molher A sra Izabell de teves e sua fa beijay
por mỹ as mãos e o mesmo a minha tia e prima
e a minha comadre ca do carvalhall –
coando me escrever respondame A tudo o q lhe escrevo sen
falltar nada e pa iso veja a ese tenpo as cartas
Coanto as encomẽdas q mãodo as pas do q troux outras vão no cai
xão q leva Jo gomez na nao Caraoja ho ql e marinhro
della pella minha lenbransa no cabo della vera ho q
e pa cada hũ ho q tudo sra mãodareis asĩ como o mãodo
por
q me vai niso meu credito e se as porsellanas q mãodo ao
bispo e a martỹ ao ao po quebrarẽ algũas seja A quebra d anbos
pa q não fique hũ con tudo e outro nada – as encomendas
todas vão en hũ quaixão q leva Jo gomez marinheiro na
nao Caraoja q e nesesario l mãodar pidir a ãto soares ou A
mell pĩto q v mãode recado aos goardas q ho deixen tirar seu
ser A caza da india e tanben maodai recado ao bpo q mãode
lla pidir q não vão as suas encomẽdas A caza da india e
se forẽ paguẽ os donos das encomendas os direitos –
eu mãodo A don Jo vinte e coatro aratẽs de q laqure e hũ
buzio lavrado da china q tudo vai dentro no caixão de minha q he
fa e ma duzia de canas de bengalla o q tudo lhe mãodareis con
A minha carta e hũs carosos e pevides de laraõjas q elle mto
A de prazar as qs não sei Ainda en q irão se mãodar algũ
dinhro disto tomaio e escreveme o coãto e o q faz e não lhe
esquesa de mo escrever pa saber ho q ey de fazer en antes
outras encomẽdas suas Areqadareis de don jo martĩ ao hũ
cruzado de frete das encomendas e tres joas de po frz e se
o bispo mãodar algũa couza tomaio – q ja de qa vai pago
Jo gomez – hũ bertollameu de llemos vai este ano e ãto
lopez q cudo q vos irão ver escreveme sra quen vos vizita
e ve pa saber A quen devo –
mãodaime sra mtas novas de vos por me fazerdes m pq de
dellas so vivo e nellas tenho minhas esperãosas Ate q noso
sor aja por ben de me levar diante dos seus olhos
A quen peso se lenbre de vos e de mĩ e de nosos fos
pa seu sviso A quen cubra de sua grasa e de sua ben
são a quen e a minha bensão os cubra e a vos elle
de vida por se não acabar a minha beijo vos sra
as mãos
de coçhin
A 3 de dezro de 1576
de voso marido
Jullião da costa
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