Resumo | O autor pede conselho ao destinatário sobre o procedimento que teve com uma sua confessada que garantia ter feito pacto com o demónio. |
Autor(es) |
António das Chagas
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Destinatário(s) |
António Ribeiro de Abreu
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De |
Portugal, Guimarães, Pombeiro |
Para |
Portugal, Coimbra |
Contexto | As cartas relativas a este caso encontram-se em dois livros dos Cadernos do Promotor da Inquisição do Coimbra, o Livro nº 348 (Caderno nº 51) e o Livro nº 353 (Caderno nº 56). Integram a denúncia de Mariana Josefa, criada de António Luís de Simões e que assistia na casa de António Luís Coelho Pereira da Silva, morador na sua quinta de Simões do concelho de Felgueiras. Mariana Josefa foi acusada de fazer pactos com o Demónio e de aliciar várias pessoas a fazê-lo também. As testemunhas vieram afirmar que o Demónio lhes aparecia sob o disfarce de um mancebo bem trajado, e, na companhia da denunciada, obrigava a fazer um escrito em que a pessoa prometia falar com o dito mancebo, de nome «Asmodeo», sem saber que este era o tal Demónio. Muito tempo depois, o mesmo Demónio reaparecia e obrigava as testemunhas a fazer muitos pactos, entre os quais havia sempre um de esquecimento para que a testemunha não se lembrasse do que tinha feito. Só através das confissões e comunhões que depois faziam na igreja é que se conseguiam começar a lembrar dos pactos e dos males que tinham feito. Muitas das pessoas ouvidas no caso disseram também ter tido «tratos ilícitos» com outras por virtude do mesmo encantamento. Eram ações durante as quais se tornavam invisíveis. No fim, esqueciam tudo. |
Suporte
| meia folha de papel escrita em ambas as faces. |
Arquivo
| Arquivo Nacional da Torre do Tombo |
Repository
| Tribunal do Santo Ofício |
Fundo
| Inquisição de Coimbra |
Cota arquivística
| Caderno 56 |
Fólios
| [307e] r, v |
Socio-Historical Keywords
| Rita Marquilhas |
Transcrição
| Leonor Tavares |
Revisão principal
| Rita Marquilhas |
Modernização
| Rita Marquilhas |
Data da transcrição | 2008 |
J M J
Meu amo e sor
Aqui vamos continuando a nossa perigrina-
ção com boa saude, e pedindolhe a Vmce cada hu de nós
sua Ave Ma em cada frga como temos ajustado não
se descuide Vmce de nos encomendar tambem a Ds e su-
posto não faziamos tenção de passar de Margaride pa
esta pte da Ribra de Vizella nos forão lá rogar com
gde instancia estes frades Bentos de Pombeiro pa
q cá lhe viessemos pregar à Igra q he frega e fica so
meia legoa de Margaride e daqui tornamos a Pedra
Ma q he hua ermida gde e maior q a igra de Var-
ziela d onde he frega e fica em boa comodide pa a vizi-
nhança; vejo lhe gosto de ficar a missa de Amarante
pa a quaresma, porq temos ja dado palavra pa al-
guas fregas q levarão athe o fim de janro e sempre
antes disso sahirá mais algua, a q não poderemos
faltar. Aquella mer pa q pedi a Licença ja tor-
nou a meus pés porem deixoume mais confuzo q na
pra vés e ainda foi sem absolvição em q ella fás
bem pouco reparo, e de q mostra bem pouco sentimto, colhi della q
assistio algum tepo em hua caza gde de cavalhros
não me quer dizer de quem he, nem em q pte e no mais
fallame por termos q desconfio mto della e se lhe acha-
ra fundamto pa me persuadir tinha algua couza de
louca, só então ficara satisfeito. Veio a meus pés outra das q a esse sto tribunal se
tem accusado destas diabruras, e não sei se me meteo, ou me quis tambem meter nellas.
He o cazo, q se accusou de q em doze cabelos de duas pessoas, macho e femea,
seis de cada hua, tinha feito pacto com o demo de q tocandoos viria as tais pessoas peccar com
ella, estes cabelos tinha nos peitos á roda do bico delles, e o pacto retificado sete vezes
incitavaa o demo fortemte a q os tocasse, e em perigo mui evidente disso andava
emqto os tinha; o onico remedio era abjurar o pacto como fes na minha mão, dizen-
do q na outra denuncia, ou denuncias q ja fes de si mesma lhe esquecera e só agora
ha poucos dias lhe lembrara, e juntamte tireilhe outros os Dos cabelos pa se quei-
marem com as ceremas da igra disseme q não tinha de quem se fiasse pa lhos tirar
sem perigo de sua fama, senão hua pessoa q está daqui mais de seis legoas a q
agora não podia recorrer; ou o confessor; eu vendo a sua necesside e occorrendome
q he licito tocar semilhtes ptes pa remedio das necessides corporais mto mais o era
pa remedio das espirituais, me offereci a tirarlhos, não achando nenhu de nós então ou-
tro meio; pareceome ser isto licito, fazendoo eu sem mao fim, e julgando q o tocarlhe
os peitos pa o sobredo effo me não cauzaria ruina algua; ella disseme q dezejava
vir nisto e q se lhe tirasse aquella occazião de culpa, porem q o demo o havia de im-
pedir mto como costumava qdo se desfazia qualquer pacto, e q só despois de co-
mungar, imediatamte se poderia fazer isto porq então estava mais livre do demo
Recebida pois a comunhão, tornei pa o mesmo lugar do confissinro e fazendo ou
simulando q se tornava a reconciliar, me disse q rezassemos o Magni-
ficus, e outras couzas como fizemos e q metesse dous dedos sem lhe ver a pte nem
tocar nella com mais e achando os cabelos os tirasse; com esta diliga tirei dous,
ou trés naquelle lugar; porem vendo ella e eu tambem assim o entendi, q por aquel-
le modo não se podia tirar em forma ficasse tudo limpo, e sem perigo de cahir algu
ou pte delle porq então não se remedeava o mal, assentamos q fosse logo pa caza e
eu