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Maarten Janssen, 2014-

Visualização das frases

[1728]. Carta de [frei João da Madre de Deus], religioso, para [Dona Antónia Maria].

ResumoO autor recrimina a postura de certas pessoas, demonstrando estar muito ofendido e não compreender os motivos.
Autor(es) João da Madre de Deus
Destinatário(s) Antónia Maria            
De S.l.
Para S.l.
Contexto

No processo por culpas de solicitação em que foi réu João da Madre de Deus, religioso trinitário, encontra-se um conjunto de 31 cartas ditas "amatórias", todas redigidas por seu punho e dirigidas a três mulheres, uma mãe e duas filhas. Tratava-as, respetivamente, como mãe e irmãs, muito embora se dirigisse a elas com expressões de amor e ciúme. Foram as destinatárias que entregaram as cartas ao prior da vila de Sintra em março de 1732. Os factos remontavam a cerca de quatro anos antes, quando aquele confessor vivia no convento da sua ordem em Sintra.

Se bem que o tivessem incriminado, mãe e filhas temiam a reação do visado, por ser vingativo e manter em sua posse “muitas cartas que ela [D. Antónia Maria] ou suas filhas escreviam e algumas prendas [a saber: uma trança de cabelos, dois corações de prata e uma caixa de prata], que eram testemunhos que contra a vida de todas perigava, […] e porque o dito Fr. João da Madre de Deus já tinha sido rogado para entregar as tais cartas, as não quisera dar; […]", pedindo que elas tivessem piedade de as haver a si e que as queimassem (fl. 11r-v). Receava-se igualmente a reação do marido da senhora, Manuel Roussado de Macedo, e dos irmãos de João da Madre de Deus, por ser “gente de muita braveza, e nenhuma prudência”, um ódio alimentado pelo facto de Manuel Roussado de Macedo ter querido casar o seu filho, Luís Machado Soares, com uma irmã do denunciado, mas este opusera-se à união. Contrariamente ao que acontecia com a irmã do réu, a família de Manuel Roussado de Macedo era pobre. As filhas "valiam-se de algum labor das suas mãos, sem desdouro do trato nobre e honesto”.

Além deste conjunto de cartas, também um trinitário do convento de Lisboa entregou em 1735 um conjunto de papéis escritos na letra do réu: duas práticas e dois sermões.

Suporte meia folha de papel, escrita em ambas as faces.
Arquivo Arquivo Nacional da Torre do Tombo
Repository Tribunal do Santo Ofício
Fundo Inquisição de Lisboa
Cota arquivística Processo 2621
Fólios 39r-v
Socio-Historical Keywords Ana Leitão
Transcrição Ana Leitão
Revisão principal Raïssa Gillier
Contextualização Ana Leitão
Modernização Raïssa Gillier
Data da transcrição2015

Texto: -


[1]
Minha Mai do meu coração.
[2]
As cartas Irião dentro de huma charga do Sattĩ, o qual eu descosi pa as meter dentro, e depois o torneoi a coser.
[3]
O Sattĩ hia embrulhado, e no meio do saco.
[4]
O saco Iria bem apertado, e depois cozido pela boca.
[5]
Mandeme diser se chegou assim, q senão he certo q o abrirão, que por essa causa eu pus sempre tanta duvida em escreverlhe a VMce.
[6]
Vamos a Outra Coisa
[7]
Confesso q eu estava de animo de se me não dar de cousa nenhuma, porem como esses sres me tocão em Coisas que me pisão, eu não sou de pedra, pa que me não sinta.
[8]
Pode VMce diser ao Prior, e ao Pe Joseph de Sousa, que se não cansem em examinar miudamte a minh a gerasão de minha Irman; porq eu lha direi, e não me indesponho de a di-ser.
[9]
A gerasão de minha Irman he a mesma q a minha E a minha he nesta forma , q direi.
[10]
Meu Pai não foi homem oficial, foi hum hoem Reposteiro D el Rei D Pedro, fo de hum homem Lavrador natural de Lamego.
[11]
Minha Mai foi natural de Lxa molher mto nobre, e tanto , q porq Casou a furto Com meu Pai, nunca mais os seos parentes a Virão, nem lhe falarão.
[12]
Tiverão meos paes mtos filhos, e por isso Viverão pobres mas não são pobres, q não tivessem o que lhes bastava pa passarem, como se fossem ricos.
[13]
Esta he a minha geração, q esses Reverendos Pes desejão saber;
[14]
E a geração de ambos os dois Pes sei eu ha mtos annos com mta miudesa; e mais do que elles imaginão.
[15]
Emqto a diserem q eu q sou Mono, Eu me não tive nunca por tal, nem Nem por tal me tem aqui nesta Corte.
[16]
Mas a Culpa tive eu, pois tratei com tal gente; e sempre a estimei, imaginando q era outra casta de gente.
[17]
Emqto ao sor Mel Roussado, Não posso deixar de estranharlhe murmurar Com elles de mim; porq diante de mim, ninguem havia murmurar do sor Mel Roussado;
[18]
E se me tinha em Casa Contra sua Vontade não me fisera aos ofertas q me fes.
[19]
Se entendeo que eu não havia ser agradecido não soube Conhecerme, pois nunca fiquei devendo coisa nenhuma a ninguem;
[20]
e se agora me não mostrei agradecido com mão mais, larga foi em mim escudo porq me Vi escandelisado do seu mao sermão nos Ultimos dias, q se claramte me não disse q me fosse embora, bem mo deo a entender.
[21]
Enfim está feita esta Caravana, e estou Livre de segda.
[22]
A todas minhas Irmans mto particulares lembranças,
[23]
E aDs q ja me doe a Cabeça e não posso mais.
[24]
De VMce Fo mto Amte e obediente.
[25]
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