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1643. Carta de Mateus Peres da Cruz, padre, para António Guedes Souto-Maior, capitão morgado.
Autor(es)
Mateus Peres da Cruz
Destinatário(s)
António Guedes Sotomaior
Resumo
O autor queixa-se ao destinatário das muitas e injustas perseguições de que tem sido alvo, movidas por um capitão-mor.
Texto: -
[1]
Sr Conpadre Anto Guedes Soutto Mayor, Capitão e morguado
de Marzuagão, gde deus a vm etca
[2]
mto sintindo me parto sen me ser posivel verme
pessoalmte con vm mas he força de negoçio pe
lo q figuo desculpado, pois fui tão
pecãtte q fui
guanhar onrra e credito tão longe pa tudo vir per
der ha esta ingratta pattria onde sou tão persi
guido e tão injustamte como ds e todo ho mũndo
bẽ sabe,
[3]
e isto no mais de porq cay da graça
de Anto de moraes, per lhe não poder dar ha
minha iggra de Zedes e me tem tanto tomado
a sua contta, q como he publiquo e notorio con seu
poder de capitão mor me veyo afronttar a minha
cassa e fazer soada de noitte con suas insignias
e motinando todo estte povo, e trasendo mta gentte
e soldados Armados e con seus irmãos so a fim de
me afrontar e matar o q sen dúvida fizera se
ds me não defendera de sua ira e trasendo
pa isso con seu poder te has justiças de sua
magde q ds gde per mtos annos amẽns
[4]
e virme
çerquar a minha cassa e abalcroarme has portas
e maltratarme minha irmãa velha e des-
possada, e prẽderme meu sobrinho, e guavã
dose per mtas veses
[5]
e en pco q se ele não vie
ra a minha cassa o não prẽdera nẽ buscara
q somte per me afronttar o fazia,
[6]
e não con
tente cõ isto me fez tantas injurias como foi mandar
me matar per seu irmão joão de mesqta
[7]
e qdo
viu q ds me defendeu, me fez prẽder sen ter
ordem de meu prelado nẽ eu ter culpas Al
guas
[8]
e me fez trazer pelas porttas a vergonha
a vergonha pelas portas de meus friguesses, vestido de
baetta conprida perguntandolhe d escarneo se me que
rião fiar,
[9]
e dizendo vm q me fiaria dise q queria a
vm pa coussas mayores
[10]
tudo por fazer sonbaria de
min
q sou hũ saçerdotte Cristão velho coneguo e Reittor
de stas iggras de sua magde e faço meu ofiçio
con
satisfação sen queixa de ninguẽ
[11]
e me tem inquietado
e desonrrado, e feitto deixar de ofreçer mtos sacriffiçios
a ds pelas Almas,
[12]
e não se contentado destes males
persuadiu a po guedes de souza q então servia
de juis ordinario, q denunçiasse de mim como fez per
seu mandado, e ordeno temerariamte e sen temor
de ds dizendo lhe fizera resistençia o q não he
tal como ds e todos sabem
[13]
e contudo a foi jurar
e o mesmo capitão mor foi a jurar con seus irmãos
e outras mtas pessoas q pa isso convocarão
q mais sinto as ofensas q fizerão a ds q todas
molestias q me tem causado q são mtas tudo con mao
zelo e sen temor do juizo de ds noso sor
[14]
e não conten
te disto persuadiu ha hũa Cna de meireles q
denũnçiasse de mim pela morte de seu marido
gar de mesqta tio deste sr capitão mor da
ordenã
ça q o matou hũ pobre pastor na ora do dia
en sua necesaria defensa por lhe comer hũas
poucas de cabras, e lhe tomou bestas
[15]
e o faz q me
acuse e me seija parte sen temor de ds
[16]
e sobre
esta causa me fez despois prẽder e guastar
mais de tres meses na cadea guastando mtos
crusados e perdendo mto de minha iggra tomando con
seu poder de capitão mor has bestas pa a pte me
hir acusar favorecemdo e fomentando con
contas e dinheiros e e omẽs
[17]
faz muito q o ditto po gue
des de souza me acuse e seija parte na resti
na resistencia q na verdade lhe não fiz
[18]
e tanto
asin q remordido o dito po guedes de sua
consçi
ençia e temor a ds como Cristão e omrrado q he
o não deixa desinstir deste mao prepositto
so a fim de me fazer mtos males sen lhos eu
mereçer nẽ nunqua lhe aver feito algũ mal
nẽ dano,
[19]
alen disto persuade todos meus pa
rentes q são umildes a q me inquietem e me
persiguão en juizo e fora dele e o mesmo fas a toda
a pesoa q contra mim quer proçeder,
[20]
e fes capitu
los de min a meus superiores mto
feos q não
se podião con verdade provar
[21]
estas e outras
mtas exorbitançias me fas e ben feito,
[22]
e a todos
nos afronta e presegue con seu poder de capi
tão mor, e de Ldo e de morguado e escrivão
da Camara con q fas medo a todos e os fas fazer
o que quer,
[23]
e tanto asim q estando, pressa hũa
pobre mer innoçentemte q ele fes prẽder
q a misericordia livra não ouve nesta terra
ofiçial de justiça nẽ pessoa q quisese
nẽ se atrevesse a fazer deligeçia pelos mdos do cor
da comarqua pa lhe noteficarẽ as ptes e tas pa
corer seu livramto q ele per este modo
incon
tra so per ser minha parentta
[24]
e tamto asim q
chegando isto a notiçia da smra dona luisa diguo
da Illma Sra dona luisa monis pediu ao Illmo
sor fonteiro seu marido mandase por amor de ds
fazer estas deligcas
[25]
e como tão grãdes sres e Cristãos
mandarão ao seu ajudante João de feittas cabral
fazer esta esta esmola q sen iso não havia remedio
[26]
agora ja vou a Bragua segunda ves e por guosto
deste innimigo guasto minha sustançia e fazenda en poder
de justiças q erão bens q eu grãgeava pa secorrer a
grã pobreza de meus parentes e proximos
[27]
tudo este
ca
pitão mor ordena con seu poder aRoguancia e soberba
[28]
fora serviço grãde de ds convertelo a ds por q veja vm
sr conpadre en q Brochela ou Ginebra ou en q
turquia se podião fazer mores estraguos de hũ sa
çerdotte Relegioso como eu q so trato de pastar
minhas ovelha e pa iso estudo e trabalho o q po
so
[29]
e este omẽ con seus poderes perverte este con
çelho todo,
[30]
e heu me ei de hir lançar aos pez
del Ds noso senhor a pedir justiça q fio de seu sto
zello, q como defensor, e protector, dos sacerdottes e
e de todos me ha de ouvir e favoreçer con justiça
[31]
tudo lanço nas abas de ds q não tardão seus sanctos
Rayos de justiça,
[32]
este imiguo como ho viço, nele he mto
e a idade pouca sen experiençia de trabalhos e quẽ
o aconselha mal
he logo proçede deste modo,
[33]
e diz
a todos os q de mim dependem q me nẽeguẽ e q me não
falem nẽ venhão a cassa sob pena de sua desgraça
e con medo dele asin fazem todos
[34]
veja vm veja aguora
sor conpadre como vesinho e freigues onrrado q causas
eu dou na minha freguesia e a todos hos omens Altos
ou baixos pa me tratarẽ deste modo, entre Cristãos
[35]
e sobre tudo isto disen
q me não ei de queixar e q me ão de tapar a boca
[36]
tudo
isto escrevo a vm per disabafar não per outro res
petto, fiado en q vm me guardara segredo, suposto q
tudo he tão publico,
[37]
com isto não canso mais a vm
[39]
Bragua
oje desasette de julho de mil e seis
çenttos e corenta e tres as
de vm
Matheus peres da Crus
[40]
dise mais o meu sobrinho, estando a porta da cadea tendoo entreguado en presemça
do juiz e dos mais q se me neguase o soltava loguo, como todo poderoso, cousa q
q so o Rei noso sor pode fazer de favor
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