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Maarten Janssen, 2014-

CARDS2142

1691. Carta de Dona Maria de Castro para a Mesa da Inquisição de Lisboa.

ResumoA autora escreve à Inquisição de Lisboa pedindo que Aleixo Cabral seja solto.
Autor(es) Maria de Castro
Destinatário(s) Inquisição de Lisboa            
De S.l.
Para S.l.
Contexto

Este processo diz respeito ao capitão e cirurgião Aleixo Cabral Henriques, cerca de 40 anos, natural da cidade da Baía de Todos-os-Santos, Brasil, e morador em Lisboa, filho de João Fernandes Henriques, mercador, e de Maria Cabral. O réu foi preso a 4 de novembro de 1690, acusado de bigamia, falsificação de documentos e heresia. Do seu processo consta que, após forçar a primeira mulher, Joana Correia, a fazer voto de castidade para obter o divórcio, terá ido viver para Lisboa e casado com Inácia Maria de Gouveia, que à data do processo já tinha falecido. Depois desse segundo casamento, terá ainda casado uma terceira vez com uma outra mulher, Leonarda Maria da Cunha, com quem ainda vivia quando foi preso.

O réu sabia ler e escrever, inclusive em latim, e tinha conhecimentos de filosofia e química, e sobre esta disse tê-la aprendido com livros e experiências. Em depoimento de justificação para se casar pela segunda vez, a 28 de janeiro de 1690, Aleixo Cabral Henriques alegara nunca nunca ter feito vida marital com Joana Correia, pelo que o casamento seria nulo. Segundo o réu, à data desse seu depoimento Joana Correia já havia falecido no Rio de São Francisco, estado de Pernambuco, e, por isso, ele tinha obtido certidão para se poder casar com Inácia Maria. No entanto, o réu não terá esperado pela autorização da igreja após ter tentado o divórcio, e casou pela segunda vez, alegando ser viúvo, tendo sido este o motivo da sua prisão.

A 8 de novembro de 1690 fez a sua primeira confissão, declarando ter saído de casa dos pais, na Bahia, quando tinha cerca de 15 anos, indo para Lisboa. Nesta cidade, ficou a viver na casa de Joana Correia, que, segundo ele, já teria na altura mais de 45 anos e era viúva de um estrangeiro chamado Francisco Brandão. O réu disse ainda que tentou casar com Inês Platem, uma filha de Joana Correia que era solteira e da idade dele, por ela assim também o querer. Quando Joana Correia soube disto, determinou que o casamento havia de ser com ela e não com a filha, o que sempre repugnara o réu. Passados dois ou três meses, Aleixo Cabral Henriques embarcou com destino à Ilha Terceira, mas, segundo ele, Joana Correia, com a ajuda de uns homens, foi buscá-lo ao navio, em Belém, forçando-o a casar com ela. Levaram-no para a casa dela, despiram-no e fecharam-no em casa durante alguns dias (tempo em que correram os banhos). Depois, na companhia de algumas pessoas, foram à presença de um escrivão, e passados alguns dias casaram na igreja de São Nicolau. O réu alegou, contudo, que nunca consumou o matrimónio e que dormia embrulhado no seu casacão, por não a reconhecer como sua mulher, que nem comia com ela à mesa e que, por isso, nasceram ódios e malquerenças.

Fugiu de novo num navio para a Bahia, mas ela seguiu-o, tendo ido no mesmo navio. Chegando à Bahia, o pai dele, João Fenandes Henriques, não o quis receber, e por isso foram os dois hospedar-se em casa da irmã de Joana Correia, Maria Correia, lá ficando durante mais de seis meses. Foram em seguida viver para o sítio de Nossa Senhora da Graça e depois para Sergipe, acabando ele por ficar na companhia de Joana Correia durante cerca de cinco anos sem nunca consumar o matrimónio. Quando estiveram em casa de Maria Correia, dormiram na mesma cama apenas algumas vezes, e, vendo isto, a sua cunhada deu contra ele libelo, pelo que foi separado de consórcio e mútua coabitação para sempre pela autoridade da Justiça.

Foi nesta condição que voltou para Lisboa, onde pediu ao seu procurador que desse libelo de nulidade de matrimónio, fundado no medo com que o contraiu e no defeito do consentimento que para ele deu. Como na sua mente nunca teve nada a ver com Joana Correia, e além disso se encontrava já apaixonado por Inácia Maria, com quem desejava casar, propôs o caso a vários teólogos e religiosos de Lisboa e todos lhe disseram que estava livre, podendo licitamente casar uma segunda vez. Foi o que fez entretanto: casou com Inácia Maria, de quem teve uma filha.

O réu atuava ainda como curandeiro, contendo o processo alguns ensalmos escritos por ele, com a finalidade de curar feridas (fólios 61, 63 e 66). Terá feito curas tão extraordinárias que se pensava mesmo que ele tinha poderes sobrenaturais. Foi interrogado a 9 de novembro de 1690 e declarou que, cerca de vinte e cinco ou trinta anos antes, estivera na cidade da Bahia. Era ainda estudante quando viu ferirem um negro, que era sobrinho de Salvador Correia de Sá o Velho e que detinha o mesmo nome, e que este curou o sobrinho com uns panos que pôs sobre a ferida, umas cruzes e umas palavras (ensalmos contidos no processo). O réu pedira então a Salvador Correia que lhe ensinasse o modo como curara o sobrinho, tendo posto esses procedimentos por escrito. Confessou também que, depois, usara esse modo para curar um índio no sertão, mas não soube o que lhe aconteceu e nunca mais voltou a utilizar esses ensalmos naquela cidade. Disse ainda que usara o mesmo tratamento para outras pessoas e que algumas sararam e outras não, sem saber porquê, julgando sempre que as palavras eram santas e que não tinham nada de supersticioso.

O réu foi condenado a fazer abjuração de leve suspeito na fé e degredo para Angola por tempo de dez anos, com penitências espirituais e instrução ordinária e pagamento das custas. Esteve cinco anos degredado em Angola e depois, após ter apresentado certidão dos seus achaques e pedidos de Maria de Castro (autora desta carta; não se sabe ao certo que relação tinha com o réu), a sua sentença foi comutada, tendo sido enviado para passar os restantes cinco anos no degredo em Castro Marim.

Suporte meia folha de papel não dobrada escrita em ambos os lados.
Arquivo Arquivo Nacional da Torre do Tombo
Repository Tribunal do Santo Ofício
Fundo Inquisição de Lisboa
Cota arquivística Processo 6255
Fólios 129 r, v
Transcrição Leonor Tavares
Revisão principal Catarina Carvalheiro
Modernização Raïssa Gillier
Anotação POS Clara Pinto, Catarina Carvalheiro
Data da transcrição2008

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Iminentisimo Snor Repete segunda ves a minha ancia a buscar Remedio na piedade de vosa Iminencia, e se não sentir, efeito ainda assim me não queixarei della, mas sempre da minha Disgraça; notorio sera a vosa Iminicencia o co-mo, esta soube magoarme, e com segundo golpe me ameaca, pois ainda não tem melhoria nehuã de minhas filhas, e por ora, esta tão mal huã dellas, q me obriga o vela a declarar a vosa Iminencia a minha aflicão; notavelmte sor são opostas aos medicos estas doentes ou seja pelo, q exprementão, ou pelo dezengano do que virão, soube, q Aleixo cabral, estava, em termos q podia com o favor de vosa Iminencia asestilas, não me falte, este em restetuicão daquele, q me negarão as emposebilidades, q suposto, eu o não Regulo por Recompensa ao menos não acresentara a dor, nesta somana dizem custuma vosa Iminencia minorar as pennas aos prezos, q sahem nela seja, este hum dos favorecidos asseitandolhe a sua fiança pois sendo assim ficara, elle Remediado, e eu a mais agar-Decida a esta mce gde Deos a vosa Iminencia de caza, em 22 de Abril de 1691

Beija as mãos a vosa Iminencia Dona Maria de Castro

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