Resumo | De partida para o degredo em África, Cândido de Almeida Sandoval escreve ao amigo a agradecer o auxílio. |
Autor(es) |
Cândido de Almeida Sandoval
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Destinatário(s) |
Manuel Isidro da Paz
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De |
Portugal, Lisboa |
Para |
S.l. |
Contexto | Em virtude de uma denúncia anónima que se fez na Intendência Geral da Polícia, descobriu-se que na Cadeia do Limoeiro se armava uma conspiração com o objetivo de derrubar o Governo e de assassinar alguns dos seus ministros. O processo é confuso, visto que existem trocas de denúncias e de acusações, bem características daquele período de indefinição política balizado pela queda do Vintismo, em 1823, e pela outorga da Carta Constitucional, em 1826. Um dos envolvidos foi o conhecido publicista, Cândido de Almeida Sandoval, que se encontrava preso na sequência de uma denúncia feita pelo impressor Joaquim Maria Torres. Numa carta que escreveu a outro preso, Sandoval referiu que, embora ele não fosse opositor ao regime, havia outros que o eram. Referia então reuniões conspiradoras que se desenrolavam junto à sua cela. Porém, paralelamente, recolheram-se depoimentos que o incriminavam a ele. Segundo José Salinas Ferreira Nobre, teria sido o próprio publicista a envolver-se nas conspirações de dissidentes ocorridas na cadeia. Uma das outras testemunhas arroladas, outro preso do Limoeiro, garantiu mesmo que Sandoval o aliciou para matar o conde de Subserra, ministro da guerra desde a Vilafrancada e um dos preferidos de D. João VI. Estivesse ou não envolvido nestas conjurações para derrubar o governo, Cândido Almeida Sandoval foi indiscutivelmente um publicista muito combativo, que aproveitou a sua posição de redator dos jornais Patriótico Sandoval e Novo Hércules para atacar os ministros do reino. Só não sabemos se esse espírito belicoso seria o suficiente para o levar a planear um assassinato. Deve-se ainda acrescentar que no âmbito desta sua detenção fez um conjunto de referências muito interessantes acerca da liberdade de imprensa e da necessidade de uma legislação que protegesse publicistas. No apenso A, encontra-se um caderninho de artigos variados, intitulado «O Sineiro, da Patriarchal Queimada ou Miscellanea Politica e Litteraria», da autoria de Cândido de Almeida Sandoval. O caderno deveria ser impresso, como publicação periódica (pasquim). |
Arquivo
| Arquivo Nacional da Torre do Tombo |
Repository
| Casa da Suplicação |
Fundo
| Feitos Findos, Processos-Crime |
Cota arquivística
| Letra J, Maço 16, Número 11, Caixa 47, Caderno [2] |
Fólios
| 59r-v Ap1-A |
Transcrição
| Leonor Tavares |
Revisão principal
| Cristina Albino |
Contextualização
| Miguel Cruz |
Modernização
| Raïssa Gillier |
Anotação POS
| Clara Pinto, Catarina Carvalheiro |
Data da transcrição | 2007 |
Preso ha um anno, inclusivo dous mezes e meio de segredo, meu
caracter se havia tornado feróz, ja pela privação da liberdade q tanto conheco, e ja pelos
continuados tormentos que hei soffrido; qdo chegou a tua carta, portadora das
ternas expressões,
filhas do sentimto de
um homem de bem, e tã verdadeiro: A época felis a que
á qual
remontas tuas reflecções, meu Amo epoca
na qual ambos cultivávamos uma innocente filosofia, serve só a aumentar a saudade que me faz esse pormontorio
Palmallense, qdo nelle fixo minhas vistas, que apenas podem estenderse alem
dos grilões e ferros que meus passos limitão.
Mas oh! Paz de minha Alma! minha indole não mudou; sou ainda
o mesmo remdido de Palmella, do Gurjelo, sou esse companheiro de teus sentimentos transportes, que
tanto agradão ao homem na idade de ouro; são
emfim o sectario de Orpheu, a quem remdo o devido culto, mesmo
nas mais profundas masmorras onde estive sepultado em vida; (como verás pela muzica que te remetto incluza) Jamais me
passou pela imaginação (e isso é que tenho bastante), regenerar o genero humano; mas tal é o erro vulgar de meus compatriotas a
meu respeito; (perdoa Paz), que acharão, que devia ser me
prohibido pensar, por isso que sabia tocar piano e forte; e que sendo Portuguez,
não devia apprender nos Reinos estrangeiros as malditas siencias
que illustrão aos homens que as cultivão e tornão felises as Nações que as premeião; que grasnão pa
o público, em bom frances ou portuguez, éra totalmte escuzado
por isso q ja não existe capitolio nem
Sabinos finalmte os mesmissimos trabalhos literarios, que me valerão longe
de Portugal, honras e estima na pobre, na
triste e na ingrata Patria minha, me reduzirão á mais punivel e lastimósa situação.
Não meu Paz, teu antigo
Amo jamais padeceu
falcidades, jamais teve a mania de fazer-se regenerador
jamais pensou de transtornar qualquer estado da Europa, onde
se achou; mas sim nesta ordem social, conhecendo eu o
q mais comvinha a meus enteresses, e aos enteresses publicos; desde logo, seguiu a carreira das letras
entrando nellas por commercio,
ou trafico q
fazem os gazeteiros, das noticias q
publicão revestidas á nuadez e gengadas segundo o gosto de quem as ha de engolir: isto
fiz eu, pa isto tenho habillidade, isto sei eu fazer; não nunca penses, Amo meu, que
o Estro q me conheces nas bellas artes se transforma-se num espirito furebando, capas,
degenerar em assassino
da Patria, inimigo dos pacificos compatriotas ou
fernetico revolucionario se ha pouco
Leis alegrão aos cobardes, pelo pricipicio ao qual elles
me levarão tão bem fiz o objecto de
compachão dos homens sensatos que sabem appreciar ao justo, meus trabalhos
e minhas desgraças. Fui
accuzado de conspirador e como fosse necessario massacrarem me deo-se-me
o terrivel caracter de cabeça de conjuradores; mas
onde estava essa conspiração? onde estavão esses conspiradores? todos meus coacuzados forão postos em liberdade e eu
só profogo, sem dro nem Amos e sem se achar prova alguma
qdo fui preso q deposesse
contra mim, fico preso cabeça sem e não