Reverendissimo Senhor Antonio Rodriguez dos Santos
Demando eu no Juizo Secular deste concelho de
Azurara da Beira a Maria Cabral do Lugar de
Contensas de Sima Freguesia de SanThiaguo de
Cacurens do mesmo concelho Bispado de Vizeu por huá acção
de Injuria em razão de impropriarme hum
Labeo de Judeo, posto que indirete, e palavras
indefrentes, porem indicativas do dito conviçio, e
animo con que forão proferidas, quando a mesma
geração he de puro Sangue, e limpa de todo o
inffecto
Posta em tella Judecial Consultou a dita Maria
Cabral, que he Mulher de Lourenco de Almeida a seu
cunhado o Padre
Joze de Almeida do dito Lugar; Este
colerico, e irado
tomou tomou por sua conta o
despique, e publicou, que o referido Conviçio era çerto,
e que assim
se havia de alleguar, e provar na
referida cauza, tomando por fundamento da sua
protervia, que eu tinha ferrado os dentes em huã Mula
Para
Para milhor
exitu do seu sinistro intento, ou
para o fim proditorio; que discozesse, no dia
3a feira que se contarão
20 do corrente Mes
de Agosto deste anno de 1765 figura me
denunciado ao Rectissimo Tribunal do Santo
Officio Com o preteisto de ser
Com effeito Judeo
de ter mordido a referida Mulla, e de ter dito á
mesma Maria Cabral em çerta occazião
que as pessoas mais virtuozas he que o diabo
mais
tentava, e que milhor servico a Deos fazia quem
perdoava as offensas do proximo porque
assim o tinha ouvido a hum Servo de Deos
Monge cuja
propozicão repetira depois de pender
em Juizo a dita accão, ou pouco antes de se
prepetuar parante o sobrinho da mesma Maria
Cabral chamado Francisco
de Almeida e
Valentim de Almaral
de Amaral ambos do mesmo lugar pondo qalqer dos
cazos mais fortes; e trocando as palavras em outras
para se reputarem agravantes, quando se deviam tomar
no milhor significado, e sentido; em razão da mesma
senseridade boa vida, e custumes.
E para milhor concluzão do seu neguoçio
entrou a preguntar testemunhas obrigando-as, e
sogeitando-as ao Juramento, que lhe
deferio
tanto para deporem, como para guardarem inviolavel
segredo debaixo das penas, que lhe comininava
fingindo-sse vice comissario do mesmo
Tribunal, porque
para milhor as compelir dezia que tinha comissão
para aquella deligencia
As
As testemunhas que preguntou,
alem de
outras, de que não tenho çerteza foram o dito
Valentim de Amaral e Agustinho de Abrantes
filho de Maria de
Abrantes do mesmo Povo; cujos
ditos elle mesmo escrevia, ainda que as
teztemunhas se não asignavão, e ás mesmas
intemidava com grandes intimativas, e
cheguava a romper no excesso de dizer a
alguas; que juravão falso.
Suposto o dito Padre se custume turvar
de
vinho, contudo nám por hisso he disculpas para
romper naquelle atentado; por ter com
effeito mao animo, e genio suberbo e
vinguativo, e por ser inemiguo
meu; como se
prezume de direito por razão da mesma injuria
esta
estâ mais patente a preversidade; com que injustamente
procedeo a referida deligencia, uzurpando a
jurisdicão; que lhe não compete.
Este he o cazo tam lamentavel para todo o meu
sangue, pois em breve tempo
perpetuada a dita
deligencia na memoria dos viventes, assim hira pasando aos
secullos futuros, sem mais tornar a perder a
nota, que o dito
Reverendo Padre por aquelle modo lhe impoem
a qual com grande magua no meu coracão, e lagrimas
nos olhos reprezento a vmce por denuncia
do mesmo Padre
para que seja servico dignar se partecipalla ao mesmo
rectissimo Tribunal, no cazo, que o seja della,
e fico a
obediencia de Vmce dezejando lhe asista huã saude
perfeita Deos guarde a
vmce muitos annos
Contensas de Sima
22 de Agosto de 1765
De vmce
Reverente Servo
Joze Pais