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Maarten Janssen, 2014-

PSCR1373

1644. Carta de Pedro Tomás, frei, para João Rodrigues de Campos, padre.

ResumoO autor aconselha espiritualmente o destinatário e encoraja-o a continuar a apoiar Luzia de Jesus.
Autor(es) Pedro Tomás
Destinatário(s) João Rodrigues de Campos            
De Esgueira, Aveiro
Para Leiria
Contexto

A ré deste processo é Luzia de Jesus, de 43 anos, religiosa da Ordem Terceira de São Francisco, natural e moradora da cidade de Leiria, presa pela Inquisição em Abril de 1645 por fingimento de visões e revelações. Luzia de Jesus escrevera quinze cadernos com revelações chamado "Cousas tocantes a este Reino de Portugal" em que dizia que vira e conversara com o anjo custódio do reino, o anjo da guarda de D. João IV e outros anjos e santos ligados a Portugal que, entre outras coisas, lhe pediram que convencesse o rei a mandar construir um mosteiro na sua casa. Estes cadernos chegaram às mãos dos inquisidores em 1643 e fizeram-se diligências para conhecer a reputação da sua autora e interrogá-la sobre as suas visões. Depois de feito o exame, consideraram que a ré devia ir para Lisboa para ser encaminhada e interrogada mais longamente, mas por causa da sua boa conduta, em vez de a prenderem, os inquisidores permitiram que ela ficasse na casa do alcaide dos cárceres e tivesse liberdade de movimentos. No entanto, Luzia de Jesus acabou por ser presa em 1645, pois, após novos interrogatórios, as suas afirmações foram consideradas excessivas e perigosas.

Luzia de Jesus era confessada do padre João Rodrigues de Campos desde Maio de 1629 e este, para a guiar nos seus exercícios espirituais e na comunhão, pedira ajuda, ao longo dos anos, a uma série de outros padres, principalmente Jesuítas, com quem se correspondeu, actuando de acordo com as instruções que lhe davam e mostrando-lhes os cadernos que a sua confessada ia escrevendo. Em finais 1644, quando se decidiu que Luzia de Jesus seria mesmo presa, João Rodrigues de Campos entregou à mesa da Inquisição uma lista de pessoas a quem falara sobre as revelações da sua confessada e, mais tarde, 14 das cartas que recebera de algumas delas, datadas de 1629 a 1644. Numa destas (PSCR1369), acrescentou que começara por pedir ajuda ao jesuíta Diogo Monteiro, provavelmente o erudito autor da "Arte de Orar", que morreu em Coimbra em 1634, tendo apresentado duas cartas da sua autoria (PSCR1368 e PSCR1369), a última destas não autógrafa. Depois da morte desse padre, João Rodrigues de Campos pedira ajuda ao jesuíta Jorge Cabral, que também falecera entretanto, e apresentou duas cartas dele (PSCR1366 e PSCR1367). Após a morte de Jorge Cabral, o confessor de Luzia de Jesus foi aconselhado, entre outros, pelo provincial dos jesuítas, António de Mascaranhas (que lhe escreveu as cartas PSCR1363 e PSCR1364) e pelo carmelita descalço Pedro Tomás, que escreveu as restantes (PSCR1370 a PSCR1375 e PSCR3376).

Na prisão, Luzia de Jesus continuou a dizer que tinha visões e acabou sentenciada, no auto de 1647, a degredo por dez anos, sendo ainda proibida de voltar a entrar em Leiria, e obrigada a penitências espirituais e pagamento das custas.

Bibliografia: Canavarro, António Abel Rodrigues (2004), "O Padre Diogo Monteiro, a sua «Arte de Orar» e os «Exercícios» de Santo Inácio de Loiola". In A Companhia de Jesus na Península Ibérica nos sécs. XVI e XVII: Espiritualidade e cultura: actas, Porto, Faculdade de Letras da Universidade do Porto, Instituto de Cultura Portuguesa; Universidade do Porto, Centro Inter-universitário de História da Espiritualidade, pp. 31-65.

Suporte duas meias folhas de papel escritas em ambas as faces.
Arquivo Arquivo Nacional da Torre do Tombo
Repository Tribunal do Santo Ofício
Fundo Inquisição de Lisboa
Cota arquivística Processo 4564
Fólios 171r-172v
Online Facsimile http://digitarq.arquivos.pt/details?id=2304550
Transcrição Maria Teresa Oliveira
Contextualização Maria Teresa Oliveira
Modernização Raïssa Gillier
Anotação POS Raïssa Gillier
Data da transcrição2016

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Jhs ma ett.

Louvado seja o sso sacro ett.

Muta consolacam tive com vm se lembrar de min. e tenho mta confiança q se lenbra diante de ds e n irman.

Ou ds ordenou q se mallograsse a ocasiã q ouve pa eu cuidar poderia ver a vm e lusia. ou o diabo o traçou asim. isto cuidei eu era serto. mas como elle não pode senã o pa q o sor lhe a lca mtas veses por elle ordena ds as couzas. pa o bem ou pa castigo nosso. Agora acabo aqui e não sei o q sera de min. ds me alumie pa o q for mais gloria sua se passar a Lxa (o q eu quisera) verei a vm e falaremos.

De nenhun modo deixe vm a prenda q ds lhe entregou e nenhuns trabalhos nen con-tradisoms o desmaem ditozo vm quando padessa por ajudalla essa alma he mto querida de ds. quanto mais a vir perseguida e com maiores trabalhos mais lhe acista e a console. q o sor o tirara de tudo bem mas q o diabo e o mundo se conjurem contra ella e q melhor sinal de ser ds q ver o mundo e o demonio armados pa empesserlhe. e os corasoms q deveras queren so a gloria de ds nunqua elle os desempara sempre lhes a lus pa asertar. resista vm con valor até os primeiros movimtos de a deixar e não fassa cazo de rasons e prudencias humanas senão segamte se abrasse con o divino e em pura fée e esperansa viva seguro exerci-tandoa e gde con essa serva do sor.

Sou de pareser q sem embargo de suas doenças e achaques q vm a deixe faser alguas peni-tencias q lhe pareserem, q suposto o desejo q ds lhe daa de a faser he continuo podera ser q porq a não fas. tem mais achaques, e fasendo algua cobre con ella mais forsas corporais e melhorada saude, como en alguns sojeitos temos experimentado. e se nella não aconteser asin logo vm a mandara sessar. con a penitencia pa q lhe tiver dado lca. experimente vm isto.

No q toca ao convento. digo q o maior inimigo q tem as obras divinas he a prudencia hu-mana con q os homens queren regular as ordens divinas e queren ensinar a ds. como se elle não soubera escolher. se ds quer o sitio sem augoa e sem pedra q queren os homens darlhe sitio con ella. elle q deu augoa ao sitio q lhe queren dar a dara ao q a tem e escolhe pa si.

Não sou de pareser q lusia váa a Lxa q levantara o demonio mta poeira. e se o sor quiser q ella . o mandara de modo q lhe não possa resistir e facilitara as contradi-soms q pa isso ouver. enquanto o sor o não fas asim. deixesse estar. e diga ao sor. se lho der a entender. q accão he essa q deve correr por sua conta e pella de hua molhersinha, e se sua mgde divina quer q q o ordene como for servido.

Pareseme q ella escreva a el rei e pessa ao sor lhe note a carta comungando algũas veses pro e pedindo ao sor lhe declare se he gloria sua e gosto seu q lhe escreva na materia e entendẽdo quer ds q escreva escreva o q o sor lhe espirar. q serão poucas palavras q o sor em poucas se declara nem da mtas rasons senã so o dis qual he sua vontade. esta carta não vaa a secro senã quem a meta a elrei q elle le todas e ds a guiara sendo ser-vido a suas mãos. e como o coraçam dos reis esta na mão de ds elle o movera como for servido. e se fara o convento donde elle quer. quando não. fasalhe sua vontade divina. e se os homens querem (avisados) fugir seu castigo sera culpa sua cair nelle. por via da inquisicam nada se fara. porq aquelles snores so zelarã se ha mal no spo da irman. e praza a ds aja quem o entenda, mas elle he tam ajustado con a escritura q logo todos os bons letrados o entenderã asin e melhor os q con as letras tiveren algua oraçons e doutrina della o ben vera vm q elles o apoian nen publican senã deixaloan asin por isso ha pa q solicitar couza nenhua por sua via. senã so esperar a resolucan q elles tomaren na apvacan do spo q ds ordenara seja con lus divina. e se ouver trabalhos armar con pasiencia en confianca en o sor tenho tempo pa mais nen posso escrever a n irman vm lhe de minhas lembranças e lhe mande me ajude mto q hei mester e vm o fassa tamben con suas orasõs. o spo sto nos encha de sua lus e graça ett. Aveiro e 24 de junho de 644

servo de vm fr pedro thomas

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