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Maarten Janssen, 2014-

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1647. Carta de Francisco de Gouveia Pinto, familiar do Santo Ofício, para um membro da Inquisição.

ResumoO autor queixa-se à Inquisição de uma mulher que o ofendeu publicamente
Autor(es) Francisco de Gouveia Pinto
Destinatário(s) Anónimo367            
De Portugal, Bragança, Torre de Moncorvo
Para S.l.
Contexto

Processo de Maria Rodrigues, cristã-nova, natural da Torre de Moncorvo, arcebispado de Braga, e moradora na cidade do Porto. Era casada com Francisco Brandão, também ele cristão-novo, tendeiro. A ré foi presa a 4 de setembro de 1647, acusada de judaísmo. O autor desta carta é uma das testemunhas do processo e no seu depoimento disse que tinha quarenta e sete anos. Disse que às sextas-feiras e aos sábados Francisco Brandão e a mulher não trabalhavam. Nesses dias via-os sempre ociosos, ou a trabalhar em casa, e que quando ele lhes perguntava a razão de não trabalharem, lhe diziam que era por estarem doentes (com dores de cabeça) ou cansados do trabalho da semana. Só o filho, de nome David, trabalhava na tenda e vendia as coisas nesses dias. Em alguns sábados, fechavam mesmo a tenda. Disse também que notou que, em alguns desses dias, à noite, se juntavam em casa da ré e do marido Henrique Rodrigues, ferrador, cristão-novo e licenciado, Francisco Nunes Ramos, médico, e sua mulher, Rodrigo Nunes, seu vizinho, tendeiro, e Francisco da Cunha, que se supunha ser da Covilhã, estanqueiro e contratador no sabão. E como eram todos cristãos-novos, toda a vizinhança desconfiava que estivessem a fazer alguma coisa de mal nessas reuniões noturnas. Segundo Francisco de Gouveia Pinto, quando este lhes perguntou se se costumavam reunir com os vizinhos em sua casa durante a noite, o casal negou tudo. Contudo, tendo o próprio visto que tal acontecia, confrontou-os com o que sabia, e eles mostraram-se muito escandalizados com a desconfiança. As várias outras testemunhas que foram arroladas no processo confimaram o que foi dito por Francisco de Gouveia Pinto. Algumas disseram ter encontrado,em circunstâncias diversas, uma "tourinha" ao pé da ré. O alcaide da prisão de Moncorvo, Brás do Canto, também fez queixa, dizendo que em 10 de outubro de 1647 mandara dois guardas fazer a vigia na oitava casa do corredor novo em cima dos cárceres, onde estava presa a ré, e os guardas disseram que ela não tinha comido nem bebido senão à noite. O alcaide, pela larga experiência que tinha com acusados de judaísmo, não teve dúvidas de que a ré seria da dita religião, e resolveu fazer a denúncia. Sobre o que relata o familiar na carta que está transcrita, a ré, em depoimento, disse que nunca fizera nada do que ali fora dito e que só estava a chorar por causa dos seus filhos. Segundo ela, o familiar Francisco de Gouveia Pinto é que lhe disse algumas palavras menos felizes porque estava com raiva de não poder ganhar dinheiro levando-a a ela e aos demais presos para a prisão.

A ré foi considerada convicta no crime de heresia e apostasia, negativa e "pertinaz", tendo-lhe sido dada a sentença de excomunhão maior, confiscação de bens para o Fisco e Câmara Real e mais penas em direito contra semelhantes estabelecidas (em 23 de julho de 1649). Diz-se também que a ré devia ser recebida na reconciliação e união da Santa Madre Igreja com cárcere e hábito perpétuo sem remissão, vistos os termos a que chegou, e que fosse ao Auto da Fé na forma costumada e nele fizesse abjuração em forma e em pena, e que tivesse instrução e penitências espirituais ordinárias. A ré devia também pagar as custas do processo. Mais tarde, o seu hábito seria diferenciado com insígnias de fogo. A ré obteve também licença para cumprir a pena na sua terra.

Suporte folha de papel dobrada escrita apenas no rosto.
Arquivo Arquivo Nacional da Torre do Tombo
Repository Tribunal do Santo Ofício
Fundo Inquisição de Coimbra
Cota arquivística Processo 2062
Fólios 14r
Transcrição Leonor Tavares
Modernização Catarina Carvalheiro
Anotação POS Clara Pinto, Catarina Carvalheiro
Data da transcrição2009

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