O autor queixa-se ao destinatário, o corregedor da comarca de Torres Vedras, de João Pimentel, que, tendo aforado recentemente uma propriedade no Bombarral, destruíra um antigo caminho público que a atravessava.
[1] | Frco da Fonceca praticou com outra q hé vezinha tapando-sse mto
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[2] | bem, deichando ao povo aquelle pequeno secorro, secorro que os mais antigos
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[3] | herdarão por huma posse immemorial, secorro, que todos sabem que a
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[4] | inda naz grandez inchentes deicha passage Livre para duaz pontes
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[5] | az gentes que do sanguinhal quizerem vir a ezta terra buzcar não só
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[6] | comestiveis, maz cirurgião, e Botica, e emfim devia fazerlhe aprezen
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[7] | tar o Tombo do prazo, que segundo julgão oz antigos não hé demarcado com
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[8] | o Ryo, maz sim a mota hé que fica Livre a serventia do povo, como
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[9] | se emudecerão todoz não só tirou o caminho, maz formou huma valla
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[10] | de 80 palmos de alto, e 10 de largo sobre elas uzurpado a hum menino
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[11] | filho do capam mor da Lourinhã para o que mudou marcos, e asim forte
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[12] | ficado disse a João Crespim que agora os passageiros ou passassem pello
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[14] | gados no ryo; e isto asim feito entrou a espalhar pello povo que as terras des-
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[15] | ta caza, que ficão do outro lado do Ryo hé q erão obrigadas a serven
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[16] | tia, contra a verdade, e athé contra a rezão natural: neste cazo foi
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[17] | percizo que o procurador de minha sobrinha fizesse hum requerimento,
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[18] | para embaraçar esta novidade, e seguiosse o Edital, e a este o Cartáz
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[19] | do Pe Reytor.
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[20] | Devo dizer a VSa hum incidente, que me ma
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[21] | gou extremamente: na noite do dia, em que se pos o Edital re
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[22] | lativo a esta caza, entulharão huma pequena porção da dita val
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[23] | la, e diz o dito João Pimentel, que lhe deicharão ficar huma carta
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[24] | em que o dezcompunhão mto e ameaçavão: eu que conheço a aleivo-
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[25] | zia daquelle homem senti logo o meu espirito aflicto, porq sem
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[26] | embargo, do que aquella acção só era propria de canalha disse a
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[27] | mim mesmo em segredo, que o meu nome seria talvez ultrajado
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[28] | dizendo o tal Pimentel que eu lhe mandaria fazer aquella obra pa
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[29] | mim tão indecoroza, e tão ofenciva a honra, que todos sabem, com
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[30] | que eu tenho vivido: não me consta comtudo que elle diga cla
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[31] | ramente o meu nome, o que eu dezejava saber, mas quaze que
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[32] | o explica. Se tenho pervenido a VSa tambem o tenho emcomodado, torno a
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[33] | rogar a VSa que desculpe a hum doente, que athé não pode fazer ezta por mão
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[34] | propria. Eu jámais fui, nem quero ser algóz de pessoa alguma, mas
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[35] | em taes circonstancias calarmehei? Se VSa quizer emformarse da scena
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[36] | que passei com o Reytor, de dois Religiozos, que estavão comigo, hum que
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[37] | se chama Fr Jozé da Soledade asiste nesta terra. Devo adevertir a VSa
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[38] | que tal e qual hé João Pimentel alguma gente canalha tem devoção
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[39] | com elle, todoz sabem quanto eu tenho referido a VSa, maz ainda mal
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[40] | poucoz são capazes de juralo. Se VSa ouvir Franco da Fonceca
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