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Maarten Janssen, 2014-

Linhas do facsímile

1753. Carta de Elzeário de Nossa Senhora do Patrocínio, frade da Ordem Terceira de São Francisco, para Manuel do Cenáculo, lente de Teologia.

ResumoO autor garante ao destinatário que não está conjurado com os frades que acusaram frei António de S. José e que, pelo contrário, pretende testemunhar em favor dele.
Autor(es) Elzeário de Nossa Senhora do Patrocínio
Destinatário(s) Manuel do Cenáculo            
De Portugal, Lisboa
Para Portugal, Coimbra
Contexto

O réu deste processo é o padre António de S. José, natural de Estarreja, religioso professo da Ordem Terceira de São Francisco e Mestre dos Noviços no Convento de Nossa Senhora de Jesus, em Lisboa. Foi preso pela Inquisição em 1754 por "sentir mal as determinações e doutrinas da Igreja". Antes de assistir em Lisboa, frei António de S. José estivera no Colégio de São Pedro dos Terceiros, em Coimbra, com as mesmas funções. Durante esse tempo, foi acusado por outros frades, entre eles os estudantes frei Eusébio de Jesus Maria José, frei Agostinho do Rosário e frei Francisco da Expectação. Os frades acusaram-no de, durante o sacramento da confissão, perguntar aos seus confessados pelos cúmplices dos seus pecados e por pecados de outros companheiros, negando-lhes a absolvição se não os revelassem, e obrigando-os a repetir fora da confissão tudo o que dissessem, para assim poder denunciar os seus delitos aos seus superiores e castigá-los. Não só quebrava, deste modo, o sigilo sacramental, como levava os seus confessados a esconderem os delitos que cometiam e a terem confissões sacrílegas, ou a não se quererem confessar com ele. Quando um religioso se quis queixar ao Santo Ofício, frei António de S. José não lhe deu autorização e prendeu-o, obrigando-o depois a desdizer-se em público, causando assim a hostilidade de vários frades. No entanto, a situação parece ter-se resolvido, pois é mencionado no processo que alguns daqueles que antes desconfiavam dele acabaram por se desdizer e pedir perdão.

Já em Lisboa,a 28 de setembro de 1753, frei Eusébio de Jesus Maria José, que agora residia na capital com os seus companheiros e frei António de S. José, escreveu aos inquisidores, dizendo que tinha uma denúncia a fazer. Manuel Teixeira da Cunha, notário do Santo Ofício, deslocou-se ao convento de Nossa Senhora de Jesus por três vezes, tendo interrogado três frades: o denunciante, frei Francisco da Expectação e frei Agostinho do Rosário. Os três acusaram frei António de S. José de ter quebrado o sigilo da confissão. Por esta razão, frei Eusébio e frei Agostinho foram alvo de uma devassa, acusados pelo réu de se gabarem de terem frequentado a casa de uma meretriz, sendo por isso punidos com encarceramento por um mês na cela da penitência do convento. Em novembro, querendo denunciar o caso ao Santo Ofício, frei Eusébio de Jesus Maria José e frei Francisco da Expectação escreveram a Manuel Teixeira da Cunha, dizendo-lhe que pretendiam fazer uma nova denúncia, mas que o seu superior lhes não permitia que saíssem do convento (cartas PSCR1573 e PSCR1574). Frei Francisco da Expectação foi chamado à mesa da Inquisição a 20 de novembro e, como resultado deste interrogatório, um outro frade confessado de frei António de S. José, que este apontara como testemunha, foi mandado depor, a 12 de dezembro. No convento correu o rumor de que frei Francisco da Expectação o mandara e isto resultou na mudança, no dia seguinte, de frei Eusébio de Jesus Maria José e frei Agostinho do Rosário para um cárcere subterrâneo, onde não podiam ver a luz do dia e onde tinham condições mínimas de sobrevivência, para que não pudessem, também eles, depor contra o Mestre dos Noviços. A 15 de dezembro, frei Eusébio escreveu, mais uma vez, a Manuel Teixeira da Cunha, explicando a situação e pedindo justiça (carta PSCR1572), tendo também enviado uma petição aos inquisidores, alegando que tudo fora inventado pelo réu, por vingança, e os dois foram ouvidos na mesa a 20 desse mês.

De facto, havia quem estivesse contra frei Eusébio de Jesus Maria José e frei Francisco da Expectação, e defendesse frei António de S. José. Assim dá conta frei Manuel do Cenáculo, o futuro bispo de Beja e arcebispo de Évora, então lente no Colégio de São Pedro da Ordem Terceira, em Coimbra, e portanto conhecedor da situação, que escreveu à Inquisição já em Janeiro de 1754, remetendo duas cartas que lhe tinham sido enviadas no final do ano anterior por frei Elzeário de Nossa Senhora do Patrocínio e frei António de Nossa Senhora da Esperança, também frades no convento de Jesus de Lisboa (as cartas PSCR1575 e PSCR1576). Os dois acusavam os seus companheiros de os terem tentado convencer a denunciar frei António de S. José, movidos por ódio e para se vingarem dele, dizendo ainda que estes se riam e vangloriavam do que tinham feito. Vários frades interrogados ao longo do processo defenderam o réu, elogiando o seu zelo e bom cumprimento das funções atribuídas, dizendo que os seus denunciantes eram pecadores, que ninguém os queria confessar, e que ameaçavam superiores que os mandavam fazer aquilo que eles não queriam com denúncias ao Santo Ofício, alegando ainda que, como inimigos do réu, não deviam ser ouvidos como testemunhas contra ele.

Os inquisidores consideraram, todavia, que o que fora dito era suficiente para prender frei António de S. José e este confessou que, de facto, perguntara pelos nomes de cúmplices aos seus confessados e que se servira do que fora dito nas confissões para notificar os seus superiores e castigar os infratores. No entanto, alegava que nunca o fizera por más intenções, mas apenas para que os pecados fossem punidos e para que houvesse ordem no convento, agindo assim por acreditar que a sua atitude era correta. Como a sua ação constituia, efetivamente, uma quebra do sigilo sacramental da confissão, e mostrava ignorância das bulas apostólicas sobre o tema e dos editais do Santo Ofício, que o réu confirmou não conhecer. O frei António de S. José foi sentenciado a abjuração de leve, privado para sempre de poder confessar, de voz ativa e passiva, foi suspenso do exercício de suas ordens por três anos e condenado ainda a oito anos de degredo.

Suporte uma folha de papel dobrada ao meio escrita em duas das faces.
Arquivo Arquivo Nacional da Torre do Tombo
Repository Tribunal do Santo Ofício
Fundo Inquisição de Lisboa
Cota arquivística Processo 1907
Fólios 56rv
Online Facsimile http://digitarq.arquivos.pt/details?id=2301809
Transcrição Maria Teresa Oliveira
Revisão principal Fernanda Pratas
Contextualização Maria Teresa Oliveira
Modernização Fernanda Pratas
Data da transcrição2016

Page 56r > 56v

[1]
[2]
J M J
[3]
Meu Mto Rdo P M

Com sumo gosto recebi hoje a letras de VP

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indicio certo da sua saude q tanto estimo, como
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dezo pa q VP tenha festas felicissimas asim es
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pirituais como temporaes como o meu affecto lhe
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deseja e como neste mundo não gosto perfeito
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não quiz a ma fortuna q eu o tivese completo pois
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vejo na carta de VP huma certa disconfiança de
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couza mto alheia do meu brio e criação pois como
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esta foi de gente as acçoens o não handem ser menos
[12]
qto mais q se eu mi quizese vingar do Me dos No
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viços não me evitava ajuntar-me com semilhantes
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rediculos nem sevandijos como o são os conjurados
[15]
para lhe fazerem mal. porq ahinda ha arochos pa
[16]
lhe deitar os braços abacho no cazo q eu lhe quizese
[17]
fazer mal. huma das maiores provas, q o Me dos No
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viços tem pa a sua inocencia e mostrar q tudo
[19]
odio, e raiva sou eu a qm elles convidarão pa esta
[20]
diabrura de q os descompus e mais ao cabesa de motim
[21]
q he o grande Expectação filhote por redadeiro toma
[22]
ra eu q o Me dos Nos dese as suas testemunhas

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