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Maarten Janssen, 2014-

Linhas do facsímile

1743. Carta de Bento Pereira da Rocha Paris, estudante, para o seu pai, João Pereira da Rocha Paris, capitão.

ResumoO autor pede ao pai que volte para casa e dê o seu estado aos seus irmãos porque ele e o resto da família estavam a passar por dificuldades.
Autor(es) Bento Pereira da Rocha Paris
Destinatário(s) João Pereira da Rocha Paris            
De Portugal, Viana do Castelo
Para América, Brasil, Maranhão
Contexto

Este processo diz respeito a João Pereira da Rocha Paris, cristão-velho, capitão e, posteriormente, mineiro e homem de negócios, de 52 anos de idade, natural de Viana do Castelo e morador no Brasil, no Maranhão (Roça dos Perizes). Filho de Damião Pereira da Rocha Paris (também capitão e cavaleiro do hábito de Cristo) e de Feliciana de Passos, o réu foi acusado de bigamia por se ter casado uma segunda vez com Gerarda Pereira de Abreu, com quem estava há três meses, estando ainda viva a sua primeira mulher, Maria Luísa da Silva, com quem viveu por oito anos e de quem teve três filhos (Bernardo Pereira da Rocha Paris, Bento Pereira da Rocha Paris e Clara Rosa). João Pereira da Rocha Paris foi denunciado pelo padre António Luís Coutinho, promotor fiscal da Justiça Eclesiástica do bispado de São Luís do Maranhão. O réu teria deixado a primeira mulher havia 22 anos quando partiu para o Brasil para ir trabalhar nas Minas no Rio de São Francisco do Pará. Depois foi para a vila de Icatú onde se disse viúvo, tendo arranjado testemunhas para provar o seu desimpedimento e assim tornar a casar-se. No seu depoimento, o réu alegou que recebera uma carta de Bento Vás da Silva (pai de Maria Luísa da Silva), em que este lhe dizia que a sua primeira mulher estava morta, mas que não podia apresentá-la porque a tinha rasgado logo. Disse ainda que nunca se tinha chegado a casar realmente com a primeira mulher porque esta, antes de se amancebar com ele, tinha tido cópula carnal com um irmão seu, e que só tinham feito uma cerimónia íntima na igreja sem a presença do padre, daí todos julgarem que eram casados. Luís Pereira da Rocha Paris, irmão do réu, confirmou a versão deste e confessou ter tido relações sexuais com a cunhada antes de esta se casar com o irmão, acrescentando ainda que os dois chegaram a puxar de suas armas pouco antes do casamento por o irmão ter descoberto o sucedido. No entanto, este casou-se do mesmo modo, sem que o irmão pudesse levantar impedimento. Maria Luísa da Silva disse que o marido já não lhe escrevia há mais de dez anos, mas que tinha recebido cartas suas dirigidas ao seu filho Bernardo em que ele falava da sua viuvez. Mas negou que tivesse tido cópula carnal com o cunhado; teria anteriormente confessado isso mesmo, mas por julgar que isso traria o seu marido para junto de si. As cartas apresentadas à Mesa serviram de prova da bigamia do réu. Depois de preso a 20 de fevereiro de 1744, foi sentenciado em auto-da-fé de 21 de junho de 1744 a abjuração de leve, degredo por sete anos para a Praça de Mazagão, penitências espirituais e pagamento de custas.

Suporte meia folha de papel dobrada escrita apenas no rosto.
Arquivo Arquivo Nacional da Torre do Tombo
Repository Tribunal do Santo Ofício
Fundo Inquisição de Lisboa
Cota arquivística Processo 6841
Fólios 48r
Online Facsimile http://digitarq.arquivos.pt/details?id=2306902
Transcrição Leonor Tavares
Revisão principal Raïssa Gillier
Contextualização Leonor Tavares
Modernização Raïssa Gillier
Data da transcrição2015

Page 43r

[1]
Vianna hoje 20 de Mayo de 743 annos

Meu Pay muito do meu coraçam muito estimare

[2]
y que estas duas achem a vm com aquela perfeitissima saude asi
[3]
como nos todos dezejamos, nos de saude ficamos para servir a vm ainda que eu mole-
[4]
stado dos olhos mas de toda a sorte pa servir a vm Meu Pai e Ser ca recebemos du-
[5]
as cartas de vm as quais fizemos grandissisima estimação, pois ja havia 9 annos que
[6]
não tinhamos tido cartas de hum Pai de qm nos somos tam amantes pois asim q as re-
[7]
cebemos logo fomos dar graças a todos os santo a qm tinhamos empenhado, e eu principa-
[8]
lmente a nossa sera do carmo pois eu e mais outro estudante ha tres annos lhe
[9]
fazemos grande festa de ser esposto todo o dia pois quando pa ali entrei estava
[10]
huma lastima estava tudo para cair: e sim a tenho empenhado para ver se por
[11]
meio da mesma sera o pode alcançar desas disditozas terras pois a maior conside
[12]
raçam q me fas pasmar he o não conhecer hum Pai por qm tanto suspiro; ca falei
[13]
com o capitam Anto de Barros e me disse ja estava mto acabado e q tinha mto bem de
[14]
seu e vir para ca hum navio sem nos mandar siquer duas castanhas pa dois fi-
[15]
lhos q ca tem pois hum fo vendo o pouco cazo q fazia delle se foi tratar da vida
[16]
e eu tambem estaria ja por esse mundo de cristo se não fora ter huma May e
[17]
Irmão, ainda q vm dis na sua q he morta pois decanse q he biba he bem bale-
[18]
nte, e disposta finalmente bizarra pois se alguem dezeja q morra nos pois
[19]
não ja q não tivemos Pai queremos ter may, e sim pode estar contente q ain-
[20]
da tem mulher recebidos em facie de Igreja, e asim meu Pai como fo q sou de
[21]
vm lhe pesso q se retire pa a sua patria e venha ou mande dar estado a dois
[22]
filhos q ca tem pois o segundo não lhe quer nada pois eu quero o estado de s-
[23]
açardote ou frade de qualquer religiam pois sabe Ds como estudei, o Pe mes-
[24]
tre me insinou pelo amor de Ds se vm vier sempre lhe ha de pagar pois vm
[25]
bem sabe q ja tenho 22 annos e me acho ja com a cara cheia de barba pois as con-
[26]
tas q vm tem par dar a Ds sam sem numero e q sera se vm não vier ou mandar
[27]
dar estado a estes dois q ca tem adivirta se sente q se não pode salvar pois o esta dizen-
[28]
do o mesmo ser vm ca mando pedir o vigario as inquiriçois e asentaram algumas pessoas
[29]
de juizo q vm mandava dizer q minha may hera morta q seria pa se tornar a ca-
[30]
zar eu isto não pruzumo porq não pode ser; novidades de meu tio não são nenhumas
[31]
do pricipio andou conosco os tombos mas agora esta mto nosso amigo e bem vizitarme
[32]
algumas vezes q elles asistem na aldea, e elle cazou a fa mto rica e dis q o mor-
[33]
gado q he de seu genrro pois ainda q ele seja nosso se vmce não vier he o mesmo
[34]
que nada pois nos não temos dinheiro meu abó ja a muitos annos q nos não
[35]
mandou nada com raiba, dis q bamos a nosso Pai; a respeito do vinho a f
[36]
azenda esta com bem poucas bideiras agora nem hum barril dele dará, foi
[37]
se vm foise a fazenda nos não temos dinheiro pa lho mandar se tivesemos
[38]
o havimos de mandar minha abó se recomenda com mtas lembrancas
[39]
e dis q quer a sua prenda q lhe prometeo; ora meu Pai pelas sincas chaga
[40]
s de cristo se retire pa ca venha ver a sua caza e sua fazenda, eu ca fico
[41]
pedindo a nossa sera do carmo pa o trazer pois pa o fim do mes q bem have
[42]
mos de fazer a sua festa e sem falta meu Pai pa a frota esperamos ou
[43]
com pouco ou com mto venha e depois si quizer tornar tornará venha ver a
[44]
sua patria e aDeos meu rico Pai emte a frota pois espero sem falta
[45]
muitas saudades de todos principalmte de mim

[46]
deste seu
[47]
filho mto mto obidiente emte a morte e lhe pede
[48]
a sua bençam
[49]
Bento Pra da Rocha Paris

[50]

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