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Maarten Janssen, 2014-

PSCR1609

1713. Carta de Manuel Mendes Cunha, homem de negócios, para o seu tio, Manuel Mendes Monforte, médico.

ResumoO autor dá notícias suas e das dificuldades financeiras da sua família e dos seus negócios, notifica-o da partida de um primo seu, Duarte Mendes Ribeiro, para a Bahia, e da chegada de uma sua irmã, Juliana Maria, que estivera presa pela Inquisição. Justifica ainda um pagamento atrasado, agradece as mercês que ele e sua mulher têm feito à sua família e acrescenta que não será necessário fazer partilhas por morte da sua mãe, pois os bens que ela deixou não chegam sequer para pagar as suas dívidas.
Autor(es) Manuel Mendes Cunha
Destinatário(s) Manuel Mendes Monforte            
De Portugal, Lisboa
Para Brasil, Bahia
Contexto

O réu deste processo é Manuel Mendes Monforte, médico de Castelo Branco, morador na Bahia, preso pela Inquisição de Lisboa por judaísmo em 1721.

Entre 1710 e 1711, muito antes de Manuel Mendes Monforte ter sido preso, houve uma vaga de prisões de cristãos-novos em Castelo Branco. Assim o conta Manuel Mendes Cunha, seu sobrinho, nas cartas que se encontram ao processo do seu tio. Entre os prisioneiros por ele mencionados, contam-se Lázaro Rodrigues Pinheiro, Ana e Álvaro Rodrigues, entre outras pessoas cujo testemunho serviria para acusar Manuel Mendes Monforte. Para evitar serem presos, Manuel Mendes Cunha e os seus irmãos tinham-se apresentado na mesa do Santo Ofício, confessando voluntariamente, pelo que foram mandados para casa até nova ordem, escapando, desta forma, à prisão. Assim se pode provar dos processos de Manuel Mendes Cunha e dos seus irmãos, Maria Teresa e António Mendes da Cunha, e da carta PSCR1610. No entanto, uma outra irmã deles, Juliana Maria, foi presa por 22 meses, como dá conta Manuel Mendes Cunha na carta PSCR1609, datada de 1713, na qual fala do seu regresso. Nesta carta, o jovem também se queixa da desgraça em que caíra a sua família, com falta de dinheiro para pagar dívidas e com os negócios a correr mal, algo de que este já se adivinhava em 1711.

As três cartas que se encontram no processo de Manuel Mendes Monforte, da autoria do seu sobrinho, provavelmente foram nele apensas para servirem de prova, talvez confirmando as afirmações feitas pelo réu no seu inventário, já que existem menções a finanças sublinhadas numa das cartas, ou talvez por conterem informações sobre pessoas que então se encontravam presas pelo Santo Ofício e sobre o próprio réu.

No fólio 57v existem algumas palavras sublinhas e acrescentos na margem, feitos por autor desconhecido, talvez do destinatário: "dívidas com que razão", "com galas, vestidos, damas e toda a mais pompa"; "a quem ou que parentes, se do seu se do meu" e "muito ruim senhor Manuel".

Suporte quatro meias folhas de papel não dobradas, as três primeiras escritas em ambas as faces e a quarta apenas no rosto.
Arquivo Arquivo Nacional da Torre do Tombo
Repository Tribunal do Santo Ofício
Fundo Inquisição de Lisboa
Cota arquivística Processo 675
Fólios 57r-60r
Online Facsimile http://digitarq.arquivos.pt/details?id=2300553
Transcrição Maria Teresa Oliveira
Contextualização Maria Teresa Oliveira
Modernização Raïssa Gillier
Anotação POS Raïssa Gillier
Data da transcrição2017

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Meu thio e sor Dor Mel Mendez Monforte Lxa 11 de Julho de 1713

Na escoadra que partio em o prisipio de Abril escrevi a Vmce por duas ou trez viaz, e ainda que foi larguamte comtudo não disse metade do que se me ofresia, nem agora o poderei dizer, porque era mais pa vocalmte do que pa escrito, mas contudo eixplicarmehei pello milhor modo que puder, cheguei a esta corte ha 8 dias a ezperar ma Irmam, aflitta, e desconsolada, que Ds foi servido restetuirme ontem a ma vista depois de vinte e dois mezes de abzensia, e he primisão devina que o que se devia sentir cauza alegria e gosto na consideração de que estamoz sogueitoz a maiorez emfortunioz, aqui tirei algunz dias de demora, athe a despacharem pa a levar pa a Bra, e falando com ella me segura, cuidara mto em não fazer mal nem inda a seuz inimigoz, o que bem se verefica pello aperto, em que se vio, e a que hia cheguando, Ds nosso sro que lhe deu luz, pa saber o que lhe comvinha premita, tella de sua santa mão e a ella e a todoz noz Livrar de nossos inimigoz

Meu Pro Duarte Roiz Mendez he o portador desta, que se rezolveu a hir e levar esse rapas de ma thia Cna Mendez em sua compa, contra o meu votto, por ser esta jornada sem aquellas condisoinz, e forma com q Vmce o mandava hir, mas elle vendose no mizaravel estado em que se achava se rezolveo a vir a embarcarse, e vendo eu isto, o aparelhei como pude, e não como era rezão por me não achar com que poder fazello, que estão tais os tenpoz que não se pode coalhar vintem, como elle a Vmce dira e foi presizo vender algunz gueneroz que thinha perdendo nelles, a fim de se poder perparar, que ia fiarse hüa pessoa em que em que cobrara de Po, ou Sancho que lhe deva pa poder valerse deste dro, iso he ezcuzado, que parese que he o mesmo fiar que perdello, e quando Vmce se queixa deste mesmo mal, tendo outroz cabedais e outra emteligensia que eu não thenho, q farei eu q não thenho, mais que o que he de Vmce e de mim se fia, algumaz pessoaz, que me fazem favor, sem mais cabedais que os alheios a que he presizo dar satisfasão, mas não he possivel seja nunca a tenpo, alfim, eu lhe dei como pude 400 U e tantoz mil rs como consta do seu Ro que mando, pa elle se aparelhar e paguar algumaz dividaz que devia que não paresia bem que indo elle pa a conpa de Vmce e publicando, o mandava Vmce hir ficase devendo, nada, do meu Pro que Ds premita levar a salvamto dira a Vmce de palavra, mtas couzaz que a mim me esqueserem, e reprezentara a Vmce a mizeria, em que todoz noz achamoz, porque como a mais da parenteira se acha tão pobre que não tem hum pão que comão he forsozo que oz que tem dem metade aos outroz por não pareserem indoze pondo coaize todoz no mesmo estado sendo os negosios tão poucoz, que nem a poder de mto trabalho em a vida que hua, pessoa leva se pode sustentar, e se agora com esta paz, que Ds foi servido darnoz, as couzas não tomarem outro caminho não sei que ha de ser de todos noz com tantaz e tão grandez obriguasoinz, a que deixado por não dar a Vmce tantoz motivoz de sentimto paso, a outra materia

grande he a rezão de queixa q Vmce tem contra mim em não aver dado a Rodrigo de sande oz 1320 e tantos ris que pagou por Vmce da letra que sobre elle veio de roma, e nenhuma desculpa que me livre desta falta, maiz que a de não ter, e por esta cauza he q me emvergonhava, e ezcondia delle, suposto que elle ha de confesar que em serta ocazião vindo eu a esta corte e trazendo hunz tafettas pretoz de castella que sendo bom guenero não thinhão saida, o fui buscar a sua caza, e lhe dise, que eu me via emvergonhado com sua mce em não averlhe emtregue aquelle dro, que eu thinha na minha mão de Vmce mto maior coantia, e que o não tenho dado não era porque a minha mizeria, cheguase ainda a termoz grasas a Dz de que me não achase com cabedal pa poder fazello, mas que este não estava liquido a dro pois trazia hum negosiozinho pa castella, e que este todo, se reduzia a trocoz e mais trocoz que pa elle metia algunz tostoinz que podia ajuntar, e que delle não tirava mais que fazendaz, que eu me achava com huaz, pesas de tafetaz que quizese tomallaz por conta deste dro e que az vendese, pello que quizese que por qualquer preso que oz vendesse lhe faria a conta que nisto não thinha perda alguma, não o quis fazer dise que queria o dro procurei a venda aos tafettas, achei o ocazião de fazer hum troco a ellez, a gueneroz que me servião pa castella, não tive nunca ocazião de ajuntar dro que cheguase a esta qta pa darlho que he tal a mizeria como isso, nem thinha ouro ou prata que empenhar, pa podello fazer, que a von que a vontade, era, e he grande de satisfazer a da letra, e sem que Vmce me digua, que tendo na ma mão dro seu o devia fazer, porque acharme com elle, mto mais depresa o avia de dar se o não tivera, de Vmce em meu poder de que tendo, e sobretudo, achei que seria menoz culpa, a de faltar a Rodrigo de Sande de que a de deixar de dar as esmollaz que Vmce e nosso thio e sro Mel Mendez Monforte me ordenarão dese cujaz dei 342 U como se ve dos Resiboz q mando, estaz são as rezoins que thenho pa não ter dado o tal dro Vmce relevara minhas faltaz, que a saber e conheser bem, oz contratenpoz q tem avido talvez, me não escrevese tão apaixonadamte neste particular.

Vay a conta corrente da solla e caixaz que veio a meu poder na frotta de 710 e por ella vera Vmce esto, 900 U e tantoz mil ris ficando inda alguma sola em ser, e outra fiada em cujoz termoz não pude fazer nesta ocazião o que Vmce me ordenava, e asim pouco a pouco irei remetendo, o que puder pa me ir dezenpenhando, e da conta que mando a meu Pro o sro Marcoz Mendes, Vmce vera me resta do 122 U e tantoz ris. estez pode Vmce cobrar e abonar na ma contta.

Ao fo do Ramalho pode Vmce dizer que Mel Rois da Costa m entregou hum fxo d asucar sem me dizer o que dele avia de fazer, que asim que elle me avizou, emtreguase seu prosedo a seu a seu Pay, que prontamte fiz como elle lhe avizara

Custodio da Cunha se foi outra vez embora segundo as notisias que ha a cauza que teve pa fazello, dira meu Pro, com que ao que elle a Vmce devia não ha mais que perder as esperansas pois as demandas que trazia, se lhe comfiscarão agora todaz e minhas Irmanz, tambem nesta divida tiverão perda na ezmolla que de lla lhe mandava dar nosso thio e sro Mel Mendes Monfortte, que Dz lhe pague a boa vontade e ellas ainda tem a ezperança de que do sro lhe ha de fazer a mesma esmolla suposto não tivese ifheito esta cobransa.

o Bispo saldanha morreo ha mt como Vm ja sabe, e falandolhe Mel De Aguiar na divida nunca foi posivel pagualla dizendo, lhe não lenbrava de tal.

nos Resiboz que mando das esmollas falta o de 160 que Vmce mandão dar a D Justa que este não vay porque como inda ontem sahio não lhe pude falar mas ira na pra ocazião que em saindo das escollas lhe darei o dro e lhe pedirei o Resibo, os mais a qm faltão por se dar as esmollas como se não cobrou couza alguma de sequines não se pode dar a todoz e se foi atendendo aos mais nesesitadoz athe segunda ordem de Vmce.

em qto a clareza e obriguasão que Vmce me pede lhe mande pa que conste o que eu devo a Vmce ou a caza de meus Pais pella fiansa que por noz pagou a D Pedro gomes acho, he escuzada, pois esta divida consta, da mesma obriguação e fiansa que Vmce e nosso thio fizerão por noz ficandolhe senpre a deretto, pa poder aver de mim o que constar paguarão e pela da fiansa, e a mim e a mim a obriguação de satisfazello, em todo, o tenpo, que Dz for servido darme com que poder paguar, que he so, o fim pa que dzo ter alguma ordem devida, e se Vmce lhe parese, que não basta o que digo com seu avizo, mandarei ezcritto, meu ou ezcretura, em que me obrigue a paguar e meus Irmaonz, na mesma forma, aquella quantia q Vmce pagou a D Pedro, que bem sintto que asim, susedese, maz esta na terra a verdade qm foi a cauza de ma destruição que se fora com perda ma me contentara maz ainda quiz a fortuna cheguase a Vmce que he o que mais me deu e da cuido e maiormte peloz disgostoz q Vmce me diz teve neste particular, e em mim sera contino, se a ma pouca fortuna for adeversa, que não possa satisfazer com a ma vontade e obriguação que estimara mais que tudo que Vmce viese no conhesimto qual he, e foi senpre a ma vontade, e tensão.

Com rezão me deve Vmce desculpar em lhe não escrever em todoz os Navioz de avizo que deste Reino partirão o anno pasado, na consideração de que d alem de minhaz continuaz aflisoinz, com que me achava, estava abzente da corte desde 7 de Janro de 712. e não sabia nem avia tenpo pa se me avizar de que partião tais avizos pella pressa e segredo com que ao depois de saidoz me avizavão partirão, e suposto que em huma ocazião me achei nesta corte em que partio hum pataixo, pello coal escrevi a Vmce maz pasado pouco tenpo veyo notisia de ser tomado pelloz fransezes, que asistir que asistir eu nesta corte, bem deve Vmce ter conhesido pellas mais ocazionz, que nunca perdi nenhuma de dar a Vmce novaz minhaz e pedirlhe mas contenuase de sua saude que esta estimarei grandemte logre Vmce livre das molestias e queixaz com que me aviza ficava, e não menoz ma sra thia a Sra Ma Ayrez da Pina, em qm suas sobrinhaz saudozamte se rrecomendão com mil saudadez, fazendo o propio em meus queridoz Primoz, e da pte de ma Irmam Juliana Ma dara Vmce a da sra oz agradesimtoz da esmolla que lhe fez, que bem sabia sua mce que qm como ella sahia de tão grandes trabalhoz, tudo lhe era nesesario, e Dz nosso sro lhe dara o pago, pellaz mcez e favores que continuamte noz fazem, e todoz nos estamoz resebemdo. he qto se me ofrese, se me lenbrar mais algua couza direi em carta a pte fico pedindo a Dz que gde a Vmce ms anns como lhe dezo.

Sobro de Vmce o mais amte q mais a Vmce estima e venera Mel Mendez Cunha

ezquesiame dizer a Vmce que era ezcuzada a recomendasão que Vmce me faz de que por morte de ma May que Dz thenha em gloria, não era nesesario fazer partilhas nem sorte aoz orfaonz, que estas so se fazem quando oz beis do cazal cresem daz dividaz que elle deve mas se estes não não cheguavão mas ainda erão tão lemitadoz que seria vergonha fazerse partilha como avia eu de cuidar em tal ja que foi Dz servido que nenhum de noz tivese legitima de Pay nem de May a, não sendo a nossa caza daz que menos thenha grasas ao sro, na noza terra, mas he tão grande, o animo com que me acho, e a confiansa que thenho em Dz, suposto o meu pouco meresimto que não desconfio inda de que me ha de secorrer, e lenbrarsse da orfande de maz Irmanz que mtoz nasem, sem couza alguma, e vem a ter mto


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