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Maarten Janssen, 2014-

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1817. Cópia de carta de Francisco Quintino da Cruz, mestre de iate, para António Ribeiro Pessoa, negociante.

ResumoO autor pede a compreensão do destinatário, patrão do iate que conduz, para os erros que cometeu, listando uma série de atenuantes. Pede perdão em nome das filhas e da defunta mulher do destinatário. Mostra-se tão desesperado que confessa sentir a tentação de se atirar ao mar.
Autor(es) Francisco Quintino da Cruz
Destinatário(s) António Ribeiro Pessoa            
De S.l.
Para Portugal, Lisboa
Contexto

António Ribeiro Pessoa, proprietário de um iate, processou o seu mestre Francisco Quintino da Cruz porque, depois de lhe ter dado dinheiro e sacas de arroz para ele trocar por esparto em Almería, soube que se tinha dirigido a Gibraltar e aí se escondera, depois de lhe ter vendido toda a carga. O queixoso pediu a prisão do réu no Limoeiro até receber devolvidos arroz, azeite e madeira, além dos documentos do iate e de um dinheiro que lhe emprestara à mulher. Além disso, ao passar por Cádiz, o réu também recebera 50 barris de aguardente de D. Miguel Baldo para levar para Lisboa e entregar a Manuel Ardison, carga essa que também vendeu logo em Gibraltar. Por tudo isto, assim que atracou em Lisboa o réu foi preso. Foi condenado a dez anos de degredo para Angola com açoites pelas ruas públicas da corte. Porém, beneficiando da Lei do Livramento, teve pena suspensa justificada com o facto de sempre ter sido mestre de iates.

A guia que António Ribeiro Pessoa entregou a Francisco Quintino da Cruz consta do processo (fl. 42r) e tem o seguinte conteúdo:

«Senhor Francisco Quintino da Cruz. Lisboa, doze de setembro de mil oitocentos e dezasseis.»

«Com a presente carta, entrego a Vossa Mercê o meu iate Senhora da Conceição e Santo António, de que Vossa Mercê é Mestre. Entrego mais quatrocentos e cinquenta mil réis em dinheiro espanhol, para Vossa Mercê seguir o destino que contratou com o Senhor Manuel Ferreira Guimarães da cidade do Porto, vindo a ser Vossa Mercê ir carregar ao Porto de Almería, carregar a pedra que o dito Senhor determinar, cujo fretamento Vossa Mercê fará escritura e me remeterá a cópia. E o dito dinheiro que acima digo e Vossa Mercê recebeu é para no porto de, dito acima, comprar de esparto. E se dirigirá a esta, onde dará entrada por franquia, e só tendo a descarregar nesta o dito esparto, o qual será dado entrada em nome Senhor Manuel Antunes. E logo que Vossa Mercê chegue a salvamento aos portos acima ditos, me avisará do que lhe tiver sucedido. E na sua viagem fará todos os protestos necessários em os casos que podem suceder, como sabe que é costume, para que quando entrar em qualquer porto, no caso de ter alguma arribada, os ratificar e para que, por sua negligência, não venha haver prejuízos na falta de suas obrigações. As quinze sacas de arroz que leva, importando na quantia de oitenta e um mil cento e setenta, deverá fazer venda dela pelo estado da terra e o seu produto poderá empregar em erva doce ou cominhos, no caso último, passa de Alicante, não se esquecendo da torna guia que deve trazer do Algarve para descarregar a fiança do mesmo arroz.»

Arquivo Arquivo Nacional da Torre do Tombo
Repository Casa da Suplicação
Fundo Feitos Findos, Processos-Crime
Cota arquivística Letra F, Maço 4, Número 9, Caixa 9, Caderno [1]
Fólios 84r-89r
Transcrição Leonor Tavares
Revisão principal Rita Marquilhas
Contextualização Leonor Tavares
Modernização Rita Marquilhas
Data da transcrição2007

Texto: -


[1]
Senhor Antonio Ri-beiro Pessoa Bordo onze de Fe-vereiro de mil outtocen-ttos e dezassette E dezassette
[2]
Infellis de todo aque-lle homem a quem a des-grassa fas timbre de per-seguir,
[3]
a sua prezença , sempre me foi agrada-vel, eu o respeittei sem-pre como a hum bom Pattram e amavel Paỹ em toda a partte espalhei com o maior prazer as boas quallidades do meu Pattram sempre Sempre incançavel a dizer que homem nenhum poderia ter tam bom Pattram como elle
[4]
sempre como tal o respeittei, e amei, e sem-pre em vossa Merçe confiei com a maior e com a mais firme por-teçam de bom Paỹ nam meu mais tambem de minha ttristte mulher e tenros filhos.
[5]
Hoje po-rem que se conttam onze Onze do correntte quando vossa Merçe teve- a bondade de chamarme a sua prezença fi-quei como mortto qu-ando observei a sua indignaçam, a sua in-despoziçam conttra mim e juro a vossa Mer-çe Senhor Anttonio Ribeiro Pessoa que tenho impettos de matarme e atirar commigo ao mar.
[6]
Eu nam posso Eu nam posso negar ao meu Pattram que commetti erros porem o homem he su-jeitto a erros;
[7]
seguindo as suas ordens eu me de-regia para Almeria a cum-prillas
[8]
porem venttos conttrarios me fize-ram abrigar por vezes nesttas desgraçadas abrigadas
[9]
mudaram todas as circunstançias de entteresses para estta Em Estta Embarcaçam
[10]
Bons entteresses comtudo tive eu arranjados em Gibraltar os quaes cubriam despezas e da-vam bons lucros
[11]
porem como pudia eu acau-tellar huma conjura-çam huma denunçia fal-sa que transtornou e tirou os entteresses arranjados com tanto trabalho a es-tta Embarcaçam
[12]
hum denunçiantte costtuma-do ja a viver de denunçias De denunçias falsas e verdadeiras foi quem me quis lançar o fogo
[13]
escapei de ser queimado;
[14]
nam sujeittei o seu Hia-tte a couza alguma
[15]
asi-gnei as lettras digo algu-ma
[16]
nam asignei as lettras a que me queriam obrigar por industria e somentte tratei de correr a prezença do meu Patram porque hera o abrigo aonde me julgava se-guro e tambem para E tambem para com-binarmos as maneiras de recuperarmos os perjuizos destta viagem de cujos avensos me julgo ca-pas como ja mostrei nouttras viagens.
[17]
Es-tou como doido nem sei o que escrevo e portan-to digo a vossa Mer-çe que se compadeça não tanto da minha humil-dade como da minha tris-te e afelitta mulher e tenros filhos
[18]
eu lhe rogo Eu lhe rogo pella Alma da sua senhora que Deos tenha em glo-ria e pella boa sortte das suas meninas que fa-ça o que he proprio da sua boa alma de huma alma nobre e huma alma grande pois que n'huma ou duas via-gens vamos recuperar os perjuizos e hiçar
[19]
esttas foram as visttas que me fizeram correr a sua prezença, e do conttrario E do conttrario nin-guem sertamentte me obrigaria a vir sacraficarme e a entregarme nas mãos do meu Pattram
[20]
a quem amo com afecto e O maior respeitto
[21]
e como humilde creado e obri-gadissimo F Q da C
[22]
PS Estta tarde fui chamado a caza da sau-de e a Mi me apareçeu E a Mi me apareçeu Joze da Barca, com hum Espanhol segundo elle disse a pregunttarme pella agoardentte, a quem respondi o que devia se-gundo a rezam e os toques que me deram
[23]
Eu nada temo porque a razam me governa para com Joze da Barca, e outtros assim
[24]
a quem temo he o meu Pa-ttram porem assim mes-mo vim buscar a sua boa sombra

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