Contexto | Processo relativo a Frei António Pimentel, da Ordem de Avis, natural de Évora e morador na vila de Serpa.
Foi acusado por feitiçaria. Quem apresentou a denúncia contra o réu foi Dona Joana de Noronha,
comendadeira do Mosteiro da Encarnação e irmã de D. Álvaro Pires de Castro, 1.º Marquês de Cascais. Segundo o relato de Dona Joana,
Frei António Pimentel foi falar com ela contando-lhe que D. Bárbara Estefânia Lara, Marquesa de Cascais, o contactara por ter sabido
dos seus remédios. Queria que o réu "lhe desse Remédio", que ela o usaria em seu marido, que viera de França "enfeitiçado".
A marquesa queria que o marido lhe quissesse bem. De acordo com o relato de Dona Joana, transmitido pelo próprio frade,
o feitiço consistia em escrever num papel certas palavras, rasgar o papel em pedaços muito pequenos e depois misturá-los na comida do Marquês.
O portador deste papel foi um criado do Marquês, Fernão Furtado. O frade teria pedido outras coisas para além do papel, tais como:
algo que o Marquês tivesse tocado com as mãos e um lenço de que se tivesse servido. Depois de terem sido tocados pelo Marquês,
a Marquesa enviou ao frade "uns bugalhos, e uma fita amarela e negra, e uma peça de fita encarnada partida em dois pedaços" (transcrição normalizada).
Com estas peças o frade havia de fazer um remédio em que o Marquês "havia de andar sempre sobressaltado e o sono que dormisse seria muito desasosegado
e inquieto, e lhe pareceria que tinha sempre a marquesa ao seu lado". Além disto, a Marquesa mostrou-lhe uma trança com os cabelos do Marquês,
tendo dito o réu que com os cabelos se lhe poderia fazer muito mal. A carta escrita a Dona Joana (CARDS1035) é sobre a relação entre o réu e o Marquês
(o homem de Cascais). Este escrito foi entregue de imediato pela denunciante à Inquisição. A delatora também entregou ao Tribunal do Santo Oficío a
carta que o réu escreveu ao Marquês sob nome falso, bem como a respetiva resposta. O réu foi ter com Dona Joana para lhe contar tudo isto porque
o Marquês não deu importância aos escritos do religioso, nem quis marcar encontro com ele, assim que foi ter com a sua irmã para lhe dar conta do que
se estava a passar e lhe propor um "Remédio" para que nenhum mal fosse feito contra ao seu irmão. Frei António Pimentel foi suspenso por
um ano da sua ordem e teve de realizar penitências espirituais. |