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Maarten Janssen, 2014-

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[1818]. Carta de Joaquim Norberto Ferreira de Mures, escrivão, para Ana Augusta Ferreira de Mures, sua irmã.

ResumoO autor escreve à irmã lamentando a falta de apoio da família e pedindo-lhe um favor.
Autor(es) Joaquim Norberto Ferreira de Mures
Destinatário(s) Ana Augusta Ferreira de Mures            
De Portugal, Lisboa, Cadeia do Limoeiro
Para Portugal, Leiria, Pombal
Contexto

Joaquim Norberto Ferreira de Mures exercia o cargo de escrivão do Geral e Notas da vila da Bemposta e em Salreu (Estarreja). Homem solteiro de 22 anos, era natural de Pombal e filho de José Félix de Mures e de D. Isabel Joaquina Teodora. Dele possuímos um pormenorizado retrato aquando da sua prisão em Pombal: estatura baixa, olhos castanhos, cara comprida, cabelo castanho escuro, barba preta. Trajava uma véstia de abas compridas de ganga, já usada, um colete de caxemira em bom uso, calça de meia cinzenta também em bom uso, botas de montar de atanado em bom uso, coberto com um carapuço de lã com uma fita encarnada e azul, também de lã.

Algum tempo antes, já tinha sido preso em Coimbra por falta de passaporte, seguindo dali para Pombal a fim de se saber a sua identidade, passando então para a cadeia do Limoeiro, em Lisboa. Mas esta era a sua versão. Conforme o auto de sumário feito nesta ocorrência, fora apanhado com armas de fogo, facas e demais armas proibidas.

O processo passou as segundas varas e os seus autos acabariam por subir ao Tribunal da Relação, acabando por ser absolvido e solto por ocasião do Indulto Régio publicado nos Faustíssimos Desposórios de Sua Alteza o Príncipe Real.

Joaquim usou a cópia da sentença para dar baixa da sua culpa e, tornando a Pombal, voltou a ser preso à ordem do Intendente Geral da Polícia, com mandado de prisão e busca, constituindo-se um novo sumário de vida e costumes pelo juiz de fora de Pombal.

Se, na sua ótica, tudo não passava de intrigas engendradas por pessoas suas inimigas, aparentemente, estava longe de ser uma mera vítima. Com efeito, os seus planos em Pombal seriam outros, pois várias testemunhas conheciam as suas ameaças de morte a oficiais de justiça. Apostado em ajustar contas com o juiz de fora, Dr. Marcos António Eiroles, e armado com um sacho e uma faca, por pouco não tirara a vida àquele juiz. Por esse mesmo facto, e por se ter alojado em casa contígua à residência de Marcos Eiroles, seria acusado de ter premeditado a morte daquele magistrado.

Além do mais, fora já arguido na vila de Pombal, por agressão física a Joaquim de Almeida e a António Gonçalves, correndo aquela causa quando ainda estava preso no Limoeiro. Conhecedor dos meandros das leis, Joaquim de Mures alegou em sua defesa não existir sequer corpo de delito, nem o obrigatório exame ocular do estado físico da vítima do suposto espancamento. Teria também propensão para lidar com armas desde a infância, um caráter volátil, explosivo e vingativo. O seu legado viria do pai, responsável por matar dois indivíduos. Negligente com a mãe, não só a maltratara, como a expulsara de casa e ameaçara de morte.

Quanto ao seu ofício, dizia-se que deixara de o exercer por manifestos erros. O seu comportamento delinquente era particularmente notado, sobretudo por manter, em Salreu, negociações com passadores e ladrões de gado, acolhendo-os em sua própria casa. Esta quadrilha já havia atuado na zona de Estarreja, vindo dois dos seus membros a ser presos em Ourém.

No ato da sua prisão, apenas se encontrou em sua posse uma navalha de ponta. Quanto à busca realizada na sua casa, indo as autoridades com o intuito de se lhe achar armas de fogo, correspondência ou outros documentos que dissessem respeito ao réu, encontraram o que procuravam: uma cravina, chumbo miúdo, pólvora e um conjunto de 14 cartas (uma das quais fragmentária).

O presente caso inscreve-se num período em que a Coroa se achava particularmente empenhada em conter as quadrilhas de ladrões que assolavam o reino, deixando as populações em constante sobressalto.

Suporte uma folha de papel dobrada escrita nas quatro faces; na quarta face, encontra-se o sobrescrito.
Arquivo Arquivo Nacional da Torre do Tombo
Repository Casa da Suplicação
Fundo Feitos Findos, Processos-Crime
Cota arquivística Letra J, Maço 59, Número 10, Caixa 176, Caderno [2], Apenso 2
Fólios [7]r-[8]v
Transcrição José Pedro Ferreira
Revisão principal Rita Marquilhas
Contextualização José Pedro Ferreira
Modernização Catarina Carvalheiro
Anotação POS Clara Pinto, Catarina Carvalheiro
Data da transcrição2007

Texto: -


[1]
Mana Limoeiro 21 de Dbro 1817
[2]
bastantes dias te escrevi hua na qual Veras, tenha Recebido, o Como penço a Respeito de Carta de João Gaudencio, por me mandares dizer ele dicera qdo ali chigou tinha falado ao meu Menistro, e depois pedindolhe Carta pa elle Respondera Com ele não tinha amizade mas q escreveria a hum Ao dele o q ja não he precizo, pois q qm me ha de Sentenciar ha de ser o guerreiro e não o Pedroza,
[3]
Se não pencares como f Eu pa o tal guerreiro he q se pertende Remetida ao Tio pois he o mais Siguro pa não Vir aVulça, de Coimbra
[4]
pa qdo guerreiro ou pa pecoa da Sua amizade he q Se pertendia algua fazendote ahi intrega dellas pa as Remeteres ao Tio.
[5]
Ao Elizeu escreVi hum dos Correios pacados pa me aRanjar atestaçoens de Parruco Padres e Escrivãens
[6]
e de A Mai não sei q Veio fazer.
[7]
Veio pa qdo fala comigo lementar q o Tio anda em dezordem com a Tia e não lementa a Prizão do Filho
[8]
de novo me lenbra qdo me dice Vai filho serVir a El rei q o dro ficara pa o Tomazinho.
[9]
Escreve ao Berdo e dis compoem no q hinda nem me escreverão nem dinhro
[10]
podia o Brevidade e de pecoas de Carater como ele Tenente e do Je como Alferes do Coronel Prigrino e do Sargto Mór, e de outras pecoas tais Jqm Valerio quanto mais milhor
[11]
Joze Dias etc
[12]
Dizendo no principio das mesmas atestaçoens o inprego de qm mas paçar e depois Atestando q meu Pai foi Proprietario de hum ofo do Publico Judicial em Votos na Va da Bemposta data de marques de Angueja e q por morte dele eu o alcancei Servindo algum tempo como tem noticia, e q pelo dezarranjo dado na familia o arrendei por Cuidar na Caza e negocios delaao
[13]
e Inventario por falescimento do Pai vivendo com a Mai e Irmans unico em pose que tem, e pa Reguer a Caza Costumava hir ao Concelho da Bemposta Receber a Renda do meu Serventuario, e q em ocazioens tais he q uzava de levar arma de fogo, ou em ocazião de caça i q nunca constara em uzar de Armas Senão em ocazioens tais, e do meu comportamto ser bom, e q consta em salrreu ter Caza ql noço Pai tinha adequirido
[14]
e q nem eu constou em ser o q talvez jurassem a ser Sinhores dahi nem tão pouco darlhe quartel
[15]
Estas atestaçoens Se Joze Dias dicer q cada hua deve Ser Sobre Si basta Ser cada hum em meia folha de Papel e pa Se não amarrotarem, pode o Branco vindo pa pa esta Cidade Trazelas a mim q estou nos corredores da Cidade, ou outra pecoa capaz,
[16]
e não havendo Com brevide Remetidas ao Tio querem se Reconhecidas ahi por hum Snr Escrivão,
[17]
Se não foce o Menezes hera bom pa eu paçar tãobem hiar
[18]
Destas Atestaçoens fazem mais Cazo do q de Justificaçoens
[19]
se te porem Cuidar nisto com Cuidado ou Rogar ao Elizeu Cuide fazio Senão fação como lhe parecer máis comforme as Suas Vontades etc
[20]
Inpinhandoce tanto como a Mai não he male, q lhe importão os negocios do Tio e saber dos Prezos de sima q aqui estão a qm vendi ou tanho vindido as bestas
[21]
talvez com o cheiro do q he meu péção eu tanha Sentença de hir puxando pla troxa como me parece
[22]
mas antes darei providencias pa livar o caminho q eu quizer e q he meu e Se não morrer permeto a volta ou mais tarde ou mais Sedo.
[23]
Nem de Tio nem de Parentes nem de amigos nada espero Senão o q for em meu perjuizo, como a esperiencia me mostra,
[24]
Se me importace o q me pertence Eu aqui não viera Se na minha Caza me deixace estar,
[25]
esta lição serveme de mto
[26]
pa o futuro mostrará como devo viver.
[27]
Asim como as Cartas q escrevi antes da Mai vir pa q não viece se dice não Receberão o mmo se dira dos q Se Seguirão;
[28]
emfim seja o qto for o tempo veremos
[29]
Não são estes trebalhos os q bastão pa me amançarem
[30]
O Bernardo me emprestou 3 moedas q foi levar pao Tio por q me mandou dizer q os papeis não podião dar paço Sem dinhro
[31]
he parente e basta dos meos
[32]
he o que espero.
[33]
A Mai aconcilhada he q me parece viria,
[34]
eu de novidades não quero saber.
[35]
O Joze me escreveo a dizer q não lhe tinhas respondido
[36]
Ve se escreves a D Ana de Sima de Muro pa ver Se lhe serve de algua Coiza.
[37]
Escreve ao Monteiro q não sei onde mora pa ele me Procurar, e eu falarlhe q me he mto precizo ou pa q elle me mande dizer por Portador onde esta pa eu lhe escrever.
[38]
de Anto Mauricio e de Selestiano nada de novo, he o q atras ja dice.
[39]
ADs
[40]
sou prezo perdi o nome

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