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Maarten Janssen, 2014-

PSCR1555

1701. Carta não autógrafa de Maria Solteira, pseudónimo de Maria Ferroa, para o bispo de Coimbra [D. João de Melo].

Autor(es)

Maria Ferroa      

Destinatário(s)

João de Melo                        

Resumo

A autora pede conselhos ao bispo de Coimbra, pois a sua família arranjou-lhe um noivo mas ela não quer casar, uma vez que fez um voto de castidade.
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Temeridade he molestar a V Illma sogeito, q ainda q subdito, se acha imcapax, assim pella rezão do sexo, como pella de sua humilde esphera; animao contudo a tomar este atrevimto a benignide de tão sto, e vigilante Prelado, e Pay spiritual, e a necesside em q se meu spirito, q por não querer tirarsse do q for vontade de Deos, pa segurança da salvação consulta com V Illma o estado em q deve ficar, e isto porq o seu comffessor, e parocho, talves com algũ temor de molestias temporais, q lhe podem sobrevir, a não quer dezenganar.

Meu Pai e sr com a boa vinda de V Illma deste Bispdo e com a do parocho q hoje assiste nesta frega, q com algũa clareza explicava a doutrina conteuda na pastoral de V Illma, e no livro da concordia spiritual, e tambem com algũas praticas, assim do mesmo, como com as de religiozo comissario dos 3os do convto de gouvea, sendo de pouca ide me fui affeiçoando, a querer servir a Deos, e sem embo q tinha mtos im-pedimtos, por viver debaixo do patrio poder, me rezolvi a pedir lca a meos Pais pa entrar por terceira de s. francisco e dandoma professei findo o anno, e querendo fazer voto de castide; como fis na da profissão pedi pa isso lca, e me não lembra se meos pais ma derão, e estando na ide de 18 annos qdo fis a profissão consagrei minha virginde ao spozo verdadro das almas xpo Jezus, de quem por meio da oração q tinha quazi continua sem q deixasse de servir a meos pais no q permetião minhas forças, recebia particulares favores no interior, aborrecendo sempre o estado dos cazados; padecendo porem algũas en-fermidades e hũa doença grave, sahi della a da virtude da pureza com mais afferro, sendo q padeci mtos tempos se-quidões pa os exercitios spirituais não me faltando contudo o sor com bons affectos, dezejando eu sempre fazer o q fosse vontade de Deos. no principio do anno sancto me achei com algũas tentaçois de q a vida q intentava de guardar pureza, era ocioza e q o sor queria outra couza de mim, e se bem me vi aflita fui continuando com a oração, e confian-ça em Deos com o mesmo intento de conservar a pureza; Succedeo enfermar irmão em quem tinha confiança q tomando estado me serveria de arimo no cazo q meos pais morressem, pa q eu não desfalecesse no meu intento, e assim pedia com instancia na sua doença a Deos q mo livrasse da morte, foi contudo vontade sua levallo pa si com cujo successo se me reprezentou q Deos me não queria neste estado q eu pretendia, e vivi con tão grdes desconsolaçois e desconfianças depois deste successo q considerava não serião minhas obras agradaveis ao mes-mo sor em forma q passou maior parte de anno sem receber a sagra-da comunhão e poucas vezes me confessei, costumandoo fazer ameudo vivi nestes tempos com siquidois graves, e na oração se me reprezentava q Deos me queria em outro estado, e que ficando no de cazada poderia gerar creaturas q sendo religiozas louvassem mto a Deos, e que tambem fi-caria empardda faleçendo meos pais, isto me apertou mais na somana sanc-ta passada e logo deste tempo, ou por me quererem emparar, ou por remirem algũas dividas estes me solecitarão espozo sem pedirme consentimto; o q sabendo eu repugnei, e repugno tomar estado de ca-zada, por entender faço agravo ao melhor spozo, e que não será este o estado em q me aja de salvar, e tambem pello voto q fis e sempre dezejei conservar, sem ter inclinação em tempo algũ ao con-tro não porq eu o merecesse mas porq o spozo Divino me da-va alentos pa vencer o que neste particular se me offrecesse. por outra prte me fas escrupolo a molestia q dou a meos pais e parentes não consentindo no cazamto que tem tratado, o q não recuzo fazer por querer outro spozo temporal, pois o não merecia, e menos as riquezas q me dizem ter, mas pellas cauzas assima referidas E porq não quizera fazer senão o q fosse mais vontade de Deos, e esta me he oculta consulto a V Illma pa q me diga o q devo fazer neste cazo pois o meu confessor me não quer dar nelle dezengano pello temor referido o q pesso a V Illma con toda a sumição e humilde como verdadeiro pai das almas e vigilante Prelado me remedee esta aflicção do spirito ordenando o q mais for servo de Deos, q sendo o como eu quizera ficar no estado do celibato, não me dera dever com q meos pais me lançarão fora de si; sem embo q não quizera deixar de servillos e alimentallos com o meu trabalho contanto q comserve a pureza a qual me parece deficultoza de conservar nestes tempos no estado de cazada, pois não considero no espozo q me querem dar o spirito de sto Henrique marido de s Cunegunda, nem o de S Elzeario, e S Delphina. Pesso a V Illma perdão deste atrevimento Atrevimento e molestia q nesta lhe dou o q faço pa segurança de minha alma, e alivio do spirito, pois não justo em semelhante cazo, resolverme sem guia, e torno a declarar a V Illma q quero o q mais for vontade de Deos pa segurança de minha alma e q nenhũa vontade sinto de tomar estado conjugal. A Pessoa de V Illma gde Ds como dezo pa emparo de todos, a quem com toda a humilde peço a benção. Folhadoza e de Agosto 12 de 1701

Humilde escrava de V Illma Ma soltra


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