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Maarten Janssen, 2014-

PSCR9382

1602. Cópia de carta de João Nunes Baião para Isabel Mendes, sua mãe.

ResumoO autor mostra-se apreensivo por temer não vir a ser libertado tão cedo. Conta à mãe que recebeu uma lima, mas ainda espera um fuzil. Pede-lhe que confie na intermediária que lhe leva escritos e encomendas à prisão.
Autor(es) João Nunes Baião
Destinatário(s) Isabel Mendes            
De Índia, Goa
Para Índia, Goa
Contexto

Algumas das cartas trocadas entre Isabel Mendes e o seu filho João Nunes Baião, quando este se encontrava preso em Goa (o que acontecia desde 3 de março de 1600), foram apreendidas pelos inquisidores e incluídas no segundo processo de Isabel Mendes, presa a 5 de abril de 1603. A cópia do processo, acompanhada do traslado das cartas, foi enviada pela Inquisição de Goa para a de Lisboa. Nela, encontram-se trinta cartas: cinco da autoria de Isabel Mendes e vinte e cinco da autoria de João Nunes Baião, escritas entre 1602 e os primeiros dias de abril de 1603. Duas destas cartas, "um papelzinho embrulhado noutro com uma linha por cima", com a letra de João Nunes Baião, foram entregues aos inquisidores no dia 4 de abril de 1603, por Simoa, uma escrava do alcaide Brás Martins, que as tinha consigo para as entregar a Isabel Mendes. Uma terceira carta, da autoria de Isabel Mendes, foi entregue aos inquisidores por um escravo do mesmo alcaide (PSCR9376). As restantes foram entregues por Leonor Costa e encontravam-se num saquinho que Isabel Mendes deixara propositadamente em cima da cama no momento em que foi presa, tendo pedido a Leonor Costa que as queimasse.

Algumas cartas tinham sido escritas em cifra ‒ é o caso da carta PSCR9380; no entanto, na cópia do processo enviado para a Inquisição de Lisboa, a carta foi trasladada e descodificada. Sobre as cartas cifradas, Isabel Mendes confessou que pedira ajuda ao seu neto António de Vilalobos para escrever as que enviou ao filho e para lhe ler aquelas que recebeu do mesmo. Inicialmente, mãe e filho trocaram correspondência por intermédio de uma cozinheira da prisão, a qual entregava também a João Nunes Baião alimentos e outros bens que a mãe lhe enviava. A partir de certa altura, a cozinheira teve medo de continuar a servir de intermediária e Isabel Mendes socorreu-se de um António, um escravo («bicho») do alcaide Brás Martins. No entanto, António não entregou muitas das cartas: rasgou algumas delas, ficou com alguns bens que Isabel Mendes lhe confiou para dar a João Nunes Baião, e, sem sucesso, tentou enganar Isabel Mendes com uma carta falsa, supostamente da autoria do filho, a pedir dinheiro. Depois deste episódio, António nunca mais se prontificou a entregar cartas. Isabel Mendes socorreu-se, então, de Simoa, uma escrava do alcaide Brás Martins, a qual passava as cartas a um Francisco, escravo do alcaide Brás Martins, que lavava os bacios dos presos, para as entregar a João Nunes Baião, de quem também trazia correio.

A comunicação entre Isabel Mendes e o seu filho foi descoberta a 4 de abril de 1603 pelo alcaide Brás Martins. Nesse dia, Francisco, um escravo de Isabel Mendes, apareceu à porta da prisão a abanar-se com uma folha de figueira ‒ o sinal combinado com Francisco, o escravo que lavava os bacios ‒ e entregou um bolo embrulhado num lenço e uns mogorins para dar ao preso. Do balcão da sua janela, o alcaide testemunhou o encontro entre os dois escravos e mandou deter o escravo de Isabel Mendes, obrigando-o a confessar. Isabel Mendes foi presa no dia seguinte.

Arquivo Arquivo Nacional da Torre do Tombo
Repository Tribunal do Santo Ofício
Fundo Inquisição de Lisboa
Cota arquivística Processo 12792-1
Fólios 7v-8v
Online Facsimile http://digitarq.arquivos.pt/viewer?id=2312999
Transcrição Teresa Rebelo da Silva
Revisão principal Catarina Carvalheiro
Contextualização Teresa Rebelo da Silva
Modernização Catarina Carvalheiro
Data da transcrição2015

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Ontem vinta tres de Mayo q foi quintafra vi o seu o qual diz q fez q quintafra a vinte de Mayo não fez boa conta perq segundafra forão vinte. Muitas couzas me não diz q esperava, nẽ me manda o fuzil. A letra leo melhor q toda outra, mas pareçe q canssa VM. E per isso não diz Diz o mais. De ler bem esta folgo mas se tardão tanto, e vão em pedaços não posso fiarme de tudo o q quero dizer; a lima folguei, ate agora não vi o mais q manda, mas se vem polla dama esta çerto, e tudo o mais de sua mão perq sou seu cativo cada vez mais. o q ella diz da meza q se fez sera assy, mas eu não fui chamado a ella, nẽ a outra ate agora. Eu estou mto desconsolado Cuidadozo do q sera, por isso estimarei as boas palavras de VM q me serão escudo pa minhas Imaginacõis, e por isso me peza de não poder ter do padre algũ allivio de sua pru-dençia, e amor q me tem. Mas nisso não se pode fazer nada. Do q de me vinha primero sei mto bem, e tudo me davão, E tanto q deixou de vir logo me disse o velho o q passava, E q lhe pareçia q VM o contara, e por isso lhe tolherão: por isso encomẽdo a VM estes perq farão maior cauza como sabe, por isso he bom ter conçertado com a moça se proveitar veremos per este Anto me peza não estar ahy, Ja q o pay assi o trouxe, mas elle tornara se o VM chamar; a Reposta do q lhe esCrevi espero. Não perq he milhor a sua letra senão polla companhia q fara neste de VM hũa palavra não pude entender onde diz q a fa de frco Nuz cazou o mançebo, outra palavra não entendy; mas pouco vay Ds as ajude, tambem da outra fa não me diz o ma-rido os dous Canarins q forão he verdade fizerão no melhor do q eu cuidava, pedi as contas per sinal, mas folgara comellas perq me acho bem com o bom cheiro, e por isso tenho tantas vezes fallado nella nũqua me vm respondeo, Mas a Dama me mandou ontem tres continhas, q lhe pedi, lho pague, E a mỹ me deixe servila como desejo vm diz me q dos mais amigos não sabe, E diz q o pe he o maior q tenho, não sei como isso , encomendeme a ds, E a virgem q me console en tanta tribullação. veja se algũa novidade sobre mỹ sobre mỹ q estou descoroçoado, Lembre Ds de mỹ E a virgem dos Remedios minha snora. Digame se alguẽ foi ahi pedir algũ Livro q me emprestou, A benção de Ds, E a de VM me cubra Amen


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