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Maarten Janssen, 2014-

CARDS0039

1809. Carta atribuída ao Padre António Vidal Ferreira Pinto, assinada com o nome Godinho de Albuquerque e enviada a António Simão de Oliveira.

ResumoO destinatário da carta é insultado e ameaçado por andar a maldizer um padre da terra.
Autor(es) António Vidal Ferreira Pinto
Destinatário(s) António Simão de Oliveira            
De América, Brasil, Maranhão
Para S.l.
Contexto

O capelão de Cururupú, o Reverendo António Vidal Ferreira Pinto, foi denunciado em 1813 por um lavrador inimigo, José Gonçalves Castelhano, enquanto culpado de uma série de crimes. O réu foi acusado de viver "escandalosamente amancebado durante mais de nove anos com Faustina Teresa, mulher casada com o alferes António dos Reis", e ainda "concubinado de portas adentro com a preta forra Maria Benedita." Disse-se ainda que era "muito remisso na administração dos sacramentos, como aconteceu com um homem branco, filho de Portugal, e com uma escrava chamada Iria do Padre António Alves Domingues", e também "um refinado negociante." Dava "conto e asilo a homens facinorosos e degradados, como um João Alves, homem de tão péssimo caráter que tem chegado a forçar algumas mulheres, dado pancadas" e era "costumado a apanhar cartas alheias para as abrir e ler e, por este meio, descobrir os segredos das famílias e dos particulares." Fazia "um notório e sórdido monopólio dos mesmos sacramentos, não batizando senão por mil e seiscentos réis, quando a esmola que recebe o pároco não excede a quatrocentos réis, e não assistindo ao sacramento do matrimónio sem que lhe deem três mil e duzentos réis." O autor do processo, no entanto, acusou também o dito padre de um crime mais banal. A 25 de setembro de 1812, o padre teria cometido contra si um "rigoroso furto": o roubo de um boi de carro, mandando-o matar "por dois dos seus agregados, com o pretexto de que tinha ido à sua roça", fazendo com que se enterrasse o coiro e a cabeça do animal "para que se não descobrisse o malefício" e conduzindo a carne para sua casa. Ao fim de um processo criminal que durou 6 anos, o capelão acabou absolvido.

Suporte meia folha de papel dobrada escrita nas quatro faces.
Arquivo Arquivo Nacional da Torre do Tombo
Repository Casa da Suplicação
Fundo Feitos Findos, Processos-Crime
Cota arquivística Letra J, Maço 3, Número 17, Caixa 11, Caderno [1]
Fólios 37r-38v
Transcrição Rita Marquilhas
Revisão principal Rita Marquilhas
Contextualização Rita Marquilhas
Modernização Clara Pinto
Anotação POS Clara Pinto, Catarina Carvalheiro
Data da transcrição2009

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Sr Anto Simam de olivra

Irmam carissimo das santas almas, nunca peguei na pena com tanto dissabor como na prezente ocazião pa vos communicar o mto que sinto o ruge ruge dos vossos procedimtos Dizem q estais feito hum Almanach desse Cururupu, quero dizer hum Corro da posta, q levais, e trazeis novides e q sois hum pesquizador excelente da vida alheia, deteriorando mtas pessoas no seu credito, sem atenção aos seus carateres, e dignidades, entre estas ao Pe desse Cururupu, de qm tendes falado com mta largueza, como fizestes hua vez na va de Guimes satirizando-o de Tabalião do Alfes Anto Martins por cauza do esquecimto da asinatura de hua carta, de que outros tão bons, histo he pedantes, como vós mofarão O tal Pe teve logo qm o inteirasse das boas auzencias que delle fizestes, tanto nessa occazião como de outras, em q vós na mma Villa despejastes o vosso Papinho, tal foi em dia de Natal em caza de Mel Ignacio, q dormindo vós na vespora, em caza de Joaqm Mel estando ahi o dito Pe o q ouvistes o fostes pintar na Va mto diverso do original, o q vos faz objeto de irrezão e aborrecimto Olhai Irmamzinho das almas da santa Cari Caridade, metei a vossa lingoinha no Cu, ou ponde hum freio na boca, e se não tiverdes algum que vos sirva mandaimo dizer, pa vos mandar fazer hum q vos contenha no modo de falar, aliás estais em maos lansois; porq eu ouvi dizer ao dito Pe qdo veio a esta Cidade, em q se falou em vós, q esperava ocazião de vos agradecer os vossos elogios; lembraivos, q elle tem amigos, e está na aceitação de mtas pessoas de bem nesta Cidade, e q o acreditão mto e tambem he constante q o Coronel de Guimaraens he seo Ao a qm o mmo Pe communica os vossos dilirios, e de outros, tambem, da vossa religião lembraivos q sois mto verde, como vos chamou o do Coronel, hua ves, q vos ameaçou com a cadeia, por seres bacharel, daqui podeis infirir, q he mor perder por carta de menos, que por carta de mais: acompanhai com os bons; vede o cazo que fazem de vós; lembraivos da supradita noute de Natal, em caza do referido Joaqm Mel, em q toda a noute asociastes com o seleiro, em q papastes por Albardeiro, e q cosmestes á meza em pe, como oficial de Albardas, sendo vós hum oficial de Malias: tudo efeitos de vós seres hum verdugo contra o Pe de qm o dito Joaqm Mel he mto amigo Estas, e outras mtas notas q por falta de tpo vos não relato, me tem ferido os ouvidos, e magoado o coração Meu rico Irmãozinho das bentas almas, conciderai o q sois, não vos façais grande, sendo da marca pequena, abatei essa bazofia, que tendes de sabio, e esperto, sabendo todos q sois hum Asninho; dizeime, tendes ja ganhado algum habeto de Christo pello oficio de marandubeiro? mas he ja pençao q tem os da vossa estatura de quererem chegar com a lingoa, aonde não podem com o corpo Sede pois, caladinho, não vos emporte a vida de ninguem, e adquerireis a estima de todos. Emfim qm esta vos escreve, não he Ilheo, q vos furte a Imoça q comprastes por dois frascos de agoardente, nem qm se despeque por cartazios, nem a qm vós tinhais por homem de saco, e botige, nem a qm vós digais q dorme em cama de folhas de Joçara, he hum vosso parente mto chegado por pte de Pai, e Mai, q vos qr mto e continuamte está com as camandollas na mam, pedindo a Deos q abençoe os vossos progetos. Dezem me q cazara vossa Irmam, e q achara bom marido, o q estimo Dailhe lembranças mas e a vossos Pais: E a Deos, q vos faça milhor do q sois, e q permita torneis a estima daquelles q tanto tendes agravado; e se vos não servir esta carapuça; hide vos sepultar no obim, com mais de mil Diabos indegar caboucullas, e pretas, pa lhe beberes os ovos, q han dem ser ser coadonados á vossa quiza.

Vosso Servo Godinho de Aboquerque Maranhão 25 de Janeiro de 1809

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