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Maarten Janssen, 2014-

Representação em facsímile

1609. Carta de Filipe Rodrigues de Montalto, médico, para o seu cunhado Tomás da Fonseca, médico.

ResumoO autor dirige-se ao seu cunhado, residente em Lisboa, queixando-se da falta de comunicação entre ambos e convidando-o a juntar-se-lhe em Florença.
Autor(es) Francisco Rodrigues de Montalto
Destinatário(s) Tomás da Fonseca            
De Italia, Firenze
Para Portugal, Lisboa
Contexto

Aquando da prisão, em 1609, de Tomás da Fonseca, médico, nascido na Covilhã, foi encontrada no seu espólio uma carta não assinada oriunda de Florença. No decurso dos interrogatórios, Tomás da Fonseca confirmou que conhecia a carta e que lhe tinha chegado às mãos poucos dias antes da sua detenção pelo Santo Oficio. Originalmente, não a quis receber por não saber quem era o remetente, vindo depois a perceber que se tratava do seu cunhado Filipe Rodrigues de Montalto, cristão-novo e médico residente em Florença, que considerava bom cristão. O facto de a missiva ter sido endereçada à “Cutilaria”, local onde já não residia há ano e meio, foi argumento usado para demonstrar que não existia um contacto regular entre ambos. No entender do inquisidor, a carta continha claro incentivo a que abandonasse o país e abraçasse a fé judaica, algo que Tomás da Fonseca foi refutando. Apenas em 1611, quando foi confrontado com a pena capital, é que aceitou confessar, implicando um vasto conjunto de pessoas, muitas delas familiares, entre os quais Filipe Rodrigues de Montalto, o qual havia deixado Lisboa em 1602, quando a emigração de cristãos-novos foi tolerada oficialmente. Possuía estudos de medicina, adquiridos em Salamanca. Em 1606, compôs um tratado sobre ótica. Foi também médico na corte de Luís XIII de França e de Maria de Médicis.

Bibliografia

Salomon, H.P. (1983), Une lettre jusqu´ici inédite du Docteur Felipe Rodrigues Montalto (Castelo Branco, 1567 ‒ Tours, 1616), Paris, Fondation Calouste Gulbenkian/ Centre Culturel Portugais.

Suporte uma folha de papel escrita em ambas as faces.
Arquivo Arquivo Nacional da Torre do Tombo
Repository Tribunal do Santo Ofício
Fundo Inquisição de Lisboa
Cota arquivística Processo 1355
Fólios 29r-v
Socio-Historical Keywords Tiago Machado de Castro
Transcrição Tiago Machado de Castro
Revisão principal Rita Marquilhas
Modernização Catarina Carvalheiro
Anotação POS Clara Pinto, Catarina Carvalheiro
Data da transcrição2013

Page 29r

De Florença a 17 de agosto de 609

Injusta cousa , que se passe a vida em perpetuo silencio, e que nem Vm queira saber de mi, nem eu o obrige a me dar no-vas de si; se me constasse, que minhas cartas não lhe serião moles-tas, prosegeria esta suave comunicação, em falta da pessoal. Dobrasse a penna, quando alẽm da auzençia, são negadas ao homẽ, novas de quẽm ama, e se Vm conspira com os mays, direi de todo, extraneus factus sum fratribus meis, eis nos em estado, que não sabemos de Vms, e se alguhũa nova temos d alguhũa parte, imperfeita, e incerta, e inquietanos muito in diluvio aguaram multarum, como por qua soa. folgara poder mandar hũa viva reprenção, e que com efficacia soubera representar a pouca rezão que Vm tem de estar tão afeiçoado a essa terra, pois sendo certo que, cadent a latere tuo mille, et decem millia a dextris tuis, grande favor do ceo neçessario pera segurar, ad te autem non appropinquabit , quanto mays, que mostra ser pouco sensetivo, quẽm tem animo pera ver semelhantes espectaculos. de nossos coraçöns, posso testificar, que a auzencia inda que longa não de-menuie, antes acreçenta o amor, do qual o primeiro effeito dezejar sumamte ver a Vms, não pera remedio de nossas pennosas saudades, porque isso seria interesse proprio, mas pera que Vms gozem da quietação d alma, e dos mays bẽns, que nosso Snor a quem ama, fora dessa estancia; E não dezeiamos, mas tambem, pedimos ao Autor de todos os bẽns, que conçeda a Vms essa felicidade. Do Snor Doutor se soou, ser vindo a Madrid, con desse-nho de vir a Anvers, ou a Florença, esta nova, inda que incerta nos alegrou muito, principalmente por nos parecer que não seria elle , porem nesta incerteza estamos solícitos, e Vms atè a comunicação de seus desenhos nos ne-gão, esperamos emenda. A consorte se encomenda em Vms mui saudosamente, o mesmo fazem os meninos, Raphael tive doente, de hũa gravissima enfer-medade, da qual foi nosso Snor servido escaparmo por sua misericordia, seja pera seu serviço, mas ficoulhe scirro no ventre, o qual o não deixa re-cuperar perfeita saude muitos meses, e inda nos inquieta. Nosso Snor guarde e prospere a Vm, em companhia da Snora Donna Izabel. Querendo Vm fazerme m de me escrever, seja com cuberta a Ruy Lopez e Diego Roiz.



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