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Maarten Janssen, 2014-

CARDS9076

1717. Carta de Francisco Antunes Ferreira para Manuel da Costa, padre comissário.

Autor(es)

Francisco Antunes Ferreira      

Destinatario(s)

Manuel da Costa                        

Resumen

O autor apresenta ao destinatário todas as provas que julga ter dos feitiços que Guiomar Pereira, meretriz, lhe lançou a ele e a outros homens para os ter apaixonados.
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Meu Sor Rdo Pe Comissario Manoel da Costa

Denuncîo ao tribal do sto offo por ordem de comfessor Franco An-tunes Frra Pintor nal, e mor na Rua das taypas da çide do Portto da frga de N Sra da Vitoria, de Guiomar Prra mer meretris natural da cide de Lxa fa de João Pinto Pra defunto criado q foi do fi-dalgo do Bomjardim, e de sua mer Mna Carva a Lisboana por al-cunha, Lavadra e mora defronte do Adro de sto Andre frga de sto Ilde-ffonço extramuros desta cide, e ella dta denunçiada mora por bayxo dos selleiros do pão ao calvario novo defronte da qta das virtudes frga de sto Ildeffonço; por prezumpção de ter pacto com o demonio, e por virtude de obrar couzas, com q fizesse comtinuar em corresponderemna os homens, com qm trata, e tratou illicitamte, e q outros a procu-rasem, e pareçesse a todos fermoza, e lhe quizessem bem, e dispendesem mto com ella.

O q a esta prezumpção me persuadio foy, q falando eu com a denunçiada por tempo de Dous mezes, por algũas vezes tive com ella algũas dissenssõins, e sem embo de por cauza dellas não querer falar com a denunciada, poucos dias se passavão, q eu como violen-tado não fosse falarlhe, procurandoa, e dandolhe dinhro mtas vezes com largueza, e não deixava eu de fazer reflexão admiran-dome asim sobre o alvoroço com q a pcurava. como sobre o gastar tanto com ella, qdo com outras similhantes mers mto menos dispendia não passando de 240 rs, e 480 rs

E andando asim perplexo, receando q ella me tivesse feito algua couza, busquei meyos pa me retirar della, e não me foi possivel, the que me vali de N Sra da Nativide da fonte da Arca, fazendolhe hua novena com premessa de hũa esmolla, pedindo-lhe me acudisse, e fizesse esqueçerme de tal mer, e no ulto dia da Novena emcontrando Anta Correa mer soltra, vezinha q foi da denunciada, e hoje mora na viella do ferrás dta frega de N Sra da Vitoria, e por ser grande amiga da denunciada, lhe reprezentei em segredo o sentimto com que andava; e ella e ella me respondeo, q em hũa das occazioins, em q eu estava differente com a denunciada, lhe disera esta, q ja tinha feito as pazes comigo, e q ella denunciada fazia aquillo zonbando em chegando a meixer os paos, q ella dta Anta Correa sabia; e q em outra occazião lhe disse-ra a denunciada: «Anta eu hey de amarrar o Franco Antunes»; o que ella dta Anta Correa não duvidava fizesse a denunciada, por ser de mto alma plo q lhe tinha vto fazer alguas vezes, e lhe tinha dto a mesma denunciada, q he tudo o seguinte.

1 Que uzava dar pão abocanhado della denunciada aos homẽns q entendia dispenderião mto com ella, na ocazião, em q hião a sua caza convidandoos pa comer, ditas primro no pão, e qdo o comião palavras diabolicas.

2 Que tambem costumava lançar no comer agua, vinho, tres cabellos de cada hũa das tres partes do corpo mto miudamte picados, e raspa, q tirava das unhas dos pes, e com palavras diabolicas dava tudo pa os homẽns não pararem sem a procurarem, e dispenderem mto com ella, e a estimarem, por lhe pareser mto fermoza, e andarem à obeda della denunciada, e q tudo qto souvessem lhe contassem.

3 Que ella denunciada lhe disera, q tinha hũa mão de toupeira pa fazer q os homẽns a procurassem, e q pa Snr isso havia de passar com ella tres portas da cide, e nellas dizer certas palavras, mas q inda se não tinha exposto a fazello.

4 Que costumava pór hũa tripeça com os pes pa sima e nelles punha tres pedaços de vella de certa medida, q tinha, e acezas a punha aos pes da cama, e descalçandosse, e rezando ao que parecia, andava a paciar com mta pressa sem falar com nynguem, por tempo da reza de hum rozario, e dezia ella denun-çiada a ella dta Anta Correa q aquillo era a reza das almas.

5 Que dissera ella denunciada em hũa ocazião a ella dta Anta Correa, e em outra a felicia de Mello mer soltra, e vezinha da denunçiada, q pa ver se os homens lhe querião bem uzava de lançar húm vintem em hua tigela de agua. que

6 Que costumava comprar húm pucarinho novo de prado, emxofar, vinagre, e pimenta, dizendo antes de ajustar o preço certas palabras, e vindo pa caza punha tudo no Lume dentro do pucaro, e com grande ansia começava a abanar, e a dizer palavras diabolicas, chamando pellos demonios, e prohibia a ella dta Anta Correa, e a Mel Coelho q a denunciada tem consigo a titulo de sobrinho, q não falassem em o nome de Jesus emqto se não abrazasse com fogo, o q dentro do pucaro estava, e q ao dipois o punha debaixo da cama com o fundo pa sima.

7 E q tudo isto fazia entre as onze, e meyo dia, âs Ave Marias, e das onze pa a meya noute, q sam tres vezes no dia; e q tudo isto via tambem fazer, e sabia o dto Mel coelho declarado no no 6o, q he fo de franco coelho cirg cirurgião, e asistente nas ptes do Brazil, o qual andou amigado com a denunçiada algũns annos, e sera o dto rapas de ide 13 pa 14 ans, e susposto a denunciada o tenha com titulo de sobro, não tem com ella rezão algũa de pa-rentesco.

8 E q ella dta Anta Correa tinha por certo conseguir a denunciada com estas couzas, o seu pretensso effeito; porq falando com ella denunçiada o Presbitero Dos da Rocha Pintor, e mor na travessa do pastelleiro de sto Eloy, q he da dta frga de N Sra da vitoria, este despendia no prencipio mto pouco com ella, e q dipois que a denunciada lhe fizera o referido logo se alargara com ella no dispendio dandolhe mtas couzas de valor, e q inda hoje estava dispendendo mto.

9 E q em outra occazião se gabara ella denunçiada a ella dta Anta Correa, q estando fazendo o q fica dto no N 6o a João da fonca homen de nego desta cide, e mor â ponte nova frga da , antes q ella acabasse a estava elle ja procurando â porta. e estando eu em hum Do, ou dia sto de preceito do mes de 7bro 4a fe passada com a denunciada â sua janella pella pte de dentro, passara o dto joão da fonca pa a dta qta das virtudes a falar com o Dor juis dos orphãos, q neste tempo nella asiste, e por eu saber q a denunciada falava com elle, reparei em que elle elle não fes cazo da janella, nem pa ella olhou, e dizendo eu isto â denunciada me respondeo ella, q sim andava o dto joão da fonca a monte por certas rezois, q entre sy tiveram, mas q se ella denunciada quizesse logo o faria vir ao Rego brando com hũa cera, e q o ponto estava em ella dar ordem a porse nisso; e despois deste dito quiquei com ella mto asustado pela suspeita com q della andava.

. E q tambem em outra occazião se gabara a denunciada a ella dta Anta Correa, q falando com Jozeph Ribro caixro de Mel Antunes Lage mercador e mor aos arcos de sam Dos frga da desta cide lhe fizera por vezes o q se declara no N 6o âs onze horas da noute, occazião em q elle estava dormindo na cama, e acordara mto ansiado, e apertado do coração, e que não podia parar sem a vir procurar, e ver a denunçiada a qual dissera isto mesmo o dto jozeph Ribro, e q ella lhe devia ter feito algũa couza: porem q ella denunçiada dis forçara a resposta dizendo: não te fis nada.

11 E q em outra occazião disera ella denunçiada a ella dta Anta Correa, q se lhe não desse de estar mal com Manoel frz soldado do Regimto desta cide por rezois q tiverão, porq ella denunciada lhe emsinaria a fazer cazo com que o dto Mel frz ficasse seu amo, e a procuraçe, o q ella dta Anta Correa não quis ademetir etc.

E como me obrigace o comfessor, Dou a Vmce esta pte; Vmce obrara o q for justo. etc V Sa Ds N Sr me gde a Vmce mtos a Porto 15 de 8bro de 1717 a

Servo e cdo De Vmce Franco Antunes Frra

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