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Maarten Janssen, 2014-

PSCR1256

1614. Carta de Bárbara Pimentel de Leão para Fernão Rodrigues, cura de Santa Justa.

ResumoA autora, que no envelope endereça a carta a um João Gonçalves, pasteleiro, para ocultar o verdadeiro destinatário, relata uma viagem que fez a Paris e denuncia vários portugueses que se encontram em Ruão e se converteram ao judaísmo, pedindo ao destinatário que lhe envie precatórios para os mandar prender.
Autor(es) Bárbara Pimentel de Leão
Destinatário(s) Fernão Rodrigues            
De França, Ruão
Para Portugal, Lisboa
Contexto

Pela nota processual, terá sido o destinatário a entregar as cartas no Santo Ofício, sendo que uma delas (PSCR1256) vinha endereçada a um pasteleiro em Lisboa, pelo que se presume que fosse para evitar a sua interceção. De interesse é também a extensa informação sobre a comunidade portuguesa de Ruão, que, pelas palavras da autora, estava fortemente influenciada pelo judaísmo, em relação ao qual Bárbara de Leão sentia clara inimizade.

Dentro do fundo do Tribunal do Santo Ofício existem as coleções de Cadernos do Promotor das inquisições de Lisboa, Évora e Coimbra. O seu âmbito é principalmente o da recolha de acusações de heresia. A partir de tais acusações, o promotor do Santo Ofício decidia proceder ou não a mais diligências, no sentido de mover processos a alguns dos acusados. Denúncias, confissões, cartas de comissários e familiares e instrução de processos são algumas das tipologias documentais que se podem encontrar nestes Cadernos. Quanto ao crime nefando e à solicitação, são culpas que não estão normalmente referidas nestes livros.

Suporte quatro folhas de papel escritas em todas as faces.
Arquivo Arquivo Nacional da Torre do Tombo
Repository Tribunal do Santo Ofício
Fundo Inquisição de Lisboa, Cadernos do Promotor
Cota arquivística Livro 206
Fólios 36r-39v
Socio-Historical Keywords Tiago Machado de Castro
Transcrição Tiago Machado de Castro
Contextualização Tiago Machado de Castro
Modernização Sandra Antunes
Anotação POS Clara Pinto, Catarina Carvalheiro
Data da transcrição2013

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A joão gomsalves pasteleiro a porta nova em lisboa Jhus em Ruão 16 de dezro 1614 Snor Fernão roiz

em 8 deste resebi a de VM de 18 de outubro, que mto estimei, asim por saber da boa saude de VM, como pelas esperansas que me em me dizer que mto sedo me mandara dizer couza de que eu leve mto gosto, por ser de mta onrra, e proveito de VM, e asim me parese mto tempo daqui a q venha o outro correo, pelo dezejo com que fico de saber tem VM couza que o meresa, que afirmo a VM sera de estimada igoalmente como se fora pa , porque não tenho em menos as couzas de VM, e o que lhe dezejo que posto que ate gora o não tenho mostrado por obras ds he testemunha desta verdade. o correo pasado escrevi a VM, como ficava de caminho pa paris, onde fui, e ha outo dias que vim, e em paris fui mto bem resebida e me agazalhei em caza de monsior de marilhar, onde resebi mtas onrras e ms de sua molher, e depois de descamsar dous dias, fui com ela falar a rainha da qual fui resebida com mtas onrras e ms, e porque ela ja agora não governa que governa o rei a tres meses, lhe fui tambem falar e em todos açhei mtas mostras, e dezejos de me fazerem mtas m, e tratouse largamte do soseso pa que fui çhamada, do qual avizarei a VM tamto que se puzer em ordem fazerse que a detemsa que agora ha, he os mtos negosios de paris como he custume aver quamdo os reis compesão a governar mas espero em noso snor de mto sedo me ver vimgada de todos os purtuguezes desta terra pa que emtão se saiba bem claramte quem sou eu e quem eles são que eles falão de boca e eu faso por obras. rainha manefestei as obriguasois que tenho a VM e as que ela tinha de me fazer ms pois por servila me tinha posto em mto risco, e que não queria ao prezente outras, mais que esta que pedia pa VM, ela me respondeo q estimara mto querer VM couza em seu reino que eu vira o que ela fazia, mas que ela escreveria de maneira que obrigase a sua santidade a lhe fazer o que eu pedia e me tomou com a sua mão a memoria de VM que eu levava feita em franses. monsior de marilhar me dise que a rainha escreveria mto bem e que sem falta iria neste correo delhe ds o soseso que eu dezejo tambem vizitei aquela snora e estive em sua caza hum dia todo inteiro e seu marido esta inda mto doemte de gota que se não pode erguer duma cama, e por ese respeito, e pelas guerras que inda não estão de todo quietas sobr esta sua ida ate a primavera em bora delhe ds saude pa que se efeitue esta ida que tamto dezejo. os purtuguezes falão, e eu como digo faso de obras e mto sedo se vera ds querendo, digo isto pelo que VM me dis na sua que lhe dise hum moso pardo que fora desta terra averia hum mes, iso são ditos de purtuguezes que pela boa vomtade que me tem buscão que falar, ao que respondo que monsior de marilhar he cazado, com hũa bela snra italiana sobrinha da rainha e dahi se çhama seu sobrinho. estimara eu mto mereser ser sua criada pelo que comforme a isto pode VM emtemder quamta verdade lhe falarão. dis me VM que mto sedo espera de me mandar dro de graviel ribeiro, pelo amor de ds peso a VM fasa niso como lhe mereso, e como quem o fas a hũa orfã, e desemparada, em terras alheas, e prometa VM a ese homẽ e tudo o que bem lhe pareser que o que VM fizer averei por bem feito, e lembro a VM que mister ter mto semtido em graviel ribeiro porque o dia que tiver dro não a de amanheser em lisboa, e se a de ir pa o geto de veneza onde esta seu filho, e não lhe paresa a VM que são isto palavras porque abaixo lhe direi couzas por onde me crea. tambem se VM tiver ordem com jolião de gois, e lhe pormeterem dro ele he amigo de o aver, e como quem sabe dese ofisio com mto mais deligemsia fara arecadar e pa isto não ha mister mais que algum amigo que lhe fale, e sei serto que a VM lhe não faltarão pa nhũa cou-za. quamto as pedras bazares, pelo navio que daqui partio escrevi a VM, que não se açhamdo grandes como lhas pedia me mandase quatro onsas das pequenas, por serto tenho averme feito m niso, e no mais, que lhe pedi e que tudo me venha bem sedo com o favor de ds, no mesmo navio, estimo mto a lembransa que VM teve das marmeladas porque tambem me falou nelas a molher de monsior de marilhar, e eu lhe dise que as esperava e asim partirei com ela das que VM me fizer m mandar não tenho por couza nova o que VM me aviza de luis vas, ser fogido, desa terra, que seu cunhado daria ordem a iso pa que se tornase a vir fazer como ele, e tambem pode ser que lhe não faltase o favor de graviel ribeiro, e eitor mendes, porque custumados são a darem semelhante favor, e ajuda, eu ate gora dele não soube outras novas mais que as que VM me mandou, permita ds por sua mezericordia que onde quer que esteja lhe abra os olhos d alma, e lhe de grasa e emtemdimto com que não torne a perseverar nos pecados em que hũa ves ja cahio, pois por estas partes não ha outra couza senão uzarem desas maldades, e ainda se não comtemtão com iso e com as fazerem em framsa e frandes escomdidamte, senão que como qua tem mto dro ganhado o vam lograr a sua vomtade demtro no gueto de veneza, como agora o fizerão as pesoas que abaixo nomearei. VM sabera que este mes pasado, veio de olamda a esta terra por ser caminho direito, hum irmão de antonio samçhes, que se çhama lopo sançhes, que he hum que se embarasou nesa terra com hũa fidalgua, o qual cazou avera hum ano em olamda com hũa purtugueza e não se comtemtou com viver la como vevia senão que com sua molher e hũa cunhada solteira veio por aqui e se foi a meter no geto de veneza a ser judeo descuberto, e andar com fato comprido e bonet amarelo, e nesa terra andava a cavalo e com dous criados e paresialhe que hera melhor que todos. Andre faleiro, que VM la conheseria mto bem que he cunhado de luis roiz de paiva, e cazado com hũa irmã de duarte gomes, se foi de frandes com dous cunhados seus e suas molheres e filhos a meter tambem no gueto de veneza e andão ja pubricamte com bonetes amarelos Antonio faleiro irmão do dito andre faleiro, e genrro de felipe denis que mora nesa terra, se foi tambem pa veneza, e inda não esta metido no gueto porque espera que desa terra venha seu sogro felipe denis, com seus dous gemros, filhas e filho, pa todos se meterem juntos, e se vem á mão este felipe denis e seus gemrros farão petisão a el rei e pedirão lisemsa pa se virem e dirão que vem a frandes a cazar algum paremte o porão outro sogeito e eles vem pa o que asima digo. fora hũa obra de mta mezericordia que nesa terra se lhe estrovara esta vimda pa que não viesem a perder suas almas. seja ds louvado que lhe da fazemda e bẽis pa uzarem tamtas maldades comtra sua fee. afirmo a VM que me fazem estas couzas ficar pasmada de ver a pouqua vergonha com que qua se fazem estes, e VM emtemda como lhe digo que graviel ribeiro como tiver dro a de fazer o mesmo e que por iso he nesesario terse mto temto nele e fazelo prender pela semtemsa q esta em poder de frco d estrada escrivão dos corregedores do sivel. mto estimei as boas novas que VM me da desa terra queira noso snor que sempre VM de bem em melhor. as que poso dar a VM desta terra, sam bem deferentes porque tudo val a pezo d ouro, e agora perese a gemte porque este rei abaixa toda a moeda, e não ha aver comprar nada porque não esta inda averiguado a como an de valer, e emquamto se ordena nimguem quer tomar dro e he lastima ver o que vai a tudo ds acuda como pode e guarde a VM e lhe de mto boas festas melhoradas com boas emtradas de anos e tudo seja como lhe dezejo. depois de ter esta escrito, me mandou çhamar hum prezidemte amigo meu desta terra, e me pedio mto escrevese a VM que por serviso de ds, e de sua fee, quizese VM dar ordem com que na emquesisão se lhe dese hũa sertidão por que cõstase as culpas por que se prendem nesa terra as pesoas por judias, e isto por rezão que os portuguezes desta vila dizem, que o guardarem eles qua os sabados e jejuarem as segundas fras e comerem pães asmos e outras velhacarias que fazem, o fazem por ser custume de lisboa, e com isto se defendem, e tapão as bocas a todos, e pa que o rei emtemda que he tudo mentira, e que eles o não fazem senão por serem judeos, pa iso estimara mto vir esta sertidão, porque com ela os castigarão a todos, como meresem porque a gemte desta terra, não quer comsemtir que aja judeos nela, e se comsemtem a estes he como digo por dizerem se governão ao modo da sua terra, que como souberem pela sertidão que peso, ser mentira, os castigarão de maneira com que outros não tenham atrevimto de fogirem de lisboa pa se virem qua. tambem nesta terra esta hum homẽ que VM sera lembrado fogio da emquesição, hũa bespora de sam joão por hum buraco que fes, o qual se çhama qua miguel de oliveira, e comtamdo eu este cazo a este snor prezidemte me dise, que se da emquesisão mandasem hum precatorio que ele o prenderia logo, e o mandaria em hum navio prezo a esa sidade, VM por serviso de ds e de sua fee mostre estes dous capitolos ao snor prior e o snor simão lopes, e paresendolhe bem isto que peso, mo mandem porque logo o farei embarcar e se ele, se çhamava la outro nome que não seja miguel de oliveira, dira no precatorio que he hum homẽ que em lisboa se çhamava fulano, e que agora tem por emformasão se çhama qua miguel d oliveira e çhamandose la este mesmo nome, bem pode vir direito, e por forsa a ha de estar o seu nome na emque-sisão de quamdo o prenderão. e vindo este precato-rio dira ao snor pro prizidemte e mais snores prizi-demtes, e as mais justisas da corrte de ruão, e asim o precatorio como a sertidão que peso vira justificada por joão vel e luis godim e não por nhũm purtu-gues e fasa VM isto como quem he pois he em serviso de noso snor que se me ele der vida eu farei q nhum judeu aja em fransa.

Barbara pimentel de leão

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