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Montes Velhos, excerto 26

LocalidadeMontes Velhos (Aljustrel, Beja)
AssuntoNão aplicável
Informante(s) Herodiano

Text: -


[1]
INF Isto está aqui uma coisa
[2]
uma coisa
[3]
Isto é engraçado.
[4]
[vocalização] Noutro tempo, havia muito divertimento no tempo da miséria, quando havia miséria
[5]
e o pessoal entretinha-se entretinha-se.
[6]
Aqueles que tinham muito, tinham automóveis,
[7]
tinham isto,
[8]
tinham aquilo e tal, tal, tal.
[9]
Aquele pequeno nunca pensou com licença em possuir um automóvel, em possuir uma biciclete a motor, e coisa.
[10]
E então tinha que ir para coisas que lhe pertenciam.
[11]
E então qual eram as coisas que pertenciam?
[12]
[vocalização] "Ah, eu vou para uma taberna, cantar uma modinha".
[13]
[vocalização] mandava assar um bocadinho de linguiça e comê-la [vocalização].
[14]
Não tinha aquela coisa e tal, tal.
[15]
Hoje não existe isso.
[16]
não existe isso.
[17]
Uma pessoa numa terra destas
[18]
Por exemplo, à rés duma estrada, aparece um restaurante.
[19]
Então aparece um freguês de Lisboa,
[20]
depois ao fim de um bocado aparece um do Algarve,
[21]
passou no carro, e tal, tal, tal, tal
[22]
e a taberna ali [vocalização] faz uma comida,
[23]
faz uma coisa, e tal.
[24]
E essa taberna tem uma saída.
[25]
Aqui, nestes sítios, não acontece isto.
[26]
E não acontece isto porquê?
[27]
Porque é rara a pessoa, mesmo numa terra destas, que não possua um automóvel.
[28]
E essa gente hoje que possui automóvel, querem estar numa classe,
[29]
não querem saber da taberna.
[30]
[pausa] Vão mais depressa, por exemplo, passear aqui ou além,
[31]
e vão comer depois a um restaurante desses.
[32]
E vem o domingo, que eram os dias em que a gente fazia qualquer coisa numa taberna destas, um domingo que se aproveitava,
[33]
pois é nos domingos que é os dias mais ruins numa taberna, numa aldeia.
[34]
Porque aos domingos, toda a gente tem automóvel
[35]
e aquele que não tem vem dalém o vizinho
[36]
Mas os automóveis são muitos
[37]
e os vizinhos são também muitos,
[38]
e quando a gente dá-se notícia, ao domingo é um silêncio!
[39]
Se a gente estiver deitados até um bocadinho mais tarde, não se ouve rumor de nada.
[40]
Parece a gente que está no monte.
[41]
Aos domingos!
[42]
Aos sábados e aos domingos parece a gente que está num monte!
[43]
Não se ouve ninguém!
[44]
A gente abre uma porta para vender um copo de vinho, essa coisa,
[45]
pois marchou-se tudo:
[46]
um foi para a praia,
[47]
outro foi para uma ribeira comer um petisco,
[48]
outro foi para outro lado.
[49]
Têm automóveis!
[50]
Têm os carrinhos para a coisa e tal, tal.
[51]
E em vindo outro certo tempo, têm os carrinhos, aos domingos
[52]
vão à caça, coisa e tal, tal.
[53]
E os domingos numa terra destas sábados e domingos são sempre mais ruins.
[54]
E depois aos dias de semana vão trabalhar
[55]
e pronto, aparecem
[56]
É sempre uma moenga.
[57]
E essas casas que estão perto da estrada nova são os uns restaurantes que, em tendo uma casa bem arranjada, defendem-se bem.
[58]
Defendem-se.
[59]
E um tipo aqui numa terra destas não se defende com uma taberna.
[60]
Não se defende com uma taberna porque aos domingos que é o dia em que a gente fazia, no outro tempo, dinheiro , ninguém tinha automóvel,
[61]
vinham para uma taberna,
[62]
cantavam,
[63]
e [vocalização] pulavam, e [vocalização] isto, e aquilo, e tal
[64]
e estava tudo muito bem.
[65]
Agora não!
[66]
Agora têm automóvel,
[67]
querem saber agora de estar aqui em Montes Velhos, em vindo o domingo!
[68]
Marimbam-se em Montes
[69]
Velhos e vão-se embora.
[70]
Vai-se tudo embora.
[71]
Ninguém quer estar aqui.

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