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Carrapatelo, excerto 6

LocalidadeCarrapatelo (Reguengos de Monsaraz, Évora)
AssuntoNão aplicável
Informante(s) Hermes

Text: -

[1]
INF Mas que preciso tinha ele de mangar?
[2]
INF Ouça:
[3]
uma vez estava de conversa com ele mais a mulher.
[4]
Estávamos de conversa lá no quintal dele.
[5]
E não sei como foi que eu falei em orquestra – em orquestra.
[6]
INF A palavra é assim dita: "orquestra", não é verdade?
[7]
INF E ele, estávamos assim a falar em toques e coisas,
[8]
que eu vim a falar em orquestra.
[9]
Estava ele e a mulher.
[10]
Começa-me ele a dizer:
[11]
"Orquestra!?
[12]
Então o que é uma orquestra"?
[13]
"É orquestra".
[14]
Começa a mulher:
[15]
"Ah, ah, ah, ah!
[16]
Orquestra?!
[17]
Ah, ah, ah, ah, ah, ah!
[18]
Orquestra"!
[19]
Eu calei-me,
[20]
não disse mais nada.
[21]
Pois se já estavam a a chatearem-me, a dizerem aquilo que não deviam dizer, com o que eu calei-me.
[22]
Aonde eles não Eles estavam a mangar de mim, aonde eu é que podia mangar deles, não é verdade?
[23]
INF Mas então?!
[24]
Se se dera o caso se houvesse ali mais família, eram os po- os próprios que os ajudavam a eles,
[25]
não era a mim.
[26]
Pois.
[27]
INF Diga?
[28]
INF Pois.
[29]
E era um meu irmão.
[30]
Eu estava anos sem ir à
[31]
casa dele e agora já tenho chorado por ele.
[32]
INF Se fosse eu que morresse…
[33]
Se fosse eu que morresse, ele talvez faz de conta que fosse uma festa.
[34]
INF Pois.
[35]
Para ele faz de conta que era uma festa.
[36]
Ele não me ligava importância.
[37]
INF Ele morreu no hospital em Reguengos.
[38]
Eu fui lá vê-lo duas vezes,
[39]
ele não abriu os olhos.
[40]
E até um dia caiu lá da cama,
[41]
ainda ainda fez aqui qualquer coisa, qualqueres arranhões na cara.
[42]
Cheguei-o a beijar,
[43]
que era meu irmão.
[44]
Pertencia ao meu sangue.
[45]
Mas a mulher dele que me odiou e depois dizia-lhe mal de mim, a ele, e ele chegou a pontos que já dizia mal de mim à mesma.
[46]
E cheguei a prestar-lhe coisas,
[47]
fiz tudo quanto pude por ele,
[48]
e ele cada vez a ligar-me menos.
[49]
Chegámos-se a juntar além em baixo – de conversa, mais outros, além onde está um um coisito além, quando se entra no povo, [pausa] do lado esquerdo –, a juntarmos-se além.
[50]
INF Às vezes, juntávamos-se além uns poucos.
[51]
Íamos para além,
[52]
conversávamos e coisa.
[53]
Chama-lhe a gente até o Jardim das Mentiras.
[54]
Porque ali ali diz-se tudo, todas as mentiras.
[55]
Cada um diz aquilo que lá lhe parece.
[56]
E nós chamamos-lhe o Jardim das Mentiras.
[57]
Ele, eu não podia dizer nada
[58]
que ele estava logo atirado a mim.
[59]
Sim senhora.
[60]
E há aí mais.
[61]
Há aí mais.

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