Representação em frases

Granjal, excerto 37

LocalidadeGranjal (Sernancelhe, Viseu)
AssuntoNão aplicável
Informante(s) Ercília Emanuel Elina

Texto: -


[1]
INF1 Os remédios caseiros muitas vezes são melhores que os da botica.
[2]
INF2 Oh, então e essas queimaduras daquela senhora da ponta, donde a mulher do Justiniano trabalha.
[3]
INF3 Olhe
[4]
INF1 Pois.
[5]
INF3 Olhe que eu tive cinco filhos.
[6]
Os quebrantos era a toda a hora.
[7]
INF1 E eu, e eu.
[8]
INF3 Olhe, chegaram-me a atar um lenço aqui ao peito
[9]
e botavam-mo aqui ao ombro.
[10]
INF1 Era.
[11]
INF3 Não podia com o peito.
[12]
INF1 A gente tinha muito leite.
[13]
Agora não têm leite
[14]
e não tratam
[15]
INF3 O leite ia atrás.
[16]
INF1 Não se tratam.
[17]
Não querem!
[18]
Então, eu vou contar à senhora quantos filhos eu criei.
[19]
INF3 O leite é que ia atrás.
[20]
INF1 [vocalização] Eu tive doze.
[21]
me morreram três,
[22]
um é que tinha seis dias.
[23]
Mas os outros tinha:
[24]
um, vinte e cinco meses
[25]
e outra três anos
[26]
chamavam-na Eugénia.
[27]
E [vocalização] E criei os outros sete.
[28]
E criei aqui o senhor Estrabãozinho.
[29]
Fui eu que o criei.
[30]
Tive-o mesmo em minha casa a criá-lo.
[31]
O Estrabãozinho, fui eu que o criei.
[32]
E [vocalização] E o senhor Evangelista.
[33]
O senhor doutor Evangelista.
[34]
INF2 O engenheiro.
[35]
INF1 É o engenheiro.
[36]
INF2 O engenheiro.
[37]
INF1 Também fui eu que o que o criei.
[38]
Dava o peito à minha filha mais velha, à minha Eurídice,
[39]
e dava-lhe o peito a ele, às horas.
[40]
Tinha tanto leitinho!
[41]
E elas não têm porquê?
[42]
Porque não querem.
[43]
Porque elas agora comem bem e eu naquele tempo tinha muita fome.
[44]
INF3 Oh, naquele tempo
[45]
INF1 Às vezes saía para a várzea, sachar, sachar, cheia de fome, cheia de fome!
[46]
INF3 E arrancavam,
[47]
danavam-me
[48]
INF3 É que parecem que arrancavam as veias do peito, ah!
[49]
INF1 O [vocalização] peito à gente.
[50]
E E eu vinha, quando vinha , mesmo sem comer nada, em jejum.
[51]
INF3 Agora, querem o que é bom!
[52]
Ai, que regalonas!
[53]
INF1 Era aquela
[54]
É, é.
[55]
São umas regalonas.
[56]
Elas podem durar outro tanto tempo.
[57]
Eu criei muito filhinho!
[58]
E iam E iam para a feira,
[59]
por exemplo, estava aqui uma senhora que chamavam a Eulália Justino,
[60]
não tinha leite.
[61]
Os filhos dela
[62]
A Encarnação olhe, essa Encarnação que aqui esteve, [vocalização] vinha atrás de mim;
[63]
em me vendo, vinha: "A mãe!
[64]
A mãe!
[65]
A mãe"!
[66]
De lhe eu dar o peito.
[67]
INF2 Porque ela era amiga de lhe dar a mama.
[68]
INF1 De lhe eu dar o peito, chamava-me mãe.
[69]
Uma vez vinha com um tabuleiro de pão para ali para o forno do senhor Euclides, da minha mãe.
[70]
Em massa.
[71]
[vocalização] Ainda vinha em massa, a sair de casa com ele.
[72]
Ela atrás de mim: "Ó mãe, ó mãe"!
[73]
A mãe, como gaguejava assim um bocadito: "Q-, Q-, Que filhos meus que nunca mais.
[74]
Nunca mais vão mamar em ninguém.
[75]
N-, N-, Nunca mais"!
[76]
Eu fui pôr o tabuleiro ao forno
[77]
e vim a correr dar-lhe a mama à rapariga.
[78]
Quase que lhos desemborreguei todos.
[79]
Eu tinha muito leite.
[80]
Em comendo um bocadinho de pão, um bocadinho de queijo, ou um bocadinho de bacalhau, ou uma sardinhinha era mais comer da gente, era [vocalização] a sopinha e um bocado de pão e sardinha eu me desfazia toda em leite.
[81]
Às vezes de noite, eu estava assim: "Eu nem me posso virar mais para ti"!
[82]
Molhava-o todo!
[83]
Eles mamavam dum lado e o leite corria do outro.
[84]
INF2 Era leiteira.
[85]
INF1 Era muito leiteirinha,
[86]
ai isso era!
[87]
INF3 Ai eu também, graças a Deus!
[88]
INF1 E a minha Eunice também assim era.
[89]
E a Eurídice?
[90]
A Eurídice também os criou todos ao peito.
[91]
INF3 Eu, graças a Deus também.

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