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Camacha, excerto 19
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INF [vocalização] Já se sabe, chegava-se [vocalização], matava-se se matasse a gente [vocalização] matasse o porco no Natal, já se sabe, chegando [vocalização], depois da morte do porco, no outro dia faziam aqueles pedaços de carne para deitar alho e vinagre e loiro e tudo
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e ficava ali numa vasilha a conservar até dia de festa.
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No dia de festa, minha mãe [vocalização] levantava-se,
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partia [pausa] pão aos pedaços
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e depois molhava aquele pão, para a gente comer, junto com a carne.
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INF No dia da fe- do Natal.
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Na parte da tarde, minha mãe era [vocalização] galinhas de casa;
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já se sabe que era aqueles galos grandes,
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tirava ali um, um um quarto ou dois – que a gente diz um quarto, que faz-se uma ave em quatro quartos –,
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ou cozia três quartos, conforme,
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ou cozia um inteiro, conforme [vocalização] a família que tinha em casa
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[pausa] e, já se sabe, era [vocalização] deitava a cozer
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[vocalização] e depois deitava-lhe massa, desta, que da [vocalização] mercearia.
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E eu me lembra um ano [pausa] que meu pai – acho que como a minha mãe não tinha dinheiro, [pausa] a minha mãe amassou desta farinha de trigo da terra, bem amassadinha –
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fazia umas tiras com [vocalização] uma garrafa
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e minha mãe cortava assim, tudo direitinho, tudo direitinho,
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aquilo ficava tudo fininho, tudo fininho
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e [vocalização] minha mãe deitava na panela
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e a gente comia por massa.
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Lembra-me minha mãe fazer um ano, para o primeiro do ano…
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Minha mãe, acho que não tinha dinheiro, coitadinha.
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Praticamente, se minha mãe não tinha, não me disse,
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mas eu [vocalização] eu é que pensei que não havia.
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E minha mãe depois, na peneira de peneirar a farinha, minha mãe pôs assim na – a casa era mais baixinha –, pôs assim na beira, estava um lindo sol, para tostar aquela massinha.
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Pensa que ela não ficava gostosa?
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[pausa] Minha mãe às vezes fazia,
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mesmo para outros jantares, minha mãe fazia.
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Cozia a lentilha adiante,
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depois deitava a massinha, um pedacinho de [vocalização] ou a banha de porco ou a [vocalização] ou não sei se [vocalização] .
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Óleo não havia nessa altura,
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não havia [vocalização] [pausa] óleo.
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Mesmo que houvesse, [pausa] se [vocalização] se havia era bem pouco.
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Era mais [vocalização] qualquer coisa de azeite de que o óleo próprio.
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O ó- O óleo [vocalização] veio por último que o azeite.
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E comia-se o nosso pratinho de massa com lentilhas, às vezes com abóbora, desta abóbora que meu pai – lidava numa fazenda, fazia [vocalização] – semeava.
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Dava chuva, graças a Deus,
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[vocalização] punha terra a descampar,
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metia [vocalização] umas sementes aqui, outras acolá
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Até lembra-me um ano de meu pai ter cabaças.
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Umas cabacinhas de limpar o comer por dentro e [vocalização] e depois fazer uma vasilhinha da água
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E eu ia a essa fazenda mais meu pai.
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E era assim a nossa vida.
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Depois, já se sabe, foi [pausa] foi melhorando qualquer coisa,
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foi melhorando qualquer coisa…
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Já se sabe, minha mãe cozia um pedacinho de arroz [pausa] para se comer depois de [vocalização] comer o caldinho da massa.
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Mas minha mãe deitava-lhe desta deitava-lhe abóbora, que ficava um arrozinho tão amarelinho que parecia uma gema de ovo!
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Mas era dumas abóboras de casca branca, aqui de Porto Santo.
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e ninguém quer [vocalização].
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Eles, quando semeiam as melancias no Verão, é que metem nos cabos da [vocalização] das mantas, [pausa] que tiram para as melancias, é que põem uma aqui, outra acolá.
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Porque aquilo [vocalização] é uma deita uma rama muito grande
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e, quando a melancia está co-, aquilo vem para cima da melancia.
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Então, eles prantam umas sementes aqui, outras aqui.
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mas este ano houve menos porque não houve chuva.
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INF Tenho uma filhaTenho uma filha casada lá em baixo defronte do aeroporto,
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que até o meu genro trabalha na Câmara de Porto Santo,
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E ele gosta muito da verdura, de verdura.
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E tem um colega que [vocalização]…
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este ano, acartaram água,
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acartaram água, da serra de dentro, lá dumas represas,
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Eles semearam melancias algumas quatro ou cinco vezes,
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para o resto ainda tiveram umas perinhas,
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mas depois quando um tem, tantos têm.
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Quando dá para um, dá para todos.
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INF Depois vendem aquilo mais barato, olhe…
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mas é melhor haver e tudo ter de que [vocalização]…
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Que eu, se eu não tenho e a senhora tem, oferece-me uma melancia.
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Se a senhora tem [vocalização] peros ou laranjas, oferece-me…
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Quando não há é que é pior para todos.
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E que acaso então, graças a Deus, foi o que Nosso Senhor não me deu [pausa] foi [pausa] ser falsa, [pausa] mentirosa, [pausa] amiga de sacrilégios, [pausa] graças a Deus.
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Tenho o que Nosso Senhor me depare,
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ouço dizer que os outros que têm,
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por exemplo, posso ouvir dizer: "Olha, aqui à parte de cima está uma festa, uns noivos ou qualquer coisa".
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Se eu ouvir dizer: "Olha, fulano pisou-se, ou ele morreu morreu, ou coisa", isso eu tenho mais pena.
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eu não{fp estou aqui na minha casa à conta de Deus, a minha nora, às vezes, vem para baixo comigo.
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E tenho ali uma vizinha ao lado, que às vezes também vou lá um pedacinho
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e assim se vai passando à conta de Deus, que não há melhor coisa que é [vocalização] que é quem quem é assim, à conta de Deus.
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INF Mesmo que tenha um sítio, fiquei num lugar que ninguém me vê.
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INF Fiquei mesmo aqui à conta de Deus.
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