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ALC30

Alcochete, excerto 30

LocalidadeAlcochete (Alcochete, Setúbal)
AssuntoO porco e a matança
Informante(s) Anselmo

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INQ1 Então estávamos a falar do, da comida que se prepara para os porcos

INF Po- Dos porcos. A comida? Pois. A comida que. [pausa] que se fazia antigamente, [vocalização] que se dava aos para os porcos era: fazia-se sêmeas, bagaço, [vocalização] batata cozida. [pausa] Isso fazia-se uma caldeirada e dava-se aos porcos.

INQ1 Pois.

INF Figos, no do tempo do figo, [pausa] dava-se isso aos porcos.

INQ2 Olha que bom, hem!

INF Agora, [pausa] o mais moderno, é as farinhas.

INQ1 Pois.

INF Agora é farinha. Vai à fábrica Anda as fá- as que vendem a farinha para dar-se aos porcos

INQ1 Por isso não sabem eles tão bem como sabiam antigamente

INF Ih! Ó Jesus! Isso é, isso é que era Isso é que era comer carne de porco e saber bem! Até toi- toicinho! Assava-se um bocado de toicinho e sabia-se bem.

INQ2 Olhe, aqui eram mais porcos pretos ou, ou porcos brancos?

INF Aqui, antigamente, guardava era muito desse porco alentejano, amarelo. Depois é que veio estes brancos. E depois agora, agora é tudo branco . Mas de antigamente aqui era sempre dos amarelos. E iam buscar ao Alentejo. Iam buscar ao Alentejo.

INQ1 Pois. Mas senhor Anselmo, ainda voltando à comida, essa comida que preparavam não lhe chamavam nome nenhum? Não lhe diziam, olhe, ou por exemplo: "Está na hora de ir levar"

INF "O comer aos porcos".

INQ1 Comer. Não lhe davam outro nome? Nem a lavagem, nem?

INF Ou o lavagem. [pausa] Ele é: "Vamos dar o lavagem aos porcos"!

INQ1 Lavagem?

INF O lavagem.

INQ1 O lavagem.

INF Mas isso é [vocalização], ai , é quem tinha um porco ou dois dentro dum dum pocilgo. "Eu vou dar" "Vou tratar dos po-". "Vou dar o lavagem aos porcos". Às vezes, diz assim: " deste tu o lavagem aos porcos"? "Não. Não tenho tempo". E agora

INQ1 E onde é que Onde é que punham a comida?

INF Dentro do comedouro. Um comedouro feito em madeira. [pausa] Tinha uma divisão ao meio, uma para o comer, outra para a água.

INQ2 E não havia assim umas coisas redondas de pedra?

INF Não. A gente aqui não usava isso, de pedra. [vocalização] Era um comedouro, [pausa] tinha uma divisão ao meio, uma tábua: desta parte aqui era a água e daqui era o comer. E depois eles começavam a a roer aquilo e a coisa, a gente agarrava, fazia em cimento, [pausa] para eles beberem a água. [vocalização] A gente às vezes até era duma cova mesmo do chão, fazia-se o cimento e punha-se ali a água, que eles bebiam.

INQ1 E essa do cimento, dava outro nome ou não?

INF Não. Era uma uma caixa de cimento. [pausa] Até se punha e pode pôr até pôr Ele pode pôr um um comedouro de cimento.

INQ1 Pois. E não havia nada a que soube-, a que chamassem pia?

INF Uma pia? Pia chamava-se mas era uma pia de dar água ao gado. Uma pia para darem-lhe dar ele água. Por exemplo, ou cavalos ou [pausa] ou às vacas ou. "Vai ali levar à pia"! E ou- E outros é uma selha!

INQ1 Sim. Mas a pia?

INF Eu tive uma pia em pedra [pausa] para dar [pausa] a água. E eu tive uma selha. Selhas então, vão se partiu algumas três!

INQ2 E a selha é em quê? Em madeira?

INF Em cimento.

INQ2 Em cimento.

INF A selha é em cimento. E [vocalização] tive uma pia em pedra, mesmo em pedra. Sabe do que era? Era dum guarda-loiça, dum guarda-co-, dum lava-copos.

INQ2 Ah! Pois. É o dezasseis.

INQ1 Pois, pois.

INF Tinha o buraco por baixo.

INQ2 Claro.

INF Eu assentei assim em cima dum cavalete em tijolos, [pausa] pus ali, eles bebiam a água, e depois eu limpava e ele saía por baixo a água.

INQ1 Pois claro.

INF Era uma pia, mas era em pedra! Era isso dum, dum dum lava-copos.

INQ2 E um masseirão? Não nada que se chame masseirão?

INF Um masseirão? Ah Não conheço. Masseirão?

INQ1 Olhe

INF Pode houver em outros lados esse nome

INQ2 Pois é. É doutros lados.

INQ1 Como é que se chama à cara do porco? Assim à boca do porco?

INF É o focinho.

INQ1 E quando eles estão assim com o focinho assim a?

INF Estão a s- a çofar foçar. A çofar foçar.

INQ1 E o barulho que eles fazem, diz que estão a quê?

INF Estão a [vocalização] ganir ou a roncar ou.

INQ1 Olhe, e quando chega à, quando as pessoas estão a engordar um porco para depois?

INF Para a engorda.

INQ1 E, e para fazer o quê, a seguir?

INF Então

INQ1 Quando é para, para o consumir em casa, para depois o comer em casa, têm que fazer o quê? um dia, que chamam uma pessoa para fazer?

INF Ah! Para fazer a matança.

INQ1 E essa pessoa que, que sabe matar o porco tem algum nome?

INF Não. Tem um

INQ2 Costumam chamar quem?

INF Tem um nome dele, é o nome dele próprio. Mas a gente precisa dele: "Eh, "! Até um rapaz que está ali do asilo. Matou-me muitos a mim. [vocalização] "Eh, Arnoldo, sábado vamos matar um porco, queres ir? " "Vou". Eu Ele levava as facas, levava uma machada [pausa] E depois o porco ia para cima duma selha isto faça de conta que é isto Estendia-se o porco em cima da da selha, ele [pausa] ia ali para a banda da cabeça, agarrava ali ao focinho e metia a faca aqui por baixo da garganta direito ao coração, e a gente agarrava das pernas. [pausa] O porco ficava ali a roncar até dar ele o gemido. Estava ali ainda em cima da selha, deitava-se para o chão. Deitava-se para o chão Estava uma escada Ele ia [pausa] com um bocado de pau ali aos perniles, ali às pernas, entalava-se assim dentro dos dois perniles, [pausa] pendurava-se da escada Ele abria-o ao meio, tirava a fressura, tirava o bandulho, tirava o bucho, tirava aquilo tudo. [pausa] Depois ia para cima duma mesa [pausa] para ele dividir o toicinho da carne. [pausa] Pronto!

INQ1 Sim senhor.

INF Cortava a cabeça, cortava as pernas, as mãos, e depois separava o toicinho da carne. Ia o presunto para ali, ia outro presunto para ali, ia as mãos, ia a carne e as costelas, e aquilo tudo [pausa] ali para vender. Vendi tantos em casa!

INQ1 Que bom que havia de ser!

INF E, e, e E aquilo era feito madurar. Naquele tempo era uma maravilha!

INQ1 Pois. Olhe, mas agora voltando um bocadinho atrás. Portanto, não diziam, por exemplo, vai-se chamar o senhor, o senhor Arnoldo?

INF E fazer a matança ao porco. Para fazer a matança.

INQ1 Porque ele é bom?

INF É [vocalização]. Ele era bom porque sabia fazer aquilo.

INQ1 Não davam o nome de magarefe?

INF E o- Não. Magarefes é agora do matadouro.

INQ2 Nem matador?

INF Do matadouro é que é ma- os magarefes. Mas antigamente não era assim. A gente ia Até houvia aqui um, que morava aqui d- daquele prédio ali em baixo, daquelas casas de baixo, que era o tio Argílio. Era ali do Montijo, mas casou em Alcochete. Esse também me matou porcos a mim.

INQ2 Mas qual era a profissão dele?

INF Era de mesmo matar porcos. E era pescador.

INQ2 Era pescador?

INF Andava à pesca. [pausa] E [vocalização] matar porcos, ele estava acostumado do Montijo.

INQ2 E não diziam que era o matador?

INF Não. O matador se dizia era dentro do matadouro, ali.

INQ2 O matadouro é o quê?

INF É onde é que se matava o gado. E depois é onde é que está que estão os magarefes, que estão , que matam. Mas esse nome de magarefe é agora moderno.

INQ1 É de agora?

INF É moderno, é moderno! Que dantes não não

INQ1 Sim senhor. Não. A gente não quer saber dele.

INF Dantes não era Não havia ga- magarefes. Eu quando ouvi falar em magarefes, foi agora quando fui levar o gado ao Montijo, aqui anos. [pausa] Ainda Ainda o matadouro do Montijo funcionava. E depois é que estava aqueles empregados, que foram daqui, deste matadouro que fechou, para .

INQ1 Pois.

INF E depois chamava-se "Mas o que era aquele nome"? "O que é que estão a empregar aquele nome"? "Então é o nome que dão agora a eles, aos ma- aos que estão a matar, magare- magarefes, magarefes" É.

INQ1 Olhe, depois de matar o porco, é p-, não o passam assim por uma, por o lume, para a?

INF Ah! Quando o porco é morto, ele é chamuscado com mato.

INQ1 Portanto

INF E depois bem raspado! Com uma faca, tirar aquele negro todo e depois é lavado! Depois de estar lavado, com um pano com água quente, é que depois é pendurado.

INQ1 Pois. Portanto, para raspar usam uma?

INF Com uma faca. É raspado assim o couro com a faca, que é para tirar aquele chamusco com aquele, os cabelos, e aquilo tudo. E depois ficou.

INQ2 Cha-, chamusco?

INF Pois, aquele chamusco do, do do mato,

INQ2 Portanto, é chamuscado?

INF que é, que é que é bem chamuscado. E depois aquilo vai é tudo raspado, que é para raspar aqueles cabelos. Ficam cortadinhos, pequeninos, e [vocalização] fica depois aquilo limpinho, o couro limpinho. Que os coiros depois também é vendido. Aquilo é tudo toicinho.

INQ1 Olhe, e quando o penduram não assim um gancho onde os vão pendurar?

INF A gente , [pausa] quando era quando eu os matava, é; mas da quando era ali do matadouro, era uns ganchos. É. É

INQ2 Olhe, é assim uma coisa, assim como esta?

INF É. isto é-, isto era Isto que está aqui [pausa] era como a gente fazia : metia-se um pernil aqui e outro daqui; e depois era aqui atado a corda, aqui à escada.

INQ1 E como é que se chama isto?

INF Isto aqui [vocalização] era o o Ai!

INQ2 Chambaril?

INF Hum Ele isso aqui a gente chamava um um Não era gancho, era Parece que era o pernil que a gente chamava a isto. Pois.

INQ1 Chambaril não?

INF Chambaril? Não era cha-.

INQ1 Não.

INF "Traz o pau [vocalização] do pernil"! [pausa] Era este pau.

INQ2 O pau de pernil?

INF Rhum. Porque [vocalização] este pau [pausa] é que era de entalar dentro dos perniles das pernas do porco.

INQ2 Pau de pernil?

INF Pois. Diz: "Traz o pau do pernil"! E depois a gente levava. Era então de enfiar: enfiava aqui um e enfia o outro. E depois era pendurado da escada, mas aqui era atado com uma corda.

INQ1 Pois.

INF Que era para o porco estar fixo [pausa] à escada.

INQ1 Pois. O gancho era a escada.

INF Agora, isto, ali, isto ali do do matadouro, isto que está aqui, é em ferro. [pausa] É em ferro. Estes ganchos são em ferros. [pausa] E depois é pendurados .

INQ1 Pois. Olhe, e quando se está a, pronto, a separar as várias partes do porco, diz-se que se está a fazer o quê ao porco?

INF É o É aberto. É serrado ao meio. É serrado. [pausa] É serrado ou [vocalização] é com a machada aberto.

INQ1 Rhum-rhum.

INF Vai-se abrir o porco [pausa]

INQ1 Pois.

INF ao meio.

INQ1 Não se diz: "Vai-se desmanchar o porco"?

INF [vocalização] Desmanchar é quando está em cima da mesa.

INQ1 Ah!

INF "Vai-se desmanchar agora o porco todo". Que o porco, enquanto está [pausa] com as duas partes divididas, está inteiro: está uma parte e está a outra.

INQ1 Pois.

INF Depois de ir para cima da mesa e separar-se o toicinho [pausa] e as banhas e as costeletas e as pernas, a fressura, o porco está ali num. Depois é que é separado: uma perna para ali, outra perna para aqui, então

INQ1 E é isso é que chamam o quê?

INF Depois é que é que chama-se isso separar o porco das carnes.

INQ1 Mas usam, dizem desmanchar, ou não?

INF É desmanchar. É desmanchar o porco. Quando ele vai desmanchado é quando vai separado daquilo tudo. [pausa] Depois, dali, é que não está feitio nenhum de porco. Está feitio de carnes, em cima da mesa. Agora enquanto ele está ali, está inteiro. Tem tudo da banda de dentro ainda. [vocalização] Depois de ele estar ali pendurado e aberto é que lhe sai aquilo tudo para fora. [pausa] Sai o bucho, sai o [vocalização] bandulho, sai sai a [vocalização] fressura, sai tudo. Quando ele está ali pendurado é que é tudo fora. Nunca aquilo é é tirado fora sem ele estar por pendurar.

INQ1 A fressura é o quê?

INF É a fressura que tem o porco agarrada com o fígado.

INQ1 Ao fígado? Pois.

INF Pois. E aquela fressura depois é para vender!

INQ1 Pois. E também outra coisa dentro da barriga do porco?

INF É o bucho, é os rinzes. Tudo quanto o porco tem, tudo, tudo

INQ1 E aquelas que são assim umas tiras grossas?

INF É as banhas.

INQ1 Não. Que depois se aproveita para fazer os chouriços? Que lavam-se muito bem

INF Isso é as tripas.

INQ1 vários nomes para as tripas?

INF . [vocalização] a tripa do encher, que é a grossa; a tripa a tripa delgadinha. É. [pausa] O porco, tudo quanto tem da banda de dentro, tudo se aproveita.

INQ1 Pois.

INF Olhe até as cascanholas, os rapazes andavam a roer por a rua. As cascanholas de [pausa] das unhas.


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