INF Pois é. Pois eu queria contar uma coisa. Por exemplo, a gente vamos trabalhar, vamos para a charneca. Vamos, por exemplo… Ia m- Ia companhas de homens – chamava-lhe a gente uma companha [pausa] de homens, com um capataz, e que falava ao pessoal – e ia [vocalização] ou cortar mato, por exemplo, para dentro do do povoado de, de dos sobreiros, portanto, aqueles sobreiros, cortar, limpar, fazer limpeza, fazer limpeza à [vocalização], ao [vocalização] ao sobreiral que estava, por exemplo [vocalização] àquilo, e fazer limpeza. E é claro, a gente, então usávamos umas roçadoiras para cortar o mato. Quando era em Março e Abril – a gente íamos justo por sete meses –, quando era em Março e Abril ia-se queimar. Queimar, tinha que se queimar ao contrário. Quer dizer, tinha que se queimar [vocalização] ao contrário do vento. Tinha que se pôr e aquilo ia ardendo, o vento estava a bater para aqui, mas aquilo ia sempre moendo e ardendo. E a gente íamos puxando com os tais ditos [vocalização] forcados, que estava aqui um numa planta dum livro, [pausa] que estava aqui.
INQ1 Rhum-rhum.
INF A puxar. É claro, e a gente depois tínhamos que fazer o comer e comer. Tínhamos que fazer o comer e comer. A gente usava lá uns cochos de cortiça – chama-lhe a gente o cocho – era o prato. Aquilo arranjava-se uma navalha, ali tudo raspadinho fora e tudo, e fazia-se o assento, estava ali. Tínhamos umas umas panelitas de barro que se usavam, que os oleiros usavam dantes, que essas panelitas chamava-lhe a gente uma púcara [pausa] àquilo. Que era para para estar a cozer o feijão, ou as couves, ou o arroz, ou tudo o que a gente lá deitava, tudo. Tínhamos essas púcaras. Tínhamos uns tachos, também de barro, com um rabozito pequeno assim, que a gente punha, fazia uma cova no chão assim deste desta coisa, da largura da enxada, funda. E [vocalização] nas barreiras era para assentar as vasilhas do comer, aqui assim. Para assentar em cima. Isto chama-se uma, uma, uma, uma uma fervedeira. Esta coisa aqui.
INQ2 Rhum-rhum.
INF E a gente punha ali a coisa em cima. E depois, por exemplo, a gente quando era principal da manhã, quando era por exemplo aí às nove horas, antigamente trabalhava-se de sol a sol, e quando era p- quando às vezes era p-, por, por por a noite adiante ainda. E E é claro, quando eram nove horas íamos almoçar. Íamos almoçar, a gente íamos fazer o comer e para comer. Mas o almoço, tinha que se estudar a maneira sempre para o almoço de aviar mais depressa. O que é que a gente foi, f-, que a gente fazia parte das vezes? Punha o tacho ao lume com uma pinga de água, punha-lhe um dente de alho, ou dois, e punha-lhe uma folha de louro e depois íamos ao cocho, íamos migar o pão. Havia esse este pão saloio – que ainda às vezes ainda aparece por aí, que chamam-lhe o pão saloio –, havia esse pão, que custava um pataco. Sabe quanto é que era um pataco?
INQ2 Não sei.
INF É dois vinténs. Sabe quanto é que era um vintém? São quatro moedas de cinco, ou sejam duas de dez. Que havia antigamente. Um tostão tinha tinha cinco moedas de, de de vintém. Quer dizer, um vintém é quatro moedas de cinco. É esse dinheiro antigo que havia assim. Que eu uma vez fui-me para acolá para a feira, para Abrantes, mais um irmão meu – já lá está também, que era até encanalizador, estava em Lisboa – e e tinha nascido a minha irmã mais nova. E eu depois fui-lhe pedir à minha mãe – bom, seja a minha madrasta, mas eu tratava-a por mãe porque eu fiquei sem mãe da idade de dezoito meses, mas eu chamava-lhe mãe – para ir para: "Ah, não. Não tenho dinheiro. Eu não tenho dinheiro e queria ir à feira mas não tenho dinheiro", e tal. Disse: "Olha, vai aí" – ela estava na cama – "vai aí à tábua da chaminé"… Há estas casas antigas que têm uma tábua na chaminé assim por cima. "Está aí cinco tostões e leva-os". E eu levei. Fui lá vi vi-me duas barracas de circo, vi uns bonecos, ainda trouxe dinheiro, sabe. Com cinco tostões, duas eram cinco moedas de, de de vintém e cada moeda uma moeda de vintém tem duas de dez. Era duas moedas de dez. E E essa moeda de dez são duas de cinco. Um vintém era dividido em em quatro partes, tudo. [pausa] E de maneira que a gente comprava aquele coiso e depois punha lá. A gente arranjava o cocho e a gente íamos comprar o pão ou… Pois o pão, a gente usava a comprar o pão, por exemplo, de dois em dois dias é que a gente comprava o pão. Aquilo era quase sempre pão caseiro porque era quase cozido cá nos nossos fornos e. A gente migava uma quantidade de sopas para dentro de, de, [vocalização] migas para dentro do coiso e depois deitava-se-lhe um coisinho de sal, [vocalização] o tempero que era preciso, o sal, o azeite, e tudo, chamava-lhe a gente aquilo àquilo um capacho.
INQ1 Ah!
INF Ah, a comer. E depois comíamos. Era como a uma açorda! Vamos lá por aqui [vocalização]. Vamos lá já a falar como é coisa: é uma uma açorda. E depois mexia-se bem. Aquilo fervia, aquilo tudo e a gente chamava aquilo àquilo um capacho. Tínhamos um bocadito de bacalhau para assar. Tínhamos, por exemplo, ou um bacalhau, um bocadito de toucinho. O bacalhau, às vezes, era só uns coisitos assim pequenos. Tudo. Ou uma sardinha, ou qualquer coisa assim. [vocalização] E outra coisa [pausa] – que esta menina deve saber, [pausa] é lá de cima, deve saber –, outra coisa: a gente lá usava para ter a sardinha, ter o conduto – ter o conduto, chama-lhe a gente o conduto, o bacalhau e essas coisas todas –, um um cortiço, [pausa] tudo. Que a gente punha um bocado duma folha de cortiça por exemplo assim desta largura, comprida, punha no lume com o carrasco, a parte preta, para baixo para o lume, aquilo ardia, aquele carrasco, a gente [verbo] aquilo. E depois estava muito maciinha – a cortiça torna-se muito macia, depois – e depois estendiam no chão, apagava. E depois a gente enrolava aquilo assim e fazia um, um cartu- quer dizer, um, um um canudo, vamos lá por aqui. Um Um canudo, fazia. A gente chamava a isso um roleiro, que era para onde a gente punha. Que depois arranjava uma rolhas, punha uma por baixo, punha outra por cima. A rolha tinha uma descavação em volta pelo lado de dentro para enfiar dentro por causa do da bicharada, da coisa.
INQ1 Ah!
INF Pois. Chamava-lhe a gente o roleiro à, à, à, àquele àquele cartucho. Tínhamos outra coisa que a menina sabe [pausa] esse nome. Quer dizer, a gente aqui não sabe. Também se fazia isso assim em volta em cortiça. Punha-se o fundo, punha-se uma asa de cortiça com um coisito de lado, era onde se nos levava o comer, quando a gente íamos depois para longe, que a gente levava o comer. Chama-se isso uma tarreta. Não é?
INQ1 Acho que sim.
INF É onde é que leva o comer. Os pastores lá usam muito aquilo.
INQ1 Rhum-rhum. Pois é.
INF Tudo. Agora lembrou-me isso. Eu depois eu estive a estudar e lembrou-me isso. Porque perguntou-me por causa quando levava numa corna as azeitonas, queijos, e tal, tal, tal. E a gente levava naquele roleiros.
INQ2 Exacto
INQ1 Rhum-rhum.
INF Nos coisos é que leva o conduto quando é, chamavam-lhe um roleiro. E a tarreta é era o coiso onde ia o comer. É como a um tacho.
INQ2 Pois, pois.
INF O que é que tinha a [vocalização] asa móvel, como a a uma asa duma cesta. De cortiça à mesma, e tudo. Mas aquilo é limpinho! Nem queira saber!
INQ2 Pois, pois.