INF Não havia veterinários, havia alveitares. Aqui na região havia havia alveitares. Houve aqui na região um homem chamado Décio das ovelhas, conhecia o gado pelo bigode aos veterinários. E [vocalização] E os veterinários [pausa] convidaram-no – um homem que não sabia ler nem escrever – para ir reger uma cadeira na Escola Veterinária. E davam-lhe dez escudos cada dia e o gajo não quis. E queriam que ele fizesse um livro. Eu tenho um livro que foi escrito – chama-se "O Tesouro do Lavrador" – que foi escrito há duzentos e vinte anos. Ainda os veterinários não sabem o que eles sabem. Porque o veterinário hoje o veterinário hoje, a ciência dele é conhecer a doença do animal. O animal conhece-o. Por exemplo, se tem uma dor, vai com a cabeça assim aonde… A gente, como eu, que convivia com os animais, conheço as doenças. Porque aqui na região a doença que ataca mais o animal é a carbunculosa com diferentes sintomas. [pausa] Ele vão O gado vacum, há quarenta e cinco moléstias que vão à carbunculosa com diferentes sintomas. A veterinária hoje está mais evoluída do que nunca esteve. Está cienti- O veterinário, dês que saiba que conheça a moléstia, aplica-lhe uma injecção, cura o animal. [pausa] Tem avançado muito. Mas esse tal esse tal v- Décio das ovelhas – contava-me o meu pai, que ele não era cá do meu tempo – chegou a Montargil ver uma junta de bois, [pausa] disse que: "Aquele que está sadio, que não tem doença, morre; e este que está doente escapa. [pausa] E este que está sadio, quando for uma hora da noite, à meia-noite, dá o berro e cai para o lado e morre". [pausa] Era um cientista! O gajo nunca quis deixar – era aqui da Lamarosa. Era cá do concelho de Coruche. Era um gajo cientista, chamava… Neste tempo não fazia De Verão não fazia mais nada que era a andar a cavalo num cavalo, [vocalização] a este e àquele; todos os dias, todos os dias iam-no chamar. Ia para o Ribatejo. O gajo em Salvaterra, andavam os veterinários a dar a injecção, já lá andavam há oito dias; e o gajo com um pontapé – que ele o que é que foi? – foi apalpar o boi – ele apalpava o animal – foi apalpar o boi e achou-lhe um marmelo na [vocalização] atravessado nas goelas. Mas agora o animal respirava. Ele recua para trás, mandou-o endireitar, deu um pontapé no marmelo, o marmelo foi… "Oh! [pausa] Está curado"! E na presença de dois veterinários, ficaram a olhar para ele. Foi daí é que ele teve grande fama… Esses veterinários convidaram-no [pausa] para a Escola Veterinária, falaram com o professor, para o gajo ter lá uma cadeira e fazer um livro. E o gajo não quis. Foi, foi um grande Foi um grande paspalhão! Deixava o nome dele escrito para toda a vida. E ficava escrito como veterinário. Porque os veterinários precisam de saber os sintomas que os animais… Então eu quando tinha lavoura chamava! Uma vez adoeceu-me uma ali e eu digo-lhe, chamei o veterinário. O veterinário disse: "Morre duas vezes"! Ele abalou, eu fui buscar o meu alfarrábio e comecei a estudar: "A doença é esta, os sintomas, é esta, é este". Montei-me na bicicleta, vim aqui ao Couço, comprei sete quilos de farinha [pausa] de trigo e comprei quarenta onças de raspa de veado. [pausa] Aqui o farmacêutico, o ajudante de farmácia, não sabia o que era uma onça. Digo eu para ele: "Então tu não sabes o que é uma onça? O teu patrão tinha um [nome] antigo". "Mas você sabe quanto é uma onça"? "Sei, sim senhor. Uma onça são vinte e cinco gramas. Fazes quarenta papelinhos". Dava dois papelinhos dissolvido em meio quilo de farinha, grosso, pela boca abaixo ao animal. Quando foi ao fim de três tratamentos, o animal, as tripas, a raspa de veado fez sarar. Porque a febre podre é umas feridas nos intestinos que os animais têm como nós temos também. [pausa] E a raspa de veado fez sarar. [pausa] Matou o micróbio. [pausa] Os antigos sabiam muita coisa! [pausa] Muita coisa!