INQ Já me disse que havia água que vinha do ribeiro. Mas havia outra que se escavava uma coisa para baixo. Que era um quê?
INF [vocalização] Essa água que era era do rio. Mas havia açudes, que lhe chamam, que era o [vocalização] o comando, [pausa] que mandava a água para as azenhas e desses açudes é que é que vinha a água. Há uma vala [pausa] que vai apanhando uma distância grande de terreno e esses que ficavam com o terreno à parte de baixo da vala é que a hortavam. Mas isso hoje hoje não. Hoje já se não horta.
INQ Pois. Mas que outras maneiras havia de se guardar a água no terreno? Portanto, já me falou na presa, não foi?
INF Pois.
INQ E havia uns que era, que se faziam em cimento, assim uns quadrados…
INF [vocalização] Olhe [vocalização], ali nesta herdade [pausa] ao fundo da horta, havia lá um sítio [pausa] que todo o Verão tinha água no cimo da terra. E eu digo assim para o patrão: "Porque é que você não manda ali abrir [pausa] uma vala [pausa] além para o ribeiro? Há aí tanta pedra. Faz-se ali um, um Faz-se ali um cano [pausa] em pedra seca". "Começa tu com ideias"! "Então [pausa] vomecê com o pessoal que aí traz, há uma certa altura que avaga certos serviços, e então, nessa altura, vomecê pode mandar para lá o pessoal e faz-se a vala. Manda para além as parelhas acartar pedra. Eu faço Eu faço o tubo". "Está bem". Fez-se. A ág- a água, por baixo Aquilo por cima era barro preto. Mas no fundo daquela, aquela fundura, [pausa] era areão, cascalho, terra lavada – e a água a aparecer de todos os lados! Bem, digo-lhe eu assim para ele: [vocalização] "Ouça lá, então se você me deixasse fazer além uma presa , [pausa] além, que eu punha a água a correr aqui a esta altura do t-, aqui ao nível da terra"? [pausa] – diante dum que lá estava que era o guarda. E diz ele assim: "Tu estás maluco, pá! Então tu não vês que aqui que que é um terreno muito mais alto do que é além, onde tu estás a dizer que vai dar água para aqui"?! "Não é isso que lhe eu estou a dizer, homem"! "Então o que é que tu estás a dizer"? "Se vomecê autoriza eu fazer além uma represa, que eu ponho a água a correr do fundo do ribeiro aqui ao nível da terra. Mas de além aqui tem que fazer uma vala. Mas aqui há-de correr aqui ao nível da terra". "É o que eu digo: tu estás maluco"! E eu faço assim para ele: "Ouça lá, [pausa] e se isto aparecer feito [pausa] como eu estou a dizer, o qual é que é o maluco"? [pausa] "Era eu. Mas não sou, porque isso nunca pode isso nunca pode ser. Isso nunca pode ser". "Está bem"! Ele [pausa] abala para Lisboa [pausa] e deu as ordens ao guarda. O guarda no outro dia de manhã: "Uns vão para aqui", "outros vão para além", "outros vão para outro lado". E eu faço assim para o guarda: "Ouça lá, agora era melhor era uma altura boa para se fazer além a presa". "Então ele já deu ordem"? "Já"! [pausa] "Então, olhe, leve os que quiser e vá para lá". "Não. Não é preciso levar muitos. [pausa] Comigo, três. Vão mais dois aí desses. A gente vamos lá fazer aquilo". Cheguei lá, dei a vala de empreitada aos outros dois e eu fui fazer a presa. No fim, faço assim para os outros: "Eh pá! Eu enganei-me"! Porque estava a ver aquilo que os outros [pausa] viam mas não viam. "Eu enganei-me"! "Então"? "Então?! [pausa] Então, esta empreitada minha é maior ca a que à sua de vocês. Então vocês depois não me vêm ajudar"? "Não. Então cada um acaba a empreitada que apanhou". "Bem, já sei que fiquei fiquei à rasca eu"! Eu a pensar cá para os meus botões: "Mal vocês sabem que eu que acabo a empreitada e voc- e fico eu a olhar para vocês". Eu acabei a empreitada, pus uma pedra em cima do do coiso, mas logo lá no fundo ficou um um tubo. A água estava a sair para o ribeiro à mesma. [pausa] E digo eu assim: "Bem, vocês disseram que que cada um acabava a sua empreitada. Vá lá ver quando é que acabam a sua. Eu agora pus a rolha ali no coiso. Eu não quero Eu não quero encher isto de água ainda agora. Isto há-de ser cheio de água mas não é agora. Tem que passar aqui uns dias para assentar a terra, e estas pedras, esta coisa que eu aqui pus, mas vocês têm que acabar de abrir isso". "Pode largar a água que a água não vem cá, homem"! Toda a gente dizia que a água que não ia lá! Não era só o patrão: era o guarda, era os carreiros, era… Toda a gente que andava lá. Aqueles dois que andavam lá comigo também diziam que a água que não corria. Eles diziam que a água que não corria. Digo eu assim: "Bem, eu vou largar a água, mas eu não quero lama dentro do ribeiro". Porque a água quando chegava aquele sítio voltava para o ribeiro. "Eu não quero lama dentro do ribeiro. Se lá cair a lama para dentro do ribeiro, vocês depois têm que a ir tirar". "Pode largar a água à vontade". Eu tiro a rolha, a água vai. E começam eles assim: "Eh! Eh pá, olha lá a já lá a água que vem"! Bem, a terra, uma foi para o ribeiro, outra foi para fora. É claro. Aquilo era uma base de conversa. "Eh pá! Essa é boa! Então a nossa terra daqui parece muito mais alto! Essa é boa! Então, hem? Então não viam vocês"?! Bem [pausa] quando foi à noite, chegou o patrão. Foi logo a ver do Ângelo que era o [vocalização] o guarda. "Então, Ângelo, então quem tem andado o que é que andou o pessoal a fazer"? "Uns foram para aqui, outros foram para além, outros foram para outro lado, e tal. O André foi fazer a presa". "A presa"? "Pois, ele como vomecê diz que já tinha dado a ordem". "Onde é que ele está"? "Está lá na casa lá em baixo". "Vai lá chamá-lo". [pausa] Eu em vez de ir lá para o lado donde ele me chamou, não. Fui assim: à roda havia ali uma capoeira, fui à roda da capoeira. Quando cheguei lá ao fundo da capoeira, chegou ele, estava eu do outro lado. Digo assim: "Então, o que é que vomecê quer"? "Quero ver o que é que tu andaste andas para aqui a fazer". "Ah, está bem"! Mas sabia eu Sabia até de modo o que é que ele queria. Quando o outro me disse, eu cá [vocalização] sa- sabia já aquilo tudo de cor e salteado. Bem, marchámos, chegámos lá, o homem lá viu a água a correr. "Sim senhor. Está certo"! Marchou. Digo eu assim: "Ouça lá"! "Então o que é"? "Eh pá, eu ainda não estou despachado". "Então"? "Eu agora quero saber qual é que é o maluco". "Ah, então nesse caso sou eu"!