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Vila Praia de Âncora, excerto 51

LocationVila Praia de Âncora (Caminha, Viana do Castelo)
SubjectA atmosfera e as condições climatéricas
Informant(s) Agesilau
SurveyALLP
Survey year1985
Interviewer(s)Gabriela Vitorino
TranscriptionSandra Pereira
RevisionErnestina Carrilho
POS annotationSandra Pereira
Syntactic annotationCatarina Magro
LemmatizationDiana Reis

Text: -


[1]
INF Eu e um filho meu este meu filho uma ocasião bem, a senho-
[2]
Era o fogo da Senhora da Bonança.
[3]
Ainda ele era pequenino tinha ele para aí o quê? Cinco anos
[4]
e levei-o comigo ao mar, pequenino.
[5]
E fomos à pesca do pancho, ali perto, perto daquele sanatório, aqui por fora.
[6]
Eu estava a ver que morria que o rapaz que me morria.
[7]
INF Vou-lhe contar.
[8]
É que eu vi-me vi-me atrapalhado.
[9]
Eu, quando saí do porto
[10]
Ainda não morava ali naquela casa,
[11]
ainda não tinha casa.
[12]
Eu estava a morar por baixo do
[13]
Sabe onde é que é o posto dos guardas, acolá em baixo?
[14]
Eu morava ali, numa casa alugada.
[15]
Pagava, naquele tempo, oitenta escudos.
[16]
Andava eu na pesca do bacalhau.
[17]
E dia de fogo de Senhora da Bonança, que era num sábado, apeteceu-me ir ao mar, numa embarcação que era do falecido meu pai, nu-, nu- numa gamelinha pequenina.
[18]
Não havia motores,
[19]
era à ve- era a remos.
[20]
E eu pego no meu filho, que era pequeno para aí cinco, cinco anos, até seis anos, talvez não os tivesse ,
[21]
e levei-o comigo.
[22]
O mar estava bom!
[23]
Mar Mar como está aqui, chãozinho, calminho, como está aqui!
[24]
E eu pego no rapaz,
[25]
disse eu para a minha mulher: "Aida, vou pilhar um bocado de peixe"!
[26]
"Não vás homem, que é dia é dia de Senhora da Bonança".
[27]
"Vou"!
[28]
E eu tinha isca, desta isca que se apanha aqui nestas nestas pedras, no mexilhão, destas minhocas assim gran-, minhocas.
[29]
INF Minhoca.
[30]
Chama-se is- isca,
[31]
mas é é umas minhocas que , no mexilhão.
[32]
INF Sim.
[33]
Cava-se Escava-se com uma sachola
[34]
[pausa] e aquela isca está debaixo do
[35]
e aquela minhoca está debaixo da is- debaixo do mexilhão.
[36]
É.
[37]
Larotes assim grandes!
[38]
E eu apanhei muita isca, e ao outro di- apanhei de véspera
[39]
e ao outro dia, vou eu e o meu rapaz.
[40]
Levei-o comigo.
[41]
INF Nós [pausa] afundeámos,
[42]
de- demos,
[43]
largámos nós chamamos-lhe poitada.
[44]
Sabe o que é uma poitada?
[45]
É uma pedra, grande, assim grandinha,
[46]
amarra-se-lhe a corda,
[47]
bota-se para o fundo, para afundear a embarcação, para afundear a embarcação.
[48]
E ali estivemos.
[49]
Estivemos.
[50]
Ora, eu levei levei sardinhas,
[51]
e peguei num pedaço de rede dessa como , fininha do camarão
[52]
e botei aquelas sardinhas naquela redinha,
[53]
botei-lhe uma pedra,
[54]
botei-lhe uma linha para o fundo
[55]
Ora, aquilo, aquela sardinha, foi-se desfazendo,
[56]
e o peixe, que estava ali pelo lado, veio todo parar à minha beira, ali, debaixo da emba- da embarcação.
[57]
Era ter linha para apanhar peixe, os tais panchinhos os tais panchos que são assim, ó, assim e assim e assim e fanecas!
[58]
INF E fanecas.
[59]
Fanecas boas!
[60]
E eu pus-lhe uma linhinha pa- para ele.
[61]
Ele estava assim à , assentadinho.
[62]
E eu à proa, porque tinha mais blindança para alar a poitada e tudo.
[63]
E eu pu-lo à com uma linhinha.
[64]
Ai, e pilhou!
[65]
Ele era tão nov- nov-!
[66]
Eu me ria.
[67]
E eu tanto me ri que depois comecei a chorar!
[68]
Caiu uma trovoada!
[69]
Caiu uma tem- uma trovoada, veio um um trovão!
[70]
Depois, deu em cair chuva,
[71]
caiu uma faísca em cima daquele sanatório, que manda um estampido que ele ele tem , ele tem pa-, rai-, tem,- tem o [pausa] pára-raios, tem.
[72]
E caí- E aquela faísca deu um tam- um estampido que veio para ali:
[73]
"Ai, meu pai, que vamos morrer todos"!
[74]
"Ó meu filho, não te assustes"!
[75]
E eu fui acolá à, à à poitada, à corda,
[76]
alei,
[77]
alei a poitada.
[78]
Eu, ali naquele tempo, eu tinha força como um leão, Jesus!

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